Acórdão Nº 0300882-96.2018.8.24.0038 do Segunda Câmara de Direito Civil, 27-10-2021

Número do processo0300882-96.2018.8.24.0038
Data27 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300882-96.2018.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador RUBENS SCHULZ

APELANTE: LUCY SOUZA DE MACENA (AUTOR) APELANTE: TRANSPORTE E TURISMO SANTO ANTONIO LTDA (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Lucy Souza de Macena ajuizou a presente "ação de indenização por danos materiais e morais" em face de Transtusa Transporte e Turismo Santo Antônio Ltda. Sustentou, em síntese, que no dia 10 de abril de 2017 contratou o serviço de transporte intermunicipal da empresa ré e recebeu uma passagem gratuita, em razão de ser idosa, para viagem do Município de Joinville/SC até o Município de Itapoá/SC, com embarque no mesmo dia às 12h15min. Relatou que, entretanto, após o transcurso de, aproximadamente, 20 (vinte) minutos de viagem, foi abordada pelo funcionário da ré, cobrador responsável por realizar a conferência das passagens, informando que a autora estava com a passagem trocada. Contou que o bilhete que portava tinha o mesmo destino (Itapoá), contudo, não faria o mesmo caminho pelo qual precisava para chegar até o seu destino. Narrou que, por não ter em mãos o bilhete correspondente àquela linha, o funcionário da ré exigiu o seu desembarque do ônibus, mesmo o veículo estando distante do ponto de embarque. Esclareceu que não tinha dinheiro para embarcar em outro ônibus, razão pela qual ficou perdida e recebeu ajuda de terceiros para conseguir retornar à rodoviária e embarcar em outro ônibus para chegar em seu destino. Dispôs que sofreu prejuízos de ordem material e moral. Asseverou a responsabilidade da ré no dever de indenizar. Por essas razões, pleiteou a concessão dos benefícios da justiça gratuita; a inversão do ônus da prova; a procedência dos pedidos, para condenar a ré ao pagamento de indenização por dano material no valor de R$ 20,96 (vinte reais e noventa e seis centavos), dano moral no valor de R$ 19.080,00 (dezenove mil e oitenta reais) e das custas processuais e honorários advocatícios. Por derradeiro, juntou documentos (Evento 1).

Restou deferida a justiça gratuita (Evento 4).

Realizada a audiência, a tentativa de conciliação restou inexitosa (Evento 40).

Citada, a empresa ré apresentou contestação, alegando que não cometeu ato ilícito, vez que a autora não foi distratada ou expulsa do ônibus por qualquer de seus funcionários. Defendeu a inexistência do dever de indenizar. Assim, pleiteou pelo julgamento de improcedência dos pedidos iniciais. Subsidiariamente, requereu a fixação do valor relativo à indenização por dano moral em patamar razoável. Juntou documentos (Evento 42).

Houve réplica (Evento 46).

Saneado o processo, restou deferida a produção de prova testemunhal (Evento 48).

Realizada a audiência de instrução e julgamento, foi tomado o depoimento pessoal da parte autora, bem como a oitiva de testemunha (Evento 88).

A oitiva das outras testemunhas se deu por carta precatória (Eventos 81, 92 e 102).

Na sequência, as alegações finais foram apresentadas (Eventos 108 e 109).

Conclusos os autos, sobreveio sentença, nos seguintes termos (Evento 119):

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido inicial (CPC, art. 487, I) a fim de condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), devidamente corrigido monetariamente pelo INPC (Provimento CGJ nº. 13/1995), a partir da presente data (Súmula nº. 362/STJ), e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação (Súmula nº. 54/STJ).

Levando-se em conta que a parte autora decaiu de parte ínfima dos pedidos (CPC, art. 86, parágrafo único), a parte ré arcará integralmente com as custas e despesas processuais, bem como com os honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da condenação (CPC, art. 85, § 2º).

Irresignadas, ambas as partes interpuseram recurso de apelação.

Em suas razões recursais, a empresa ré objetiva a reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos iniciais, reiterando as alegações expostas em contestação, no sentido de que não cometeu ato ilícito e que inexiste o dever de indenizar. Subsidiariamente, requer a minoração do quantum indenizatório (Evento 126).

A autora, por sua vez, pretende a majoração do valor de indenização por dano moral (Evento 132).

Apresentadas as contrarrazões (Eventos 131 e 136), ascenderam os autos a esta eg. Corte de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conhece-se dos recursos e passa-se ao exame dos seus objetos.

Destaca-se, ademais, que a apreciação dos presentes recursos, em detrimento de outros que estão há mais tempo conclusos neste gabinete, não afronta o critério cronológico de julgamento dos processos, previsto no art. 12 do Código de Processo Civil. Ao revés, valendo-se da interpretação do parágrafo 2º do referido artigo, tratando-se de causa relativamente simples, antecipar o seu julgamento privilegia a celeridade e a economia processual e contribui para o desafogamento do Judiciário, uma das diretrizes da novel legislação.

Assim, por ordem de prejudicialidade, analisa-se, primeiramente, as razões do recurso da empresa ré. Na sequência, caso remanesça a necessidade, serão apreciadas as questões vertidas no recurso da autora.

1 RECURSO DA EMPRESA RÉ

De início, menciona-se que a relação estabelecida entre as partes é de consumo, razão pela qual incidem na hipótese as normas protetivas previstas no Código de Defesa do Consumidor.

Isso, pois, nas relações de consumo, confere-se o status de consumidor à pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final e de fornecedor a "toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços" (artigos 2° e 3° do Legislação Consumerista).

E, como é cediço, a legislação consumerista, por sua natureza protetiva, preconiza a responsabilidade civil objetiva relativa aos danos causados, ao passo que a demonstração de culpa do fornecedor é prescindível.

Nesse sentido, a responsabilidade do fornecedor é presumida, salvo quando comprovada alguma situação prevista no Código de Defesa do Consumidor ou, ainda, a ruptura do nexo de causalidade, in verbis:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. [...] (grifou-se).

Esclarecida a legislação aplicável, e analisando os autos, constata-se que a autora alega que contratou os serviços de transporte da ré e recebeu uma passagem gratuita, em razão de ser idosa, para viagem do Município de Joinville/SC até o Município de Itapoá/SC, com embarque no mesmo dia às 12h15min.

Relata que, entretanto, após o transcurso de, aproximadamente, 20 (vinte) minutos de viagem, foi abordada pelo funcionário da ré, cobrador responsável por realizar a conferência das passagens, oportunidade em que este constatou que a autora estava com a passagem trocada. Conta que o bilhete que portava tinha o mesmo destino (Itapoá), contudo, não faria o mesmo caminho por Guaruva, que era o que precisava para chegar em seu destino.

Narra que, por não ter em mãos o bilhete correspondente àquela linha, o funcionário da ré exigiu o seu desembarque do ônibus, mesmo o veículo estando distante do ponto de embarque. Diante disso, esclarece que teve que pedir ajuda a terceiros, vez que não tinha dinheiro para embarcar em outro ônibus.

Pois bem.

Conforme depreende-se dos autos, restou incontroverso que a autora embarcou no ônibus que não correspondia com o seu bilhete, pois ingressou no veículo errado.

Igualmente inconteste que a conferência da passagem da autora pelo funcionário da ré somente ocorreu dentro do ônibus, enquanto este já estava...

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