Acórdão Nº 0300901-16.2019.8.24.0023 do Quinta Câmara de Direito Público, 17-04-2020

Número do processo0300901-16.2019.8.24.0023
Data17 Abril 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo Interno
Tipo de documentoAcórdão




Agravo Interno n. 0300901-16.2019.8.24.0023/50000, da Capital

Relator: Desembargador Hélio do Valle Pereira

MULTA PROCESSUAL - AGRAVO INTERNO - RECURSO ESPECIAL REMETIDO PELA 2º VICE-PRESIDÊNCIA PARA RETRATAÇÃO - ACOLHIMENTO.

1. Julgado monocraticamente recurso por Tribunal de Justiça, cabe agravo interno. Será uma etapa obrigatoriamente se o objetivo for, na sequência, apresentar recursos extraordinário ou especial, respectivamente ao STF ou ao STJ. Essa conduta não representa um caráter protelatório e não justifica multa (Tema 434 do STJ).

2. O Novo Código de Processo Civil tornou aquele regime, porém, mais áspero. Hoje, não apenas o agravo interno protelatório desafia multa, mas também aquele que seja manifestamente improcedente (desde que assim considerado à unanimidade).

A regra é boa porque se o julgamento unipessoal derivou de jurisprudência formada, o objetivo é restringir mesmo as insurgências. Será um risco ao qual exposto o agravante. Não se tratará de avaliação à luz de possível malícia, mas meramente de constatação objetiva quanto à falta de verossimilhança do agravo interno.

3. No caso, entretanto, em que pese à firme posição deste Tribunal de Justiça e especialmente desta Câmara, não se pode dizer que o assunto de fundo (a possível redução de alíquota de ICMS sobre a energia elétrica) seja isento de controvérsia. O agravo interno (mesmo que tenhamos pessoalmente como manifestamente improcedente) é objetivamente passível de polêmica, tanto que pende análise de repercussão geral pelo STF.

4. Retratação positiva para excluir a multa do art. 1.021 do NCPC.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo Interno n. 0300901-16.2019.8.24.0023/50000, da comarca da Capital - 3ª Vara da Fazenda Pública em que é Agravante Cotresc- Cooperativa de Transportes de Cargas do Estado de Santa Catarina Ltda e Agravado o Estado de Santa Catarina.

A Quinta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, em juízo de retratação, retirar a penalidade imposta. Sem custas.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Denise de Souza Luiz Francoski e Artur Jenichen Filho.

Florianópolis, 17 de abril de 2020.

Desembargador Hélio do Valle Pereira

Presidente e relator


RELATÓRIO

Cooperativa de Transportes de Cargas do Estado de Santa Catarina Ltda apelou de sentença do juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Capital que julgou improcedente o pedido constante de mandado de segurança - impetrado em relação a ato do Diretor da Diretoria de Administração Tributária do Estado de Santa Catarina.

Relatou ser ilegal a cobrança do ICMS sob a alíquota de 25% sobre as tarifas de energia elétrica, visto que se trata de serviço público fundamental e essencial, ferindo, assim, o princípio da seletividade. Houve, ainda, flagrante violação do princípio da isonomia quando a legislação catarinense estabeleceu "alíquota de 12% sobre operações de energia elétrica para consumidores domésticos e rurais" em detrimento daqueles industriais e comerciais, que recolhem o percentual de 25.

Buscou, além do reconhecimento do direito ao pagamento do tributo pela alíquota de 12% ou 17% - por simetria em relação a outros bens essenciais -, a compensação dos valores pagos a maior nos últimos cinco anos com aqueles devidos ao Fisco.

Decidi monocraticamente o feito e reconheci que, inexistente hierarquia entre os princípios constitucionais, encontra respaldo no princípio da legalidade a alíquota de 25% de ICMS incidente sobre operações com energia elétrica.

Veio então agravo interno.

Ali se defendeu que o pedido principal se relacionou à inconstitucionalidade (e consequente suspensão da exigibilidade) da alíquota de 25% de ICMS incidente sobre a energia elétrica, e, somente de forma subsidiária, à aplicação dos percentuais de 12 e 17. A decisão, segundo o agravante, não enfrentou a pretensão principal, mas apenas a subsidiária. A partir daí, reiterando os argumentos de outrora, relatou que o writ foi impetrado visando ao reconhecimento da inconstitucionalidade da cobrança do ICMS com alíquota de 25% sobre as tarifas de energia elétrica, visto que se trata de serviço público fundamental e essencial, o que fere os princípio da seletividade e isonomia. A norma estadual, argumenta, atribui alíquota distintas a produtos essenciais e iguais para bens supérfluos, o que põe em xeque o princípio da isonomia.

Reforçou que a questão é debatida no STF no RE 714.139/SC, que foi tomado como paradigma para representar a controvérsia no julgamento de Repercussão Geral (Tema 745) e que, aliás, contou com parecer favorável da PGR pela inconstitucionalidade do art. 19, inciso II, alíneas "a" e "c" da Lei Estadual Catarinense 10.297/1996, que prevê justamente alíquota superior à geral para a energia elétrica.

Esta Quinta Câmara de Direito Público, entretanto, de forma unânime negou provimento ao recurso, aplicando ao agravante a multa do art. 1.021 do NCPC. O acórdão contou com esta ementa:

AGRAVO INTERNO - TRIBUTÁRIO - ALÍQUOTA (25%) DE ICMS SOBRE ENERGIA ELÉTRICA - ALEGAÇÃO DE AFRONTA A PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS - NÃO OCORRÊNCIA - PREPONDERÂNCIA DA LEGALIDADE E DA SEGURANÇA JURÍDICA.

Norma de Santa Catarina estabelece determinada alíquota a título de ICMS sobre operações com energia elétrica (que, a exceção de determinadas hipóteses, é a rigor de 25%). A postulante defende que seja reconhecida a invalidade da regra, tendo como parâmetro o art. 155, § 2º, da Constituição Federal. É que, sendo seletivo o tributo, não pode ser exigida alíquota para produto essencial de forma idêntica àqueles considerados supérfluos. Dito de outro modo, seria o caso de ser cobrada pelo percentual de 17 (por simetria com outros bens considerados essenciais), não nos atuais e máximos 25%.

Deve preponderar, porém, a segurança jurídica. É que além de existir lei em vigor que expressamente fixa tais patamares e o princípio da legalidade tem força ainda mais eloquente em seara tributária , de constitucionalidade presumida, pode-se paralelamente compreender que o escalonamento previsto atende à capacidade contributiva (e identicamente a seletividade e a isonomia), preservando-se, outrossim, o interesse público quanto a eventuais contingências relacionadas à escassez do produto, com o desestímulo ao consumo abusivo e ao desperdício.

Compreensão reiterada do TJSC, em especial do Grupo de Câmaras de Direito Público.

Recurso desprovido. Aplicação da multa do art. 1.021 do NCPC.

O particular, então, apresentou recurso especial. A 2ª Vice-Presidência desta Casa, porém, devolveu os autos para juízo de retratação. É que pelo Tema 434 do STJ o agravo interposto contra decisão monocrática com objetivo de exaurir a instância ordinária não se constitui recurso "manifestamente inadmissível ou infundado, o que torna inaplicável a multa prevista no art. 557, § 2º, do Código de Processo Civil".

VOTO

1. O acórdão prolatado por conta do agravo interno foi assim fundamentado:

(...)

Quanto ao tema de fundo, há norma estadual que estabelece determinada alíquota (25%) a título de ICMS sobre operações com energia elétrica. A postulante, entretanto, na linha do disposto no art. 155, § 2º, da Constituição Federal, defende que, sendo seletivo o tributo, não pode ser exigida alíquota para produto essencial de forma idêntica (ou mais gravosa) àqueles considerados supérfluos. Dito de outro modo, seria o caso de se abster da cobrança ou reconhecer a incidência de percentuais menores (12 ou 17), não os atuais 25%.

Ratifico, porém, independentemente de maiores debates quanto ao conteúdo da norma controvertida, que deva preponderar a segurança jurídica. Isso por que, inexistindo hierarquia entre os princípios constitucionais relacionados à questão (seletividade, isonomia e legalidade, dentre outros correlatos), tenho, por critério de ponderação, por prevalecente o último. É que além de existir Lei em vigor que expressamente fixa tais patamares - e o princípio da legalidade tem força ainda mais eloquente em seara tributária -, de constitucionalidade presumida, pode-se paralelamente compreender que o escalonamento previsto atende a capacidade contributiva (e identicamente a isonomia), preservando-se, outrossim, o interesse público quanto a eventuais contingências relacionadas à escassez do produto, com o desestímulo ao consumo abusivo e ao desperdício.

Não se pode, outrossim, descartar certa margem de extrafiscalidade da exação, tal como ponderou o Juiz Marco Aurélio Ghisi Machado:

No tocante ao ICMS, contudo, a própria Constituição Federal é clara ao estabelecer a facultatividade da adoção da referida técnica, dispondo que o imposto "poderá" ser seletivo.

E mesmo que assim não fosse, haveria ainda que se considerar que a imposição de uma maior ou menor alíquota tributária a um determinado fato imponível, não se restringiria, necessariamente, à adoção dessa técnica.

Isso porque, cada vez mais, a tributação se afasta da sua ordinária finalidade arrecadatória, voltando-se à consecução de desígnios outros, atinentes à ordenação da economia e das relações sociais, em verdadeira função extrafiscal.

Nos dizeres de Geraldo Ataliba, "consiste a extrafiscalidade no uso de instrumentos tributários para obtenção de finalidades não arrecadatórias, mas estimulantes, indutoras ou coibidoras de comportamentos, tendo em vista outros fins, a realização de outros valores constitucionalmente consagrados" (ATALIBA, Geraldo. IPTU - Progressividade. Revista de Direito Público (RDP) 93/233).

Assim é que, mesmo com relação a serviços potencialmente reputados 'essenciais' à sociedade, como seria o caso da energia elétrica, e até mesmo das comunicações, será possível a imputação de alíquotas tributárias mais gravosas, como forma de regulação das relações sociais no tocante a esses serviços.

(...)

Em suma, portanto, não há óbice à eventual...

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