Acórdão Nº 0300397-56.2016.8.24.0074 do Quarta Câmara de Direito Civil, 22-09-2022

Número do processo0300397-56.2016.8.24.0074
Data22 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300397-56.2016.8.24.0074/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH

APELANTE: ALCIDES VANDERLINDE (RÉU) APELADO: MARILZA DE ANDRADE SCHMOEGEL (AUTOR) APELADO: MARIANE SCHMOEGEL (AUTOR)

RELATÓRIO

Acolho o relatório da sentença (evento 70/1º grau), de lavra do Juiz Valter Domingos de Andrade Junior, por contemplar precisamente o conteúdo dos presentes autos, ipsis litteris:

MARIANE SCHMOEGEL e MARILZA DE ANDRADE SCHMOEGEL promoveram a presente ação em relação a ALCIDES VANDERLINDE.

Alegam que, no dia 10.01.2016, trafegavam normalmente pela Rodovia BR-470, quando o veículo conduzido pelo réu teria invadido a contramão de direção e atingido frontalmente o veículo em que estavam as autoras, gerando danos morais, materiais e estéticos. Argumentam que o réu, ao invadir a mão contrária de direção sem as devidas cautelas, agiu negligentemente, em total desrespeito às leis de trânsito. Contam que foram submetidas a intervenção cirúrgica, o que lhes causou cicatrizes externas e internas em várias partes do corpo. Relatam também que, em razão das lesões, houve a redução da capacidade laborativa e que ficaram impossibilitadas de continuar a desenvolver suas profissões e suas atividades ordinárias, prejudicando rendimentos mensais de R$ 1.640,00 e de R$ 1.042,00.

Pedem, em razão destes fatos, a condenação do réu ao pagamento, a título de danos materiais, (a) das despesas médicas e hospitalares, no valor de R$ 380,00; (b) dos reparos realizados no veículo automotor conduzido pela autora, nos valor de R$ 14.888,00; e (c) de pensão mensal em razão da redução da capacidade para atividades habituais, no valor do último salário recebido por cada uma das autoras. Pedem, ainda, a compensação dos danos morais e estéticos oriundos do acidente, em valor a ser arbitrado pelo juízo.

Citado, o réu apresentou defesa em forma de contestação (e. 19).

Preliminarmente, impugnou a concessão da justiça gratuita. No mérito, alegou a existência de caso fortuito, sob o fundamento de que a invasão da pista contrária teria ocorrido em razão ter sido acometido por um desmaio enquanto conduzia o veículo. Afirmou que conduzia seu veículo de forma prudente e que a colisão teria sido imprevisível e inevitável. Defendeu a não ocorrência de redução na capacidade laborativa, de dano moral ou de dano estético e que, em relação à autora Mariane, as lesões corporais seriam decorrente de culpa concorrente, na medida em que essa não estaria usando o cinto de segurança. Requereu a improcedência dos pedidos.

Houve réplica (e. 23).

Na decisão de evento 26, as preliminares foram afastadas e saneou-se o processo, deferindo a produção de prova pericial.

A prova pericial aportou aos autos no evento 43.

A parte autora juntou novos documentos (e. 54). A parte ré, intimada para sobre eles se manifestar (e. 58), manteve-se inerte.

É o relatório.

O Magistrado julgou parcialmente procedentes os pedidos exordiais, nos seguintes termos:

Assim, julgo procedentes, em parte, os pedido formulado na inicial para condenar ALCIDES VANDERLINDE ao pagamento de R$ 15.268,00, a título de danos materiais; de R$ 40.000,00, a título de danos morais; e de R$ 8.000,00, a título de danos estéticos.

O valor da condenação pelos danos materiais deverá ser corrigido pelo INPC desde a data dos orçamentos e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês desde 10.01.2016 (data do evento danoso - art. 398 do Código Civil).

O valor da condenação dos danos morais e dos danos estéticos deverá ser corrigido desde a publicação desta decisão pelo INPC e acrescido de juros de 1% ao mês desde 10.01.2016 (data do evento danoso - art. 398 do Código Civil).

Condeno ainda o réu ao pagamento das despesas e de honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação, observada eventual gratuidade e as isenções legais.

Irresignado com a prestação jurisdicional entregue, o réu interpôs apelação (evento 78/1º grau). Preliminarmente, busca a revogação do benefício da gratuidade da justiça concedido às autoras. No mérito, aduz tese de exclusão de responsabilidade pelo ilícito e requer o afastamento da condenação à reparação dos danos suportados pelas acionantes. Subsidiariamente, pleiteia a readequação do quantum arbitrado a título de indenização por danos morais e estéticos.

Contrarrazões no evento 86 dos autos de origem.

VOTO

O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

1 IMPUGNAÇÃO À JUSTIÇA GRATUITA

Em sede de preliminar de apelação, sustenta o recorrente que o benefício da gratuidade da justiça concedido às apeladas comporta revogação por alegadamente descumprirem os requisitos para fazer jus à benesse.

Sem razão o insurgente.

In casu, o pleito de revogação do benefício da gratuidade da justiça que, como é cediço, é concedido às pessoas com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, chama à ordem as regras insculpidas no art. 99 do CPC/15:

Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.

(...)

§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.

§ 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural (...).

Nesse diapasão, a declaração de hipossuficiência das autoras (item 17, evento 7 dos autos de primeiro grau) foi devidamente acompanhada de prova documental que amparou o deferimento do pleito ante o preenchimento dos pressupostos processuais de estilo.

Isso porque a autora Marilza, qualificada na exordial como empresária, sócia da SB Molas e Soldas LTDA ME., disse estar afastada das atividades laborais para recuperar-se do infortúnio, e que seu rendimento bruto mensal, quando exercia a função de auxliar de escritório em dita empresa, alcançava o valor de R$ 1.640,00 (mil seiscentos e quarenta reais). Aduziu que não possuía veículo ou imóveis registrados em seu nome, conforme certidões do competente Ofício do Registro de Imóveis da comarca de sua residência e do Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN/SC) (item 9 do evento 1, e evento 7, todos dos autos de origem).

Anoto que, por um lado, o apelante se insurge quanto à concessão da benesse a pessoa que consta no quadro societário de empresa, sendo que tal situação, por si só, não comprova riqueza, nem mesmo atesta suficiência econômica da parte para arcar com custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios, sem prejuízo de seu sustento e de sua família.

De outra banda, a autora Mariane declarou-se desempregada na data de 11/4/2016. Juntou ao caderno processual folha de pagamento referente ao mês de novembro de 2015, da qual se depreende que àquele tempo exercia o cargo de recepcionista em escritório de contabilidade de nome FCONT Contabilidade ME., com salário base de R$ 1.042,00 (mil e quarenta e dois reais). Além disso, anexou extrato de consulta ao DETRAN/SC que atesta a inexistência de veículo automotor registrado em seu nome e também certidão negativa de propriedade de bens imóveis na comarca onde reside (item 10 do evento 1, e itens 18 e 19 do evento 7, todos dos autos de origem).

Assim, quanto ao benefício estendido às autoras, a impugnação almejada pelo réu não passa de mera ilação, pois desacompanhada de prova que infirme aquela já acostada aos autos. O acionado aduz, em manifesto descompasso com o conteúdo probatório dos autos que "quanto à segunda requerente, junta folha de pagamento, fls. 53 - como recepcionista. Porém tal documento nem menciona qual empresa labora, assim evidente que a mesma trabalha na empresa da família (SB Molas e Soldas - contrato social anexo)" (pág. 4 do evento 78 dos autos de primeiro grau).

No caso em tela, a comprovação de capacidade econômica ou, porventura, da modificação das condições pessoais das acionantes cabia ao impugnante (Art. 373, inciso II, do CPC/15), ônus processual o qual não foi satisfeito, eis que as razões recursais, no ponto, caracterizam mera reprodução de argumentos já rechaçados pelo Togado a quo, incapazes de derruir a presunção de veracidade da hipossuficiência declarada pelas autoras.

Nesse sentido, é da Jurisprudência desta Casa de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA RÉ.GRATUIDADE DA JUSTIÇA. APELANTE QUE VERBERA NÃO FAZER A AUTORA JUS À BENESSE DIANTE DO PATRIMÔNIO QUE OSTENTA. INSUBSISTÊNCIA. ELEMENTOS ENCARTADOS NOS AUTOS QUE CORROBORAM A ALEGAÇÃO DE HIPOSSUFICÊNCIA ECONÔMICA VERTIDA PELA DEMANDANTE NA EXORDIAL. BENEFÍCIO REGULARMENTE CONCEDIDO. MANUTENÇÃO DEVIDA.ILEGITIMIDADE PASSIVA. PREFACIAL QUE SE CONFUNDE COM A TESE PERTINENTE AO MÉRITO, DEMANDANDO ANÁLISE CONJUNTA. ILEGITIMIDADE ATIVA. ALEGADA AUSÊNCIA DE PROVA DA AFETAÇÃO DO PATRIMÔNIO DA REQUERENTE PELO INCÊNDIO QUE FUNDAMENTA A PRETENSÃO COMPENSATÓRIA. TESE INCOMPATÍVEL COM ACERVO PROBATÓRIO CONTIDO NO FEITO. PRELIMINAR RECHAÇADA.RESPONSABILIDADE CIVIL. INCÊNDIO OCORRIDO EM IMÓVEL LOCADO QUE AFETOU IMÓVEL VIZINHO PERTENCENTE À AUTORA. RÉ QUE É LOCADORA DO BEM EM QUE SE ORIGINOU O FOGO. CONTRATO DE LOCAÇÃO QUE ENSEJA TRANSFERÊNCIA DE RESPONSABILIDADES AO LOCATÁRIO, NÃO INTEGRANTE DA LIDE. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE DENOTEM CIRCUNSTÂNCIA INSERIDA DA ESFERA DE RESPONSABILIDADE DA LOCADORA. HIPÓTESES DO ART. 932 DO CÓDIGO CIVIL NÃO CARACTERIZADAS. DEVER DE INDENIZAR PELOS DANOS QUE NÃO É IMPUTÁVEL À REQUERIDA. PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIZAÇÃO APREGOADAS NOS ARTS. 186, 187 E 927 DA NORMA EM COMENTO NÃO CONFIGURADAS. PRETENSÃO RESSARCITÓRIA QUE DEVE SER JULGADA IMPROCEDENTE. SENTENÇA REFORMADA NO PONTO.LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DOLO PROCESSUAL DA AUTORA NÃO CARACTERIZADO. INOCORRÊNCIA DE QUAISQUER DAS HIPÓTESES DO ARTIGO 80 DO...

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