Acórdão Nº 0300576-40.2014.8.24.0080 do Quinta Câmara de Direito Civil, 04-11-2021

Número do processo0300576-40.2014.8.24.0080
Data04 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300576-40.2014.8.24.0080/SC

RELATORA: Desembargadora CLÁUDIA LAMBERT DE FARIA

APELANTE: IVONE SARTORI (AUTOR) APELANTE: BANCO PAN S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Na 1ª Vara Cível da Comarca de Xanxerê, Ivone Sartori ajuizou "Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Indenização por Danos Morais e Materiais e Pedido de Tutela de Urgência" em face de Banco Panamericano S.A objetivando, em suma, a concessão da tutela provisória de urgência para a cessação dos descontos realizados na sua conta salário; a intimação da instituição bancária ré para apresentar a cédula de crédito bancário n. 703131172-8, em sua via original, a fim de comprovar a veracidade da assinatura e a inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Por fim, pleiteou a total procedência da ação, a fim de que seja declarada a inexistência da relação jurídica entre as partes litigantes e a condenação da requerida ao pagamento de danos morais e materiais, de modo que seja devolvido em dobro os valores já descontados da sua conta salário (Evento 1 dos autos de origem).

Para fundamentar sua pretensão, a demandante alegou, em síntese, que é servidora do Estado de Santa Catarina e possuía empréstimo consignado (operação 795695178) junto ao Banco do Brasil (BB), pactuado em 01/06/2012, com desconto mensal de R$ 1.015,48, tendo pago 23 das 71 parcelas aventadas (INF 3 do Evento 1 dos autos de origem). Porém, sem qualquer solicitação, o aludido empréstimo foi quitado pelo Banco Panamericano S.A, em 23/04/2014, ora réu (INF 6 do Evento 1 dos autos de origem). Tal acerto fez surgir um novo desconto na sua folha de pagamento, na quantia de 1.005,74. Ademais, asseverou que antes mesmo de ter acesso a qualquer informação, a ré depositou o valor de R$ 4.290,08 na sua conta e passou a lançar um débito em 72 parcelas (Evento 1 dos autos de origem).

Prosseguiu afirmando que prontamente, em 06/05/2014, efetuou a devolução para a requerida do aludido valor depositado em sua conta (INF 5 do Evento 1 dos autos de origem). Na tentativa de resolver o impasse, administrativamente, em 12/05/2014, dirigiu-se ao PROCON (protocolo atendimento 16074148) e solicitou o envio da segunda via do suposto mútuo celebrado (INF 7 dos Evento 1 dos autos de origem)

Outrossim, informou que foram expedidas 3 notificações extrajudiciais em 04/06/2014 (INF 8, 9 e 10 do Evento 1 dos autos de origem) para que instituição financeira tivesse a ciência de que não existia qualquer contrato celebrado com ela e, por conseguinte, cancelasse os descontos realizados na sua folha de pagamento. No entanto, não obteve êxito nas negociações extrajudiciais. Por fim, destacou que jamais emitiu qualquer cédula de crédito bancário, de modo que a assinatura aposta na avença n. 703131172-8, em discussão, não é sua (INF 12 do Evento 1 dos autos de origem).

A análise da tutela foi postergada para após a apresentação da contestação (Evento 4 dos autos de origem).

Citada (Evento 9 dos autos de origem), a ré apresentou contestação, arguindo, em síntese: a) que é parte ilegítima a figurar junto ao polo passivo, já que não contribuiu para qualquer ato ilícito; b) que não houve fraude; c) que, se houve mesmo fraude, a autora é responsável pelo estelionato sofrido, não cabendo à ré responder por ele; d) que a requerida não pode suportar eventual responsabilidade oriunda de falsidade ideológica cometida por terceiro, e; e) que inexiste ato ilícito ou mesmo abalo moral indenizável (Evento 12 dos autos de origem).

Houve réplica (Evento 19 dos de origem), na qual a autora ratificou os pedidos iniciais e requereu que a medida de antecipação de tutela pleiteada na inicial fosse reanalisada.

No evento 22 dos origem, o togado singular determinou a expedição de ofício ao BB para que esse prestasse esclarecimentos acerca da negociação que travou junto à casa bancária requerida para fins de transferência do financiamento firmado pela autora.

Em resposta, o banco réu asseverou que o contrato n. 703131172-8 se tratava de compra de dívida, no valor líquido de R$ 36.719,24, a ser resgatado em 72 parcelas mensais de R$ 1.005,74. Desse montante, a quantia de R$ 32.429,16 foi utilizada para quitar dívida da autora perante o BB e o remanescente de R$ 4.290,08 foi disponibilizado na conta da demandante, em 24/04/2014 (INF 33 do Evento 26 dos autos de origem). Informou, ainda, que foram descontadas 10 parcelas mensais do benefício da autora. Para comprovar suas assertivas acostou aos autos o referido contrato (INF 35 do Evento 26 dos autos de origem).

O BB também se manifestou alegando que a avença em pauta foi transferida, de acordo com as regras de portabilidade, a pedido da cliente, para a ré, de modo que não houve negociação alguma do BB com a requerida. (Evento 32 dos autos de origem).

Intimados acerca do interesse na dilação probatória (Evento 41 dos autos de origem), a casa bancária pugnou pelo julgamento antecipado (Evento 44 dos autos de origem), enquanto a autora manifestou interesse na realização de perícia grafotécnica (Evento 45 dos autos de origem).

Na decisão do Evento 50, dos autos de origem, foi reconhecida a aplicabilidade da legislação consumerista, determinada a inversão do ônus probatório e saneado o feito. Na mesma, oportunidade foi deferida a realização de perícia grafotécnica.

Apresentados os quesitos por ambas as partes (Evento 53 e 63 dos autos de origem), a requerida foi intimada para apresentar cópia original do contrato em análise (Evento 63 dos autos de origem). Porém, a ré negou-se a entregá-lo (Evento 66 dos autos de origem). Houve manifestação da autora (Evento 69 dos autos de origem).

Nesses termos, o magistrado julgando antecipadamente a lide consignou no dispositivo da sentença o seguinte (Evento 73 dos autos de origem):

Ante o exposto, na forma do inciso I do artigo 487 do Código de Processo Civil, resolvo o mérito e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais formulados por Ivone Sartori em face de Banco Panamericano S/A, apenas para declarar inexistente a relação jurídica discutida, consistente na portabilidade de crédito representada pelos contratos de fls. 105/118, com o retorno da negociação aberta com o Banco do Brasil ao seu status quo ante.

Por haver sucumbência recíproca, condeno ambas as partes ao pagamento, pro rata, das custas processuais e honorários de sucumbência, estes últimos que fixo em 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa (art. 85, § 2°; art. 86, caput; e art. 87; todos do CPC). Vedada a compensação

Ainda, considerando que a perícia grafotécnica deferida não foi realizada, expeça-se alvará para levantamento dos honorários depositados às fls.154/156 em favor da parte autora, observando-se os dados bancários fornecidos à peça de fl. 162.

Diante da sentença supra, a demandada interpôs embargos de declaração, no qual aduziu, em suma (Evento 78 dos autos de origem):

[...]

2. Cumpre esclarecer que, uma vez quitados os contratos da autora junto ao Banco do Brasil, o mesmo fica impossibilitado de reaverbar a margem consignável da autora. Ainda, se os contratos da autora forem retomados, a mesma estará em mora junto ao Banco do Brasil pelo atraso nas prestações, uma vez que os pagamentos retornariam de onde pararam.

3. Neste sentido, para a melhor resolução para o presente feito, a fim de que sejam cumpridas todas as obrigações deferidas, e para que nem a ré, nem a autora, nem o Banco do Brasil tenham prejuízos, se mostra necessário que seja oficiado ao INSS a fim de que ele realize os cancelamentos e ativações de empréstimos referidos no dispositivo, mesmo porque as rés não possuem tal podem frente ao sistema do órgão pagador.

4. Ainda, se faz necessário que as parcelas descontadas dos contratos de portabilidade sejam transferidas aos contratos portados, quando reativados, para que a autora não fique em mora junto à instituição financeira. Neste sentido, poderá a sentença definir que as parcelas descontadas no contrato do Pan sejam abatidas no valor do contrato original, para que não haja qualquer prejuízo à autora. Toda esta conversão deverá ser feita por meio de ofício ao INSS, pois, conforme já explanado, o Banco PAN não possui poderes para tanto.

5. Neste ínterim, impende sejam acolhidos os presentes Embargos de Declaração para que seja sanada a omissão do dispositivo uma vez que a ré se encontra impossibilitada de cumprir com todas as obrigações previstas sem que a autora seja prejudicada. Assim, deverá o dispositivo esclarecer cada comando que será feito, a forma de abatimento dos valores dos contratos, e definir que o órgão pagador da autora deve realizar tais mudanças sistemicamente.

O juiz singular rejeitou os aclaratórios nos seguintes termos (Evento 80 dos autos de origem):

Entretanto, inexiste como acolher os embargos. E isso porque não compete ao Juízo dizer às partes os detalhes da forma como devem cumprir os comandos da sentença, o que fica a encargo delas próprias.

O que compete ao Juízo é resolver a controvérsia posta à sua análise e apontar a solução objetiva do litígio. Os minuciosos detalhes de como as partes pretendem realizar o cumprimento deve ser sopesada por elas mesmas, nas formas legalmente permitidas.

Além disso, inexiste como o presente Juízo, no presente caso, determinar detalhes do cumprimento da obrigação, já que o cumprimento final não envolve apenas as partes sob litígio, mas também envolve terceiros que não integram a lide. Além de que se tratam de medidas que envolvem procedimentos de cunho administrativo, sobre os quais este Juízo não possui influência sem que antes seja posta sob sua análise controvérsia anterior e devidamente instruída.

Inconformada, a instituição bancária interpôs recurso de apelação, em que pretende a reforma da sentença, de modo a ver julgados improcedentes os pleitos exordiais. Aduziu, em síntese, que todos os documentos necessários para garantir a legalidade da operação foram exigidos no ato da contratação e caso tenha sido...

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