Acórdão Nº 0300873-98.2018.8.24.0050 do Câmara de Recursos Delegados, 30-09-2020

Número do processo0300873-98.2018.8.24.0050
Data30 Setembro 2020
Tribunal de OrigemPomerode
ÓrgãoCâmara de Recursos Delegados
Classe processualAgravo Interno
Tipo de documentoAcórdão




Agravo Interno n. 0300873-98.2018.8.24.0050/50002, de Pomerode

Relator: Desembargador Salim Schead dos Santos

AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DECISÃO DA 3ª VICE-PRESIDÊNCIA QUE, COM BASE EM PARADIGMA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, NEGOU SEGUIMENTO AO RECURSO. SUPOSTA OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. NECESSIDADE DE ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL [ARE n. 748.371 RG/MT (TEMA 660)]. IMPOSSIBILIDADE DE ASCENSÃO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. DESPROVIMENTO. APLICAÇÃO DA MULTA DO ART. 1.021, § 4º, DO CPC/2015.

O Supremo Tribunal Federal, no regime de repercussão geral, firmou orientação no sentido de que, em se tratando de "tema relativo à suposta violação aos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal", quando o "julgamento da causa depende de prévia análise da adequada aplicação das normas infraconstitucionais", ausente está a repercussão geral. [STF - ARE n. 748.371 RG/MT, Rel. Ministro Gilmar Mendes (TEMA 660)].

É manifestamente improcedente o agravo interno dirigido contra decisão que, sustentada em orientação do Supremo Tribunal Federal, firmada no regime de repercussão geral, nega seguimento a recurso extraordinário, daí porque se aplica ao agravante a multa prevista no § 4º do artigo 1.021 do Código de Processo Civil de 2015.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo Interno n. 0300873-98.2018.8.24.0050/50002, da comarca de Pomerode 2ª Vara em que são Agravantes Master Catarina Indústria de Pigmentos e Corantes Eireli e outros e Agravado Banco do Brasil S/A.

A Câmara de Recursos Delegados decidiu, por votação unânime, negar provimento ao agravo interno, e condenar a agravante a pagar à parte contrária a multa de 1% sobre o valor atualizado da causa (artigo 1.021, § 4º, do CPC/2015). Custas na forma da lei.

O julgamento, realizado no dia 30 de setembro de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. João Henrique Blasi, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Volnei Celso Tomazini. Funcionou como representante do Ministério Público a Exma. Sra. Dra. Gladys Afonso.

Florianópolis, 02 de outubro de 2020.

Desembargador Salim Schead dos Santos

Relator


RELATÓRIO

Master Catarina Indústria de Pigmentos e Corantes Eireli e outros, com base no artigo 1.021 do Código de Processo Civil, interpuseram o presente agravo interno contra a decisão da 3ª Vice-Presidência desta Corte de Justiça que, amparada em precedente do Supremo Tribunal Federal [ARE n. 748.371 RG/MT - (TEMA 660)], negou seguimento ao recurso extraordinário (fls. 22/23, do incidente processual 50001 - SAJ/SG).

Em suas razões, os agravantes sustentam o equívoco da decisão agravada não se subsumindo o caso concreto à aplicabilidade do Tema 660 do STF, pois "apontou-se violação direta a textos constitucionais especificamente do disposto no art. 5º incisos LIV e LV"; que "os princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa são ferramentas fundamentais para garantir uma prestação jurisdicional eficiente [...] para eliminar eventuais erros do judiciário [...] sendo certo que, para averiguar eventual violação, não é necessário a análise de legislação ordinária"; que "a violação a tais princípios se mostrou tão gravosa a ponto de determinar a procedência da ação, tanto é assim, que o juiz afastou as alegações de cobrança excessiva por entender que os Agravantes não provaram a cobrança dos encargos abusivos alegados"; que "a controvérsia está diretamente relacionada ao direito de defesa dos Agravantes, pois o juiz da causa na origem não deferiu o pedido de apresentação de todos os contratos e extratos pela Instituição bancária" e "ao assim proceder [...] violou direta e frontalmente o direito dos Agravantes ao contraditório, a ampla defesa e devido processo legal, mormente se considerarmos [...] aplicável à espécie o Código de Defesa do Consumidor que estabelece a inversão do ônus probatório".

Com base nesses argumentos, requer o provimento do presente agravo interno, para o regular prosseguimento do recurso extraordinário interposto (fls. 1/4).

Intimada, a parte agravada, nas contrarrazões, pugna pelo desprovimento do recurso (fls. 7/8).

A 3ª Vice-Presidência, em juízo de retratação, manteve a decisão agravada e determinou a remessa dos autos à Secretaria da Câmara de Recursos Delegados, para oportuna inclusão em pauta, nos termos do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça.

Os autos vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

1. Imperativo anotar, ab initio, que o art. 1.030, inciso I, e suas alíneas "a" e "b", do Código de Processo Civil de 2015, determinam o seguinte:

Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá:

I - negar seguimento:

a) a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o Supremo Tribunal Federal não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de repercussão geral;

b) a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos.

O § 2º do art. 1.030 do diploma processual, por sua vez, estabelece que "da decisão proferida com fundamento nos incisos I e III caberá agravo interno, nos termos do art. 1.021" e, não havendo retratação, como neste caso, o agravo será levado "a julgamento pelo órgão colegiado, com inclusão em pauta" (art. 1.021, § 2º, do CPC/2015).

2. No mérito, há que se negar provimento ao agravo interno.

A 3ª Vice-Presidência deste Tribunal de Justiça negou seguimento ao recurso extraordinário quanto à alegada violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, porque o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do [ARE n. 748.371 RG/MT - (TEMA 660)], reconheceu que se trata de matéria sem repercussão geral, quando necessário o exame de legislação infraconstitucional.

O Agravo em Recurso Extraordinário n. 748.371 RG/MT (TEMA 660), julgado pelo Supremo Tribunal Federal, utilizado como paradigma pela decisão agravada, está assim ementado:

Alegação de cerceamento do direito de defesa. Tema relativo à suposta violação aos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal. Julgamento da causa dependente de prévia análise da adequada aplicação das normas infraconstitucionais. Rejeição da repercussão geral. (STF - ARE n. 748.371 RG/MT (TEMA 660), Rel. Ministro Gilmar Mendes, julgado em 06/06/2013, DJe 1º/08/2013 ).

Dos fundamentos do voto extrai-se:

Inicialmente, verifico que o recurso extraordinário fundou-se em suposta violação ao princípio da ampla defesa, em virtude da ausência de intimação para manifestação acerca de cálculos referentes à purgação da mora que fora requerida.

Sobre o tema, relembro que a ampla defesa possui densidade constitucional, portanto admite, em situações excepcionais de manifesto esvaziamento do princípio, o acesso à jurisdição desta Suprema Corte, por meio de recurso extraordinário.

A propósito, assinalou a Corte Constitucional alemã: Na interpretação do direito ordinário, especialmente dos conceitos gerais indeterminados (Generalklausel), devem os tribunais levar em conta os parâmetros fixados na Lei Fundamental. Se o tribunal não observa esses parâmetros, então ele acaba por ferir a norma fundamental que deixou de observar; nesse caso, o julgado deve ser cassado no processo de recurso constitucional (Verfassungsbeschwerde).

Não há dúvida, por outro lado, de que essa orientação prepara algumas dificuldades, podendo converter a Corte Constitucional em autêntico Tribunal de revisão.

É que, se a lei deve ser aferida em face de toda a Constituição, as decisões hão de ter a sua legitimidade verificada em face da Constituição e de toda a ordem jurídica. Se se admitisse que toda decisão contrária ao direito ordinário é uma decisão inconstitucional, ter-se-ia de acolher, igualmente, todo e qualquer recurso constitucional interposto contra decisão judicial ilegal.

Por essas razões, procura o Tribunal formular um critério que limita a impugnação das decisões judiciais mediante recurso constitucional. Sua admissibilidade dependeria, fundamentalmente, da demonstração de que, na interpretação e aplicação do direito, o Juiz desconsiderou por completo ou essencialmente a influência dos direitos fundamentais, que a decisão se revela grosseira e manifestamente arbitrária na interpretação e aplicação do direito ordinário ou, ainda, que se ultrapassaram os limites da construção jurisprudencial. Não raras vezes, observa a Corte Constitucional que determinada decisão judicial afigura-se insustentável, porque assente numa interpretação objetivamente arbitrária da norma legal (Sie beruth vielmehr auf schlechthin unhaltbarer und damit objektiv willkürlicher Auslegung der angewenderen Norm).

Embora o modelo de controle de constitucionalidade exercido pelo Bundesverfassungsgericht revele especificidades em relação ao modelo brasileiro, é certo que a ideia de que a não-observância do direito ordinário pode configurar uma afronta ao próprio direito constitucional tem aplicação também entre nós.

Ressalte-se, ainda, que, no Brasil, os possíveis abusos cometidos na aplicação da lei como o afastamento completo de sua incidência podem configurar ofensa direta ao art. 97 da Constituição e à Súmula Vinculante 10 desta Corte, ensejando até mesmo a...

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