Acórdão Nº 0300699-15.2015.8.24.0044 do Quarta Câmara de Direito Público, 05-11-2020

Número do processo0300699-15.2015.8.24.0044
Data05 Novembro 2020
Tribunal de OrigemOrleans
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão


Apelação / Remessa Necessária n. 0300699-15.2015.8.24.0044, de Orleans

Relator: Desembargador Odson Cardoso Filho

REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO PADRONIZADOS. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECLAMO DA AUTORA E DO MUNICÍPIO DEMANDADO.

ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. PREFACIAL AFASTADA EM SANEADOR. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO OPORTUNA. PRECLUSÃO. NÃO CONHECIMENTO.

REMESSA OFICIAL. CONTEÚDO ECONÔMICO INFERIOR AO LIMITE PREVISTO EM LEI. SENTENÇA NÃO SUJEITA AO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO.

CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICA PÚBLICA NA ÁREA DA SAÚDE. LEGALIDADE. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO À SEPARAÇÃO DOS PODERES.

VULNERAÇÃO ORÇAMENTÁRIA. INEXISTÊNCIA. PREVALÊNCIA DA PROTEÇÃO DO DIREITO À SAÚDE.

FORNECIMENTO DE FÁRMACO NÃO PADRONIZADO. GARANTIA DO DIREITO À SAÚDE E À VIDA DIGNA. REQUISITOS ESTABELECIDOS EM IRDR (TEMA N. 1) PELO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO DEVIDAMENTE PREENCHIDOS. IMPOSIÇÃO MANTIDA.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUTORA ASSISTIDA POR ESCRITÓRIO-MODELO DA FACULDADE DE DIREITO. POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DOS RÉUS AO PAGAMENTO DE VERBA HONORÁRIA EM FAVOR DA INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR MANTENEDORA DAS ATIVIDADES DE ESTÁGIO DE PRÁTICA FORENSE AO QUAL VINCULADO O CAUSÍDICO QUE ASSISTE A PARTE. FIXAÇÃO DEVIDA.

REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. RECLAMO DO MUNICÍPIO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO. RECURSO DA AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação / Remessa Necessária n. 0300699-15.2015.8.24.0044, da comarca de Orleans 2ª Vara em que é Apte/Apda Dirma da Silva Bernardo e Apdos/Aptes Município de Orleans e outro.

A Quarta Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, não conhecer do reexame necessário; conhecer em parte do reclamo do município e, nesta medida, negar-lhe provimento; e conhecer do apelo da autora e dar-lhe parcial provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 5 de novembro de 2020, a Excelentíssima Senhora Desembargadora Vera Lúcia Ferreira Copetti e o Excelentíssimo Senhor Desembargador Cid Goulart. Funcionou, pela Procuradoria-Geral de Justiça, o Excelentíssimo Senhor Doutor Sandro José Neis, tendo lavrado parecer a Excelentíssima Senhora Doutora Gladys Afonso.

Florianópolis, data da assinatura digital.



Desembargador Odson Cardoso Filho

Presidente e Relator


RELATÓRIO

Na comarca de Orleans, Dirma da Silva Bernardo ingressou com Ação de Obrigação de Fazer em face do Estado de Santa Catarina e do Município de Orleans.

Afirma que conta com 80 (oitenta) anos de idade e é portadora de artrose avançada, transtornos intervertebrais e osteoartrite, necessitando dos fármacos Tramal Retard 100 mg e Artico 1,2/1,5g. Alega que os medicamentos não foram disponibilizados pela rede pública de saúde, e que não desfruta de recursos para custear o tratamento. Daí postular, inclusive em antecipação de tutela, o fornecimento dos aludidos remédios (fls. 1-5).

Emendada a inicial (fls. 29-30), deferiu-se o pleito antecipatório (fls. 31-33).

Formada a relação jurídica processual e observado o contraditório, o feito restou saneado, oportunidade em que arredadas as prefaciais de ilegitimidade passiva da municipalidade e de chamamento da União ao processo e deferida a prova pericial (fls. 116-119).

Ultimada a instrução, a magistrada a quo julgou procedentes os pedidos iniciais para determinar que os acionados forneçam à autora os medicamentos buscados, isentando os entes públicos das custas, sem condenação em honorários advocatícios (fls. 151-157).

Insatisfeitas, acionante e municipalidade apelaram. Enquanto a primeira pugna pela fixação dos honorários sucubenciais (fls. 161-166), a segunda, por seu turno, suscita sua ilegitimidade, insistindo que a disponibilização de fármacos de alto custo e excepcionais é de responsabilidade do Estado e da União; no mérito, aventa a inexistência de previsão orçamentária e de autonomia administrativa para custeio de substâncias medicamentosas não fornecidas pelo SUS, de modo que a imposição de primeiro grau viola os princípios da isonomia, da legalidade e da separação entre os três Poderes, diante do que postula a improcedência dos pedidos iniciais (fls. 174-203).

Com contrarrazões do Estado (fls. 171-173) e da autora (fls. 208-212), os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça.

Manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça pelo conhecimento dos reclamos, desprovimento do interposto pelo ente municipal e provimento do aforado pela autora (fls. 218-227).

Houve a suspensão do processo, em razão da afetação da matéria pelo Superior Tribunal de Justiça (fls. 230-231) e, com o julgamento do REsp n. 1.657.156/RJ, o levantamento (fl. 235).

É o relatório.

VOTO

1. Tendo a sentença combatida sido publicada em 15-12-2016 (fl. 158), isto é, quando já em vigência o Código de Processo Civil de 2015, o caso será analisado sob o regramento do novo Diploma, "respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada" (art. 14 do CPC).

Diante disso, os recursos apresentam-se tempestivos e preenchem os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual merecem ser conhecidos, exceto quanto à preliminar de ilegitimidade passiva, suscitada nas razões recursais do Município.

A tese foi negada no decisório de fls. 116-119, item "2", e não houve insurgência oportuna (isto é, no momento subsequente) - leia-se, por agravo -, contra tal deliberação.

Não pode o recorrente, agora, em grau de recurso, demonstrar insatisfação com sua permanência no feito, eis que, como visto, operou-se a preclusão.

É da jurisprudência:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. PRECLUSÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 83 DO STJ. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA.

1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, ainda que se trate de matéria de ordem pública, tal fato não tem o condão de afastar a preclusão, quando a questão foi anteriormente decidida.

2. Inadmissível o recurso especial quando o entendimento adotado pelo Tribunal de origem coincide com a jurisprudência do STJ (Súmula n. 83/STJ).

3. O recurso especial não comporta o exame de questões que impliquem revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, a teor do que dispõe a Súmula n. 7 do STJ.

4. No caso concreto, para apreciar a tese de que não teriam sido preenchidos os requisitos para a medida excepcional de penhora do faturamento da empresa, seria imprescindível nova análise da prova dos autos, inviável em recurso especial.

5. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ, AgRg no AREsp n. 687.155/RJ, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 4-12-2018 - grifei)

Igualmente: STJ, AgInt no AREsp n. 1.435.606/PR, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 30-9-2019; AgInt no REsp n. 1.582.669/MG, rel. Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, j. 30-3-2017; AgRg no REsp n. 1.314.021/SP, rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 4-8-2015.

Vale ressaltar, outrossim, que por ocasião da sentença não houve retomada dessa matéria.

Não bastasse isso, a questão da responsabilidade dos entes públicos pelo fornecimento de remédios já se encontra pacificada nas Cortes Superiores, afinal a Constituição Federal assegura que a saúde é direito de todos e dever do Estado (art. 196), sendo competência comum e solidária dos entes federados, conforme dicção do art. 23, II, com expressa inclusão dos municípios (art. 30, VII).

Nessa linha, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 855.178/SE - Tema n. 793, consolidou dois entendimentos: [i] que "o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente"; e, ao resolver os embargos de declaração, estabeleceu que [ii] "os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro".

Indubidoso, portanto, que o Município de Orleans é parte passiva legítima para figurar nesta ação cominatória para dispensação de medicamentos (STF, ARE n. 926.469 AgR, rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, j. 7-6-2016).

Desta maneira, o reclamo do município deve ser conhecido apenas no remanescente.

Recebo os apelos apenas no efeito devolutivo (arts. 1.012, § 1º, V, e 1.013, caput, do CPC/2015).

2. Diferentemente do consignado no julgado de primeiro grau (fl. 157), incabível o reexame necessário. Com efeito, verifico que o custo mensal dos insumos agasalhados pela sentença foi estimado em R$ 326,95 (trezentos e vinte e seis reais e noventa e cinco centavos - fls. 15-17), o que representa despesa anual de R$ 3.923,40 (três mil, novecentos e vinte e três reais e quarenta centavos), ou seja, inferior ao valor de alçada previsto no § 3º, III, do art. 496 do NCPC.

3. A insurgência da municipalidade refere-se à outorga de medicamento pela esfera judicial - que compromete o orçamento municipal, viola o princípio da isonomia e afronta o postulado da Separação dos Poderes.

Como já visto, a Constituição da República determina que cuidar...

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