Acórdão Nº 0300360-57.2014.8.24.0055 do Segunda Câmara de Direito Público, 15-03-2022

Número do processo0300360-57.2014.8.24.0055
Data15 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300360-57.2014.8.24.0055/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO ROBERTO BAASCH LUZ

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA APELADO: TATIANE FERREIRA (AUTOR) APELADO: POLIANA FERREIRA DE JESUS

RELATÓRIO



Trata-se de apelação cível interposta pelo ESTADO DE SANTA CATARINA, contra a sentença (Evento 120 dos autos na origem) que, na ação de indenização por danos morais e materiais n. 0300360-51.2014.8.24.0055, ajuizada, por TATIANE FERREIRA, por si, e representando POLIANA FERREIRA DE JESUS, em face do ESTADO DE SANTA CATARINA, diante da conexão com os autos de n. 03006507220148240055, de forma conjunta, julgou procedentes em parte os pedidos veiculados em ambos os feitos, nos seguintes termos:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido inicial de ambas as ações conexas (nº 0300360-57.2014.8.24.0055 e nº 0300650-72.2014.8.24.0055), ajuizada, a primeira, por Tatiane Ferreira e Poliana Ferreira de Jesus, esta devidamente representa pela sua genitora, em face do Estado de Santa Catarina e, a segunda, por Mateus Ferreira de Jesus, legalmente representado pelos seus guardiãos Adilson Alves de Jesus e Adinalva Rickli de Oliveira de Jesus, em face daquele réu, para:

a) CONDENAR o requerido (Estado de Santa Catarina) ao pagamento de indenização por danos morais aos autores (Tatiane, Poliana e Mateus) no valor de R$ 50.000,00, na proporção de 1/3 para cada um. Para o cálculo da correção monetária e juros de mora, reconheço, por ora, na linha da jurisprudência catarinense, a "aplicação dos índices previstos no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09. Contudo, aponto a possibilidade da incidência de fator diverso, em fase de liquidação ou execução da sentença, nos termos do que for julgado em definitivo pelo STF no Tema 810" (TJSC, Apelação Cível 0301019-18.2017.8.24.0037, Primeira Câmara de Direito Público, j. em 07/05/2019)."

b) CONDENAR o réu ao pagamento de pensão que se dará com base na fundamentação exposta no corpo desta decisão, levando-se em conta que o valor será o do salário mínimo atualizado, mas as parcelas vencidas serão apuradas, depois de identificadas a sua projeção nominal à época, pelos mesmos indexadores expostos no item anterior.

CONDENO o réu ao pagamento dos honorários advocatícios, os quais fixo em 15% sobre o valor da condenação, considerando sobretudo a natureza e a importância das causas, o tempo de tramitação do feito e a presença de fase instrutória (CPC, art. 85, § 2°). A base de cálculo da verba honorária será o somatório da condenação mais um ano das parcelas vincendas (CPC, art. 85, § 9º; STJ, AgRg no REsp nº 905.784/DF, Rel. Min. Paulo Tarso Sanseverino, j. 16/11/2010).

Sustenta, o primeiro apelante, Estado de Santa Catarina, preliminarmente, em síntese, a ilegitimidade ativa de Tatiane Ferreira, argumentando, para tanto, que "Não se verifica nos documentos constantes nos autos nenhum elementoque demonstre a existência da relação conjugal entre o de cujus e a autora Tatiane, ao tempodo falecimento de Edinei", nem mesmo prova de que "à época dos fatos ensejadores da presente demanda, a autora era sua companheira, nem de sua dependência financeira em relação ao de cujus."

A propósito, aponta que "a testemunha Alvino afirmou que não conhecia a autora Tatiane, porém no processo crime, na fase inquisitória, afirmou que conhecia Edinei, que era vizinho dele, que morava com outros irmãos, os quais se metiam em confusão, sinal evidente de que não viviam juntos (Edinei e Tatiana); não eram conhecidos como um casal" e, ainda, que o mesmo depoente, no Inquérito Policial IPM n. 004//14.BPM/2002, disse que a vítima Edinei morava apenas com seus irmãos, tendo indicado, a referida testemunha, "seu endereço como sendo: Rua Rosa Schessel, n.º 122, São Rafael, Rio Negrinho, a certidão de óbito da vítima confirma que este residia na Rua Rosa Schessel", enquanto o endereço indicado na exordial por Tatiane é diverso.

Ainda em sede preliminar, argui a prescrição da pretensão inaugural, em relação à autora Tatiane, pontuando que "que a autora Tatiane Ferreira nasceu em 08/11/1982, razão pela qual veio a completar 18 (dezoito) anos de idade em 08/11/2000"; "O fato ensejador da responsabilidade civil do Estado ocorreu em 03/11/2002, data em que a autora Tatiane Ferreira já era maior e capaz"; "(...) o fato ocorreu em 03/11/2002, e a ação só veio a ser protocolada em juízo em 25/06/2014"; "O fato, portanto, homicídio praticado por agente público estadual, era identificável de plano, não havendo necessidade de aguardar o desfecho da ação penal correlata, para somente após demandar contra o Estado no juízo cível"; "Isso porque, no caso em exame, a autoria já era conhecida desde a data do fato, de maneira que não havia necessidade de aguardar o desfecho do processo criminal, não incidindo no presente caso, a hipótese do art. 200 do Código Civil"; "Ademais, a responsabilidade civil é independente da criminal (art. 935 do Código Civil), sendo totalmente infundadas as alegações de que era necessário aguardar o desfecho do processo-crime para só então dar início à ação indenizatória, já que, como afirmamos, a autoria do delito era conhecida desde o dia do fato"; "Outrossim, ainda que os fatos narrados na exordial tenham dado ensejo à deflagração da ação penal pelo Ministério Público, em relação ao Estado de Santa Catarina não se aplica a interrupção do prazo prescricional preconizada no artigo 200 do Código Civil porque a responsabilidade do ente federativo independe da aferição de culpa do preposto e, portanto, não guarda relação com a apuração do fato na esfera criminal."

Pugna pelo acolhimento da preliminar, com a extinção do feito em relação à autora Tatiane, nos termos do art. 487, II, do CPC.

Quanto ao mérito, assevera que "o disparo de bala de borracha que atingiu Edinei Jauri de Jesus configurou medida necessária e proporcional, efetivada em cumprimento do dever legal (impedir a resistência à ordem de prisão de terceira pessoa, manter a ordem e a segurança públicas, eis que os amigos da vítima investiram contra a guarnição e tentavam tomar a arma do soldado Baungartner, enquanto a vítima investia contra o soldado Gildo Rogério Hoffmann), bem como em legítima defesa do agente e de seu companheiro de guarnição, soldado Baungartner, ameaçados pela atitude hostil da vítima", de modo que "Os atos praticados dentro das hipóteses supracitadas, inequivocamente presentes no caso vertente, excluem a ilicitude da conduta e, por conseguinte, obstam à concretização reparatória", concluindo haver o rompimento do nexo causal, o que defende afastar, por conseguinte, o dever reparatório.

Assere, ademais, que "Além de não existir qualquer ilicitude na atuação dos agentes estatais - o que, por si só, já afastaria qualquer pretensão indenizatória - claro está que foi a vítima quem lhe deu causa", uma vez que "É inegável que o evento teria tido outro desfecho se a vítima não tivesse agido de forma agressiva, atacado o policial militar Gildo Rogério Hoffmann e ignorado os avisos prévios que lhe foram feitos." Isso porque, "A vítima deliberadamente persistiu com as investidas contra o policial, implementando óbice à atuação do policial, não sendo suficiente nem mesmo o fato de estar o policial armado" e, "Ao se aproximar perigosamente do Sd. Gildo, não deixou alternativa alguma àquele agente a não ser disparar a arma de munição não-letal (bala de borracha), já que todas as medidas anteriores foram insuficientes para inibir a atitude agressiva e perigosa da vítima."

Nestes termos, pugna pelo reconhecimento de culpa concorrente, "Na eventualidade de não serem acolhidos os argumentos referentes à inexistência de responsabilidade estatal pelo evento".

Adiante, no concernente aos danos materiais, assevera que "não há provas de que o falecido tinha renda, nem de que prestava auxílio financeiro aos autores, pelo que é incabível o pensionamento." No ponto, sucessivamente, requer que o prazo final do pensionamento corresponda à maioridade do autor (18 anos), ou, na pior das hipóteses, 21 anos, enquanto, no que diz respeito a companheira "a pensão deve-se limitar até a data em que o falecido completaria 65 anos de idade."

Por fim, almeja a redução do quantum fixado a título de danos morais, bem como, que os juros de mora tenha fluência a partir do transito em julgado, com fundamento no art. 407 do CC.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado pelo Excelentíssimo Senhor Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira, manifestou-se "pelo conhecimento e desprovimento do recurso de apelação interposto pelo Estado de Santa Catarina, bem como pelo conhecimento e parcial provimento do recurso de apelação interposto por Mateus Ferreira de Jesus, com a reforma da sentença, a fim de que seja majorado o quantum fixado a título de indenização por danos morais para R$ 30.000,00 (trinta mil reais), para cada um dos autores." (Evento 12)

É o relatório.

VOTO

Pretende o apelante, a reforma da sentença singular que o condenou ao pagamento de indenização por danos morais e materiais, em razão da morte de Edinei Jauri de Jesus, em confronto com Policias Militares, em decorrência de um tiro com armamento não letal, com quem convivia maritalmente a parte autora, Tatiane Ferreira, e genitor da autora, Poliana Ferreira de Jesus.

Lançando mão das ferramentas digitais, a fim de elucidar o cenário debatido nos autos, colhe-se do relatório sentencial:

1. Da ação de ação de indenização por danos morais e materiais c/c pedido de pensão alimentícia nº 0300360-57.2014.8.24.0055

Tatiane Ferreira, em nome próprio e representando Poliana Ferreira de Jesus, ajuizaram a presente ação em face do Estado de Santa Catarina alegando que: a) em 03/11/2002 Edinei Jauri de Jesus, com quem a primeira convivia maritalmente e genitor da segunda, foi morto pelo Policial Militar Sd. Gildo Rogério Hoffmann, o qual teve a sua culpa reconhecida nos autos nº 055.04.000938-0, neste Juízo; b) o marido da autora era responsável pelo...

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