Acórdão Nº 0300476-54.2018.8.24.0045 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 29-10-2020

Número do processo0300476-54.2018.8.24.0045
Data29 Outubro 2020
Tribunal de OrigemPalhoça
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300476-54.2018.8.24.0045, de Palhoça

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

RECURSO DA EXECUTADA/EMBARGANTE.

TESE DA EXTINÇÃO DÉBITO EM DECORRÊNCIA DA MORTE DO MUTUÁRIO, COM BASE NO ARTIGO 16 DA DA LEI 1.046/50. IMPOSSIBILIDADE. LEGISLAÇÃO TACITAMENTE REVOGADA, CONSOANTE ENTENDIMENTO FIRMADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. FALECIMENTO QUE, EM REGRA, IMPORTA NA TRANSMISSIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO, NOS TERMOS DO ARTIGO 1.997 DO CÓDIGO CIVIL.

"Segundo a jurisprudência do STJ, houve a ab-rogação tácita ou indireta da Lei 1.046/50 pela Lei 8.112/90, pois esta tratou, inteiramente, da matéria contida naquela, afastando, em consequência, a sua vigência no ordenamento jurídico. [...] sob qualquer ângulo que se analise a controvérsia, a conclusão é uma só: o art. 16 da Lei 1.046/50, que previa a extinção da dívida em virtude do falecimento do consignante, não está mais em vigor, e seu texto não foi reproduzido na legislação vigente sobre o tema. No particular, a morte da consignante não extingue a dívida por ela contraída mediante consignação em folha, mas implica o pagamento por seu espólio ou, se já realizada a partilha, por seus herdeiros, sempre nos limites da herança transmitida (art. 1.997 do CC/02)". (STJ. REsp 1753135/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/11/2018, DJe 22/11/2018)

ALEGADA FALTA DE TÍTULO EXECUTIVO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. DESNECESSIDADE DE SUBSCRIÇÃO DE DUAS TESTEMUNHAS INSTRUMENTÁRIAS NO CONTRATO EM DEBATE. REQUISITO NÃO EXIGIDO PELA LEI Nº 10.931/04. ADEMAIS, TÍTULO REPRESENTATIVO DE OBRIGAÇÃO LÍQUIDA, CERTA E EXIGÍVEL, ANTE O VALOR FIXO E O TERMO DE VENCIMENTO DA DÍVIDA. TESE ARREDADA.

AUSÊNCIA DA VIA ORIGINAL DA CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO QUE ENSEJOU A EXECUÇÃO. IRRESIGNAÇÃO DESPROVIDA DE QUALQUER FUNDAMENTO ACERCA DE EVENTUAL DÚVIDA SOBRE A AUTENTICIDADE DO DOCUMENTO. ASSINATURAS EXISTENTES NO TÍTULO QUE NÃO FORAM OBJETO DE IMPUGNAÇÃO. TÍTULO EXECUTIVO HÍGIDO. PRECEDENTES DESTA CORTE E DESTE ÓRGÃO COLEGIADO. TESE AFASTADA.

VERBAS SUCUMBENCIAIS. APELO MANEJADO SOB A VIGÊNCIA DO CPC/15. NOVO REVÉS DO RECORRENTE. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DA VERBA EM FAVOR DO CAUSÍDICO DA APELADA QUE SE IMPÕE. EXEGESE DO ARTIGO 85, § 11, DO CPC/15.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300476-54.2018.8.24.0045, da comarca de Palhoça 1ª Vara Cível em que é Apelante Neuza Nazir de Souza e Apelado Banco Daycoval S/A.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento,e por majorar, para 18% (dezoito por cento) do valor atualizado da causa, os honorários de sucumbência fixados na sentença e devidos ao patrono da parte apelada, com fundamento no artigo 85, § 11, do CPC/15, suspensa a respectiva exigibilidade por efeito da justiça gratuita (art. 98, § 3º, do CPC/15). Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Guilherme Nunes Born, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Mariano do Nascimento e José Maurício Lisboa.

Florianópolis, 29 de outubro de 2020.

Desembargador Luiz Zanelato

Relator


RELATÓRIO

Neuza Nazir de Souza interpôs recurso de apelação da sentença de fls. 154-158, proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível da comarca de Palhoça, nos autos da ação de embargos à execução, proposta em face de Banco Daycoval S/A, que julgou improcedentes os pedidos formulados na petição inicial.

Na origem, trata-se de embargos do devedor ofertados pela apelante para o fim de resistir à execução de título extrajudicial promovida pelo banco apelado. Requereu, ao final, a procedência dos pedidos iniciais para acolher a preliminar de ilegitimidade passiva ou, no mérito, extinguir a execução por falta de título idôneo (fls. 01-08).

Em juízo de admissibilidade da demanda, o magistrado de origem recebeu os embargos sem lhes atribuir efeito suspeito por falta de garantia da execução e determinou a intimação da parte embargada, nos termos do art. 920 do CPC (fl. 131).

Devidamente intimado, o banco embargado apresentou impugnação aos embargos, na qual arguiu as seguintes teses defensivas: (i) ausência dos requisitos legais para o oferecimento de embargos para alegar excesso de execução; (ii) que não há real intenção de a embargante quitar a dívida de forma amigável, sendo os embargos meramente protelatórios; (iii) inexistência de dúvida acerca da pronta possibilidade de execução da cédula de crédito bancário; (iv) que o art. 16 da Lei n 1.046/50 está revogado e atual legislação não prevê extinção do saldo devedor pelo falecimento do mutuário (fls. 134-138). Pugnou, ao final, pela improcedência dos pedidos.

Réplica às fls. 150-153.

Na data de 154-158, o juiz da causa, Dr. Ezequiel Rodrigo Garcia, prolatou sentença nos seguintes termos:

I RELATÓRIO

NEUZA NAZIR DE SOUZA ajuizou embargos à execução contra BANCO DAYCOVAL S/A, ambos devidamente qualificados e representados no feito.

Em síntese, alegou que os contratos de empréstimo pessoal sob execução foram firmados por sua mãe, NAZIR FELICIDADE DE SOUZA, pessoa já falecida. Aduziu que, com o falecimento da tomadora dos empréstimos, a dívida se extingue. Postulou que, caso não se reconheça a extinção da dívida, que a sua responsabilidade seja limitada ao valor do quinhão que lhe cabe por herança.

Requereu a procedência dos embargos e a extinção da execução.

Os embargos foram recebidos sem efeito suspensivo.

Regularmente intimado, o embargado apresentou resposta sob a forma de impugnação. Suscitou a preliminar de inépcia da inicial. No mérito, sustentou que o falecimento da tomadora dos empréstimos não extingue a dívida. Requereu a improcedência dos embargos

À p. 139, foi determinada a juntada de cópias legíveis dos contratos sob execução.

Nova manifestação da embargante às ps. 150/153.

[...]

Como se vê, sem fundamento o pedido para declarar a extinção da dívida em razão do falecimento da mutuária.

Esclareço, por fim, que cada herdeiro só responde pela dívida dentro da força da herança e na proporção da parte que cada um receber, conforme dispõem os arts. 796 do CPC e 1.997 do Código Civil. Ou seja, não havendo herança, não há responsabilidade dos herdeiros pela dívida deixada pelo de cujus.

A comprovação de que houve herança e o quinhão de cada herdeiro compete ao credor.

III DISPOSITIVO

Ante o exposto, rejeito os embargos. Condeno a embargante ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 15% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2.º do CPC. A cobrança dos encargos, no entanto, fica suspensa em razão do benefício da gratuidade da justiça que ora lhe defiro. Junte-se cópia desta sentença na execução em apenso.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, arquive-se, com as devidas baixas. (fls. 154-158)

Irresignada, a parte embargante interpôs recurso de apelação, sob os fundamentos de que: a) a referida sentença desconsiderou que o entendimento firmado por parte da jurisprudência, no sentido que o artigo 16 da Lei 1.046/50, que previa a extinção da dívida em caso de falecimento do consignante, não está mais em vigor, não goza de presunção absoluta; b) toda legislação em comento é de natureza especial, de modo que hermeneuticamente, mantem-se válida as disposições do artigo 16 da Lei 1.046/50 para os servidores e pensionistas que se enquadram como servidores públicos estatutários do Estado, por duas razões: primeiro, a relação desses servidores com a consignatária é regida pelas disposições do Decreto 080/11 do Estado de Santa Catarina e, em segundo lugar, de acordo com as disposições do 22 da Constituição Federal, competiria exclusivamente à União legislar sobre a matéria e não fazendo, se mantém a regra especial da Lei 1.046/50 para os servidores e pensionistas que se enquadram como servidores públicos estatutários do Estado; c) quanto aos contratos, juntados as fls. 143/144 e 145/146, em conformidade com as disposições normativas do artigo 27, parágrafo único c.c. o artigo 29, incisos I a VI, todos da Lei nº 10.931/04, não se revestem da natureza executiva, equivocando-se a sentença no ponto. Isso porque não assinados por duas testemunhas e sem a juntada da cártula original nos autos, já que a legislação específica sobre as cédulas de crédito bancário permite a aplicação da legislação comum no que não for conflitante e a cartularidade e circularidade orientam o direito cambiário; d) ao contrário do que constou na parte dispositiva da decisão guerreada, de rejeição dos embargos, a hipótese é de acolhimento ao menos parcial, na medida em que se reconheceu a limitação da responsabilidade da apelante a força da herança e na proporção da parte que eventualmente recebeu, além da determinação de que essa prova compete ao credor, de modo que a redistribuição da sucumbência se torna necessária para não contrariar o disposto no artigo 85, §6º e 8º, do CPC (fls. 162-170).

Contrarrazões apresentadas às fls. 174-181, em que a parte apelada requer o desprovimento do recurso.

O recurso ascendeu ao Tribunal de Justiça e foi distribuído a esta relatoria.

Os autos vieram conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

1. Exame de admissibilidade

Inicialmente, registra-se que se trata de recurso de apelação interposto contra sentença prolatada sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este diploma processual que disciplina o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Feitas estas digressões, conheço do recurso de apelação porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

2. Fundamentação

Examinados os...

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