Acórdão Nº 0300546-46.2016.8.24.0076 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 22-09-2020

Número do processo0300546-46.2016.8.24.0076
Data22 Setembro 2020
Tribunal de OrigemTurvo
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0300546-46.2016.8.24.0076, de Turvo

Relatora: Desembargadora Rejane Andersen

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PEDIDO LIMINAR. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE O PLEITO EXORDIAL. RECURSO DA PARTE AUTORA.

ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA. NÃO ACOLHIMENTO. INTIMAÇÃO, NOS TERMOS DO ARTIGO 26 DA LEI N. 9.514/1997, REALIZADA EM MARÇO DE 2016, A QUAL CONSTITUIU EM MORA O DEVEDOR. TENTATIVAS DE INTIMAÇÕES ANTERIORES SEM SUCESSO. NOTIFICAÇÃO EFETUADA EM 2008 EM DESENCONTRO COM AS FORMALIDADES LEGAIS. AUSÊNCIA DE OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO NO CASO.

SUSCITADA A NULIDADE DA GARANTIA PRESTADA (BEM IMÓVEL) NO PACTO FIRMADO ENTRE OS LITIGANTES, ANTE O DESVIRTUAMENTO DA LEI DO SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO. DESPROVIMENTO. Procedimento CABÍVEL. NOS TERMOS DAS LEIS Nº 10.931/2004 E 9.514/1997. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. SENTENÇA MANTIDA.

"[...] 1. Cinge-se a controvérsia a saber se é possível a constituição de alienação fiduciária de bem imóvel para garantia de operação de crédito não relacionadas ao Sistema Financeiro Imobiliário, ou seja, desprovida da finalidade de aquisição, construção ou reforma do imóvel oferecido em garantia.

2. A lei não exige que o contrato de alienação fiduciária de imóvel se vincule ao financiamento do próprio bem, de modo que é legítima a sua formalização como garantia de toda e qualquer obrigação pecuniária, podendo inclusive ser prestada por terceiros. Inteligência dos arts. 22, § 1º, da Lei nº 9.514/1997 e 51 da Lei nº 10.931/2004.

3. Muito embora a alienação fiduciária de imóveis tenha sido introduzida em nosso ordenamento jurídico pela Lei nº 9.514/1997, que dispõe sobre o Sistema Financiamento Imobiliário, seu alcance ultrapassa os limites das transações relacionadas à aquisição de imóvel. [...] (REsp n. 1.542.275/MS, Terceira Turma, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 24-11-2015, grifou-se). (Agravo de Instrumento n. 4034072-72.2018.8.24.0000, de Rio do Sul, rela. Desa. Janice Goulart Garcia Ubialli, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 19-2-2019).

PLEITO DE CONDENAÇÃO DA PARTE ADVERSA EM DANOS MORAIS. DESPROVIMENTO. ILÍCITO NÃO VERIFICADO. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO DA APELADA NA COBRANÇA DA DÍVIDA. DANO MORAL NÃO VERIFICADO.

"Inexistindo ilícito que gere consequências negativas ao espírito da requerente, não há o que se falar em indenização por danos morais" (Apelação Cível n. 2014.092902-6, de Brusque, rel. Des. Monteiro Rocha, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 26-2-2015).

HONORÁRIOS RECURSAIS. VIABILIDADE DE FIXAÇÃO. CONSECTÁRIO DO DESPROVIMENTO INTEGRAL DO APELO INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELO TRIBUNAL DA CIDADANIA (RESP N. 1.573.573/RJ) E ACOMPANHADO POR ESTE ÓRGÃO JULGADOR. VERBA DEVIDA AO CAUSÍDICO DA PARTE APELADA.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300546-46.2016.8.24.0076, da Comarca de Turvo (Vara Única), em que é Apelante Eládio Rocha Hahn e outro e Apelado Cooperativa de Crédito de Livre Admissão de Associados Litorânea (Sicoob/sc Credija):

A Segunda Câmara de Direito Comercial decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento e, consequentemente, fixar honorários recursais, em favor do procurador da parte apelada, em R$ 1.000,00 (mil reais). Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Desembargadores Robson Luz Varella e Newton Varella Junior.

Florianópolis, 22 de setembro de 2020.


Rejane Andersen

PRESIDENTE E RELATORA


RELATÓRIO

Eládio Rocha Hahn e Rosita da Silva Gomes Hahn ajuizaram ação declaratória de inexistência de débito c/c pleito de indenização por danos morais e pedido liminar de suspensão de procedimento extrajudicial de consolidação de posse e propriedade de imóvel contra Cooperativa de Crédito Rural de Jacinto Machado – SICOOB CREDIJA, alegando, em síntese, que firmaram com a instituição uma Cédula de Crédito Bancário com garantia hipotecária tendo como objetivo a concessão de limite de crédito no valor de R$ 100.000,00 para operações de desconto de cheques. Afirmaram, que foram surpreendidos com descontos pela cobrança, inesperada e em única vez, do valor de R$ 85.723,60, oriundo de títulos de seus clientes que não foram saldados a partir da assinatura do contrato. A instituição procedeu com descontos nas contas correntes da pessoa física e jurídica, sem qualquer autorização para tal.

Requereu a condenação da instituição financeira por danos morais, declaração da prescrição, com a quitação/inexigibilidade da Cédula de Crédito Bancário nº 110352 e declaração da nulidade da cláusula que estabeleceu a garantia imobiliária.

O pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi indeferido (fls. 130-132).

Apresentação de contestação às fls. 138-157.

Ato contínuo, sobreveio sentença de mérito (fls. 251-253), da qual se extrai a seguinte parte dispositiva:

Diante do exposto, julgo IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, o que faço com esteio no art. 487, inciso I, do CPC.

Ainda, ACOLHO a preliminar que afastou a prescrição e a preliminar de impugnação ao valor da causa e readéquo, de ofício, o valor dado à causa para R$202.032,53, sendo R$152.032,53 referente ao valor do débito existente entre as partes à época do ajuizamento da ação e R$50.000,00 pelo pedido de dano moral. Readéque-se o valor da causa, devendo os requerentes recolherem as custas complementares.

Revogo a liminar concedida às fls. 221/222.

Condeno os requerentes ao pagamento das custas e honorários que fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após, com o trânsito em julgado, arquivem-se.


Irresignada com o decisum singular, a instituição bancária requerida apresentou recurso de apelação (fls. 257-271), no qual sustentou, em apertada síntese, que a apelada notificou a parte apelante em 23-6-2008, portanto a interrupção da prescrição ocorreu nessa data e voltou a correr, com o prazo fatal em 23-6-2011. Ademais, pela prescrição trienal, todas as tentativas de notificação para pagamento extrapolaram esse período de três anos.

Alegaram que o contrato se trata de uma operação denominada desconto de cheques com garantia de imóvel, e eventual inadimplemento não poderia gerar a consolidação da posse do imóvel, mas o ingresso de ação visando a cobrança dos valores. E, ainda, que a Cédula de Crédito Bancário foi confeccionada com total desvirtuamento da Lei 9.514/1997.

Por fim, sustentaram a condenação por dano moral, pelo desconto de inadimplência de seus clientes por um ano, em uma única vez, o que tornou impossível a cobrança para com os clientes e o consequente encerramento da empresa.

Contrarrazões às fls. 289-310.

Após, os autos ascenderam a esta Egrégia Corte de Justiça.

É o relato do necessário.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto com o desiderato de reformar sentença que julgou improcedentes os pleitos formulados pela parte requerente na presente ação declaratória de inexistência de débito c/c pleito indenizatório e pedido liminar para suspensão do procedimento extrajudicial da consolidação de posse e propriedade sobre os imóveis matrículas nº 2.095 e 5040 (fls. 172-183).


1. Prescrição

Inicialmente, ressalta-se que as partes firmaram Cédula de Crédito Bancário, na modalidade Desconto de Cheques, no valor R$ 100.000,00 (cem mil reais), fls. 17-27, datada de 27-9-2006, tendo como objeto a concessão de limite do crédito para operações de desconto de cheques. Foram apresentados em garantia os imóveis matriculados sob os ns. 2.095 e 5040, do Registro de Imóveis de Jacinto Machado/SC.

Ato contínuo, ante a ausência de pagamento da dívida, foram notificados pela instituição bancária em 23-6-2008 (fl. 191), a qual apontou o débito, no entanto o apelante não promoveu o pagamento. Após, foram realizadas diversas tentativas de notificação extrajudicial, todas sem sucesso, sendo que em 23-3-2016 foi efetivamente efetivada a intimação dos autores, conforme procedimento da Lei 9.514/97.

Verifica-se que o aviso enviado no ano de 2008 não pode ser considerado como a intimação determinada na lei, pois não cumpriu com as formalidades prescritas no art. 26, § 3º, da Lei 9.514/97, a qual preceitua:

§ 3º A intimação far-se-á pessoalmente ao fiduciante, ou ao seu representante legal ou ao procurador regularmente constituído, podendo ser promovida, por solicitação do oficial do Registro de Imóveis, por oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento.


A intimação efetivada no ano de 2016 (fl. 197) cumpre os requisitos, pois promovida por solicitação do Oficial de Registro de Imóveis de Sombrio, com informação acerca da constituição em mora e penalidades legais.

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA DE BEM IMÓVEL. LEI Nº 9.514/1997. INTIMAÇÃO PESSOAL. NECESSIDADE. EXEGESE DO ART. 26 § 3º. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. Na alienação fiduciária em garantia de bem imóvel, vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á [...] a propriedade do imóvel em nome do fiduciário (art. 26, caput, da Lei nº 9.514/1997).

2. Ao fiduciante é dada oportunidade de purgar a mora. Para tanto, deverá ser intimado pessoalmente, ou na pessoa de seu representante legal ou procurador regularmente constituído.

3. A intimação, sempre pessoal, pode ser realizada de três maneiras: (a) por...

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