Acórdão Nº 0300528-64.2017.8.24.0084 do Segunda Câmara de Direito Civil, 17-09-2020

Número do processo0300528-64.2017.8.24.0084
Data17 Setembro 2020
Tribunal de OrigemDescanso
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300528-64.2017.8.24.0084, de Descanso

Relator: Desembargador Rubens Schulz

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO COMINATÓRIA E INDENIZATÓRIA. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO USADO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DE AMBAS AS PARTES.

MÉRITO. COMPRA E VENDA DE MÁQUINA ESCAVADEIRA USADA. ALEGADO PROBLEMA NO MOTOR. IMPLEMENTO DESTINADO A SERVIÇOS DE ESCAVAÇÃO E TERRAPLANAGEM QUE APRESENTA POUCA FORÇA NO DESEMPENHO DO SERVIÇO. CONSTATAÇÃO DO PROBLEMA SOMENTE QUANDO UTILIZADA. DEFEITO OCULTO CARACTERIZADO.

"Para haver vício redibitório, vários pressupostos são reclamados, o que se extraem dos dispositivos que tratam da matéria, os quais coincidem com a versão do Código anterior: a) que o vício da coisa seja oculto. [...]; b) que o vício torne a coisa imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminua de valor. [...]; c) há de ser o vício anterior à tradição, ou, no mínimo, é necessário que exista no momento da tradição. Após o requerente receber a coisa, esta já se encontra em seu poder, e responsabiliza-se ele pelo que vier a ocorrer" (TJSC, Apelação Cível n. 0000632-73.2014.8.24.0072, rel. Des. José Agenor de Aragão).

DEMAIS PREJUÍZOS COM REPAROS NA MÁQUINA ESCAVADEIRA. SUBSTITUIÇÃO DE JUNTAS DE CABEÇOTE, SERVIÇOS DE LUBRIFICAÇÃO E DEMAIS COMPONENTES PERIFÉRICOS AO MOTOR. PRETENSA INDENIZAÇÃO DE TAIS DESPESAS. INSUBSISTÊNCIA. ESCAVADEIRA COM OITO ANOS DE USO. DESGASTES NATURAIS E INERENTES AO TEMPO DE UTILIZAÇÃO. VÍCIO OCULTO NÃO CARACTERIZADO NESTES PONTOS. INEXISTÊNCIA DE DEVER DE INDENIZAR.

LUCROS CESSANTES. SUSTENTADA A PERDA MATERIAL COM CONTRATOS DE LOCAÇÃO DA MÁQUINA QUE NÃO FORAM EFETIVADOS. AUSÊNCIA DE PROVA DAS PERDAS. INDENIZAÇÃO NÃO CARACTERIZADA.

HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO. FIXAÇÃO.

RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300528-64.2017.8.24.0084, da comarca de Descanso (Vara Única), em que são apelantes e apelados Dois Toques Transportes e Serviços Ltda. ME e R & F Veículos RF Pupulim Comércio de Veículos Ltda ME.

A Segunda Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer de ambos os recursos de apelação e negar-se-lhes provimento. Em observância ao artigo 85, §§ 2º e 11, do Código de Processo Civil, fixa-se honorários recursais equivalentes a 20% (vinte por cento) do valor a esse título arbitrado na sentença. Caberá a cada recorrente arcar com este custo em favor do Dr. Procurador da parte contrária, sem compensação. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Des. Rubens Schulz, presidente com voto, a Exma. Sra. Desa. Rosane Portella Wolff e o Exmo. Sr. Des. Monteiro Rocha.

Florianópolis, 17 de setembro de 2020.

Desembargador Rubens Schulz

RELATOR


RELATÓRIO

Dois Toques Transportes e Serviços Ltda. ME ajuizou esta ação redibitória e indenizatória em face de R & F Veículos RF Pupulim Comércio de Veículos LTda ME perante o Juízo da Vara Única da comarca de Descanso. Alegou que em junho de 2017 adquiriu da ré uma máquina escavadeira hidráulica, a qual, dias após a compra, apresentou grave problema mecânico no motor. Disse que o conserto exigiu a substituição do motor, além de demais serviços de retífica. Arguiu que teve prejuízo com lucros cessantes, pois a máquina ficou muito tempo no conserto. Entendendo que o defeito no motor consubstancia vício oculto, pugnou pela condenação da ré na indenização do prejuízo material e dos lucros cessantes.

O Juízo determinou a designação de ato conciliatório e a citação (fls. 53-54).

A tentativa de composição em Juízo restou infrutífera (fl. 72).

A ré apresentou contestação sustentando preliminarmente a incompetência do Juízo. No mérito asseverou que não houve vício e que os defeitos apresentados pela máquina representam desgaste natural Pugnou pela improcedência dos pleitos (fls. 74-84).

Com a manifestação da parte autora acerca da resposta, a ré juntou mídias físicas (fl. 104).

O Juízo proferiu decisão saneando o feito e o encaminhando para a produção de provas (fls. 107-109).

Na fase instrutória foram colhidos o depoimento de cinco testemunhas (fl. 119).

Apresentadas as alegações finais, sobreveio a sentença em que o Magistrado singular julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais e condenou a ré a indenizar a autora pelos prejuízos materiais referentes à substituição do motor, com valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Com relação à sucumbência, impôs a cada litigante o pagamento de metade das custas processuais; quanto aos honorários, condenou a ré a pagar 12% (doze por cento) sobre o valor da condenação a parte autora e, a acionante a pagar à ré 12% (doze por cento) sobre o valor dos danos emergentes e lucros cessantes que não foram acolhidos (fls. 142-151).

Irresignadas, ambas as partes interpuseram apelação.

A requerida insurge-se alegando que nos contratos firmados entre as partes (fls. 19-20 e 21-22), tanto a camionete Volkswagen Amarok, entregue pela autora como pagamento, quanto a retroescavadeira foram repassadas no estado em que se encontravam, segundo vistoria feita pelo comprador, sem garantia. Entendendo que não há direito a reclamação da demandante, pugnou pela reforma da sentença, com a improcedência dos pedidos (fls. 154-158).

A autora, por sua vez, apela aduzindo que os demais prejuízos não abrangidos pela sentença também estão devidamente demonstrados nos autos. Postula pelo provimento do recurso, com a total procedência dos pedidos (fls. 162-168).

Com contrarrazões de ambas as litigantes, os autos foram encaminhados a este Tribunal de Justiça.

Vieram conclusos.

Este é o relatório.


VOTO

De início, destaca-se que a apreciação do presente recurso, em detrimento de outros que estão há mais tempo conclusos neste gabinete, não afronta o critério cronológico de julgamento dos processos, previsto no art. 12 do Código de Processo Civil de 2015. Ao revés, valendo-se da interpretação do parágrafo 2º do referido artigo, tratando-se de causa relativamente simples, antecipar o seu julgamento privilegia a celeridade e a economia processual e contribui para o desafogamento do Judiciário, uma das diretrizes da novel legislação.

Assim, presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conhece-se do recurso e passa-se a sua análise.

É objeto desta lide o suposto vício oculto que acometeu o motor da máquina escavadeira que a autora adquiriu da ré em junho de 2017, nos termos dos contratos de fls. 19-21 e 22-23

Segundo argumentou a autora, poucos dias após a compra e tendo começado a utilizar a máquina para os fins a que se destina, logo percebeu que o motor desta perdeu força rapidamente, ficando impraticável o uso do bem para o serviço pesado. Estribada neste fato é que a autora pretende ver-se indenizada pelo prejuízo com a compra de um motor novo, bem assim com a mão de obra de consertos que precisou realizar.

Assim, na relação jurídica então entabulada entre os particulares que ora são parte nesta lide, em havendo alegado prejuízo cometido por um em face de outro, é mister destacar que da parte postulante exige-se a obrigação da demonstração dos conhecidos pressupostos da responsabilização civil subjetiva que rege o tema:

- ilícito civil

- dano

- nexo de causa entre o primeiro e o segundo

- cometimento do ilícito com culpa.

O prejuízo material que a autora diz ter suportado deriva de alegado vício redibitório.

Segundo os ensinamentos de Rizzato Nunes, vícios ocultos são aqueles que "só aparecem algum ou muito tempo após o uso e/ou que, por estarem inacessíveis ao consumidor, não podem ser detectados na utilização ordinária" (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 6 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2011).

Também elucida Washington de Barros Monteiro:

Acerca do vício redibitório, aliás, vale dizer que o dever de indenizar é constituído por cinco elementos: a) que a coisa tenha sido recebida em virtude de contrato comutativo, ou de doação com encargo; b) que se ressinta de defeitos prejudiciais à sua utilização, ou lhe diminuam o valor; c) que esses defeitos sejam ocultos; d) que sejam graves; e) que já existam no momento da celebração do contrato. (MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Obrigações. São Paulo: Saraiva, 2003, p.49).

É da jurisprudência deste Tribunal:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE VÍCIO REDIBITÓRIO C/C PERDAS E DANOS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA AUTORA. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO USADO. PRETENDIDA À SUBSTITUIÇÃO DO BEM OU A DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS, ALÉM DAS PERDAS E DANOS, EM RAZÃO DA EXISTÊNCIA DE RESTRIÇÃO JUDICIAL QUE IMPEDE A TRANSFERÊNCIA DO VEÍCULO. RESTRIÇÃO INCLUÍDA APÓS A TRANSAÇÃO, POR DETERMINAÇÃO JUDICIAL EM AÇÃO TRABALHISTA PROPOSTA EM DESFAVOR DO ANTIGO PROPRIETÁRIO DO AUTOMÓVEL. IMPOSSIBILIDADE DE ATRIBUIR À DEMANDADA À RESPONSABILIDADE PELA RESTRIÇÃO, AINDA MAIS, POR TER SIDO LEVADA A EFEITO APÓS A TRADIÇÃO. AUSENTE PROVA DE PREEXISTÊNCIA DO VÍCIO, NÃO HÁ COMO DECLARÁ-LO. SENTENÇA MANTIDA. [...] Para haver vício redibitório, vários pressupostos são reclamados, o que se extraem dos dispositivos que tratam da matéria, os quais coincidem com a versão do Código anterior: a) que o vício da coisa seja oculto. [...] b) que o vício torne a coisa imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminua de valor. [...] c) há de ser o vício anterior à tradição, ou, no mínimo, é necessário que exista no momento da tradição. Após o requerente receber a coisa, esta já se encontra em seu poder, e responsabiliza-se ele pelo que vier a ocorrer. [...] (RIZZARDO, Arnaldo. in Contratos. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 160/2). HONORÁRIOS RECURSAIS. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO. PERCENTUAL MÁXIMO ARBITRADO NA ORIGEM (ART. 85, § 11, CPC). RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (TJSC, Apelação Cível n. 0000632-73.2014.8.24.0072, de Tijucas, rel. Des. José Agenor de Aragão, Quarta Câmara...

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