Acórdão Nº 0300810-31.2018.8.24.0064 do Quarta Câmara de Direito Público, 29-10-2020

Número do processo0300810-31.2018.8.24.0064
Data29 Outubro 2020
Tribunal de OrigemSão José
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0300810-31.2018.8.24.0064, de São José

Relatora: Desa. Subst. Bettina Maria Maresch de Moura

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DO RÉU.

POSSIBILIDADE DE COBRANÇA DO ITBI - IMPOSTO DE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS, SOBRE O VALOR TOTAL DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA, COM PACTO DE MÚTUO PARA CONSTRUÇÃO DE UNIDADE HABITACIONAL. INSUBSISTÊNCIA. BASE DE CÁLCULO INCORRETA. FATO GERADOR LIMITADO À AQUISIÇÃO DA FRAÇÃO IDEAL DO TERRENO, POIS SOMENTE QUANTO A ESTA OPERAÇÃO, HOUVE TRANSFERÊNCIA. MANUTENÇÃO DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO QUE SE IMPÕE. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NAS SÚMULAS 110 E 470 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRECEDENTES DESTA CORTE ESTADUAL.

"É indevida a cobrança do ITBI sobre o valor do contrato destinado à construção futura de imóvel, porquanto não constitui seu fato gerador, devendo incidir apenas sobre o montante da fração ideal do respectivo terreno, este efetivamente adquirido e transferido" (TJSC, Apelação Cível n. 0304542-59.2014.8.24.0064, de São José. Quarta Câmara de Direito Público. Rela. Desa. Sônia Maria Schmitz. Data do julgamento: 14.09.2017).

APELAÇÃO SOB A ÉGIDE DO CPC/2015. ESTIPÊNDIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DEVIDOS À PARTE APELADA.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0300810-31.2018.8.24.0064, da Comarca de São José, Vara da Fazenda Pública, em que é Apelante Município de São José e Apelado Luciano Del Mestre Souza.

A Quarta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, fixando-se honorários recursais. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Odson Cardoso Filho, com voto e dele participou a Desa. Sônia Maria Schmitz.

Florianópolis, 29 de outubro de 2020.

Bettina Maria Maresch de Moura

Relatora


RELATÓRIO

Luciano Del Mestre Souza ajuizou "Ação de Repetição de Indébito Tributário (ITBI)" contra Município de São José aduzindo, em síntese, que em 19.05.2016 firmou "contrato de compra e venda de terreno e mútuo para construção de unidade vinculada a empreendimento, com fiança, alienação fiduciária em garantia e outras obrigações - recursos SBPE", no qual figurou como comprador. Disse que o valor da fração ideal do terreno é R$ 30.885,63 (trinta mil, oitocentos e oitenta e cinco reais e sessenta e três centavos), mas que o Réu, de forma equivocada, realizou o cálculo e emitiu as guias para recolhimento do Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis - ITBI, com base no valor do financiamento para a futura construção da unidade habitacional. Defendeu que a futura edificação não se trata de hipótese de incidência do ITBI, de modo que a exigência da exação sobre base de cálculo que contempla tal valor, é ilegal e inconstitucional. Diante disso, requereu a condenação do Réu à restituição do valor de R$ 5.862,29 (cinco mil, oitocentos e sessenta e dois reais e vinte e nove centavos), referente à diferença entre o valor do ITBI calculado sobre a fração ideal do terreno e aquele considerando a futura unidade imobiliária. Juntou documentos (fls. 09/40).

Citado, o Réu apresentou contestação e documentos (fls. 48/66). Alegou, em suma, que correta a utilização do valor da futura edificação como base de cálculo, posto que se trata de contrato de "compra de imóvel pronto para entrega futura" (fl. 49) e que o Autor "não adquiriu apenas a fração ideal do terreno para futura construção das unidades habitacional, adquiriu, como se pode ver do contrato firmado, imóvel pronto para entrega futura" (fl. 50). Defendeu que "o fato dos imóveis estarem em construção e que deverão ser entregues em 36 (trinta e seis) meses pela Construtora/Incorporadora [...] não os retiram da base de cálculo do ITBI, pois o ato de transmissão também os contempla" (fl. 51) e que não há prova pré-constituída de que o negócio jurídico foi pactuado sob o regime de contrato por administração. Suscitou a inaplicabilidade das Súmulas 110 e 470 do STF, posto que a construção não será realizada pelo Autor. Por fim, requereu a improcedência da pretensão inaugural.

Houve réplica (fls. 70/76).

As partes foram intimadas para indicar as provas que pretendiam produzir (fl. 77), tendo apenas o Réu se manifestado, postulando o julgamento antecipado da lide (fl. 80).

O Ministério Público alegou a falta de interesse em intervir no processo (fls. 84/85).

Sobreveio sentença (fls. 86/91), nos seguintes termos:

[...] À vista do exposto, com base no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos iniciais formulados por Luciano Del Mestre Souza contra Município de São José para condenar o réu a restituir o ITBI pago em excesso, devendo ser observada, na base de cálculo do tributo, apenas o valor correspondente à fração ideal do terreno adquirida.

Sobre o montante devido, deverá incidir correção pelo IPCA, a contar do desembolso do tributo pelo contribuinte, e juros de mora de 0,5% ao mês, a contar do trânsito em julgado desta decisão (Súmula 188 do Superior Tribunal de Justiça).

Em face do princípio da sucumbência, condeno a parte requerida ao pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o montante da condenação, nos termos do art. 85, § 3º, inciso I, do CPC.

Isento de custas.

Tendo em vista que o valor da causa não suplantará 100 salários mínimos, não se sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório, com alicerce no art. 496, § 3º, III, do CPC.

P.R.I.

Transitada em julgado, arquive-se. [...]

O Réu opôs embargos de declaração (fls. 98/101), os quais foram rejeitados (fls. 105/106).

Irresignado, o Réu interpôs recurso de apelação (fls. 113/124). Alega, resumidamente, que o contrato firmado pelo Autor se trata de uma simulação, porquanto o intuito daquele era a aquisição de imóvel na planta, típico negócio jurídico denominado como contrato de incorporação imobiliária. Defende que a incorporação se caracteriza "quando o incorporador leva adiante o empreendimento no intuito de incorporar a edificação ao terreno e disponibilizar à venda as unidades autônomas, em construção ou a serem construídas" (fl. 118), sendo que a base de cálculo do ITBI é a unicidade envolvendo a fração ideal do terreno e as unidades a serem construídas. Defende que inaplicáveis ao caso as Súmulas 110 e 470 do STF, já que a responsabilidade pela construção do empreendimento é da vendedora, não havendo qualquer ilegalidade na sua conduta. Requer a reforma do decisum fustigado, julgando-se improcedente a pretensão inaugural.

Com contrarrazões (fls. 128/136), os autos ascenderam a esta Corte.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Ricardo da Silva, manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 151/154).

Este é o relatório.


VOTO

1. Da admissibilidade do recurso

Inicialmente, consigno que a decisão recorrida foi publicada quando já em vigor o Código de Processo Civil de 2015, devendo este regramento ser utilizado para análise do recebimento da apelação.

Neste sentido, é orientação do Superior Tribunal de Justiça, através do Enunciado Administrativo n. 3:

"Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC."

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.

2. Do mérito

Trata-se de apelação interposta pelo Município de São José contra sentença que julgou procedente o pleito formulado na "Ação de Repetição de Indébito Tributário (ITBI)", deflagrada por Luciano Del Mestre Souza.

Alega o Apelante/Réu, resumidamente, que o contrato firmado pelo Apelado/Autor se trata de uma simulação, porquanto o intuito daquele era a aquisição de imóvel na planta, típico negócio jurídico denominado como contrato de incorporação imobiliária. Defende que a incorporação se caracteriza "quando o incorporador leva adiante o empreendimento no intuito de incorporar a edificação ao terreno e disponibilizar à venda as unidades autônomas, em construção ou a serem construídas" (fl. 118), sendo que a base de cálculo do ITBI é a unicidade envolvendo a fração ideal do terreno e as unidades a serem construídas. Defende que inaplicáveis ao caso as Súmulas 110 e 470 do STF, já que a responsabilidade pela construção do empreendimento é da vendedora, não havendo qualquer ilegalidade na sua conduta. Requer a reforma do decisum fustigado, julgando-se improcedente a pretensão inaugural.

O reclamo não comporta provimento.

Sobre o tema, dispõe a Constituição Federal:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

I - propriedade predial e territorial urbana;

II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;

[...]

§ 2º O imposto previsto no inciso II:

I - não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;

II - compete ao Município da situação do bem.

O Código Tributário Nacional, por sua vez, prevê:

Art. 35. O imposto, de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador:

I - a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil;

II - a transmissão, a qualquer...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT