Acórdão Nº 0300792-57.2014.8.24.0126 do Quinta Turma de Recursos - Joinville, 07-06-2017

Número do processo0300792-57.2014.8.24.0126
Data07 Junho 2017
Tribunal de OrigemItapoá
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão


Recurso Inominado n. 0300792-57.2014.8.24.0126, de Itapoá

Relator: Juiz Yhon Tostes

RECURSO INOMINADO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. INCÊNDIO EM DEPÓSITO DE FERTILIZANTES. FUMAÇA TÓXICA LANÇADA EM SÃO FRANCISCO DO SUL. AUTOR RESIDENTE EM ITAPOÁ. BAIRRO NÃO AFETADO PELO EVENTO DANOSO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MANUTENÇÃO IMPERIOSA. PRECEDENTE DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO CIVIL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA.

Para viabilizar a concretização da segurança jurídica, a observância do sistema dos precedentes judiciais estatuído no novo CPC assume cardeal importância na atividade de entrega da prestação jurisdicional, conforme se constata da boa doutrina jurídica sobre o tema:

"A segurança jurídica, postulada na tradição do civil law pela estrita aplicação da lei, está a exigir o sistema de precedentes, há muito estabelecido para assegurar essa mesma segurança no ambiente do common law, em que a possibilidade de decisões diferentes para casos iguais nunca foi desconsiderada e, exatamente por isso, fez surgir o princípio, inspirador do stare decisis, de que os casos similares devem ser tratados do mesmo modo (treat like cases alike). Embora deva ser no mínimo indesejável para um Estado Democrático dar decisões desiguais a casos iguais, estranhamente não há qualquer reação a essa situação na doutrina e na praxe brasileiras. É como se estas decisões não fossem vistas ou fossem admitidas por serem inevitáveis. A advertência de que a lei é igual para todos, que sempre se viu escrita sobre a cabeça dos juízes nas salas do civil law, além de não mais bastar, constitui piada de mau gosto àquele que, em uma das salas do Tribunal e sob tal inscrição, recebe decisão distinta da proferida – em caso idêntico – pela Turma cuja sala se localiza metros mais adiante, no mesmo longo e indiferente corredor do prédio que, antes de tudo, deveria abrigar a igualdade de tratamento perante o direito.

(...)

A segurança jurídica, vista como estabilidade e continuidade da ordem jurídica e previsibilidade das consequências jurídicas de determinada conduta, é indispensável para a conformação de um Estado que pretenda ser ‘Estado de Direito’." (MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes Obrigatórios. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 80 e 95).

Por isso, para evitar o tratamento desigual dispensado aos jurisdicionados, assim como para buscar a consecução da segurança jurídica, é que esta 5ª Turma de Recursos de SC segue o entendimento do Grupo de Câmaras de Direito Civil do e. TJSC (Apelação n. 0600252-34.2014.8.24.0061, de São Francisco do Sul, Rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. 09-03-2016), segundo o qual só faz jus ao recebimento da indenização pelos danos morais o cidadão que demonstrar ter morado, à época dos fatos, em um dos bairros/localidades do município de São Francisco do Sul que estejam elencados no Anexo II do Decreto Municipal n. 1.922, de 25/09/2013.

Utilizando a mesma razão de decidir do julgado paradigma supra, com base em orientação da Defesa Civil emitida à época do evento danoso, o e. TJSC tem entendido que para um morador de Itapoá ter direito à indenização, caber-lhe-ia trazer provas de que, no período do ocorrido, residia nos bairros do Pontal ou Figueira do Pontal, únicas localidades de Itapoá afetadas pela fumaça tóxica (vide Apelação n. 0015874-08.2014.8.24.0061, de São Francisco do Sul, Rel. Des. Raulino Jacó Brüning, j. 22-09-2016).

Desta forma, ao falhar em provar ser morador de alguma localidade afetada pela fumaça tóxica, o autor/recorrente deixou de comprovar o dano que daria ensejo à indenização, o que torna inviável a procedência dos pedidos inaugurais.

RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de n. 0300792-57.2014.8.24.0126, da comarca de Itapoá (Juizado Especial Cível), em que é recorrente DAVID BUENO, e recorridos ADM DO BRASIL LTDA e GLOBAL LOGÍSTICA E TRANSPORTES LTDA:

A 5ª Turma de Recursos decidiu, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso.

Custas e honorários pelo recorrente, sendo estes fixados em 10% do valor corrigido da causa (art. 55, caput, 2ª parte, da Lei nº 9.099/95). Contudo, fica suspensa a exigibilidade de tais valores, consoante disposto no art. 98, § 3º, do NCPC, eis que já deferida a justiça gratuita ao recorrente.

Participaram do julgamento, realizado no dia 07 de junho de 2017, os Exmos. Srs. Juízes Augusto César Allet Aguiar e Décio Menna Barreto de Araújo Filho.

Joinville, 09 de junho de 2017.




Yhon Tostes

PRESIDENTE E RELATOR
































RELATÓRIO

Trata-se de ação condenatória com pedido de indenização por danos morais ajuizada por DAVID BUENO (residente em Itapoá, bairro Paese) em face de ADM DO BRASIL LTDA e GLOBAL LOGÍSTICA E TRANSPORTES LTDA.

A parte autora pretende a reparação dos danos morais que alega ter sofrido em decorrência de ato ilícito praticado pelas rés, consistente na liberação de fumaça tóxica que, no dia 24/09/2013, atingiu o município de São Francisco do Sul, chegando a dois bairros de Itapoá, após um incêndio em depósito de fertilizantes.

Em 1º grau, foi prolatada sentença de improcedência.

Irresignado, o autor interpôs recurso inominado.

Devidamente contra-arrazoado, subiram os autos.

É a síntese do necessário, apesar de dispensável o relato (art. 46 da Lei 9.099/95 e do art. 63, § 1º, do Regimento Interno das Turmas de Recursos Cíveis e Criminais dos Juizados Especiais do Estado de Santa Catarina).














VOTO

A solução jurídica a ser dada a processos nos quais se pedem indenizações para compensação de lesões morais que têm origem comum no fato narrado na inicial deste feito, em virtude do grande número de lides sobre o tema, foi judicialmente estipulada pelo Grupo de Câmaras de Direito Civil do e. Tribunal de Justiça de Santa Catarina, na Apelação n. 0600252-34.2014.8.24.0061, nos seguintes termos:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INCÊNDIO EM DEPÓSITO DE FERTILIZANTES. FUMAÇA CONTENDO RESÍDUOS QUÍMICOS. DANO AMBIENTAL CONFIGURADO PELA INEQUÍVOCA POLUIÇÃO DO AR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DAS RÉS. EXEGESE DO ART. 14, § 1º, DA LEI N. 6.938/81 E DO ART. 225, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALEGAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE FATO FORTUITO. IMPOSSIBILIDADE. TEORIA DO RISCO INTEGRAL. LEGISLAÇÃO AMBIENTAL ESPECÍFICA A REGULAR A MATÉRIA EM ANÁLISE. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. CONSEQUENTE IMPOSSIBILIDADE DE HAVER CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO. DISCUSSÃO ACERCA DO PREJUÍZO DE TERCEIROS DIANTE EVACUAÇÃO DA ÁREA ATINGIDA PARA EVITAR DANOS À SAÚDE. MORADORES PRÓXIMOS OBRIGADOS A DEIXAR SUAS CASAS OU IMPEDIDOS DE PARA LÁ RETORNAREM. COMPROVAÇÃO DE QUE A PARTE AUTORA RESIDIA EM UM DOS BAIRROS AFETADOS. ANGÚSTIA E AFLIÇÃO CARACTERIZADAS PELA NECESSIDADE DE RÁPIDA DESOCUPAÇÃO DO LOCAL E PELO RECEIO DE INTOXICAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS QUE ULTRAPASSAM O MERO DISSABOR. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO EM R$ 1.500,00. OBSERVÂNCIA AOS PARÂMETROS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. CARÁTER PEDAGÓGICO ADEQUADAMENTE SOPESADO DIANTE DO AJUIZAMENTO DE AÇÕES EM MASSA. CONDENAÇÃO EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ PELO CARÁTER PROTELATÓRIO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA REFORMADA APENAS NESTE PONTO E MANTIDA COM FUNDAMENTO JURÍDICO DIVERSO QUANTO AO CERNE DA QUESTÃO. RECURSO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO. RECURSO DAS RÉS PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Com a evolução legislativa referente à responsabilidade objetiva, a atual complexidade da sociedade e dos meios de produção e circulação do capital, fizeram com que algumas atividades que implicassem em maiores riscos à coletividade fossem alçadas a uma categoria diferente, por meio da qual não mais seria necessária a demonstração da culpa, mas apenas do nexo de causalidade e dano.

2. O caráter objetivo da responsabilidade civil por danos ao meio-ambiente remonta à edição da Lei 6.938/81, a qual positivou o princípio do poluidor-pagador tendo, posteriormente, conquistado status constitucional ao ser recepcionado pela Constituição Cidadã, aplicando-se aos casos de degradação ambiental a teoria do risco integral.

3. O quantum da indenização por danos morais - que tem por escopo atender, além da reparação ou compensação da dor em si, também ao elemento pedagógico - deve harmonizar-se com o grau de sofrimento da parte indenizada e a situação econômica de todos, para não ensejar a ruína de um ou o enriquecimento sem causa do outro. (TJSC, Apelação n. 0600252-34.2014.8.24.0061, de São Francisco do Sul, Rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. 09-03-2016).

Em virtude da necessidade de observância dos precedentes judiciais imposta pelo novo Código de Processo Civil, de forma a garantir a manutenção e o respeito à estabilidade, integridade e coerência da jurisprudência do TJSC (art. 926, caput, do NCPC), assim como visando concretizar a segurança jurídica e o tratamento isonômico entre os jurisdicionados, é que, nesta demanda, SEGUIR-SE-ÃO as orientações, fundamentos e solução jurídica dadas pelo Grupo de Câmaras de Direito Civil do TJSC no acórdão paradigma (Apelação n. 0600252-34.2014.8.24.0061).

Assim, do julgado paradigma, são extraídas as seguintes conclusões a serem aqui...

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