Acórdão Nº 0300774-64.2017.8.24.0018 do Quinta Câmara de Direito Público, 01-11-2022

Número do processo0300774-64.2017.8.24.0018
Data01 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300774-64.2017.8.24.0018/SC

RELATORA: Desembargadora DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELANTE: JANETE DE FATIMA PEREIRA PUTZEL WARTHA ADVOGADO: JOEL BIRATAN MACHADO (OAB SC023891) RÉU: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se de ação proposta por JANETE DE FATIMA PEREIRA PUTZEL WARTHA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS requerendo o restabelecimento do auxílio-doença (NB 530.453.823-0) e sua posterior conversão em aposentadoria por invalidez, ou a concessão de auxílio-acidente.

Foi proferida sentença de extinção sem julgamento do mérito e revogada a tutela antecipada. Como o benefício pretendido tinha sido obtido judicialmente, entendeu-se ausente o interesse de agir em propor nova ação pois "bastaria o requerimento de cumprimento da ordem já emanada naquele processo" (evento 77 na origem).

As partes apelam.

A autarquia alega, em síntese, que (evento 83 na origem):

a) os artigos 60, § 10 e 101 da Lei 8.213/91 admitem a revisão administrativa do benefício concedido judicialmente, "sendo descabida a interpretação de que apenas por outra decisão judicial é que seria facultada a cessação da benesse", e

b) o STJ tem decidido que não é necessário observar o paralelismo da formas para a revisão do benefício, de sorte que o pedido deve ser julgado improcedente.

A autora, por outro lado, sustenta que (evento 87 na origem):

a) além do restabelecimento do auxílio-doença, busca também a concessão de aposentadoria por invalidez, de modo que o objeto desta ação é mais amplo do que o da demanda anterior, evidenciando seu interesse processual;

b) há divergência de entendimento entre as duas Varas da Fazenda Pública da Comarca de Chapecó quanto ao meio adequado para restabelecimento do benefício obtido judicialmente, de modo que esta ação deve ser processada sob pena de colocar em risco seu direito;

c) necessita da antecipação da tutela para imediato restabelecimento do auxílio-doença, e

d) a causa está madura para julgamento, devendo ser julgado procedente o pedido.

Não foram apresentadas contrarrazões (evento 97 na origem).

A requerente peticionou apresentando exames médicos recentes e reiterando o pedido de antecipação da tutela (evento 29 e 32).

Este é o relatório.

VOTO

Atendidos os pressupostos que regem a admissibilidade, conhece-se dos recursos.

1) Recurso da autarquia

O INSS se insurge contra à compreensão de que o benefício concedido judicialmente não poderia ser objeto de revisão administrativa em função do paralelismo das formas.

Tem razão.

A origem judicial do benefício temporário não obsta o dever de a autarquia convocar o segurado para revisões periódicas, a fim de verificar se persiste o quadro clínico que ensejou sua concessão. Nesse caso, se for constatada, mediante perícia médica oficial, que houve plena recuperação da capacidade, é cabível a cessação da benesse obtida judicialmente. No entanto, esse procedimento - assim como qualquer outro que tramita na esfera administrativa - deve assegurar o contraditório ao segurado, que poderá apresentar novos documentos médicos para mostrar a manutenção da incapacidade, além de interpor recurso administrativo.

É, aliás, o que prevê a Lei 8.212/91:

Art. 71. O Instituto Nacional do Seguro Social-INSS deverá rever os benefícios, inclusive os concedidos por acidente do trabalho, ainda que concedidos judicialmente, para avaliar a persistência, atenuação ou agravamento da incapacidade para o trabalho alegada como causa para a sua concessão.

A Lei 8.213/91 complementa:

Art. 60. (...)

§ 10. O segurado em gozo de auxílio-doença, concedido judicial ou administrativamente, poderá ser convocado a qualquer momento para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção, observado o disposto no art. 101 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.457, de 2017)

§ 11. O segurado que não concordar com o resultado da avaliação da qual dispõe o § 10 deste artigo poderá apresentar, no prazo máximo de trinta dias, recurso da decisão da administração perante o Conselho de Recursos do Seguro Social, cuja análise médica pericial, se necessária, será feita pelo assistente técnico médico da junta de recursos do seguro social, perito diverso daquele que indeferiu o benefício. (Incluído pela Lei nº 13.457, de 2017)

(...)

Art. 101. O segurado em gozo de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e o pensionista inválido estão obrigados, sob pena de suspensão do benefício, a submeter-se a exame médico a cargo da Previdência Social, processo de reabilitação profissional por ela prescrito e custeado, e tratamento dispensado gratuitamente, exceto o cirúrgico e a transfusão de sangue, que são facultativos. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

Afinal, como já decidiu esta Câmara: "a decisão judicial que defere benefício previdenciário faz coisa julgada rebus sic stantibus. Alterada a situação de fato, a autarquia, a quem compete cumprir a decisão em seus limites (não além disso), pode interromper o pagamento, se surgido fato novo" (AI n. 4003999-83.2019.8.24.0000, de Chapecó, rel. Hélio do Valle Pereira, j. 11-04-2019).

Quer dizer, ao contrário do que entendeu o magistrado, não é preciso observar o paralelismo das formas para que a autarquia possa promover a cessação do benefício concedido judicialmente. Essa perspectiva, aliás, foi reforçada pela Lei 13.457/2017 que, alterando a Lei 8.213/91, previu o seguinte:

Art. 60 (...)

§ 8o Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício.

§ 9o Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei.

Sobre o paralelismo das formas, além do mais, decidiu o STJ:

PREVIDENCIÁRIO. CANCELAMENTO OU SUSPENSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO UNILATERALMENTE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PARALELISMO DAS FORMAS. DESNECESSIDADE. EXIGÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL POR MEIO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.1. Cinge-se a controvérsia dos autos a obrigatoriedade da aplicação do princípio do paralelismo das formas nos casos de suspensão ou cancelamento de benefício previdenciário.2. O Tribunal de origem manifestou-se sobre a possibilidade de a Autarquia suspender/cancelar o benefício previdenciário, porém, deve obedecer os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, bem como a observância do princípio do paralelismo das formas.3. É inaplicável o princípio do paralelismo das formas por três motivos: 1) a legislação previdenciária, que é muito prolixa, não determina esta exigência, não podendo o Poder Judiciário exigir ou criar obstáculos à autarquia, não previstos em lei;2) foge da razoabilidade e proporcionalidade, uma vez que através do processo administrativo previdenciário, respeitando o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, é suficiente para apurar a veracidade ou não dos argumentos para a suspensão/cancelamento do benefício, e não impede uma posterior revisão judicial;3) a grande maioria dos benefícios sociais concedidos pela LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social - Lei n. 8.742/93, são deferidos por meio de decisão judicial, o que acarretaria excessiva demanda judicial, afetando por demasia o Poder Judiciário, bem como, a Procuradoria jurídica da autarquia, além da necessidade de defesa técnica, contratada pelo cidadão, sempre que houvesse motivos para a revisão do benefício.4. O que a jurisprudência desta Corte exige não é a aplicação do princípio do paralelismo das formas, é a concessão do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sempre que houver necessidade de revisão do benefício previdenciário, por meio do processo administrativo previdenciário, impedindo com isso, o cancelamento unilateral por parte da autarquia, sem oportunizar apresentação de provas que entenderem necessárias.5. Conforme bem ressaltou o Tribunal de origem, o recorrente cancelou unilateralmente o benefício previdenciário, o que vai de encontro à jurisprudência desta Corte e do STF.Recurso especial improvido.(REsp n. 1.429.976/CE, rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, j. em 18/2/2014)

Em casos idênticos, oriundos da mesma comarca, este Tribunal tem ratificado a possibilidade de revisão administrativa do benefício concedido judicialmente:

A) APELAÇÃO CÍVEL. INFORTUNÍSTICA. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM ANÁLISE DE MÉRITO POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR. IMPOSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. AUXÍLIO-DOENÇA CONCEDIDO JUDICIALMENTE. CANCELAMENTO ADMINISTRATIVO. VIABILIDADE. NATUREZA TEMPORÁRIA DA BENESSE. SENTENÇA CASSADA. É da própria natureza do auxílio-doença sua transitoriedade. Assim, havendo alteração dos fatos que motivaram a anterior concessão judicial do benefício, é possível que a autarquia, administrativamente, cesse o pagamento da benesse, bastando para tanto a realização de nova perícia com respeito à ampla defesa. (...) (AC n. 0313251-56.2016.8.24.0018, de Chapecó, rel. Pedro Manoel Abreu, Primeira Câmara de Direito Público, j. 11-06-2019).

B) PREVIDENCIÁRIO. PEDIDO DE RESTABELECIMENTO/CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO. SENTENÇA QUE JULGOU EXTINTO O FEITO ANTE A AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUXÍLIO-DOENÇA CONCEDIDO JUDICIALMENTE CESSADO NA VIA ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE. DEVER DO INSS DE SUBMETER OS SEGURADOS A REAVALIAÇÕES PERIÓDICAS. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. "Auxílio-doença é benefício de índole provisória. A Lei 13.457/2017 inclusive impõe a necessidade de um prognóstico de alta, ainda que a prestação seja decorrente de decisão judicial. Segurado - em tais circunstâncias - que não compareceu à perícia administrativa, tendo o INSS...

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