Acórdão Nº 0300473-69.2018.8.24.0055 do Primeira Câmara de Direito Público, 10-03-2020

Número do processo0300473-69.2018.8.24.0055
Data10 Março 2020
Tribunal de OrigemRio Negrinho
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão

8

Apelação Cível n. 0300473-69.2018.8.24.0055

Relator: Desembargador Pedro Manoel Abreu

APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA. TÉCNICO EM OPTOMETRIA. PROFISSIONAL DE NÍVEL MÉDIO. REQUISIÇÃO DE ALVARÁ PARA ABERTURA DE CONSULTÓRIO. NEGATIVA DA MUNICIPALIDADE. ACERTO DA ADMINISTRAÇÃO. POSICIONAMENTO ASSENTE DESTA CORTE PARA SUPERAR OS ENTRAVES ADMINISTRATIVOS QUE, FULCRADOS NOS DECRETOS FEDERAIS Nº 20.931/32 E Nº 24.492/34, AINDA EM VIGOR, POR NÃO SE AFEIÇOAREM COMPLETAMENTE À REALIDADE MODERNA. SENTENÇA QUE DENEGOU A ORDEM. CASO EM ESPECÍFICO QUE TRATA DE PROFISSIONAL DE NÍVEL MÉDIO. VEDAÇÃO EXPRESSA À ABERTURA DE CONSULTÓRIO PELO ARTIGO 38, DO DECRETO N. 20.931/32. RECURSO DESPROVIDO.

Não existe qualquer impedimento ao exercício da profissão de técnico de optometria, para a qual o profissional deve estar regularmente habilitado. No entanto, há óbice à instalação de consultório, conforme art. 38 do Decreto n. 20.931/ 32.

Logo, ao profissional da optometria que haja concluído com êxito curso superior devidamente reconhecido pelo Estado não se aplicam as vedações constantes dos aludidos Decretos, revelando-se lhe lícito, pois, realizar exames de acuidade do sentido da visão utilizando-se, a tal desiderato, dos equipamentos necessários, e, ainda, prescrever o uso de lentes corretivas, excluídos, de seu mister, por via de consequência, todo o ato médico afeto ao estudo, ao diagnóstico e ao tratamento de patologias oftálmicas (TJSC, rel. Des. Luiz Antônio Zanini Fornerolli)

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300473-69.2018.8.24.0055, da comarca de Rio Negrinho 2ª Vara em que é Apelante Ordelão Ismael de Assumpção Júnior e Apelado Prefeito do Município de Rio Negrinho e outro.

A Primeira Câmara de Direito Público decidiu, por meio eletrônico, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 10 de março de 2020, foi presidido pelo Desembargador Luiz Fernando Boller, com voto, e dele participou o Desembargador Jorge Luiz de Borba.

Florianópolis, data da assinatura digital.


Desembargador Pedro Manoel Abreu

Relator





RELATÓRIO

Cuida-se de Apelação Cível interposta por Ordelão Ismael de Assumpção Júnior contra sentença proferida em sede de mandado de segurança impetrado em face do Prefeito do Município de Rio Negrinho.

O decisum objurgado denegou a segurança.

Em suas razões, sustenta o Apelante que impetrou o mandamus para ver reconhecido seu direito líquido e certo de obtenção de alvará sanitário para funcionamento de seu consultório de optometrista, o que foi negado, sob o fundamento de que não possuía a formação superior exigida.

Assevera, contudo, que preenche os requisitos para o exercício da profissão, uma vez que possui diploma de conclusão do curso de Técnico em Óptica e Optometria, autorização para exercer a função pela Portaria da DRE/RP de 13/02/01-DOE/SP de 16/02/2001, além de certificado de regularidade técnica emitido pelo CROO-SC (fl. 14/15 e 22). Aduz, nesse sentido que, ainda que sua formação seja de nível técnico, tem direito líquido e certo à concessão do alvará, porque sua atividade não invade competência de ato privativo médico, respeitando os limites estabelecidos.

Salienta, também, que a profissão de Optometrista foi regulamentada pelos Decretos n. 20.931/1932 e n. 24.492/1934, os quais ainda estão em vigor, e pela Portaria n. 397/2002 do Ministério do Trabalho, existindo, ainda, decisão recente do Superior Tribunal de Justiça que reconheceu a profissão e a legitimidade para seu exercício (REsp 975322/RS), não existindo fundamento legal para negativa do alvará pleiteado.

Ressalta, por fim, que não é atribuição do Judiciário deferir ou não o registro de Técnicos em profissões das mais variadas áreas, e sim da Administração Pública, no caso, do Conselho Brasileiro de Óptica e Optometria, que já deferiu seu registro após a verificação do preenchimento dos requisitos de qualificação profissional (fl.14-15).

Pugna pelo provimento do recurso e reforma da sentença, de modo a permitir o exercício profissional e funcionamento do estabelecimento, requerendo-se que seja expedido o competente alvará sanitário.

Em suas contrarrazões (fls. 103-105), sustenta o Prefeito Municipal que o pedido não pode ser concedido, já que o alvará pleiteado é direcionado à instalação de consultório e prescrição de lentes de grau, o que é vedado à profissionais que possuam curso técnico.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Dr. Newton Henrique Trennepohl, manifestou-se pelo desprovimento do apelo.

Este é o relatório.



VOTO

Sem delongas, nega-se provimento ao recurso.

A matéria objeto do presente recurso é idêntica àquela enfrentada pela eminente Desembargadora Vera Copetti, quando do julgamento monocrático da Apelação Cível n. 0300796-45.2016.8.24.0055, em 12.12.2018, também da Comarca de Rio Negrinho e do mesmo impetrante. Ante o brilhantismo da decisão, com a devida vênia, toma-se como razão de decidir, in verbis:

Cuida-se de mandado de segurança impetrado por Ordelão Ismael de Assumpção Júnior em face do ato dito coator de agente fiscal da Vigilância Sanitária de Rio Negrinho, objetivando a suspensão da interdição e revalidação do alvará sanitário para funcionamento de seu consultório optométrico.

A controvérsia reside nos limites de atuação do optometrista, isto é, em saber se essa categoria profissional pode ou não realizar consultas e prescrever fórmulas de grau, de forma a verificar a legalidade das restrições contidas no alvará sanitário.

A sentença concedeu a segurança determinando que o impetrado conceda alvará sanitário para que o impetrante pudesse exercer a atividade de optometrista em sua plenitude, “condicionada à comprovação, pelo impetrante, perante o órgão concedente, de conclusão de Curso Superior em Optometria, devidamente validado pelo Ministério da Educação, vedadas as práticas de médico oftalmologista, preenchidos os demais requisitos específicos da legislação sanitária.”

O município de Rio Negrinho sustenta que não houve qualquer afronta a direito líquido e certo ou conduta ilegal contra o profissional, apenas houve o cumprimento da lei, pois o pedido foi indeferido pelo fiscal sanitarista, com base no Decreto n. 24.492/34 e Decreto n. 20.931/32.

Porém, sem razão.

É que a controvérsia encontra-se há muito tempo consolidada neste Tribunal de Justiça, a qual já teve a oportunidade de ser examinada de forma exaustiva pelos Grupos de Câmaras de Direito Público e de Direito Civil (a propósito: EI n. 2010.079843-6, rel. Des. Carlos Prudêncio, j. em 10.08.2011; EI n. 2008.052823-4, rel. Des. Eládio Torret Rocha, j. em 09.11.2011).

Tal posição, aliás, também já havia sido adotada no Grupo de Câmaras de Direito Público, ao julgar pedido de uniformização de jurisprudência, consoante se verifica na seguinte ementa:

ADMINISTRATIVO - OPTOMETRIA - RESTRIÇÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL ILEGALIDADE. 1. Afronta o princípio da razoabilidade a restrição ao exercício da optometria com embasamento nos ultrapassados Decretos ns. 20.931/32 e 24.492/34, já que, a toda evidência, a ratio legis desses diplomas não mais se afeiçoa à realidade da vida moderna. 2 Se existe curso superior reconhecido pelo Ministério da Educação que habilita profissionais para o exercício das atividades de optometria, não tem sentido impedir que aqueles que colam grau e providenciam o registro no respectivo órgão fiscalizador exerçam em toda a sua plenitude a profissão que escolheram. O exercício profissional da optometria, no entanto, deverá se restringir àquelas atividades facultadas pelas normas de regência, sendo vedado, em absoluto, as práticas privativas do médico oftalmologista. (TJSC, Pedido de Uniformização de Jurisprudência em Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 2006.030031-7, de São José, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, Grupo de Câmaras de Direito Público, j. 11-3-2009).

Idêntica solução merece ser adotada no caso vertente, sobretudo em razão do advento da Lei n. 12.842/2013.

No que diz respeito à seara própria e restrita de profissionais da medicina, é preciso considerar as disposições da Lei n. 12.842/2013 que, buscando acabar com a controvérsia existente sobre o assunto, relegando as atribuições privativas de médico a defasados regramentos e ao arbítrio dos órgãos de classe, dispôs "sobre o exercício da Medicina”.

Mencionado diploma legal dispõe, em seu art. 4º e 5º, sobre as atividades privativas de médico, a saber:

Art. 4º São atividades privativas do médico:

I - (VETADO);

II - indicação e execução da intervenção cirúrgica e prescrição dos cuidados médicos pré e pós-operatórios;

III - indicação da execução e execução de procedimentos invasivos, sejam diagnósticos, terapêuticos ou estéticos, incluindo os acessos vasculares profundos, as biópsias e as endoscopias;

IV - intubação traqueal;

V - coordenação da estratégia ventilatória inicial para a ventilação mecânica invasiva, bem como das mudanças necessárias diante das intercorrências clínicas, e do programa de interrupção da ventilação mecânica invasiva, incluindo a desintubação traqueal;

VI - execução de sedação profunda, bloqueios anestésicos e anestesia geral;

VII - emissão de laudo dos exames endoscópicos e de imagem, dos procedimentos diagnósticos invasivos e dos exames anatomopatológicos;

VIII - (VETADO);

IX - (VETADO);

X - determinação do prognóstico relativo ao diagnóstico nosológico;

XI - indicação de internação e alta médica nos serviços de atenção à saúde;

XII - realização de perícia médica e exames médico-legais, excetuados os...

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