Acórdão Nº 0300589-59.2018.8.24.0125 do Segunda Câmara de Direito Civil, 23-01-2020

Número do processo0300589-59.2018.8.24.0125
Data23 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemItapema
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300589-59.2018.8.24.0125, de Itapema

Relator: Desembargador Rubens Schulz

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL RESIDENCIAL PARA TEMPORADA. RESCISÃO ANTECIPADA EM RAZÃO DO ALAGAMENTO DO IMÓVEL. IMOBILIÁRIA QUE ARCOU COM O PAGAMENTO DOS ALUGUEIS DE OUTRO IMÓVEL. DEMANDA AJUIZADA PELA IMOBILIÁRIA CONTRA O PROPRIETÁRIO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. INCONFORMISMO DO PROPRIETÁRIO.

CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL PARA TEMPORADA. APLICAÇÃO DAS NORMAS ESPECÍFICAS DA LEI N. 8.245/1991. CASO CONCRETO QUE NÃO CARACTERIZA SERVIÇO DE HOSPEDAGEM, E TAMBÉM NÃO ESTÁ SUJEITO AO CDC.

ARGUMENTO DE ENTREGA DO IMÓVEL EM CONDIÇÕES APTAS PARA UTILIZAÇÃO. SUSCITADA CAUSA EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. INSUBSISTÊNCIA. EXCESSO DE CHUVAS QUE NÃO POSSUI O CONDÃO DE AFASTAR A OBRIGAÇÃO DO PROPRIETÁRIO DE DISPONIBILIZAR O IMÓVEL PARA LOCAÇÃO EM PERFEITAS CONDIÇÕES DE FRUIÇÃO. SUBSTRATO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA O ALAGAMENTO DO IMÓVEL DEVIDO À FALTA DE MANUTENÇÃO, FATO QUE OBSTOU A CONTINUIDADE DA LOCAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO CONFIGURADA. INTELIGÊNCIA DO ART. 22, INCS. I E IV, DA LEI N. 8.245/1991. DEVER DE RESSARCIR O PREJUÍZO SUPORTADO PELA IMOBILIÁRIA, A QUAL AGIU COMO MANDATÁRIA DO PROPRIETÁRIO NA ADMINISTRAÇÃO DA LOCAÇÃO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300589-59.2018.8.24.0125, da comarca de Itapema (2ª Vara Cível), em que é Apelante Ruby Aldyr Keil Junior e Apelada Leonildo Casagrande e Cia Ltda, representada por Leonildo Casagrande.

A Segunda Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer e negar provimento ao recurso. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Des. Jorge Luis Costa Beber, presidente com voto, o Exmo. Sr. Des. Rubens Schulz e a Exma. Sra. Desa. Rosane Portella Wolff.

Florianópolis, 23 de janeiro de 2020.

Desembargador Rubens Schulz

RELATOR

Documento assinado digitalmente

Lei n. 11.419/2006


RELATÓRIO

Trata-se de "ação de ressarcimento de danos" ajuizada por Leonildo Casagrande e Cia Ltda, representada por Leonildo Casagrande, em desfavor de Ruby Aldyr Keil Júnior, com esteio no descumprimento de contrato de corretagem.

A pretensão foi julgada parcialmente procedente para condenar o réu ao pagamento de R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais), equivalente a 4 diárias do contrato de locação (fl. 24), no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) cada, descontado o percentual de 10% (dez por cento) referente a comissão de corretagem, com atualização monetária desde o efetivo desembolso, e acréscimo de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação (fl. 128). O réu foi condenado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 20% (vinte por cento) do valor da condenação.

Inconformado com a decisão proferida, o réu interpôs recurso de Apelação Cível (fls. 130-139). Argumenta que necessária a reforma, a fim de julgar improcedente o pedido da petição inicial. Para tanto, aduz que o contrato de locação estabelece a ausência de responsabilidade do locador pela rescisão antecipada; que os prejuízos decorrentes do serviço de hospedagem constituem obrigação da imobiliária autora; que as fortes chuvas demonstram a excludente de responsabilidade por caso fortuito ou força maior; e que o imóvel estava em condições de utilização, motivo pelo qual o término da avença ocorreu por desistência da locatária.

A autora apresentou contrarrazões (fls. 144-153).

Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

Vieram conclusos.

Este é o relatório.


VOTO

Presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conhece-se do recurso e passa-se ao exame do seu objeto. Destaca-se, ademais, que a apreciação do presente recurso, em detrimento de outros que estão há mais tempo conclusos neste gabinete, não afronta o critério cronológico de julgamento dos processos, previsto no art. 12 do Código de Processo Civil. Ao revés, valendo-se da interpretação do parágrafo 2º do referido artigo, tratando-se de causa relativamente simples, antecipar o seu julgamento privilegia a celeridade e a economia processual e contribui para o desafogamento do Judiciário, uma das diretrizes da novel legislação.

Ab initio, extrai-se das razões recursais que a imobiliária apelada é responsável por eventual ressarcimento, visto que "não está como fornecedor de hospedagem e sim como cliente da imobiliária que seu imóvel foi cadastrado" (fl. 134).

Nada obstante o respeitável fundamento adotado na sentença quanto ao serviço de hospedagem, tem-se que o presente litígio está sujeito a Lei n. 8.245/1991, que traz normas específicas a respeito da locação para temporada.

Sobre essa modalidade de contrato, cita-se o édito do art. 48 da Lei de Locação:

Art. 48. Considera - se locação para temporada aquela destinada à residência temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de determinado tempo, e contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja ou não mobiliado o imóvel.

Parágrafo único. No caso de a locação envolver imóvel mobiliado, constará do contrato, obrigatoriamente, a descrição dos móveis e utensílios que o guarnecem, bem como o estado em que se encontram.

Desse modo, não está caracterizado o serviço de hospedagem. Igualmente, o Código de Defesa do Consumidor não incide no caso concreto, mormente porque a controvérsia gira em torno da locação por temporada e a prestação de serviço de corretagem. Assim, aplica-se a Lei de Locação.

Ultrapassado esse ponto, passa-se a deliberar acerca da pretensão exordial.

Depreende-se do caderno processual que, na data de 19-10-2017, a Sra. Edna Maria Luiz dos Santos celebrou o "Instrumento particular de contrato de locação residencial para temporada nº 571/2017" com a apelada, tendo por objeto o imóvel de titularidade do apelante, localizado na rua Antônio Valondoveski, n. 52, em Perequê (fl. 15). A locação para temporada foi ajustada para o período de 8-1-2018 a 15-1-2018 (sete dias), com diária no valor de R$1.000,00 (mil reais). Estes alugueis foram devidamente adimplidos, conforme recibos de fls. 17-18.

Como salientado pelo ilustre Magistrado a quo, a ocorrência de fortes chuvas no dia 10-1-2018, que provocaram o alagamento da casa, são fatos incontroversos.

Analisando as fotografias de fls. 19-21, constata-se que o imóvel não possuía qualquer condição de habitabilidade, o que ensejou a imediata desocupação e rescisão do contrato de locação. Além do mais, não há dúvida de que o imóvel apresentava defeitos no escoamento de água e esgoto e/ou telhado. A quantidade de água acumulada no interior da casa corrobora a ausência de manutenção, não sendo crível que as chuvas, por si só, tenham ocasionado o alagamento em tal extensão.

Por seu turno, a prova documental coligida aos autos pelo apelante não demonstra a tese de defesa. O Decreto n. 1743/2008 do Município de Porto Belo declara a situação de emergência em razão dos danos ocasionados pelas chuvas nos dias 10 e 11-1-2018. Como mencionado alhures, a ocorrência de chuva constitui ponto incontroverso. Embora o evento da natureza tenha causado prejuízos de grande proporção no Município, principalmente nas vias públicas (fl. 86), tal circunstância não define que o imóvel estava apto para uso. Na mesma intelecção, as fotografias de fls. 88-98 não comprovam o estado da casa, tais como o telhado e os sistemas hidráulico e sanitário.

Conclui-se que o imóvel não foi entregue para locação em perfeitas condições de fruição, o que viola a disciplina do art. 22, incs. I e IV, da Lei n. 8.245/1991, a saber:

Art. 22. O locador é obrigado a:

I - entregar ao locatário o imóvel alugado em estado de servir ao uso a que se destina;

[...]

IV - responder pelos vícios ou defeitos anteriores à locação;

A propósito, colaciona-se da jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. LOCAÇÃO COMERCIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. SÚMULA Nº 7/STJ. OBRIGAÇÕES DO LOCADOR. ART. 22, I, DA LEI Nº 8.245/1991. ENTREGA DO IMÓVEL EM ESTADO DE SERVIR AO USO A QUE SE DESTINA. ALCANCE DA NORMA.

1. Cinge-se a controvérsia a saber o alcance da obrigação do locador, prevista no art. 22, I, da Lei nº 8.245/1991, sobretudo se lhe compete a regularização do bem junto aos órgãos públicos segundo a atividade econômica a ser explorada pelo locatário.

2. A destinação do imóvel para locação urbana pode ser para uso residencial (arts. 46 e 47 da Lei nº 8.245/1991), para temporada (arts. 48 a 50 da Lei nº 8.245/1991) ou para uso comercial (arts. 51 a 57 da Lei nº 8.245/1991).

3. A determinação legal de que é dever do locador entregar ao locatário o imóvel alugado em estado de servir ao uso a que se destina (art. 22, I, da Lei nº 8.245/1991) está ligada à modalidade de locação em si mesma considerada, se residencial, comercial ou para temporada.

4. Na hipótese de locação comercial, a obrigação do locador restringe-se, tão somente à higidez e à compatibilidade do imóvel ao uso comercial. Salvo disposição contratual em sentido contrário, o comando legal não impõe ao locador o encargo de adaptar o bem às peculiaridades da atividade a ser explorada, ou mesmo diligenciar junto aos órgãos públicos para obter alvará de funcionamento ou qualquer outra licença necessária ao desenvolvimento do negócio.

5. Os deveres anexos à boa-fé, especialmente os deveres de informação, cooperação, lealdade e probidade, exigíveis das partes na execução dos contratos, contudo, impõem ao locador uma conduta colaborativa, no sentido de fornecer ao locatário os documentos e informações necessárias à implementação da atividade no imóvel objeto da locação.

6. Recurso especial parcialmente conhecido...

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