Acórdão Nº 0300520-29.2018.8.24.0092 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 23-04-2020

Número do processo0300520-29.2018.8.24.0092
Data23 Abril 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300520-29.2018.8.24.0092

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA PARA, EM REVISÃO AO CONTRATO EXEQUENDO, (I) DECLARAR A NULIDADE DAS CLÁUSULAS QUE ESTIPULAM A CAPITALIZAÇÃO DE JUROS, COM O AFASTAMENTO DA TABELA PRICE E APLICAÇÃO DE JUROS SIMPLES (II) LIMITAR OS JUROS MORATÓRIOS EM 0,5% AO MÊS ATÉ DEZEMBRO DE 2002, E, APÓS, EM 1% AO MÊS, (III) DETERMINAR A REPETIÇÃO SIMPLES DO INDÉBITO, E (IV) DESCARACTERIZAR A MORA DO EMBARGANTE ATÉ O RECÁLCULO DO SALDO DEVEDOR.

RECURSO DO EMBARGADO/EXEQUENTE.

1. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS E TABELA "PRICE". PACTO CELEBRADO EM PERÍODO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N. 11.977/09. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO LEGAL PARA CONTRATAÇÃO DE JUROS CAPITALIZADOS MENSALMENTE EM CONTRATOS DE FINANCIAMENTO HABITACIONAL. EXCLUSÃO QUE IMPLICA NO AFASTAMENTO DA TABELA PRICE, ENQUANTO SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO BASEADO EM JUROS COMPOSTOS CAPITALIZADOS MENSALMENTE. PLEITO SUBSIDIÁRIO DE UTILIZAÇÃO DO SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO CONSTANTE (SAC). IMPOSSIBILIDADE. MÉTODO QUE, IGUALMENTE, CONDUZ À CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. APELANTE QUE NÃO REQUEREU A MANUTENÇÃO DA CAPITALIZAÇÃO ANUAL. PRÁTICA VEDADA EM QUALQUER PERIODICIDADE. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL MANTIDO.

2. MORA. AFASTAMENTO DA CAPITALIZAÇÃO DE JUROS QUE NÃO ACARRETA, AUTOMATICAMENTE, NA SUA DESCARACTERIZAÇÃO, MORMENTE QUANDO VERIFICADA A AUSÊNCIA DO DEPÓSITO INCIDENTAL. NECESSIDADE DE PAGAMENTO DA QUANTIA INCONTROVERSA QUE SEGUE A ORIENTAÇÃO FIRMADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO N. 1.061.530/RS. CONTEXTO QUE IMPÕE O NECESSÁRIO RECONHECIMENTO DA MORA, SUJEITANDO O EMBARGANTE ÀS RESPECTIVAS CONSEQUÊNCIAS. TÓPICO PROVIDO.

3. JUROS DE MORA. ALEGADA POSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO À MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL, À LUZ DA SÚMULA 530 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. IMPOSSIBILIDADE. REGRA APLICÁVEL AOS JUROS COMPENSATÓRIOS. CONSECTÁRIOS LEGAIS ADEQUADOS EM CONSONÂNCIA COM O PRECEITUADO NO ARTIGO 406 DO CÓDIGO CIVIL CUMULADO COM O § 1º DO ARTIGO 161 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. INCIDÊNCIA, AINDA, DA SÚMULA 379 DA CORTE SUPERIOR. IRRESIGNAÇÃO IMPROCEDENTE.

4. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. AFASTAMENTO DE ENCARGOS CONTRATUAIS ABUSIVOS QUE IMPLICA, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO, NA DEVOLUÇÃO DE VALOR EVENTUALMENTE COBRADO A MAIOR DA PARTE CONTRATANTE, DE FORMA SIMPLES. SENTENÇA ACERTADA.

5. ÔNUS SUCUMBENCIAIS.

5.1. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO DO EMBARGADO QUE IMPORTA NA NECESSIDADE DE REDISTRIBUIÇÃO DA RESPONSABILIDADE PELOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS FIXADOS NA ORIGEM, A OBSERVAR A PROPORÇÃO DE SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA DOS LITIGANTES.

5.2. HONORÁRIOS RECURSAIS (ARTIGO 85, § 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL). INAPLICABILIDADE NA HIPÓTESE DIANTE DO ACOLHIMENTO PARCIAL DO APELO.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300520-29.2018.8.24.0092, da comarca da Capital - Bancário 3ª Vara de Direito Bancário da Região Metropolitana de Florianópolis em que é Apelante Transcontinental Empreendimentos Imobiliários Ltda e Apelado Nei Benito Damo.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Guilherme Nunes Born, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Carlos Adilson Silva e Mariano do Nascimento.

Florianópolis, 23 de abril de 2020.

Desembargador Luiz Zanelato

Relator


RELATÓRIO

Transcontinental Empreendimentos Imobiliários Ltda interpôs recurso de apelação da sentença proferida pelo juízo da 3ª Vara de Direito Bancário da Região Metropolitana de Florianópolis da comarca da Capital - Bancário, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial (fls. 95-112).

Cinge-se a petição inicial em embargos à execução opostos por Nei Benito Damo, arguindo, preliminarmente, a ilegitimidade ativa e passiva, bem como o excesso de execução. No mérito, pleiteou a adequação do contrato executado aos parâmetros permitidos pela lei, especificamente (a) o afastamento da capitalização de juros; (b) a aplicação de juros de mora de 0,5% ao mês até 30-1-2003 e após, juros de 1% ao mês, de acordo com o Código Civil vigente; (c) a vedação da cobrança de multa contratual de 2% sobre os juros moratórios. Apontou, ainda, erro de cálculo das prestações vencidas após 30-4-2011, porquanto não lhe foi concedido o desconto de 48,32% sobre o valor das prestações devidas, em razão do falecimento da Sra. Maria Dutra Fonseca. Por fim, pugnou pelo recebimento dos presentes embargos à execução no efeito suspensivo e a procedência dos pedidos formulados com a condenação do embargado ao pagamento das custas processuais e dos ônus sucumbenciais (fls. 1-13).

Diante da ausência da garantia do juízo, a petição inicial foi recebida sem a concessão de efeito suspensivo, à luz do artigo 919, § 1º, do Código de Processo Civil (fl. 43).

Devidamente citada, a empresa Transcontinental Empreendimentos Imobiliários Ltda apresentou impugnação, defendendo a legitimidade dos litigantes. No mérito, refutou as ilegalidade arguidas, afirmando que a cobrança da capitalização de juros é permitida, bem como os juros de mora, não havendo falar em excesso de execução. Requereu a improcedência dos pedidos iniciais e a condenação do embargante ao pagamento das verbas da sucumbência (fls. 47-50).

Réplica às fls. 92-94.

Na data de 14 de agosto de 2018, o juiz da causa, Dr. Marcelo Pizolati, prolatou sentença de parcial procedência, cujo dispositivo segue transcrito:

Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedentes os pedidos contidos nos presentes embargos à execução propostos por Nei Benito Damo em face de Transcontinental Empreendimentos Imobiliários Ltda., para revisar o contrato exequendo, no sentido de:

a) declarar a nulidade das cláusulas que estipulam a cobrança da capitalização de juros no contrato, objeto da presente demanda, proibindo-se a utilização da Tabela Price, devendo ser aplicado juros remuneratórios pelo método simples;

b) limitar os juros moratórios no percentual de 1% ao mês, após a vigência d do Código Civil (janeiro de 2003), de modo que antes deverá incidir juros de 0,5% ao mês até dezembro de 2002.

c) determinar a repetição simples de eventual indébito ou compensação pela instituição financeira, desde que verificado pagamento a maior, a ser apurado por simples cálculo aritmético, corrigidos em índice da CGJ e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês, desde a data da citação.

c) descaracterizar a mora da parte embargante para tão somente determinar que o banco réu readéque os cálculos da execução em apenso.

Determino que o banco embargado providencie o recálculo da dívida, nos moldes desta decisão, dando continuidade à execução com o novo cálculo.

Considerando que ambas as partes foram vencedoras e vencidas, há que ser reconhecida a sucumbência recíproca, de modo que ambas devem ser condenadas ao pagamento das custas processuais, na proporção de 60% para a parte autora e 40% para o réu.

Sabe-se que o ônus da sucumbência surge da necessidade de recomposição do patrimônio do litigante vencedor. Contudo, os honorários advocatícios devem ser arbitrados em valor adequado, que não pode ser excessivo a ponto de configurar uma penalização, e tampouco ser reduzido de modo a desmerecer a atividade do advogado. Assim sendo, para a fixação da verba honorária é levado em consideração o trabalho e o grau de zelo do profissional, o local e o tempo da prestação do serviço, a natureza e a complexidade da causa, conforme prevê o art. 85, §§ 2º e 8º do CPC.

Dessa forma, considerando todos os requisitos mencionados, atinentes ao caso concreto, fixo a verba honorária em R$ 3.000,00 (três mil reais), porquanto tal quantia se mostra adequada para remunerar os procuradores das partes, na mesma proporção da distribuição das custas processuais, acima mencionada (40% pagos pela ré em favor do advogado da parte autora e 60% pagos pela demandante em favor do patrono da ré). Ressalto, por derradeiro, que fica vedada a compensação da verba honorária, nos termos do art. 85, § 14, do CPC. (fls. 95-112)

Ato contínuo, o demandante opôs embargos de declaração (fls. 136-138), os quais foram rejeitados (fls. 139-141).

Irresignada, a parte embargada interpôs recurso de apelação, argumentando, em síntese, que (a) a aplicação do método de amortização pela Tabela Price deve ser mantida, com amparo legal dos arts. 110, 354 e 422 do Código Civil e art. 15-B da Lei n. 4.380/64, independentemente da capitalização de juros, a qual não é vedada; (b) subsidiariamente, a dívida deve ser amortizada pelo Sistema de Amortização Constante - SAC; (c) porquanto não preenchidos os requisitos autorizadores, é inviável a descaracterização da mora do embargante, e respectivo óbice da inscrição de seu nome nos cadastros protetivos; (d) os juros moratórios devem ser mantidos na forma originalmente contratada; (e) não há falar em repetição do indébito; e (f) os ônus sucumbenciais devem ser arcados integralmente pelo adversário (fls. 118-133).

Contrarrazões apresentadas às fls. 146-161.

O recurso ascendeu ao Tribunal de Justiça e foi distribuído a esta relatoria por sorteio (fls. 163-165).

Este é o relatório.


VOTO

1. Juízo de admissibilidade

Conheço do recurso de apelação porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

2. Fundamentação

2.1. Tabela Price

A apelante sustenta que amortização pela Tabela Price deve ser mantida, porquanto não redunda necessariamente na formação de juros compostos mas, como previsão contratual, na efetiva amortização das prestações, e, jamais, na sua capitalização.

Todavia, tal sistema é justamente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT