Acórdão Nº 0300468-84.2014.8.24.0088 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 30-01-2020

Número do processo0300468-84.2014.8.24.0088
Data30 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemLebon Régis
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300468-84.2014.8.24.0088

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA, NA VIGÊNCIA DO CPC/2015.

RECURSO DA PARTE EMBARGANTE

EXECUÇÃO DE CHEQUES QUE NÃO CIRCULARAM. POSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DA "CAUSA DEBENDI". PRINCÍPIOS DA AUTONOMIA E DA ABSTRAÇÃO DO TÍTULO DE CRÉDITO EXCEPCIONADOS QUANDO O TÍTULO NÃO ENTROU EM CIRCULAÇÃO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INEXIGIBILIDADE DA DÍVIDA. ALEGADA NÃO PERFECTIBILIZAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO QUE ENSEJOU A EMISSÃO DAS CÁRTULAS. TESE REFUTADA. PROVAS AMEALHADAS AOS AUTOS QUE DEMONSTRAM QUE OS TÍTULOS FORAM EMITIDOS COMO FORMA DE PAGAMENTO A CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULO ENTABULADO ENTRE AS PARTES. CÁRTULAS PREENCHIDAS À PARTE EXEQUENTE NOMINALMENTE. ALEGATIVA DA RECORRENTE DE QUE, APESAR DE JÁ TER EMITIDO OS CHEQUES, AINDA NÃO HAVIA CONCRETIZADO A COMPRA DO AUTOMÓVEL, QUE SE MOSTRA FANTASIOSA E DESVINCULADA DE TODO O ACERVO PROBATÓRIO DOS AUTOS. ACERTADO RECONHECIMENTO DA PERFECTIBILIZAÇÃO DO NEGÓCIO OPERADO ENTRE AS PARTES. SENTENÇA MANTIDA.

INEXIGIBILIDADE DOS TÍTULOS. ALEGAÇÃO DE QUE OS CHEQUES FORAM EMITIDOS EM GARANTIA ATÉ O RECEBIMENTO DE UMA CARTA DE CRÉDITO DE CONSÓRCIO QUE A EMBARGANTE POSSUÍA JUNTO AO BRADESCO. TESE INSUBSISTENTE. EMISSÃO DE TRÊS CHEQUES PARA O PAGAMENTO DO PREÇO TOTAL DE VEÍCULO ADQUIRIDO PELA EMBARGANTE. CÁRTULA DE MAIOR VALOR QUE FOI DADA EM CAUÇÃO À LIBERAÇÃO DE VALORES DE CONSÓRCIO, MAS QUE NÃO É OBJETO DA EXECUÇÃO ORA EMBARGADA. TÍTULOS EXEQUENDOS QUE CORRESPONDEM AOS DOIS CHEQUES DE MENOR VALOR, EMITIDOS PELA EMPRESA EXECUTADA/EMBARGANTE PARA COMPLEMENTAR O PREÇO AJUSTADO DO VEÍCULO. LIQUIDEZ, CERTEZA E EXIGIBILIDADE DOS CHEQUES NÃO ABALADAS.

SUCUMBÊNCIA RECURSAL. CONSECUTIVO INSUCESSO PROCESSUAL DA EMBARGANTE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS ADICIONAIS DEVIDOS. INCIDÊNCIA DA NORMA DO ARTIGO 85, § 11, DO CPC/2015.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300468-84.2014.8.24.0088, da comarca de Lebon Régis Vara Única em que é Apelante(s) Mecânica Heine Ltda Me e Apelado(s) Passarin & Filho Ltda.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, acrescidos honorários de sucumbência recursal ao encargo da apelante. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Salim Schead dos Santos, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Mariano do Nascimento.

Florianópolis, 30 de janeiro de 2020.

Desembargador Luiz Zanelato

Relator


RELATÓRIO

Mecânica Heine Ltda Me interpôs recurso de apelação da sentença de fls. 183-194, proferida pelo juízo da Vara Única da comarca de Lebon Régis, nos autos dos embargos à execução opostos em face de Passarin & Filho Ltda, que julgou improcedentes os embargos e determinou o regular prosseguimento da ação de execução.

Na origem, trata-se de embargos à execução opostos por Mecânica Heine Ltda Me contra Passarin & Filho Ltda, visando: a) o reconhecimento da nulidade da execução, por ausência de juntada aos autos dos cheques originais, cada um no valor de R$ 9.000,00 (nove mil reais), que estão sendo executados; b) o reconhecimento da possibilidade de discussão do negócio jurídico que deu ensejo a emissão dos títulos executados; c) ser declarada a nulidade do título executivo, por inexistência da dívida, porque, segundo alega, não se efetivou o negócio entre as partes; d) a inexigibilidade dos títulos, ao argumento de que apenas foram oferecidos como forma de garantia, e não de pagamento. Requereu, ao final, o recebimento dos embargos com efeito suspensivo, e a procedência dos pedidos iniciais (fls. 1-17).

Ao receber a inicial, o magistrado de origem concedeu efeito suspensivo aos embargos (fl. 45).

Devidamente intimada (fl. 46), a empresa embargada apresentou impugnação aos embargos do devedor, argumentando, em síntese, que a) os cheques executados foram emitidos pela empresa embargante como parte do pagamento de um veículo que havia sido adquirido pelo proprietário desta; b) não há se falar em nulidade dos títulos, porquanto emitidos para pagamento de negócio entabulado entre as partes; c) estão ausentes os requisitos necessários para a concessão de efeito suspensivo aos embargos. Pugna a improcedência dos pedidos iniciais, com o regular prosseguimento do feito executório (fls. 48-62).

Por meio da decisão de fls. 67-70, foi reconhecida a existência de conexão entre os presente embargos e os embargos à execução nº 0300290-38.2014.8.24.0088, bem como foi afastada a suscitada nulidade da execução por ausência de juntada aos autos dos cheques originais.

Em 29-09-2015, foi realizada audiência de instrução e julgamento, durante a qual foram colhidos os depoimentos pessoais dos representantes legais das partes, e inquiridas 5 (cinco) testemunhas arroladas pela parte embargante, e 2 (duas) testemunhas arroladas pela embargada. Ainda, foram cientificadas as partes acerca da designação de data, pelo Juízo do Comarca de Caçador, para a oitiva da testemunha Odair Maciel de Oliveira (fl. 134).

A carta precatória expedida para a oitiva da testemunha Odair Maciel de Oliveira, retornou devidamente cumprida (fls. 147-163).

Por meio do petitório de fls. 164-166, a empresa embargada pugnou pela juntada aos autos de novas provas, requerimento indeferido às fls. 170-172.

As partes apresentaram alegações finais (fls. 175-179 e 180-182).

Na data de 03-05-2018, o juiz da causa, Dr. Rafael de Araújo Rios Schmitt, prolatou sentença de improcedência, nos seguintes termos:

Sustenta o embargante que os cheques que embasam a execução não são exigíveis, vez que o negócio entre as partes, que ensejou a emissão das cártulas, não se concretizou, tratando-se apenas de cheques caução que garantiriam o negócio, se concluído, até a liberação da carta de crédito disponível no Banco Bradesco, em nome do embargante.

Acrescentou que se deslocavam até a cidade de Caçador para fazer o test drive na rodovia e também para ver outro veículo, pois ainda remanescia dúvidas quanto à aquisição do veículo que se envolveu no sinistro e outro que estava na concessionária.

Por outro lado, a embargada sustenta que a venda do veículo já havia sido concluída, inclusive os cheques estavam na posse de João Gabriel Passarin, representante da embargada, bem como, argumenta que no momento do acidente o representante da embargante, Jacson Willys Heine, se deslocava até a cidade de Caçador, na direção do veículo negociado, apenas para levar João Gabriel Passarin e o vendedor Felipe Kaipers Ribeiro de volta à concessionária, vez que estes teriam se deslocado até esta cidade com o veículo vendido à Jacson e não teriam como retornar à Caçador.

Em audiência, Jacson Willys Heine (audiovisual de fl. 136), representante da embargante, sustentou que "não tinha firmado nenhum negócio com aquele (veículo) ali, nós tava indo para fechar o negócio ou com aquela ou com a TR4 lá, tava nessa dúvida ainda" (04min09seg 04min22seg). "e os cheques da Heine, que foi colocado a Heine, porque eu não tenho, não tenho particular, só uso da empresa mesmo, já levei preenchido que caso desse com esse ali já ficava, se caso desse com o outro também já ficava, já estaria com o cheque lá". Indagado se os valores dos veículos eram iguais, afirmou que a TR4, 0km, era R$ 68.000,00, o mesmo valor da ASX (04min38seg 05min02seg) (grifou-se).

Indagado em que momento fez a entrega dos cheques para o representante da embargada, afirmou que não entregou, asseverando que os cheques estavam no console do carro com seu celular e que após o acidente os cheques foram encontrados, não sabendo por quem, e entregues à embargada, pois estavam nominais à Passarin & Filho Ltda (07min59seg 08min39seg).

Por sua vez, Moacir Passarin (audiovisual de fl. 137), representante legal da empresa Passarin & Filho Ltda e genitor de João Gabriel Passarin (este quem estava efetuando as tratativas de venda do veículo à Jacson, juntamente com o vendedor Felipe), indagado, relatou que a origem da dívida executada por meio dos cheques "foi a compra de um veículo ASX, 2011, 4x2, na cor prata", sendo que a negociação foi com João Gabriel e com o Felipe, vendedor da empresa que acabou falecendo no acidente que ocorreu após a negociação (00min29seg00min57seg). Relatou ainda que Jacson Heine "falou que se o carro (ASX) fosse bom ele iria ficar com o carro, aí o João Gabriel foi na casa dele, foi na casa dele, tava ele e a esposa dele em casa e ele falou, olha pai, ele ofereceu aqui cinquenta mil à vista, uma carta lá do Bradesco, uma carta contemplada e dois cheques de oito mil, de nove mil, é, nove mil, daí eu 'tá tudo certo, pode fazer o negócio', 'tá feito, tá então, tá fechado aqui, então nós só vamos lá no Bradesco pegar os cheques', então eles foram até o Bradesco, pegaram os cheques, o gerente assistiu, atendeu eles (...) aí eles deram o cheque pro João Gabriel, ele deu o cheque para o João Gabriel, daí o João me ligou, olha eu to saindo daqui, tinha começado um chuvão já, um chuvão forte, aí eu sempre falo, olha cuidado, tal e coisa, ele falou não pai, o senhor aqui é um senhor de idade, pessoa responsável, que vai dirigindo o carro, não tem problema nenhum, e aí o João Gabriel, mais o rapaz que faleceu no acidente, nosso funcionário, o Sr. Jacson e a esposa, ele dirigindo e ela na frente, foram em direção à Caçador e aconteceu o acidente, que a gente sabe, no trajeto, e ele (Jacson) tava dirigindo o carro" (04min03seg 05min39seg).

Joceli Heine (audiovisual de fl. 139), instada em Juízo, confirmou a versão do esposo Jacson, declarando que estavam em dúvida entre a aquisição daquele veículo ASX ou outro veículo, zero quilômetro, da mesma marca e que estavam indo para Caçador para decidir, frisando que não havia sido fechado qualquer negócio até aquele momento,...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT