Acórdão Nº 0300651-26.2018.8.24.0020 do Sexta Câmara de Direito Civil, 23-11-2021

Número do processo0300651-26.2018.8.24.0020
Data23 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300651-26.2018.8.24.0020/SC

RELATORA: Desembargadora DENISE VOLPATO

APELANTE: LEIA CRISTINA CARDOSO (AUTOR) E OUTRO ADVOGADO: RITA DE CASSIA PAGANI DE OLIVEIRA (OAB SC013591) ADVOGADO: SIMONE SALEH RAHMAN (OAB SC015708)

RELATÓRIO

Forte no Princípio da Celeridade, e utilizando racionalmente as ferramentas informatizadas, adota-se, in totum, o relatório da Sentença (Ev. 62), verbis:

"LEIA CRISTINA CARDOSO formulou pedido visando condenar OBF CONSTRUCOES LTDA. a outorgar-lhe o título de propriedade do imóvel de matrícula n. 72.437 do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Criciúma, conforme obrigação ajustada em contrato de compromisso de compra e venda firmado entre elas. A autora narrou que, embora tenha cumprido com seus deveres contratuais, a ré injustificadamente não lhe forneceu a documentação necessária à lavratura do contrato definitivo. Por conta disso e devido ao longo tempo de espera, que inclusive lhe impossibilitou de dispor do imóvel, requereu também a condenação da ré a compensar os danos extrapatrimoniais sofridos.

Regularmente citada, a ré apresentou contestação afirmando que sua negativa não foi injustificada. Segundo ela, a outorga da escritura pública não foi concedida porque a autora desejava receber a integralidade do imóvel, o que na sua visão estava incorreto, pois a adquirente firmou a avença ao tempo em que era casada sob o regime da comunhão parcial de bens. Por conta disso, a negativa foi adequada, o que, por consequência, afasta a existência da dano indenizável de natureza extrapatrimonial (evento 37).

Houve réplia (evento 41).

Após a apresentação de documentos adicionais pela autora e a a manifestação da ré a respeito (eventos 53 e 57), os autos vieram para sentença."

Ato contínuo, sobreveio Sentença da lavra do MM. Magistrado Giancarlo Bremer Nones (Ev. 62), julgando a demanda nos seguintes termos:

"Ante o exposto, resolvendo o mérito (art. 487, I, do CPC), JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais, a fim de condenar OBF CONSTRUCOES LTDA. a cumprir o instrumento particular de promessa de compra e venda firmado com LEIA CRISTINA CARDOSO, de modo a outorgar-lhe a escritura de compra e venda do(s) imóvel(s) descrito(s) na inicial (imóvel de matrícula n. 72.437 do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Criciúma), no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de multa diária (art. 497 do CPC) no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), limitada ao valor atualizado do(s) bem(s).

Não havendo cumprimento da obrigação no prazo fixado, declaro suprida a escritura pública pela presente sentença (art. 501), sem prejuízo da multa vencida anteriormente, ficando a parte autora responsável pelos tributos e custos dos atos registrais/notariais (art. 490 do CC).

Tornando-se absolutamente impossível o adimplemento da prestação de fazer, fica assegurado à parte autora o direito de pedir a conversão da obrigação em perdas e danos (prestação de pagar quantia) (arts. 499 e 500 do CPC).

Condeno as partes ao pagamento das despesas processuais, na proporção de 80% para a parte ré e 20% para a parte autora.

Na mesma proporção acima, condeno as partes ao pagamento dos honorários advocatícios da parte contrária, arbitrados em 10% sobre o valor da causa (art. 85, § 2º, do CPC).

As partes ficam cientes da aplicação do art. 513 e ss c/c 523 do CPC." (grifos no original)

Opostos embargos de declaração pela parte demandada (Ev. 66), foi negado provimento ao recurso (Ev. 73).

Irresignada com a prestação jurisdicional, a requerida interpôs recurso de apelação (Ev. 72 - APELAÇÃO1), suscitando, preliminarmente, a nulidade da Sentença por violação ao princípio da congruência, ao argumento de ter a autora incorrido em modificação da causa de pedir formulada na inicial. No mérito, aduz equivocado o entendimento firmado pelo Juízo a quo, porquanto a demandante não comprovou ser legítima possuidora, em caráter exclusivo, dos direitos sobre o bem imóvel objeto da lide, haja vista ostentar o estado civil de casada na data da formalização da avença, cujo regime era o de comunhão parcial de bens. Relata não ter negado a outorga da escritura pública, apenas exigindo a apresentação de "alvará judicial, ofício ou formal de partilha expedido pelo juízo do divórcio informando que fosse realizada a escritura exclusivamente em nome da autora, o que notoriamente confere legalidade e segurança jurídica ao ato em questão". Assevera que a questão relativa à transferência do bem deveria ter sido analisada por ocasião da ação de divórcio ajuizada pela autora e seu ex-cônjuge, contudo, aludido imóvel não fez parte do rol de bens da partilha. Pelo exposto, postula a reforma da Sentença para julgar improcedentes os pedidos iniciais. Sucessivamente, com alicerce no princípio da causalidade, pugna sejam os ônus sucumbenciais atribuídos exclusivamente à parte autora, ou, ainda, redistribuídos de forma igualitária.

A demandante, por sua vez, apresentou contrarrazões (Ev. 85 - PET1).

Interpôs a autora, ainda, Recurso Adesivo (Ev. 86 - PET1), pleiteando, prefacialmente, a concessão do benefício da Justiça Gratuita em razão da impossibilidade de custeio das despesas processuais. No mérito, requer a reforma do decisum para julgar procedente o pedido de indenização por danos morais.

Contrarrazoado o recurso (Ev. 86), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

1. Admissibilidade

É consabido que o procedimento recursal exige o preenchimento de pressupostos específicos, necessários para que se possa examinar o mérito do recurso interposto. Portanto, torna-se imperiosa, num primeiro momento, a análise dos pressupostos recursais, em razão de constituírem a matéria preliminar do procedimento recursal, ficando vedado ao Tribunal o conhecimento do mérito no caso de não preenchimento de quaisquer destes pressupostos.

Tais pressupostos são classificados como intrínsecos (cabimento, interesse recursal, legitimidade recursal, inexistência de fato extintivo do direito de recorrer) e extrínsecos (regularidade formal, tempestividade e preparo). Os pressupostos intrínsecos estão atrelados ao direito de recorrer, ao passo que os extrínsecos se referem ao exercício desse direito.

In casu, a parte autora interpôs o presente recurso sem, contudo, promover o recolhimento das custas de preparo recursal, pleiteando a concessão do benefício da Justiça Gratuita em razão da impossibilidade de custeio das despesas processuais.

Pois bem.

Na perspectiva constitucional de amplo acesso à prestação jurisdicional (artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal), a simples afirmação na própria petição inicial atestando a impossibilidade de arcar com os dispêndios processuais, sem prejuízo do sustento próprio e da família, adquire presunção relativa de veracidade.

Neste sentido, reza a disposição do art. 99, §§ 2º e 3º do Código de Processo Civil:

"Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.[...]§ 2o O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.§ 3o Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural."

Do mesmo modo, dispõe o artigo 1º da Lei n. 7.115/1983:

"Art. 1º - A declaração destinada a fazer prova de vida, residência, pobreza, dependência econômica, homonímia ou bons antecedentes, quando firmada pelo próprio interessado ou por procurador bastante, e sob as penas da Lei, presume-se verdadeira."

Não se desconhece, porém, que tal presunção é relativa. É por isso que, em aportando aos autos elementos que demonstrem a capacidade da parte de custear a demanda, há de indeferir-se o benefício da gratuidade da Justiça, sendo lícito ao Magistrado, ainda, condicionar a concessão do benefício à demonstração concreta de pobreza.

Esta prerrogativa, contudo, há de ser exercida em consonância com a garantia constitucional de gratuidade da jurisdição, insculpida no artigo 5º. Inciso LXXIV, da Constituição Federal.

A esse respeito, é a exegese do Superior Tribunal de Justiça:

"I - Em decorrência do princípio constitucional da inafastabilidade da prestação jurisdicional, é admitida a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita às partes, nos termos da Lei n. 1.060/50;II - O benefício da assistência judiciária pode ser pleiteado a qualquer tempo, sendo suficiente para sua obtenção que a pessoa física (ou entidade filantrópica ou de assistência social), afirme não possuir condição de arcar com as despesas do processo, havendo presunção legal juris tantum (relativa) de miserabilidade em favor do postulante;III - É certo que a parte ex adversa, contudo, pode demonstrar a inexistência do estado de miserabilidade, ou mesmo o Magistrado ou Tribunal indeferir o benefício, caso encontrem elementos que infirmem a hipossuficiência do requerente, não sendo esse o caso dos autos;[...]V - Recurso especial provido." (STJ, REsp 1.185.599/MG, rel. Min. Massami Uyeda, j. em 15/05/2012, DJe de 24/05/2012).

E ainda:

"PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PESSOA FÍSICA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. JUSTIÇA GRATUITA INDEFERIDA. ACÓRDÃO QUE DECIDIU COM BASE NO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 07/STJ.A declaração de hipossuficiência não ostenta presunção absoluta de veracidade, podendo ser afastada por provas acostada aos autos pela parte adversa ou a pedido do juízo.O benefício da justiça gratuita pode ser pleiteada a qualquer tempo, bastando, para obtenção do benefício pela pessoa física, a simples afirmação de que não está em condições de arcar com as custas do processo e com os honorários advocatícios. Nada obstante, cuidando-se de afirmação que possui presunção iuris tantum, pode o magistrado indeferir a assistência judiciária se não encontrar fundamentos que confirmem o estado de hipossuficiência do...

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