Acórdão Nº 0300432-95.2015.8.24.0059 do Terceira Câmara de Direito Público, 31-05-2022

Número do processo0300432-95.2015.8.24.0059
Data31 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300432-95.2015.8.24.0059/SC

RELATOR: Desembargador SANDRO JOSE NEIS

APELANTE: RITA TERESINHA SCHWERTZ HERRMANN (AUTOR) APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Na Comarca de São Carlos, Rita Teresinha Schwertz Herrmann ajuizou ação acidentária contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, sustentando que, em virtude de acidente de trabalho ocorrido quando tinha aproximadamente 18 anos de idade, sofreu lesão no seu olho esquerdo que resultou na perda da visão; que mesmo estando incapacitada, o INSS indeferiu na esfera administrativa o benefício auxílio-doença em três ocasiões distintas; que em decorrência da lesão suportada, encontra-se incapacitada para o exercício de suas funções, razão pela qual requereu a concessão do benefício da aposentadoria por invalidez, ou do auxílio-doença. Alternativamente pleiteou a concessão do auxílio-acidente.

Citado, o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contestou sustentando que não é devido qualquer benefício porque, de acordo com a perícia técnica, a autora não está incapacitada temporária ou definitivamente para o trabalho; que o benefício acidentário somente será devido se a perícia médica constatar a redução da capacidade laborativa do segurado; que não é devido o benefício auxílio-acidente porque à época não era previsto tal benefício ao segurado especial.

Os argumentos expendidos na contestação foram impugnados.

Foi deferida a realização de prova pericial e nomeado o perito. O laudo foi juntado e as partes sobre ele se manifestaram.

Sentenciando, o digno Magistrado julgou improcedente o pedido formulado na inicial.

A autora apelou sustentando que os argumentos expendidos na sentença de que a legislação vigente à época do acidente não contemplava os trabalhadores rurais em seu rol de beneficiários, não merece prosperar, uma vez que, com o advento da Constituição Federal de 1988, houve a equiparação dos trabalhadores rurais e urbanos, bem como a vedação constitucional de distinção entre tais segurados; que, além disso, restou configurada nos autos a redução da capacidade funcional, motivo pelo qual faz jus ao benefício de auxílio-acidente.

Após fluir 'in albis' o prazo para o oferecimento das contrarrazões, os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

Da legislação aplicável ao caso concreto

Na espécie, verifica-se que o alegado acidente de trabalho ocorreu em meados de 1983, quando estava em vigor a Lei n. 6.367, de 19/10/1976, regulamentada pelo Decreto n. 83.080, de 24.01.1979.

A Lei n. 6.367, de 19 de outubro de 1976, que até o advento da Lei n. 8.213/91 dispunha sobre o seguro de acidentes do trabalho a cargo do INPS e dá outras providências, definiu acidente de trabalho no seu art. 2º como "aquele que ocorrer pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, ou perda, ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho"; e equiparou ao acidente de trabalho, para os fins da citada lei (§ 1º): "I - a doença profissional ou do trabalho, assim entendida a inerente ou peculiar a determinado ramo de atividade e constante de relação organizada pelo Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS); II - o acidente que, ligado ao trabalho, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte, ou a perda, ou redução da capacidade para o trabalho".

Em face das disposições da Lei n. 6.367/76, se as lesões decorrentes de acidente de trabalho ou a doença profissional ou do trabalho apenas reduzissem a capacidade laborativa do segurado, sem torná-lo totalmente incapaz, ele teria direito ao auxílio-acidente se não pudesse mais exercer a mesma atividade de antes mas sim outras (art. 6º), ou ao auxílio-suplementar se continuasse apto para o exercício da mesma atividade, embora com maior esforço (art. 9º). Vejam-se os dispositivos:

"Art. 6º O acidentado do trabalho que, após a consolidação das lesões resultantes do acidente, permanecer incapacitado para o exercício de atividade que exercia habitualmente, na época do acidente, mas não para o exercício de outra, fará jus, a partir da cessação do auxílio-doença, a auxílio-acidente.

"§ 1º O auxílio-acidente, mensal, vitalício e independente de qualquer remuneração ou outro benefício não relacionado ao mesmo acidente, será concedido, mantido e reajustado na forma do regime de previdência social do INPS e corresponderá a 40% (quarenta por cento) do valor de que trata o inciso II do Art. 5º desta lei, observado o disposto no § 4º do mesmo artigo.

"§ 2º A metade do valor do auxílio-acidente será incorporada ao valor da pensão quando a morte do seu titular não resultar de acidente do trabalho.

"§ 3º O titular do auxílio-acidente terá direito ao abono anual.

"(...).

"Art. 9º. O acidentado do trabalho que, após a consolidação das lesões resultantes do acidente, apresentar, como sequelas definitivas, perdas anatômicas ou redução da capacidade funcional, constantes de relação previamente elaborada pelo Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS), as quais, embora não impedindo o desempenho da mesma atividade, demandem, permanentemente, maior esforço na realização do trabalho, fará jus, a partir da cessação do auxílio-doença, a um auxílio mensal que corresponderá a 20% (vinte por cento) do valor de que trata o inciso II do Artigo 5º desta lei, observado o disposto no § 4º, do mesmo artigo."

Três eram os traços distintivos principais entre o auxílio-acidente do art. 6º e o auxílio suplementar do art. 9º da Lei n. 6.367/76: 1º) o auxílio-acidente era devido ao segurado que, em razão das sequelas definitivas, não tivesse mais condições de exercer a mesma atividade de antes, mas sim outras; enquanto que o auxílio suplementar era devido a quem continuasse exercendo a mesma atividade, porém, com maior esforço; 2º) era de 40% do salário de contribuição o percentual do auxílio-acidente; enquanto que o auxílio suplementar era de 20%; 3º) o auxílio-acidente era vitalício e após a morte do segurado metade do respectivo valor era transferido para a pensão por morte em favor dos dependentes; enquanto que o auxílio suplementar cessava definitivamente com a aposentadoria de qualquer espécie do obreiro e nada era transferido aos dependentes com a morte dele.

No caso dos autos consta que a autora, quando trabalhava na agricultura, na época com aproximadamente 18 anos de idade (meados de 1983, eis que nascida em 1965), sofreu acidente de trabalho que lhe ocasionou lesão no olho esquerdo, que acarretou atrofia do globo ocular e diminuição do campo de visão (Evento 58, laudo judicial).

Os benefícios previdenciários/acidentários, para trabalhadores urbanos (e depois da Constituição de 1988, também para trabalhadores rurais) tiveram seu regramento próprio dado pela Lei 3.807/60, modificada ou substituída pelas Leis n. 5.890/73, 6.367/76 e 8.213/91, com as alterações dadas pelas Leis n. 9.032/95, 9.129/95 e 9.528/97. As referidas leis foram regulamentadas por Decretos Federais, tais como: Decreto n. 61.784/67, Decreto n. 79.037/76, Decreto n. 83.080/79, Decreto n. 357/91, alterado pelo Decreto n. 611/92, e Decreto n. 3.048/99, alterado pelo Decreto n. 4.032/2001. Para trabalhadores rurais, até o advento da atual Carta Magna, outras leis estabeleciam a concessão de benefícios por incapacidade, entre as quais a Lei n. 6.195/74, a Lei Complementar n. 11/74 e o Decreto n. 83.080/79.

Na espécie, compulsando-se os autos, verifica-se que o acidente noticiado na peça pórtica ocorreu em meados de 1983, quando ela exercia suas atividades de agricultora (auxiliava sua família m atividades campesinas de subsistência), em regime de economia familiar, daí a necessidade de analisar a possibilidade de aplicação da lei vigente à época dos fatos, ou seja, aquela com vigência no ano de 1983.

A Lei Complementar n. 11, de 25/05/1971, regulamentada pela Lei n. 6.195, de 19 de dezembro de 1974, que estavam em vigor à época dos fatos, não previam a concessão de auxílio-acidente, daí porque é inviável, na ocasião, a equiparação jurídica do trabalhador rural não empregado ao empregado urbano, para efeito de benefícios da previdência social, em período anterior à promulgação da Constituição Federal de 1988.

Com efeito, a Lei Complementar n. 11 de 25 de maio de 1971, instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL), dispondo que:

"Art. 1º. É instituído o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL), nos termos da presente Lei Complementar.

"§ 1º Ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural - FUNRURAL -, diretamente subordinado ao Ministro do Trabalho e Previdência Social e ao qual é atribuída personalidade jurídica de natureza autárquica, caberá a execução do Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, na forma do que dispuser o Regulamento desta Lei Complementar.

"§ 2º O FUNRURAL gozará em tôda a sua plenitude, inclusive no que se refere a seus bens, serviços e ações, das regalias, privilégios e imunidades da União e terá por fôro o da sua sede, na Capital da República, ou o da Capital do Estado para os atos do âmbito dêste."

E o art. 2º e 3º, do mesmo diploma legal, além de vincular o empregado rural ao programa de assistência ao trabalhador rural, regulamentou, taxativamente, quais os benefícios eram devidos a essa categoria, verbis:

"Art. 2º O Programa de Assistência ao Trabalhador Rural consistirá na prestação dos seguintes benefícios:

"I - aposentadoria por velhice;

"II - aposentadoria por invalidez;

"III - pensão;

"IV - auxílio-funeral;

"V - serviço de saúde;

"VI - serviço de social.

"Art. 3º São beneficiários do Programa de Assistência instituído nesta Lei Complementar o trabalhador rural e seus dependentes".

Como se vê, o benefício do auxílio-acidente ou o auxílio-suplementar previstos na legislação previdenciária urbana (Lei n. 6.367/76), não foram abrangidos nem por essa Lei Complementar, nem pela Lei n. 6.195/74 que amparava o trabalhador rural na época dos fatos.

A Lei...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT