Acórdão Nº 0300945-70.2019.8.24.0076 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 05-05-2022

Número do processo0300945-70.2019.8.24.0076
Data05 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300945-70.2019.8.24.0076/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: ROBERTO CARLOS BORGA (EMBARGANTE) APELANTE: COOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISSAO DE ASSOCIADOS SUL CATARINENSE (EMBARGADO) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

COOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISSAO DE ASSOCIADOS SUL CATARINENSE interpôs apelação autônoma, e ROBERTO CARLOS BORGA apresentou recurso adesivo contra a sentença proferida nos autos da ação de embargos à execução, em curso perante o juízo da Vara Única da Comarca de Turvo, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial, nestes termos:

I - RELATÓRIO:

ROBERTO CARLOS BORGA ajuizou ação de Embargos à Execução em face de COOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISSAO DE ASSOCIADOS SUL CATARINENSE.

Alegou preliminarmente, a incompetência do juízo, por ser hipossuficiente diante do embargado, devendo aplicar-se a legislação consumerista, remetendo os autos à Urussanga/SC.

No mérito, alegaram a ausência de constituição em mora e a ilegalidade dos juros aplicados.

Intimado o embargado, requereu a improcedência da demanda.

Os autos vieram conclusos.

É o relato.

II. FUNDAMENTAÇÃO.

Trata-se de Embargos à Execução propostos por ROBERTO CARLOS BORGA, em face de COOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISSAO DE ASSOCIADOS SUL CATARINENSE.

Profiro julgamento antecipado (art. 355, inciso I, do CPC), visto que desnecessária a produção de outras provas além das acostadas aos autos.

Da incompetência absoluta do juízo.

Alegou o embargante a incompetência absoluta do juízo, visto tratarem-se de consumidores hipossuficientes, bem como ter sido a cédula firmada na cidade de Urussanga/SC, requerendo a remessa dos presentes autos e da execução em apenso à referida cidade.

Pois bem, recentemente o STJ decidiu que para tornar inválida a cláusula do foro de eleição, necessária se faz a comprovação da hipossuficiencia do consumidor, bem como sua dificuldade ao acesso à justiça, o que não foi realizado nos autos, neste sentido:

"[...] O STJ possui entendimento no sentido de que a cláusula que estipula a eleição de foro em contrato de adesão, só poderá ser considerada inválida quando demonstrada a hipossuficiência ou a dificuldade de acesso da parte ao Poder Judiciário. 6. Nesta perspectiva, a situação de hipossuficiência de uma das partes, por sua manifesta excepcionalidade, deve ser demonstrada com dados concretos em que se verifique o prejuízo processual para alguma delas. 7. A condição de consumidor, considerada isoladamente, não gera presunção de hipossuficiência a fim de repelir a aplicação da cláusula de derrogação da competência territorial quando convencionada, ainda que em contrato de adesão. [...] " (REsp 1675012/SP, rela. Mina. Nancy Andrighi, j. 8-8-2017) [...] (Agravo Interno n. 0001338-05.2019.8.24.0000, de Xanxerê, rel. Des. Dinart Francisco Machado, j. 30-7-2019). (TJSC, Conflito de Competência n. 0001560-70.2019.8.24.0000, de São Bento do Sul, rel. Des. Luiz Zanelato, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 29-08-2019).

Assim, mantém-se a competência do juízo.

Mérito.

Em relação ao mérito, cumpre esclarecer que é predominante o entendimento na doutrina e na jurisprudência que aos contratos bancários aplicam-se os dispositivos do Código Consumerista, até porque existe previsão expressa nesse sentido (art. 3º, § 2º , da Lei n. 8.078/90), enquadrando-se a parte embargada no conceito de fornecedora. Por outro lado, o embargante enquadram-se no conceito de consumidor, previsto no art. 2º do CDC. Por esta razão, torna-se indispensável a aplicação ao caso em concreto das normas constantes no Código de Defesa do Consumidor.

Acerca da aplicabilidade do CDC ao presente caso, José Reinaldo de Lima Lopes é citado na obra "Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do Anteprojeto" (GRINOVER, Ada Pellegrini (coord). 8 ed., Rio de Janeiro : Forense Universitária, 2004, p. 50 ) pela seguinte consideração: "É fora de dúvida que os serviços financeiros, bancários e securitários encontram-se sob as regras do Código de Defesa do Consumidor. Não só existe disposição expressa na Lei nº 8.078/90 sobre o assunto (art. 3º, § 2º), como a história da defesa do consumidor o confirma, quando verificamos que a proteção aos tomadores de crédito ao consumo foi das primeiras a ser criada".

Tal entendimento restou consolidado por meio da edição da Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

Não divergindo, a jurisprudência deste Tribunal consagra que mesmo as instituições financeiras devem pautar-se pelas diretrizes do Código de Defesa do Consumidor, vejamos: "São aplicáveis as disposições do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários (AgREsp n. 544.813/RS, Ministra Nancy Andrighi, DJ 1º-12-2003, p. 356)" (AC n. 2002.017533-7, Des. Salim Schead dos Santos).

"Firmes são os posicionamentos da doutrina e dos tribunais no sentido da aplicabilidade das disposições do Código de Defesa do Consumidor aos contratos celebrados com as instituições financeiras" (AC n. 2001.000242-1, Des. Sérgio Roberto Baasch Luz).

Está, por conseguinte, plenamente caracterizada a existência de uma relação jurídica de consumo na qual a instituição financeira figura como fornecedora na modalidade de prestadora de serviço, aplicando-se, destarte, as disposições do Código de Defesa do Consumidor.

Taxa de juros remuneratórios acima do limite legal.

Pretende a embargante a limitação dos juros remuneratórios pactuados. Pois bem, quanto à limitação dos juros, a jurisprudência hodierna é tranquila em afirmar que o art.192, §3º da Constituição Federal não era norma auto-aplicável, de modo que sua aplicabilidade dependia da edição de Lei Complementar.

O Supremo Tribunal Federal, intérprete máximo das normas constitucionais, sumulou a matéria: "Súmula 648. A norma do § 3º do art. 192 da constituição, revogada pela emenda constitucional 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar".

Na verdade, esse entendimento já vinha sendo perfilhado desde o julgamento da ADI nº 004-07/DF, quando o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional parecer de caráter normativo que sustentava a falta de auto-aplicabilidade do art. 192, §3º, da Carta Magna.

Importa registrar também que o art. 25, I, do ADCT da CF/88 não acarretou a revogação do inciso IX, da Lei 4.595/64, pois o Supremo Tribunal Federal, guardião máximo da nossa Constituição, já se posicionou sobre a questão, tendo afirmado a inexistência de revogação da Lei 4.595/64. Nesse sentido foi o entendimento perfilhado por ocasião do julgamento dos Recursos Extraordinários n.º 309.318-5 e n.º 288.320-4.

O Superior Tribunal de Justiça também ressaltou a vigência da Lei 4.595/64, asseverando que persiste em nosso ordenamento jurídico a autorização conferida ao Conselho Monetário Nacional para dispor acerca das taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras: "1- Esta Corte firmou entendimento no sentido de que a Lei nº 4.595/64 continua em vigência, persistindo no nosso ordenamento jurídico a autorização conferida ao Conselho Monetário Nacional para limitar os juros praticados pelas instituições financeiras. Precedentes. (...)". Edcl no AgRg no Resp 679211 / RS". (Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Recurso Especial 2004/0085074-8 Relator(a) Ministro Jorge Scartezzini (1113) Órgão Julgador T4 - Quarta Turma Data do Julgamento 13/12/2005. Data da Publicação/Fonte DJ 13.02.2006 p. 812).

Oportuno frisar que se mostram inaplicáveis às instituições financeiras as disposições contidas na Lei de Usura, consoante entendimento assente do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVOS REGIMENTAIS DE AMBAS AS PARTES. CONTRATOS DE MÚTUO. JUROS. LIMITAÇÃO. ABUSIVIDADE. APLICAÇÃO DO CDC. PACIFICAÇÃO DO TEMA. VERBA HONORÁRIA. ARTIGO 20, § 4º, DO CPC. INCIDÊNCIA. I. A Lei de Usura não se aplica às instituições financeiras, de sorte que não há abusividade apenas porque cobrada do mutuário taxa superior a 12% ao ano. Aplicação da jurisprudência uniformizada da 2ª Seção. (Resp n. 407.097/RS, Rel. p/ acórdão Min. Ari Pargendler, DJU de 29.09.2003)". (STJ QUARTA TURMA MIN. ALDIR PASSARINHO JR. DJ 10/08/2004 RESP 540881).

Ademais, como preconiza o Excelso Pretório, através de enunciado sumular: "Súmula 596. As disposições do decreto 22.626/1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional".

Do mesmo modo, ainda que aplicáveis ao caso as disposições do Código de Defesa do Consumidor, conforme já anotado, só haverá que se cogitar de onerosidade excessiva da taxa de juros quando o seu percentual exceder a taxa média de mercado divulgada pelo BACEN, considerada à época de celebração do pacto.

Nesse sentido, cito precedentes jurisprudenciais assim ementados:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL.CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PRELIMINARES ACOLHIDAS EM MENOR EXTENSÃO. JUROS. LIMITAÇÃO (12% AA). LEI DE USURA (DECRETO N. 22.626/33). NÃO INCIDÊNCIA. APLICAÇÃO DA LEI N. 4.595/64. DISCIPLINAMENTO LEGISLATIVO POSTERIOR. SÚMULA N. 596 - STF. INEXISTÊNCIA DE ONEROSIDADE EXCESSIVA. ABUSIVIDADE. APLICAÇÃO DO CDC. RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. MULTA, ART. 557, § 2º, DO CPC. (...) II. Não se aplica a limitação de juros de 12% ao ano prevista na Lei de Usura aos contratos bancários não previstos em leis especiais, sequer considerada excessivamente onerosa a taxa média do mercado. Precedente uniformizador da 2ª Seção do STJ, posicionamento já informado no despacho agravado. (AgRg no Resp 654621 / RS Ministro Aldir Passarinho Junior (1110) Dj 28.02.2005 P. 336) "(...) Quanto à limitação dos juros remuneratórios, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, no Resp 407.097/RS, publicado no DJ 29.09.2003, proclamou que a alteração da taxa de juros...

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