Acórdão Nº 0300412-95.2015.8.24.0159 do Quarta Turma de Recursos - Criciúma, 07-11-2017

Número do processo0300412-95.2015.8.24.0159
Data07 Novembro 2017
Tribunal de OrigemArmazém
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão




ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Quarta Turma de Recursos - Criciúma





Recurso Inominado n. 0300412-95.2015.8.24.0159, de Armazém

Relatora: Juíza Miriam Regina Garcia Cavalcanti

RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. MORTE DE DEPENDENTE DA SEGURADA DECORRENTE DE ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. EMBRIAGUEZ. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

INSURGÊNCIA DA AUTORA. ALEGAÇÃO DE QUE A EMBRIAGUEZ NÃO ENSEJA A PERDA DO DIREITO À COBERTURA SECURITÁRIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE A EMBRIAGUEZ TENHA INFLUENCIADO DECISIVAMENTE O RESULTADO DO EVENTO DANOSO, TAMPOUCO A INTENÇÃO DO FALECIDO DE FRAUDAR A RELAÇÃO NEGOCIAL E BENEFICIAR SUA FAMÍLIA. ÔNUS DA PROVA EM QUE NÃO SE DESINCUMBIU A SEGURADORA. ENTENDIMENTO PACIFICADO EM JULGADO RECENTE DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (RESP 1.665.701/RS). DEVER DA SEGURADORA DE INDENIZAR EM RAZÃO DO FALECIMENTO DO DEPENDENTE DA SEGURADA. NECESSIDADE DE PAGAMENTO PELA RÉ DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA ACRESCIDA DE JUROS DE MORA DE 1% AO MÊS, A CONTAR DA CITAÇÃO, E CORREÇÃO MONETÁRIA, A CONTAR DA CONTRATAÇÃO DO SEGURO.

RECURSO PROVIDO.



Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado n. 0300412-95.2015.8.24.0159, da Comarca de Armazém (Vara Única), em que é recorrente Ermi Correa da Silva, e recorrida Liberty Paulista Seguros S.A..



ACORDAM, em sessão da Quarta Turma de Recursos, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, para condenar a recorrida ao pagamento da indenização securitária, correspondente a 50% do capital segurado individual para morte (R$ 9.500,00 – nove mil e quinhentos reais), acrescido de correção monetária a partir da contratação e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a contar da citação.


RELATÓRIO


Dispensado o relatório (Lei 9.099/95, art. 46).


VOTO



De início, cumpre ressaltar que resta incontroverso nos autos ser a autora beneficiária do contrato de seguro de vida contratado por ela por meio de sua empregadora "Gravatal Hoteis de Turismo S/A", consubstanciado na apólice n. 93.58.410.687 (pág. 14 e ss.), que prevê, dentre outras, a cobertura por morte e morte acidental.


Incontroverso, outrossim, o fato de ter o dependente da segurada, seu esposo Tomaz da Silveira, em 07 de dezembro de 2014, durante a vigência do seguro mencionado (01.01.2015 a 01.01.2016), envolvido-se em acidente de trânsito, culminando com seu óbito (boletim de ocorrência: pág. 54; e certidão de casamento à pág. 13, onde consta o seu falecimento).


Entretanto, após ter a autora solicitado pagamento da indenização securitária, prevista no contrato para o caso de falecimento da segurada ou de seu cônjuge, a seguradora negou a cobertura pelos seguintes argumentos (pág 24), in verbis:


"(...) Informamos que após análise da documentação apresentada, verificamos que o segurado era condutor do veículo que perdeu o controle da direção derrapando e saindo da pista, desta forma o evento não encontra amparo, tendo em vista o segurado ter feito uso de bebida alcoólica conforme laudo de exame toxicológico e de dosagem alcoólica, expedido pelo Instituto de Medicina Legal, configurando agravamento de risco conforme código civil, que transcrevemos abaixo:

- Artigo 768:

O segurado perderá à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato.


5. RISCOS EXCLUÍDOS


(...) c) as perturbações e intoxicações alimentares de qualquer espécie, bem como as intoxicações decorrentes da ação de produtos químicos, drogas ou medicamentos, salvo quando prescritos por médico, em decorrência de acidente coberto;


Diante o exposto, estamos impossibilitados de atender a solicitação. (...)"


Contudo, inaplicável a justificativa acima transcrita ao presente caso, vejamos.


Sobre a contratação de seguro e a embriaguez ao volante, nos casos de seguro de veículo, o egrégio Tribunal de Justiça já firmou entendimento no sentido defendido pela seguradora e acolhido pelo juízo singular, reconhecendo a validade da cláusula limitativa:


APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. NEGATIVA DE COBERTURA SECURITÁRIA. SEGURO DE VEÍCULO. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INSURGÊNCIA DOS AUTORES. CONDUTOR EMBRIAGADO. EXCLUDENTE DO DEVER DE INDENIZAR. PEDIDO DE INTERPRETAÇÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS DE MODO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR. CONHECIMENTO PÚBLICO A RESPEITO DA PROIBIÇÃO DE DIRIGIR ALCOOLIZADO. PLENA CIÊNCIA DOS RISCOS. CLÁUSULA VÁLIDA E APLICÁVEL. EBRIEDADE DO CONDUTOR DO VEÍCULO SEGURADO DOCUMENTALMENTE COMPROVADA. AGRAVAMENTO DO RISCO EVIDENCIADO. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE À DEMONSTRAÇÃO DE QUE O ESTADO DE EMBRIAGUEZ FOI FATOR DETERMINANTE PARA O ACIDENTE. CONDIÇÕES NORMAIS DE TRÂNSITO. INOCORRÊNCIA DE FATORES EXTERNOS QUE TIVESSEM CONTRIBUÍDO PARA O SINISTRO. PRECEDENTES. DEVER DE INDENIZAR NÃO CARACTERIZADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (Apelação Cível n. 0001935-50.2012.8.24.0054, de Rio do Sul, rel. Des. Jairo Fernandes Gonçalves, j. 30-5-2017).


Entretanto, no presente caso é analisado um seguro de vida, firmado na modalidade em grupo, que tem por finalidade garantir a vida de uma pessoa, e não a utilidade de um bem.


Nesse sentido, o colendo Superior Tribunal de Justiça já firmou o seguinte posicionamento, o qual se acolhe:


(...) Com relação ao contrato de seguro e à embriaguez ao volante, é certo que a Terceira Turma desta Corte Superior possui entendimento de que a direção do veículo por um condutor alcoolizado já representa agravamento essencial do risco avençado, sendo lícita a cláusula do contrato de seguro de automóvel que preveja, nessa situação, a exclusão da cobertura securitária. Isso porque há comprovação científica e estatística de que a bebida alcoólica é capaz de alterar as condições físicas e psíquicas do motorista, que, combalido por sua influência, acaba por aumentar a probabilidade de produção de acidentes e danos no trânsito, entre outros fundamentos (princípios do absenteísmo e da boa-fé e função social do contrato).

Assim, nessa espécie securitária, constatado que o condutor do veículo estava sob influência do álcool (causa direta ou indireta) quando se envolveu em acidente de trânsito - fato que compete à seguradora comprovar -, há presunção relativa de que o risco da sinistralidade foi agravado, a ensejar a aplicação da pena do art. 768 do CC. Por outro lado, a indenização securitária deverá ser paga se o segurado demonstrar que o infortúnio ocorreria independentemente do estado de embriaguez, como, a título exemplificativo, culpa do outro motorista, falha do próprio automóvel, imperfeições na pista, animal na estrada (vide REsp nº 1.485.717/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 14/12/2016).

Todavia, o caso dos autos se refere a seguro de vida, integrante do gênero seguro de pessoa, que possui princípios próprios, diversos, portanto, dos conhecidos seguros de dano.

Nesse contexto, no contrato de seguro de vida, ocorrendo o sinistro morte do segurado e inexistente a má-fé dele (a exemplo da sonegação de informações sobre eventual estado de saúde precário - doenças preexistentes - quando do preenchimento do questionário de risco) ou o suicídio no prazo de carência, a indenização securitária deve ser paga ao beneficiário, visto que "(...) a cobertura neste ramo é ampla" (ALVIM, Pedro. Obra citada, pág. 452 - grifou-se).

De fato, as cláusulas restritivas do dever de indenizar no contrato de seguro de vida são mais raras, visto que não podem esvaziar a finalidade do contrato, sendo "(...) da essência do seguro de vida para o caso de morte um permanente e contínuo agravamento do risco segurado" (TZIRULNIK E., CAVALCANTI F. Q. B., PIMENTEL A. O Contrato de Seguro: de acordo com o Novo Código Civil Brasileiro, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, pág. 155).

Dessa forma, ao contrário do que acontece no seguro de automóvel, a cláusula similar inscrita em contrato de seguro de vida que impõe a perda do direito à indenização no caso de acidentes ocorridos em consequência direta ou indireta de quaisquer alterações mentais, compreendidas entre elas as consequentes à ação do álcool, de drogas, entorpecentes ou substâncias tóxicas, de uso fortuito, ocasional ou habitual, revela-se inidônea. (...) (REsp n. 1665701/RS, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, j....

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