Acórdão Nº 0300425-07.2019.8.24.0078 do Quinta Câmara de Direito Público, 20-09-2022

Número do processo0300425-07.2019.8.24.0078
Data20 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300425-07.2019.8.24.0078/SC

RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA

APELANTE: JESSICA CARDOSO DE MELO (AUTOR) E OUTROS APELADO: OS MESMOS INTERESSADO: SIMONE DE PIERI RODRIGUES (INTERESSADO) INTERESSADO: VIVIANE DA ROSA DA SILVA (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença:

JESSICA CARDOSO DE MELO ajuizou a presente ação ordinária em face do MUNICÍPIO DE MORRO DA FUMAÇA e COOPERATIVA DE ELETRIFICAÇÃO RURAL DE MORRO DA FUMAÇA, objetivando que os réus sejam compelidos ao fornecimento de energia e água em imóvel de sua propriedade.

Após discorrer sobre outras questões fáticas, além das jurídicas, pugnou pela procedência dos pedidos iniciais. Valorou a causa. Juntou documentos.

Recebida a inicial, foi indeferido o pedido de antecipação de tutela e concedido o beneficio da justiça gratuita à parte autora, conforme decisão de Evento 6.

Devidamente citados, os réus apresentaram contestação aos Eventos 19 e 20.

Houve réplica (Eventos 24 e 25).

O Ministério Público se manifestou pela improcedência dos pleitos (Evento 29).

Em audiência, foram ouvidas duas testemunhas (Evento 84).

As partes apresentaram alegações finais (Eventos 91, 92 e 93).

Adito que os pedidos foram julgados improcedentes.

A autora, claro, recorre. Reconhece, conforme depoimentos colhidos em audiência, que seu imóvel possui ligação de água, mas insiste fazer jus à energia elétrica. Todos seus vizinhos possuem o serviço essencial, ligado à dignidade humana, e não pode ser tratada de forma desigual. Aliás, é até contraditório que possua um dos préstimos mas o outro seja negado. Afirma que possui um filho com síndrome de Down e que o imóvel está situado em área urbana consolidada, não sendo justificável a recusa do fornecimento.

Houve contrarrazões.

A Procuradoria-Geral de Justiça se manifestou pelo desprovimento.

VOTO

1. Embora a recorrente afirme que o imóvel esteja localizado em área urbana, ele está evidentemente em zona rural, tendo esse registro constado em documento oficial (evento 1, informação 9) juntado pela própria parte e sido mencionado, ainda que indiretamente, em audiência, ao que se soma a imagem do imóvel anexada (evento 19 da origem, informação 26) indicando realmente ser esta sua verdadeira localização.

Seja como for, retiro aquilo que é certo: há incontroversamente uma série de ocupações irregulares na região, que vêm de muito tempo, sendo que a maioria dos moradores possuem o serviço de energia elétrica fornecido normalmente - o Poder Público, por assim dizer, tolerava até certo período a clandestinidade, mas passou a ser menos permissivo ultimamente. Não existe, sob outro ângulo, nenhuma alegação ou registro de que a área utilizada pela autora esteja inserida em um cogitável espaço restritivo ambientalmente, talvez que dano dessa natureza tenha sido promovido (o imóvel, segundo foi dito em audiência, está lá no mínimo há mais de uma década; a acionante tem recebido luz por ajuda de um vizinho, irregularmente, daí por que deseja que o problema seja solucionado de forma correta), apenas não sendo realizada a ligação adequada porque a Administração possui norma obstando a entrega do préstimo em imóveis situados em área de ocupação irregular.

Nesse panorama, não se nega que os réus têm compromissos com a segurança, urbanismo e meio ambiente. Não existe, por assim dizer, um direito invencível ao acesso à energia elétrica. A Administração concretiza a entrega do serviço público e suas condutas, no que se referem a esses aspectos, têm presunção de legitimidade e ela está gabaritada a apurar os temas técnicos subjacentes. Na situação concreta, porém, há prova além do razoável no sentido de que a autora possui mesmo direito à ligação de energia elétrica em sua residência, a despeito da resistência até aqui empregada pelos réus.

2. O tema é regrado pela Aneel, fazendo esse papel a Resolução 414/2010, que possui estas disposições relacionadas ao caso concreto:

Art. 52. A distribuidora pode atender, em caráter provisório, unidades consumidoras de caráter não permanente localizadas em sua área de concessão, sendo o atendimento condicionado à solicitação expressa do interessado e à disponibilidade de energia e potência.

(...)

§ 2º Para o atendimento de unidades consumidoras localizadas em assentamentos irregulares ocupados predominantemente por população de baixa renda, devem ser observadas as condições a seguir: (Redação dada pela REN ANEEL 479, de 03.04.2012)

I - deve ser realizado como forma de reduzir o risco de danos e acidentes a pessoas, bens ou instalações do sistema elétrico e de combater o uso irregular da energia elétrica;

II - a distribuidora executará as obras às suas expensas, ressalvado o disposto no § 8° do art. 47, devendo, preferencialmente, disponibilizar aos consumidores opções de padrões de entrada de energia de baixo custo e de fácil instalação; e

III - a distribuidora pode adotar soluções técnicas ou comerciais alternativas, mediante apresentação das devidas justificativas para avaliação e autorização prévia da ANEEL; e (Redação dada pela REN ANEEL 610, de 01.04.2014)

IV - existência de solicitação ou anuência expressa do poder público competente. (Incluído pela REN ANEEL 418, de 23.11.2010)

§ 3o Os consumidores atendidos na forma deste artigo devem ser previamente notificados, de forma escrita, do caráter provisório do atendimento e das condições técnicas e comerciais pertinentes, bem como da possibilidade de conversão do atendimento provisório em definitivo nos termos do §5 o e, no caso do § 2o , da eventual necessidade de remoção da rede de distribuição de energia elétrica após a decisão final sobre a situação do assentamento. (Redação dada pela REN ANEEL 670 de 14.07.2015)

§ 4o Os equipamentos de medição a serem instalados devem ser compatíveis com a aferição e o registro das grandezas de consumo de energia elétrica e demanda de potência, conforme o caso.

§ 5o O interessado poderá solicitar a conversão do fornecimento provisório em definitivo, devendo a distribuidora verificar a necessidade de restituir valores pagos a maior, aplicando os procedimentos descritos nos arts. 40 a 48, conforme o caso, no prazo de até 90 (noventa) dias da solicitação, com a devida atualização pelo IGP-M, considerando o orçamento à época, a carga, demanda e tarifas atuais, bem como a necessidade de obra adicional, custos de retirada não incorridos e aproveitamento da obra já realizada no atendimento provisório. (Incluído pela REN ANEEL 670 de 14.07.2015)

Na situação, nada consta, de fato, quanto a uma possível regularidade do imóvel da autora, como mesmo reclamam os réus, só que a jurisprudência é tranquila no sentido de que referida regra não obsta a ligação daquela utilidade se se cuidar de área...

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