Acórdão Nº 0300325-44.2019.8.24.0016 do Terceira Câmara de Direito Civil, 26-07-2022

Número do processo0300325-44.2019.8.24.0016
Data26 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300325-44.2019.8.24.0016/SC

RELATOR: Desembargador SAUL STEIL

APELANTE: ICATU SEGUROS S/A (RÉU) APELADO: CELSO ZAMPIERI (Espólio) (AUTOR) APELADO: RENILSE ALBERTI (Inventariante) (AUTOR) APELADO: CELSO ZAMPIERI JUNIOR (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Por brevidade, adota-se o relatório elaborado pelo Douto Juízo de Direito da 1ª Vara da comarca de Capinzal:

"CELSO ZAMPIERI (Espólio) ajuizou ação de cobrança em face de ICATU SEGUROS S/A, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos.

Alega a parte autora que aderiu a alguns consórcios, garantidos por seguro prestamista firmado com a ré. Sustenta que, em 27/01/2018, o segurado faleceu em decorrência de acidente de trânsito. Ainda, alega que houve indeferimento pela seguradora ré quanto ao pedido de cobertura formulado, ao argumento de que o segurado agravou o risco do contrato.

Em vista disso, requer a condenação da ré ao pagamento da indenização referente à cobertura contratada, de modo a quitar os contratos de consórcio e pagar a diferença entre os débitos e o valor da cobertura aos herdeiros, bem como reembolsar o valor despendido por estes ante a negativa de cobertura.

Citada, a ré apresentou resposta na forma de contestação (evento 15), em que arguiu, preliminarmente, a ilegitimidade ativa do espólio. Outrossim, impugnou o valor atribuído à causa e o benefício da justiça gratuita concedido à parte autora. No mérito, argumentou que a negativa foi legítima, diante do agravamento do risco pelo segurado, por ingestão de medicamento e álcool. Defendeu que o valor do capital segurado é diverso daquele indicado pela parte autora e que inexiste saldo remanescente a ser pago aos beneficiários.

Assim, requer a improcedência dos pedidos formulados pela parte autora ou, na eventualidade de ser o pedido julgado procedente, pugnou pela aplicação da taxa SELIC sobre o valor da condenação e de juros e correção a contar da citação.

Houve réplica (evento 19).

Decisão saneadora no evento 21.

Designou-se audiência de instrução, ocasião em que foi colhido depoimento da inventariante, bem como foram ouvidas duas testemunhas arroladas pela parte autora e uma pela parte ré, consoante termo do evento 88.

Em audiência de continuação, foram ouvidas outras duas testemunhas arroladas pela parte ré (evento 108).

As partes apresentaram suas alegações finais (eventos 110 e 111)".

Sobreveio sentença (Evento 113 - 1G) na qual a magistrada Flávia Carneiro de Paris julgou procedentes os pedidos, nos seguintes termos:

"Ante o exposto, julgo PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, extinguindo o feito com resolução de mérito (art. 487, I, do CPC), para CONDENAR a parte ré a: a) reembolsar os valores despendidos pelo espólio com o pagamento dos prêmios após o óbito do segurado (27/01/2018), corrigidos monetariamente pelo INPC a partir do desembolso e acrescidos de juros de mora deste a citação (art. 405 do CC); b) efetuar a liquidação do saldo devedor dos contratos de consórcio em nome do de cujus Celso Zampieri junto ao Banco Sicredi (nº 00472918, 00472920, 00457255 e 00339161); c) efetuar o pagamento do saldo de capital segurado excedente ao saldo devedor ao beneficiário, se houver.

Condeno a ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios, os quais fixo em 15% sobre o valor da condenação (art. 85, §2º, do CPC)".

Opostos embargos de declaração pela ré (Evento 118 - 1G), foram parcialmente acolhidos para sanar a contradição apontada (Evento 124 - 1G).

Admitida a habilitação do herdeiro CELSO ZAMPIERI JUNIOR como terceiro interessado (Evento 129 - 1G).

Irresignada, a seguradora interpôs recurso de apelação (Evento 144 - 1G).

Preliminarmente, voltou a afirmar que o espólio autor carece de legitimidade ativa, eis que a cobrança do seguro compete exclusivamente ao beneficiário indicado pelo segurado nas propostas de adesão ao seguro, seu filho Celso Zampieri Júnior. Alegou, ainda no ponto, que a magistrada singular não observou os limites subjetivos da demanda ao ter deferido no Evento 129 (1G), após a estabilização da lide e sem oportunizar o contraditório, a habilitação nos autos do referido beneficiário.

No mérito, insistiu, em síntese, na licitude da negativa administrativa, porquanto o acidente que ceifou a vida do segurado ocorreu unicamente em razão de ele estar totalmente embriagado e ter ingerido medicamento, quadro a atrair a incidência de cláusula da apólice que exclui riscos relacionados a morte decorrente de atos ilícitos dolosos.

Subsidiariamente, apontou que a condenação deve ser limitada ao valor correspondente à soma dos saldos devedores dos consórcios à data do sinistro e há de ser direcionada à estipulante do seguro, descabendo qualquer repasse suplementar ao autor, pois o importe de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) referido na petição inicial refere-se, apenas, ao limite disponibilizado a cada segurado, permitindo-se a contratação de diversos consórcios e sua cobertura pelo seguro prestamista, ao passo que o valor efetivo da garantia se trata de montante incerto e indefinido quando da contratação do seguro, que somente será aferido no momento do óbito do segurado.

Foram oferecidas as contrarrazões pelo terceiro interessado e pelo autor (Eventos 152 e 153 - 1G).

É o relatório.

VOTO

O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e dele conheço.

Trata-se de ação de cobrança por meio da qual o ESPÓLIO DE CELSO ZAMPIERI, representado pela inventariante RENILSE ALBERTI. pretende que a seguradora ICATU SEGUROS S/A seja condenada ao pagamento de seguro prestamista atrelado a quatro contratos de consórcio celebrados pelo de cujus, falecido em acidente de trânsito, com a estipulante Administradora de Consórcios Sicredi Ltda.

Da sentença de procedência proferida na origem, apela a seguradora ré, cujas insurgências passa-se a apreciar de forma pormenorizada.

1. Da preliminar de ilegitimidade ativa

A companhia securitária dá início a seu recurso com reiteração da preliminar de ilegitimidade ativa do espólio do segurado.

Afirma, em suma, que apenas o beneficiário indicado pelo segurado nas propostas de adesão ao seguro (Evento 15, Informação 106, p. 15-17, 21-23, 27-31 e 39-44, e Informação 107, p. 1-3 - 1G), seu filho Celso Zampieri Júnior, é quem teria legitimidade para demandar o pagamento da cobertura securitária.

Sem razão.

Em que pese o art. 794 do Código Civil enuncie que, "no seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito", dispositivo esse que ampara o entendimento de que a legitimidade para a cobrança da cobertura securitária por morte do segurado, em sede de seguros de vida, é realmente do beneficiário indicado na apólice, no caso vertente se está diante de seguro prestamista, cuja finalidade precípua é a quitação do saldo devedor dos contratos de consórcio a ele vinculados.

Há, nesse cenário, evidente interesse processual e legitimidade do espólio em obter o pagamento do seguro prestamista, uma vez que a quitação das parcelas residuais dos contratos de consórcio, ou mesmo a aquisição dos bens deles objeto, é do interesse da integralidade dos herdeiros do segurado, até porque, com o falecimento deste, respondem, nas forças da herança, perante a instituição credora.

A corroborar:

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE SEGURO PRESTAMISTA. RECURSO DA RÉ.1) CONTRARRAZÕES. AVENTADA INOVAÇÃO RECURSAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA NÃO SUSCITADA EM CONTESTAÇÃO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. CONHECIMENTO. TESE REFUTADA.2) DO APELO DA RÉ.2.1) ILEGITIMIDADE ATIVA. VIÚVA A PLEITEAR INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA EM NOME PRÓPRIO. INSUBSISTÊNCIA. EX-CONSORTE QUE FIGURA NO POLO ATIVO APENAS QUANTO AO PLEITO DE DANOS MORAIS DECORRENTES DAS INCESSANTES LIGAÇÕES DE COBRANÇA E AMEAÇAS DE BUSCA E APREENSÃO DO VEÍCULO. POSSIBILIDADE. ESPÓLIO, REPRESENTADO PELA INVENTARIANTE, LEGITIMADO PARA POSTULAR O SEGURO. PROEMIAL AFASTADA [...]" (TJSC, AC n. 0004487-05.2013.8.24.0037, rel. Des. Gerson Cherem II, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 29-07-2021; destaquei).

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. SEGURO PRESTAMISTA. FALECIMENTO DO SEGURADO. NEGATIVA DE COBERTURA ANTE ALEGADA NÃO APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS COMPLEMENTARES PARA CONCLUSÃO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ. ARGUIÇÃO DE ILEGITIMIDADE DO ESPÓLIO PARA PLEITEAR O CUMPRIMENTO DO CONTRATO PRESTAMISTA FORMALIZADO PELO DE CUJUS. MATÉRIA NÃO ARGUIDA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. IRRELEVÂNCIA. QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA PASSÍVEL DE CONHECIMENTO EM QUALQUER TEMPO E GRAU DE JURISDIÇÃO, INCLUSIVE DE OFÍCIO (ART. 485, § 3º DO CPC). TESE, CONTUDO, AFASTADA. LEGITIMIDADE ATIVA EVIDENCIADA [...]" (TJSC, AC n. 0012979-95.2013.8.24.0033, de Itajaí, rel. Selso de Oliveira, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 01-11-2018).

Não se ignora que, na petição inicial, o espólio autor requereu a condenação da...

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