Acórdão Nº 0300388-17.2014.8.24.0090 do Segunda Turma Recursal, 11-08-2020
Número do processo | 0300388-17.2014.8.24.0090 |
Data | 11 Agosto 2020 |
Tribunal de Origem | Capital - Norte da Ilha |
Órgão | Segunda Turma Recursal |
Classe processual | Recurso Inominado |
Tipo de documento | Acórdão |
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ESTADO DE SANTA CATARINA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA Segunda Turma Recursal |
Recurso Inominado n. 0300388-17.2014.8.24.0090, da Capital - Norte da Ilha
Relatora: Juíza Margani de Mello
RECURSO INOMINADO. TRANSPORTE TERRESTRE. EXTRAVIO DEFINITIVO DE BAGAGEM. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA EMPRESA. TESE DE AFASTAMENTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONSUBSTANCIADA NA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS E AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO DE SEGURO. APLICAÇÃO DO DECRETO N. 2.521/98 QUE NÃO AFASTA A INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. TRANSPORTADORA QUE NÃO EXIGE PRÉVIA DECLARAÇÃO PREENCHIDA PELO PASSAGEIRO, INFORMANDO O VALOR DOS PERTENCES AO TEMPO DA VIAGEM. REGRA DO ÔNUS DA PROVA DESCUMPRIDO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DEVER DE INDENIZAR. LIMITAÇÃO PREVISTA NO DECRETO N. 2.251/98 REVOGADA PELO DECRETO N. 8.083/13. DECRETO N. 12.601/80 QUE NÃO PODE PREVALECER SOBRE AS NORMAS CONSUMERISTAS, QUE ASSEGURAM REPARAÇÃO INTEGRAL DOS DANOS SOFRIDOS PELO PASSAGEIRO. DANOS MORAIS. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA JURISPRUDÊNCIA NO SENTIDO DE QUE, NO CASO DE PERDA DEFINITIVA DE PERTENCES, OS DANOS NÃO DEPENDEM DE PROVA. PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE MINORAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. QUANTIA QUE ATENDE O CARÁTER COMPENSATÓRIO E EDUCADOR DA MEDIDA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado n. 0300388-17.2014.8.24.0090, da comarca da Capital - Norte da Ilha Juizado Especial de Santo Antônio de Lisboa, em que é recorrente Auto Viação Catarinense Ltda., e recorrida Gisele Tyba Mayrink Redondo Orgado:
I - RELATÓRIO
Conforme autorizam o artigo 46, da Lei 9.099/95, e o Enunciado n. 92, do FONAJE, dispensa-se o relatório.
II - VOTO
Insurge-se a empresa de ônibus recorrente contra a sentença de pp. 180-182, da lavra da juíza Ana Luisa Schmidt Ramos, que julgou procedentes os pedidos contra ela formulados, sustentando, em síntese: a) inexistência de comprovante de pagamento dos bens extraviados; b) necessidade de aplicação do Decreto Federal nº 2.521/98 para valoração dos danos materiais; c) ausência de contratação de seguro; d) não comprovação dos danos morais indenizáveis. Requer a reforma do julgado ou, subsidiariamente, a redução do valor da indenização.
Contrarrazões apresentadas às pp. 218-225.
O reclamo não merece acolhimento.
No que pertine à ausência de comprovação de que os itens pleiteados estavam efetivamente no interior da mala despachada pela recorrida, razão não assiste à empresa recorrente, na medida em que a aplicação do disposto na legislação por ela indicada não afasta a incidência das normas consumeristas. A propósito: "o Regulamento dos Serviços Rodoviários Interestaduais e Internacionais, regulado pelo Decreto Lei n. 2.521/98, no tocante à situação dos objetos pessoais dos passageiros, depositados nos porta-bagagens do coletivo, estabelece apenas princípios gerais dos serviços prestados aos usuários, mas que o artigo 5º, inciso IV, da referida norma, aponta pela observação das normas de defesa do consumidor, sendo certo que tal dispositivo faz transcender, quanto aos seus efeitos, o decreto mencionado, reportando-se necessariamente à Lei 8.078/90" (TJSC, AC n. 2011.002382-0, relª. Des. Subst. Maria Terezinha Mendonça de Oliveira , j. .7.6.11).
E, seguindo nesta linha de raciocínio, esta Turma de Recursos entende que "se a empresa transportadora não exigiu declaração prévia do conteúdo e do valor da bagagem a fim de fixar o limite da indenização (CC, art. 734, parágrafo único), assumiu o risco quanto à bagagem transportada, ao seu conteúdo e ao seu valor, notadamente se inexistem dúvidas quanto à existência das bagagens e do extravio ocorrido, devendo prevalecer o montante dos danos materiais apontado pela passageira" (TJDF, AC n. 448.561, Segunda Turma Cível, rela. Desa. Carmelita Brasil, DJDFTE 23/09/2010) (TJSC, AC n. 2014.026043-4, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. 26-5-2015).
No mesmo sentido: "(...) não merece acolhimento a afirmativa de falta de provas do bens constantes da mala perdida. Evidente que a exigência de demonstração do exato conteúdo e valor da bagagem extraviada constitui ônus muito gravoso, mormente quando atribuído ao hipossuficiente. Aliás, não é coerente impor aos consumidores a exibição dos recibos fiscais da totalidade de bens que carregam em sua mala ou atribuir-lhes o encargo de apresentar o relatório de despacho se sequer há menção ou prova de que a empresa entregou-o ao passageiro" (TJSC, Apelação Cível n. 0012184-87.2012.8.24.0045, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 27-6-2016).
Dessa forma, cabia à empresa recorrente apresentar cópia do formulário de despacho de bagagem preenchido pela passageira antes do embarque, o que poderia facilmente ter sido feito e que atestaria o conteúdo da mala. Contudo, não trouxe aos autos nenhum documento neste sentido - ônus que lhe incumbia.
A recorrente também argui a imprudência da passageira, por não contratar seguro para transporte da bagagem como motivo para afastamento dos danos materiais. Sabe-se que a contratação de seguro-bagagem, embora aconselhada, é opcional, de forma que é inviável tolher o direito da consumidora de pleitear os danos materiais por conta de sua não obtenção.
Resta configurado, portanto, o dever de indenizar os prejuízos materiais experimentados pela recorrida. No que pertine ao valor condenatório, esse não deve se limitar ao disposto nos Decretos invocados pela recorrente,...
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