Acórdão Nº 0300430-09.2019.8.24.0020 do Quinta Câmara de Direito Civil, 18-02-2020

Número do processo0300430-09.2019.8.24.0020
Data18 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300430-09.2019.8.24.0020, de Criciúma

Relatora: Desembargadora Cláudia Lambert de Faria

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO DO NOME DO AUTOR NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO, EM DECORRÊNCIA DE DÉBITO OBJETO DE SUPOSTA CESSÃO DE CRÉDITO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

RECURSO DO AUTOR

REQUERIDA QUE DEIXOU DE COMPROVAR, DE MODO SUFICIENTE, QUE A DÍVIDA NEGATIVADA FOI ADQUIRIDA ATRAVÉS DE CESSÃO DE CRÉDITO. TERMO DE DECLARAÇÃO DE CESSÃO ACOSTADO AOS AUTOS QUE NÃO ESPECÍFICA OS CRÉDITOS CEDIDOS, É GENÉRICO, NÃO SENDO DOCUMENTO HÁBIL PARA COMPROVAR A TITULARIDADE DA COBRANÇA E A LEGITIMIDADE DA INSCRIÇÃO. INEXISTÊNCIA DO DÉBITO DO AUTOR FRENTE À RÉ. INSCRIÇÃO INDEVIDA. ATO ILÍCITO CONFIGURADO. DANO MORAL PRESUMIDO. DEVER DE INDENIZAR CARACTERIZADO. SENTENÇA REFORMADA.

ÔNUS SUCUMBENCIAL. NECESSIDADE DE INVERSÃO. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS JÁ CONSIDERANDO O LABOR NA FASE RECURSAL DA PROCURADORA DO DEMANDANTE.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300430-09.2019.8.24.0020, da comarca de Criciúma 1ª Vara Cível em que é Apelante Vandecir Roberto Lima e Apelado Omni S/A Crédito Financiamento e Investimento.

A Quinta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Cézar medeiros, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Ricardo Fontes.

Florianópolis, 18 de fevereiro de 2020.

Desembargadora Cláudia Lambert de Faria

Relatora


RELATÓRIO

Vandecir Roberto Lima ajuizou ação declaratória de inexistência de débito c/c indenização por danos morais em face de Omni S/A - Crédito Financiamento e Investimento, alegando, em síntese, que a requerida inscreveu indevidamente seu nome nos órgãos de proteção ao crédito, em decorrência de uma suposta dívida vencida em 3/8/2014, relativa ao contrato de nº 102391000115113 (fl.11).

Disse que desconhece o contrato negativado, motivo pelo qual considera ser devida a indenização por danos morais, uma vez que a requerida agiu com total negligência, negativando seu nome indevidamente e sem qualquer motivação lógica.

Portanto, postula, em sede de tutela antecipada, que a demandada exclua imediatamente seu nome no cadastro de inadimplentes, sob pena de multa e pugna, no mérito, pela declaração de inexistência do débito e pela condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais. Juntou documentos (fls.9/11).

À fl. 49, o magistrado singular deferiu a tutela antecipada e concedeu os benefícios da justiça gratuita.

Citada, a requerida apresentou contestação (fls. 60/65), defendendo, em suma, que adquiriu o débito do Banco RCI Brasil por meio de contrato de cessão de crédito, o qual é decorrente do contrato de financiamento de veículo de nº 262938464. Esclarece que o autor não quitou a integralidade das parcelas, razão pela qual seu nome foi negativado. Por isso, pugna pela improcedência dos pedidos da exordial. Juntou documentos (fls. 66/89).

Houve réplica (fls. 243/245).

Julgando antecipadamente a lide (fls. 246/248), o magistrado singular consignou no dispositivo da sentença o seguinte:

"Isto posto e revogando a tutela de urgência anteriormente deferida, julgo IMPROCEDENTES os pedidos demandados por Vandecir Roberto Lima na Ação Declaratória de Inexistência de Débito cumulada com Indenização por Danos Morais movida em face de Omni S/A Crédito Financiamento e Investimento, na forma do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Condeno, ainda, o autor ao pagamento das custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º do mesmo diploma legal, restando sobrestados, dada a gratuidade (fl. 49)".

Irresignado, o autor interpôs recurso de apelação (fls. 252/256), argumentando, basicamente, que o termo de cessão acostado aos autos não demonstra que o débito negativado foi cedido a parte ré, na medida em que não possui qualquer numeração, tampouco faz menção ao valor do débito ou aos dados do apelante. Por isso, requer o provimento do recurso, para declarar a inexistência do débito negativado, bem como para condenar a recorrida ao pagamento de indenização por danos morais.

As contrarrazões foram juntadas às fls.260/267.

Após, os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

Inicialmente, diante da entrada em vigor, a partir de 18-03-2016, do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105, de 16-03-2015), faz-se necessário definir se a nova lei será aplicável ao presente recurso.

Com relação aos requisitos de admissibilidade recursal, consoante Enunciado administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça (aprovado em sessão do Pleno do dia 16-03-16), aquela Corte decidiu que "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

No caso em apreço, a sentença foi prolatada já na vigência do novo CPC, portanto, devem ser observados os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, os quais encontram-se presentes na espécie, sendo o recorrente dispensado do recolhimento do preparo, tendo em vista o deferimento do benefício da justiça gratuita (fl.49).

Por seu turno, a análise do pleito recursal também deve obedecer aos dispositivos do novo código.

Inicialmente, cumpre esclarecer que o caso em tela é regido pelas normas do Código de Defesa do Consumidor. O autor enquadra-se perfeitamente no conceito de consumidor (CDC, art. 2º). A demandada, por seu turno, subsume-se na definição legal de fornecedora, a teor do art. 3º daquele Códex.

Por ser incontroversa a relação de consumo que envolve as partes, incidem, repita-se, as regras previstas no Código de Defesa do Consumidor, destacando-se, para o caso concreto, o art. 14 do referido diploma legal:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Assim, à configuração do dever de indenizar, deve a parte interessada demonstrar o defeito no fornecimento do serviço, o dano e o nexo de causalidade entre um e outro.

A par disso e, diante da inversão do ônus da prova, cediço que passa a ser ônus da ré comprovar a origem do débito que motivou a inscrição do nome do autor nos órgãos de restrição ao crédito, bem como demonstrar ser a titular da dívida negativada (fls. 26/27), uma vez que aduz ter adquirido o crédito através de contrato particular de cessão.

A fim de comprovar a origem da dívida, a parte ré acostou aos autos cédula de Crédito Bancário (fls.66/81), a qual demonstra ter o autor celebrado com o Banco RCI Brasil S.A., contrato de financiamento de nº 262938464, para aquisição de um veículo. Além disso, acostou às fls. 82/84 extrato evolutivo da dívida, confirmando a existência de débitos em abertos.

Entretanto, analisando minuciosamente os autos, constata-se que a requerida não juntou qualquer documento apto a comprovar que adquiriu a dívida, que embasou a anotação negativa, através de cessão de crédito.

Note-se que a requerida apresentou apenas Termo de Declaração de Cessão genérico (fls.88/89), onde não há descrição específica dos créditos adquiridos por meio da cessão.

O termo menciona que os contratos cedidos foram citados no anexo 1.1, ocorre que o aludido documento encontra-se em branco, sem qualquer espaço preenchido (fls.129/135), de modo que não há como afirmar que o débito do autor junto ao Banco RCI Brasil S.A tenha sido efetivamente transferido à requerida.

A simples juntada de termo de declaração de cessão genérico (fls.88/89), sem qualquer menção do contrato negativado não é documento hábil para comprovar a titularidade da cobrança e a legitimidade da inscrição. A parte ré poderia ter apresentado documentos capazes de comprovar quais os produtos que adquiriu, especificando os dados do autor e do débito cedido, contudo, não se desincumbiu do ônus lhe competia.

Ainda que a ré tenha comprovado a origem da dívida negativada - contrato de financiamento de automóvel-, a ausência de prova de que houve a transferência de titularidade do crédito discutido nos autos afasta o seu direito de exigir o adimplemento da dívida e também de apontar o nome do autor nos órgãos de proteção ao crédito, medida que somente poderá ser efetivada pelo titular do crédito.

Com efeito, conclui-se que a ré/cessionária não logrou demonstrar que adquiriu, através da cessão de crédito, o débito negativado, razão pela qual deve ser reconhecida entre as partes a inexigibilidade da cobrança da dívida.

Neste sentido, é jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL [...] "APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE PROVAS NO FEITO DA ALEGADA CESSÃO DE CRÉDITO HAVIDA ENTRE OS DEMANDADOS. INDEVIDA INSCRIÇÃO DO NOME DA DEMANDANTE EM CADASTROS DE INADIMPLENTES. NO CASO VERTENTE, DEMONSTRADO O DANO, O NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE ELE E OS ATOS PRATICADOS PELOS RÉUS, ESTÁ EVIDENCIADA A RESPONSABILIDADE DESTES PARA RESPONDER POR AQUELE PREJUÍZO. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO DE MANEIRA RAZOÁVEL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. APELAÇÕES DA AUTORA E DOS REÚS (SIC) DESPROVIDAS." [...]

Analisando-se os autos, denota-se que não há qualquer prova da alegada perfectibilização da cessão de crédito que teriam celebrado os requeridos, assim como não há prova da notificação da devedora, ora autora, acerca da suposta cessão. A demandante nega ter sido...

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