Acórdão Nº 0300513-94.2015.8.24.0010 do Sétima Câmara de Direito Civil, 17-12-2020

Número do processo0300513-94.2015.8.24.0010
Data17 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0300513-94.2015.8.24.0010/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0300513-94.2015.8.24.0010/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA


APELANTE: KATHERINE MACHADO (RÉU) ADVOGADO: LUDMILA ACOSTA SAIBRO (OAB SC038315) ADVOGADO: José Roberto Cabreira Saibro (OAB SC013438) APELADO: VILMAR TORRES DOS SANTOS (AUTOR) ADVOGADO: MÁRCIA ZOMER ROSSI MATTEI (OAB SC023386) INTERESSADO: MARIO SCHUEROFF (RÉU) ADVOGADO: LAURO BOEING JUNIOR ADVOGADO: CRISTIANI WERNER BOEING INTERESSADO: MARIA SALETE ZEZULKA (RÉU) ADVOGADO: LAURO BOEING JUNIOR ADVOGADO: CRISTIANI WERNER BOEING


RELATÓRIO


Katherine Machado interpôs recurso de apelação contra sentença (evento 101) que, nos autos da ação indenizatória por acidente de trânsito ajuizada por Vilmar Torres dos Santos, também em face de Mário Schueroff e Maria Salete Zezulka, reconheceu a ilegitimidade passiva da terceira ré e julgou procedente o pedido inicial em relação aos demais corréus.
Para melhor elucidação da matéria debatida dos autos, adota-se o relatório da sentença recorrida:
Vilmar Torres dos Santos ingressou com a presente "ação de reparação de danos materiais decorrentes de acidente de trânsito" em face de Mario Schueroff, Katherine Machado e Maria Salete Zezulka, todos devidamente qualificados.
Narra o autor que, por volta das 5h30min do dia 29.11.2014, na Rodovia SC 108, a segunda requerida Katherine, embora não habilitada, porém autorizada pelo primeiro réu Mario, conduziu o veículo de propriedade da terceira ré Maria Salete de maneira imprudente e invadiu a pista contrária colidindo de frente com o veículo Fiat Uno Vivace de sua propriedade, conduzido por sua filha Liziani Heideman Santos Badziak, que veio a óbito logo após o acidente, tendo como caroneira sua neta Mirela Santos Badziak, que sofreu algumas lesões corporais. Disse que em momento algum os requeridos conversaram com o autor para auxiliar nas despesas decorrentes do acidente, pleiteando pelo ressarcimento dos danos materiais ocasionados em seu veículo. Sustentou que a culpa pelo acidente está evidenciada pelo Croqui, sendo inteiramente os réus culpados pelo acidente, haja vista a conduta imprudente. Por fim, pugnou pela condenação dos réus ao ressarcimento dos valores que gastaria com a reparação do bem móvel envolvido no acidente. Juntou documentos.
Deferido os benefícios da justiça gratuita, foi determinada a citação dos réus (e. 12).
Devidamente citada, a ré Katherine apresentou contestação (e. 32), aduzindo, preliminarmente, ilegitimidade ativa do autor. No mérito, narrou que conduzia o veículo envolvido no acidente ocorrido em 29.11.2014. Alegou que enquanto trafegava pela rodovia tomou todas as cautelas necessárias, porém perdeu a visibilidade da pista, pois o veículo dirigido pela mãe das requerentes estava com o farol alto. Disse que a vítima do acidente não tomou as cautelas necessárias de segurança, contribuindo para que acontecesse o acidente, ou seja, a culpa pelo acidente foi exclusiva da vítima. Narrou que não teve culpa no acidente, bem como o nexo causal entre o acidente e o prejuízo não está demonstrado. Sustentou que inexiste prova da culpa do acidente, motivo pelo qual não há se falar em dever de indenizar. Ao final, requereu o acolhimento da preliminar e, subsidiariamente, a improcedência da actio. Juntou documentos.
Citados, os requeridos Mário e Maria Salete apresentaram defesa na forma de contestação (e. 40), aduzindo, preliminarmente, ilegitimidade passiva ad causam. No que diz respeito ao mérito, declararam que inexiste qualquer conduta culposa dos réus, haja vista que a culpa pelo acidente foi exclusiva da vítima, tendo em vista que a visibilidade da motorista foi afetada pelo farol alto do veículo da vítima. Sustentaram que a ré Katherine, embora não possuía habilitação, tinha plena conhecimento em direção veicular, tal como que a vítima agiu com imprudência, transitando com o farol alto durante a noite. Disseram que o conjunto probatório nos autos e o Boletim de Ocorrência não possibilitam auferir a existência da culpa do acidente, visto que a motorista do veículo Fusion transitava em sua mão de direção. Alegaram, também, caso não seja reconhecida a culpa exclusiva da vítima, a culpa concorrente da vítima. Impugnaram os pedidos de danos materiais, vez que o valor apresentado é maior que o valor da tabela FIPE do bem móvel e requereram o desconto dos valores percebidos pelo seguro DPVAT. Ao final, pugnaram pelo acolhimento da preliminar e pela improcedência da demanda, bem como postularam pelo benefício da justiça gratuita. Juntaram documentos.
Houve réplica (e. 48 e e. 59).
Na decisão saneadora (e. 62), foi postergada a análise da preliminar de ilegitimidade passiva da requerida Maria Salete, intimando-se as partes para especificar as provas que pretendem produzir.
Os réus pugnaram pela oitiva de testemunhas (e. 65 e e. 66).
Foi deferida a justiça gratuita aos réus Mário Schueroff e Maria Salete Zezulka, bem como designada audiência de instrução e julgamento (e. 71).
Considerando que as testemunhas já foram ouvidas nos autos em apenso, a parte autora concordou com o aproveitamento dos depoimentos (e. 79), motivo pelo qual a audiência foi cancelada.
A ré Katherine apresentou alegações finais (e. 93).
Após, os autos vieram conclusos.
É, na concisão necessária, o relatório. Decido.
Da parte dispositiva do decisum, extrai-se a síntese do julgamento de primeiro grau:
Ante o exposto, reconheço a ilegitimidade passiva "ad causam" da requerida Maria Salete Zezulka, razão pela qual JULGO EXTINTO o feito sem resolução do mérito (CPC, art. 485, VI).
No mais, com supedâneo no artigo 487, I, do CPC, resolvo o mérito da ação e JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, CONDENANDO os réus Mario Schueroff e Katherine Machado, solidariamente, ao pagamento dos danos materiais em favor do autor, no montante de R$ 23.125,00, devendo incidir correção monetária pelo INPC desde novembro de 2014 e juros de mora de 1% ao mês desde a data do sinistro (29.11.2014), conforme Súmula n. 54 do STJ.
CONDENO os requeridos, solidariamente, ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% do valor atualizado da condenação (CPC, art. 85, § 2º).
Suspensa exigibilidade das verbas sucumbenciais quanto ao réu Mario Schueroff, ante o deferimento da justiça gratuita (e. 71.98) (CPC, art. 98, §3º).
Em suas razões recursais (evento 110) a segunda demandada assevera que "conduzia o veículo envolvido no fatídico incidente ocorrido em 29 de novembro de 2014 quando em determinado momento, perdeu a visibilidade da pista em razão de que a vítima trafegava pela via com farol em luz alta, fato que acarretou na colisão entre os dois veículos" (p. 4).
Alega que não foi responsável pela ocorrência do acidente, devendo ser afastado o dever de indenizar.
Sustenta que o croqui do acidente, elaborado pela autoridade policial, não traduz a realidade dos fatos ocorridos, de modo que a presunção de veracidade de que goza o boletim de ocorrência foi elidida por meio da prova produzida nos autos.
Com base nesses argumentos, postula a reforma da sentença objurgada para julgar improcedente o pleito exordial. Subsidiariamente, requer o reconhecimento da culpa concorrente, a fim de reduzir o valor arbitrado a título de indenização material, bem como da redistribuição do ônus sucumbencial.
Certificado o decurso do prazo sem apresentação de contrarrazões (evento 115 dos autos de origem), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.
Este é o relatório

VOTO


Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que reconheceu a ilegitimidade passiva da terceira ré e julgou procedente o pedido inaugural em relação ao primeiro e à segunda demandada.
Porque presentes os pressupostos de admissibilidade, conhece-se da apelação interposta.
De início, destaca-se que a decisão recorrida foi publicada quando já vigente o novo Código de Processo Civil (4-9-2020 - evento 101), motivo pelo qual a referida norma norteará a presente decisão, por incidência do princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais), nos moldes do art. 1.046 do atual Código de Ritos.
Tem-se como fato incontroverso, porque reconhecido expressamente pelas partes, a ocorrência de um acidente de trânsito no dia 29-11-2014, por volta das 04h30min, na Rodovia SC - 108, altura do Km 316, no município de Braço do Norte, envolvendo o veículo de propriedade do autor, ora apelado, modelo Fiat Uno Vivace, placas MIU 7623, e o automóvel conduzido pela apelante e de propriedade do primeiro réu, Mário Schueroff, modelo Ford Fusion, placas MMJ 1509, que transitavam em sentidos opostos, culminando na morte de Lizani Heidemann Santos Badziak, filha do autor, que conduzia o seu veículo.
A controvérsia, portanto, cinge-se em verificar qual das motoristas teria dado causa ao infortúnio, e sobre tal ponto debruçar-se-á a presente decisão.
Adianta-se, desde já, que o apelo não comporta acolhimento.
I - Da culpa pelo acidente de trânsito:
Como se sabe, dispõe o art. 186 do Código Civil: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".
Nas palavras do doutrinador Rogério Greco: "A conduta, nos delitos de natureza culposa, é o ato humano voluntário dirigido, em geral, à realização de um fim lícito, mas que, por imprudência, imperícia ou negligência, isto é, por não ter o agente observado o seu dever de cuidado, dá causa a um resultado não querido, nem mesmo assumido, tipificado previamente na lei penal" (Curso de direito penal - Parte geral, 11 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009, p. 200).
É cediço que "para que se configure o ato ilícito, será imprescindível que haja: a) fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência; b) ocorrência de um dano patrimonial...

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