Acórdão Nº 0300634-45.2015.8.24.0068 do Sétima Câmara de Direito Civil, 20-04-2023

Número do processo0300634-45.2015.8.24.0068
Data20 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0300634-45.2015.8.24.0068/SC



RELATOR: Desembargador OSMAR NUNES JÚNIOR


APELANTE: NUTRISEARA - COMERCIO DE SUBPRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL LTDA ADVOGADO: GIAN CARLO POSSAN (OAB SC012812) APELANTE: JOSE ANTONIO FERNANDES MOREIRA ADVOGADO: GIAN CARLO POSSAN (OAB SC012812) APELADO: COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN APELADO: EDSON PELISSON ADVOGADO: MARCOS DEZEM (OAB SC019958) ADVOGADO: ANILTON GUIOTO CONSALTER (OAB SC003529) APELADO: DIRCEU JOAO MOSCON ADVOGADO: Anna Paula Garghetti (OAB SC036246)


RELATÓRIO


Nutriseara - Comércio de Subprodutos de Origem Animal LTDA e José Antonio Fernandes Moreira ajuizaram ação de indenização de danos morais em face de Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, Edson Pelisson e Dirceu Moscon.
Na exordial, os autores explicaram que a atividade comercial da empresa requerente consiste basicamente na coleta de óleos e gorduras de origem vegetal e animal que seriam descartados na natureza e que o autor José Antônio Fernandes Moreira é um dos sócios-proprietários da pessoa jurídica.
Narraram que, em agosto de 2014, alguns moradores do Bairro Garghetti (Seara/SC) constataram que a água distribuída pela CASAN apresentava forte odor, com aparência de contaminada. Alegaram que, antes de tomar outras providências, os requeridos Edson Pelisson e Dirceu João Moscon, vereadores do Município de Seara/SC, acusaram publicamente os requerentes de serem os responsáveis pela contaminação por terem supostamente realizado uma ligação clandestina.
Sustentaram que fora instaurado o Procedimento Preparatório 06.2014.00008075-0, pela Promotoria de Justiça da Comarca, no qual foi colhido o depoimento de empregados da CASAN. Pontuaram que os prepostos prestaram falsas informações sobre uma suposta ligação clandestina entre o sistema hídrico da empresa e o público.
Salientaram que a Polícia Ambiental se dirigiu até as dependências da empresa para averiguar a suposta ligação, mas que lavraram laudo afirmando que não havia correlação entre os sistemas. Asseveraram que o procedimento administrativo foi arquivado.
Explicaram que seria praticamente impossível fazer a ligação das redes hídricas, pois a tubulação faz parte do prédio da empresa. Argumentaram que seria necessário destruir parte da edificação para fazer a ligação e depois a desconexão. Frisaram que a pessoa jurídica autora somente utiliza água do encanamento público para uso social (escritório, cozinha e banheiros), enquanto a água do sistema hídrico próprio provém da chuva e da limpeza do óleo, sendo utilizada para limpeza e resfriamento de caldeiras.
Destacaram que são referência na área de preservação ambiental, que desenvolvem projetos sociais em escolas da região, e que a fama de poluidora do meio ambiente prejudicou sobremaneira o nome da empresa e a honra subjetiva do sócio-proprietário.
Por tais motivos, pugnaram pela condenação dos requeridos ao pagamento de indenização por danos morais.
Em contestação (evento 23), o requerido Dirceu João Moscon, preliminarmente, suscitou sua ilegitimidade passiva e a inépcia da inicial. No mérito, afirmou que não cometeu ato ilícito, pois as palavras proferidas sobre os autores eram acobertadas pela imunidade parlamentar e pela liberdade de expressão. Alegou, ainda, que não ficou configurado o dano moral.
A ré CASAN, em sua peça contestatória (evento 24), arguiu sua ilegitimidade passiva e, no mérito, defendeu a inexistência do abalo anímico alegado pelos autores.
Por sua vez, o demandado Edson Pelisson (evento 26) também afirmou que estava acobertado pela imunidade parlamentar e que não se excedeu quando proferiu as palavras que supostamente teriam abalado os requerentes. Salientou que não restou comprovado o dano moral e, subsidiariamente, postulou que eventual quantum indenizatório fosse fixado em patamar inferior ao pretendido pelos demandantes.
Os autores apresentaram réplicas às contestações (eventos 31, 32 e 33).
Em decisão saneadora, foram afastadas as preliminares suscitadas nas contestações (evento 41).
Realizada audiência de instrução, foram colhidos depoimentos dos autores e de testemunhas arroladas pelas partes (eventos 69, 70 e 112).
Foram apresentadas alegações finais (eventos 94, 118, 122 e 124).
Sobreveio sentença (evento 125), cujo dispositivo transcrevo:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido efetuado pelos Autores, nos termos do art. 487, I, do CPC, por ausência de dano a ser reparado.Em consequência, CONDENO os Autores ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, os quais, na forma do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil, arbitro em 10% sobre o valor da causa.
Irresignados, os autores interpuseram recurso de apelação (evento 130). Em síntese, repisaram que não realizaram ligação clandestina entre as redes hídricas e que tanto a ré CASAN como os requeridos vereadores praticaram condutas ilícitas contra os demandantes. Alegaram que as palavras proferidas pelos edis ultrapassaram a proteção conferida pela imunidade parlamentar. Pugnaram pela reforma da sentença para julgar procedentes os pedidos exordiais.
A ré CASAN e o requerido Edson Pelisson apresentaram contrarrazões (eventos 134 e 138, respectivamente).
É o relatório

VOTO


1. ADMISSIBILIDADE
O recurso é tempestivo e munido do preparo recursal. Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço da insurgência e passo à análise do mérito.
2. MÉRITO
2.1. RESPONSABILIDADE CIVIL DOS VEREADORES
O presente litígio versa, em suma, acerca de pretensão indenizatória em razão de palavras proferidas pelo réus Edson Pelisson e Dirceu Moscon durante sessão da Câmara de Vereadores do Município de Seara/SC, que, supostamente, teriam afrontado os direitos da personalidade dos autores.
O art. 186, do Código Civil, dispõe que "aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito" e, em razão disso, consoante prevê o art. 927 do mesmo diploma, "fica obrigado a repará-lo".
O mencionado dispositivo trata da culpa em sentido amplo, a qual abrange tanto o dolo quanto a culpa em sentido estrito. Dessa forma, o regime de responsabilidade civil previsto pela Lei n. 10.406/2002 adotou a teoria subjetiva da culpa, sendo necessária a comprovação de alguns elementos para que reste caracterizada, quais sejam, a conduta dolosa ou culposa do agente, o dano causado e o nexo de causalidade entre eles.
Anoto que, ao mesmo tempo em que o texto constitucional assegurou o direito à manifestação do pensamento e à liberdade de expressão (art. 5º, incisos IV e IX), garantiu também, em equivalente hierarquia, os direitos da personalidade (5º, X), havendo a necessidade de ponderação dos interesses em conflito quando da análise de cada caso concreto.
Ademais, no caso em exame, para além do direito à liberdade de expressão - constitucionalmente garantido a todo cidadão -, não pairam dúvidas de que o conflito também envolve o direito à imunidade parlamentar, assegurada pela Constituição Federal, em seu art. 29, VIII.
Assim, a análise do litígio deverá ser feita através do sopesamento entre os direitos postos em debate, de modo a buscar a solução que melhor reflita a intenção do legislador.
Estabelecidas tais premissas, adianto que a sentença de improcedência não merece reforma. Explico.
Em análise do contexto fático-probatório, vislumbro ser fato incontroverso que as referidas falas aconteceram durante sessão legislativa do município: o réu Edson Pelisson discursava na tribuna e o requerido Dirceu João Moscon teceu alguns comentários.
Na oportunidade, proferiram as seguintes palavras (evento 25):
EDSON - Mas também o que me traz à essa tribuna, presidente, recebi um comunicado de moradores do bairro Garghetti, onde, ao passar dos dias aí, uns dias atrás eles acabaram notando um mau cheiro, a água da Casan, que vinha da Casan, com cheiro de podre mesmo, segundo eles é dias e dias que aquilo estava acontecendo, mas como aquela situação de que a Casan um dia vem água um dia não vem, aquela coisa de cloro, achavam que era normal aquilo lá. E ontem, essa semana, desde segunda, aquilo acabou ficando uma água podre, podre mesmo; eu fui verificar, o cheiro é horrível, passava-se nas mãos assim, você cheirava e parecia que você tinha mexido em cocô, de podre que estava a água. Os moradores ligaram para a Casan, informando, vieram ali, analisaram, olharam... gente do céu, foram atrás, foram até a empresa NutriSeara e estava lá o problema. A empresa tem um poço, um poço qualquer aí que tem água aí dentro, ele acaba ocupando aquela água várias vezes porque ele ocupa bastante água, né?, e aquela água circula aí... o que que ele fez?, simplesmente adaptou aquela água daquele poço na rede da Casan, na rede de água que vem da Casan; e quando a água não ia para o bairro nas caixas lá em cima, com a força empurrava, e secava, voltava tudo e toda aquela água ia para os moradores. Então, levei ao conhecimento da vigilância, da Casan, a Casan foi lá, interrompeu o fornecimento de água da empresa, interrompeu o fornecimento de água da empresa, até ele regularizar a situação; comuniquei a promotoria pública, segundo eles vão tomar providências; mas isso não pode acontecer. Meus...

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