Acórdão Nº 0300663-94.2019.8.24.0023 do Segunda Câmara de Direito Público, 13-06-2023

Número do processo0300663-94.2019.8.24.0023
Data13 Junho 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0300663-94.2019.8.24.0023/SC



RELATOR: Desembargador FRANCISCO JOSÉ RODRIGUES DE OLIVEIRA NETO


APELANTE: ERIC DAVID ZANCHET (AUTOR) ADVOGADO(A): ALEXANDRE ARAUJO KONESCKI (OAB SC006894) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (MP) INTERESSADO: DIRETOR DO PRESÍDIO REGIONAL DE BIGUAÇU (INTERESSADO)


RELATÓRIO


Trata-se de apelação interposta por Eric David Zanchet em face de sentença que, proferida nos autos da "ação anulatória de ato administrativo c/c reintegração ao cargo público c/c antecipação de tutela" ajuizada contra o Estado de Santa Catarina, julgou improcedentes os pedidos iniciais diante da ausência de nulidade no processo administrativo disciplinar que culminou na aplicação de penalidade de demissão simples (evento 82).
Opostos embargos de declaração (evento 87), os aclaratórios foram rejeitados (evento 89).
Em suas razões recursais, alegou que ajuizou a presente demanda anulatória objetivando, em síntese: (a) a declaração de nulidade do Processo Administrativo Disciplinar Sumário n. SJC 00042784/2013; (b) o reconhecimento do não cometimento de infração disciplinar; (c) a reintegração no cargo de agente penitenciário; (d) além da condenação do ente estatal ao pagamento da respetiva indenização.
Aduziu que o magistrado sentenciante julgou improcedentes os pedidos iniciais com fundamento nas razões de decidir do mandado de segurança n. 4011569-57.2018.8.24.0000, conclamando que naquela decisão foram enfrentadas todas as teses expostas na petição inicial.
Argumentou, contudo, que, naqueles autos, a ordem foi denegada em virtude da ausência de prova pré-constituída e que, no caso concreto, embora oportunizada a produção de provas, tais elementos não foram analisados pelo magistrado singular.
Asseverou que houve violação aos preceitos insculpidos no art. 341 do CPC, o qual prevê que serão consideradas verdadeiras as alegações autorais não impugnadas pelo réu, bem como os art. 399 e 400, ambos do CPC, porquanto, embora o ente federativo tenha apresentado os documentos relacionados ao desfecho da lide, várias páginas se encontram ilegíveis, o que demonstra a sua recusa.
Pontuou que, com base nos documentos amealhados aos autos, é possível verificar, por meio de amostragem, que o servidor efetivamente laborou nos dias 02.02.13 e 03.02.13, apesar de tais dias terem sido incluídos no cômputo de faltas injustificadas.
Relatou que o Decreto Estadual n. 1.326/12 permitiu a realização de plantões extras, inclusive em outras unidades prisionais, o que restou corroborado com a oitiva da prova oral produzida em juízo.
Concluiu que, dos 67 dias que a administração pública utilizou como fundamento para a configuração de inassiduidade intermitente, 21 dias devem ser excluídos - correspondentes a dias de descanso não computados, realizações de plantões extras, e exercício de atividade laboral em unidade prisional distinta da que estava lotado -, totalizando apenas 46 (quarenta e seis) dias de faltas injustificadas no ano de 2013, o que não caracteriza inassiduidade intermitente, conforme o parágrafo único do art. 137 da Lei Estadual n. 6.745/85.
Por tais razões, requereu o provimento do recurso (evento 95).
Com as contrarrazões (evento 100), os autos ascenderam a esta Corte, sendo a mim distribuídos.
Por intermédio do Procurador Américo Bigaton, a Procuradoria-Geral de Justiça apontou ser desnecessária sua intervenção, ante a ausência de interesse público no feito (evento 9, PROMOÇÃO1).
É o relatório essencial

VOTO


1. O voto, antecipe-se, é pelo reconhecimento ex officio da ocorrência de coisa julgada em relação ao pedido de nulidade do PAD e, pela manutenção da sentença em relação ao capítulo relativo aos danos morais.
2. O art. 337, § 4º, do CPC/15 disciplina que ""há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado".
O art. 502 do CPC/15 estabelece que a coisa julgada material é "a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso", dispondo o caput do art. 503 do CPC/15 que "a decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida".
Já o art. 505 do CPC/15 prevê que "nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide (...)", restando asseverado no art. 507 que "é vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão".
Segundo Fredie Didier, "a coisa julgada é resultado da combinação de dois fatos: [...] a) O art. 502 do CPC põe como pressuposto da coisa julgada a existência de uma decisão de mérito. [...] A decisão apta à coisa julgada deve fundar-se em cognição exauriente. Decisões proferidas em cognição sumária - decisões provisórias (arts. 294-311, CPC) - não estão aptas à coisa julgada. [...] b) O segundo pressuposto da coisa julgada é o trânsito em julgado. Para que haja coisa julgada, é preciso que contra a decisão não caiba mais recurso, qualquer recurso, ordinário ou extraordinário - 'não mais sujeita a recurso', de acordo com o texto do art. 502" (Curso de Direito Processual. volume 2. 17ª Edição. São Paulo: Ed. Juspodivm, 2022, p. 664/665).
Também de acordo a doutrina supracitada, "com a formação da coisa julgada, preclui a possibilidade de rediscussão de todos os argumentos - 'alegações e defesas', na dicção legal - que poderiam ter sido suscitados, mas não foram. A coisa julgada torna preclusa a possibililidade de discutir o deduzido e torna irrelevante suscitar o que poderia ter sido deduzido (o dedutível) e torna irrelevante suscitar o que poderia ter sido deduzido (o dedutível); a coisa julgada cobre a res deducta e a res deducenda" (ob. cit., p. 700).
Dessa forma, é inviável a rediscussão das questões já decididas em demandas transitadas em julgado, devendo ser preservado o que nelas foi consolidado, inclusive se houve impetração de mandado de segurança anteriormente, a teor do que prelecionam os arts. 502 a 508 do CPC/15.
Isso é o que se infere da leitura, a contrariu sensu, do artigo 19 da Lei do mandado de segurança ("a sentença ou o acórdão que denegar mandado de segurança, sem decidir o mérito, não impedirá que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os respectivos efeitos patrimoniais") e da Súmula 304 do STF ("decisão denegatória de mandado de segurança, não fazendo coisa julgada contra o impetrante, não impede o uso da ação própria").
Assim, se "a denegação da ordem postulada pode se dar por insuficiência de provas, atestando, consequentemente, a necessidade de dilação probatória para adequado conhecimento da matéria. Nestes casos, efetivamente, a decisão fará coisa julgada meramente formal, facultando-se, inclusive, a propositura de novo pedido de mandado de segurança, desde que respeitado o prazo decadencial, nos termos do art. 6º, §6º, da Lei nº 12.016/09. Contudo, nos casos em que a denegação ocorre em virtude da certificação (declaração) da indubitável inexistência do direito alegado pelo impetrante, então a coisa julgada será material, revestindo-se da 'autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso' (art. 502, do CPC)."(TJSC, Apelação Cível n. 0301530-85.2017.8.24.0014, de Campos Novos, rel. João Henrique Blasi, Segunda Câmara de Direito Público, j. 12-12-2017 - grifou-se).
Tal intelecção, a propósito, alinha-se às decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça no sentido de que "a formulação de pretensão com fundamento na mesma causa de pedir e que constitui de conseqüência necessária e imediata da pretensão mandamental já denegada no mérito em outra oportunidade é suficiente para atrair a aplicação dos efeitos do trânsito em julgado, em razão da eficácia preclusiva da coisa julgada, na forma do art. 474 do Código de Processo Civil - simplesmente porque todos os pedidos conexos e derivados da primeira pretensão não podem ser acolhidos com entendimento contrário ao que ficou consignado originariamente" (RMS 32280/MG, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 17/03/2011, DJe de 29/03/2011 - grifou-se).
No mesmo rumo, colhe-se do acervo jurisprudencial da Corte Superior:
"ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEMBROS DO MAGISTÉRIO PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE BARRA MANSA. AÇÃO ORDINÁRIA QUE BUSCA A READMISSÃO NO SERVIÇO PÚBLICO. MÉRITO ANTERIORMENTE APRECIADO EM MANDADO DE SEGURANÇA. COISA JULGADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.1. A Corte de origem, ao denegar o Mandado de Segurança impetrado anteriormente pelos recorrentes, no qual buscavam a readmissão ao serviço público, examinou o mérito da questão, o que impede sua rediscussão na via ordinária, por força da coisa julgada material.2. Agravo Regimental desprovido." (AgRg nos EDcl no Ag n. 969.172/RJ, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Quinta Turma, julgado em 4/11/2010, DJe de 6/12/2010 - grifou-se).
"PROCESSUAL CIVIL - DENEGAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA ANTERIORMENTE IMPETRADO - REDISCUSSÃO DA MATÉRIA NA VIA ORDINÁRIA - IMPOSSIBILIDADE - COISA JULGADA MATERIAL - PRECEDENTES.Ocorrência de coisa julgada material na hipótese, pois, ao se denegar o mandado de segurança impetrado anteriormente pelo recorrente, adentrou no mérito da questão, o que impede sua rediscussão na via ordinária.Agravo regimental improvido." (AgRg no REsp n. 645.400/RJ, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 9/9/2008, DJe de 9/10/2008 - grifou-se).
Pois bem. Transpondo tais ensinamentos ao caso concreto, conclui-se que deve ser reconhecida a existência de coisa julgada material.
Explica-se.
O autor impetrou em 2018 o mandado de segurança n. 4011569-57.2018.8.24.0000 contra ato do Governador do Estado de Santa Catarina (Ato n. 792, de 06.04.18), que o demitiu do cargo de agente penitenciário. Referido...

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