Acórdão Nº 0300957-71.2016.8.24.0082 do Primeira Câmara de Direito Civil, 14-07-2022

Número do processo0300957-71.2016.8.24.0082
Data14 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0300957-71.2016.8.24.0082/SC

RELATOR: Desembargador RAULINO JACÓ BRUNING

APELANTE: MARCELO JAKOVLJEVIC PUDLA APELADO: INTERCULTURAL AGENCIA DE VIAGENS S.A.

RELATÓRIO

Adoto o relatório da r. sentença proferida na Comarca da Capital, da lavra da Magistrada Nicolle Feller, por refletir fielmente o contido no presente feito, in verbis:

Marcelo Jakovljevic Pudla, qualificado nos autos, ajuizou ação declaratória de nulidade de cláusula contratual abusiva cumulada com repetição de indébito e indenização por dano moral, sob o procedimento comum, em face de Intercultural Agência de Viagens Ltda - Epp, igualmente qualificada nos autos.

Narrou, em síntese, que firmou, em setembro de 2015, contrato com a requerida para realização de intercâmbio nos Estados Unidos, na modalidade Work Experience, pelo valor de U$ 928,00 (novecentos e vinte e oito dólares), sendo que no mês seguinte pediu o desfazimento da avença, diante da incompatibilidade da oferta de emprego e suas férias escolares. Disse que, quando da negociação, foi informado da existência de multa no importe de U$ 50,00 (cinquenta dólares) para a hipótese de desistência, mas obteve o reembolso de apenas U$ 499,00, sendo posteriormente informado sobre a ausência de devolução da parcela denominada "Custo Intercultural", disposição que considera abusiva. Pleiteou, assim: a) o reconhecimento da abusividade das cláusulas do contrato de intercâmbio firmado com a requerida, as quais vedam o reembolso do "Custo Intercultural" (cláusula 6ª, parágrafo 1º, e cláusula 12ª, parágrafo 2º); b) a condenação da requerida ao pagamento, em dobro, do valor de U$ 379,00 (trezentos e setenta e nove dólares), ao câmbio da data do pagamento, atualizado monetariamente, ou do valor que o juízo arbitrar adequado, a partir da revisão da referida cláusula contratual; c) a condenação da demandada ao pagamento de R$ 17.600,00 (dezessete mil e seiscentos reais) a título de danos morais, pela prática desleal perpetrada pela requerida; d) a condenação da demandada ao pagamento de R$ 8.800,00 (oito mil e oitocentos reais) a título de danos morais pela perda do tempo útil (fls. 01-39).

Juntou documentos (fls. 41-95) e comprovou o recolhimento das custas (fls. 96-97).

Foi designada audiência de conciliação e determinada a citação da requerida (fl. 99).

Citada a ré (fl. 105), as partes compareceram à audiência de conciliação, na qual restou sem êxito a autocomposição (fl. 113).

A demandada apresentou contestação, aduzindo que o autor contratou o pacote Work Experience, na modalidade Independent, por meio da qual a empresa compromete-se a efetivar os trâmites para que o intercambista ingresse nos Estados Unidos com visto de trabalho temporário, tendo o contratante a responsabilidade de obter seu próprio emprego no local de destino. Pontuou que o autor desistiu de forma imotivada do contrato, tendo recebido a devolução da quantia paga conforme previsão contratual, a qual não abrange o chamado "Custo Intercultural", consoante cláusulas 6ª e 11ª do pacto firmado. Pontuou que tal custo refere-se aos atos preparatórios para viabilização do programa de intercâmbio, muitos seguindo exigência da legislação e do Governo Estadunidense, que encerram a prestação efetiva de serviços antes mesmo do embarque, envolvendo toda a preparação do intercâmbio e o processamento da inscrição perante a instituição promotora do programa no exterior. Referiu que as cópias dos e-mails trocados entre as partes demonstram que os serviços contratados referentes ao "Custo Intercultural" foram prestados e que o requerente, por razões pessoais, desistiu do contrato. Asseverou que o problema do conflito de datas foi apresentado pelo autor em 08/10/2015 e não no momento de sua contratação em 23/09/2015 como alega, pontuando que o postulante não teria como ter uma Job Offer (oferta de emprego) sem que estivesse inscrito no programa, o que ratifica a prestação dos serviços por si. Aduziu, ainda, a inexistência de dano moral indenizável. Pleiteou, por fim, a improcedência dos pedidos formulados (fls. 115-137), juntando documentos (fls. 138-157).

A parte autora apresentou réplica (fls. 176-200), juntando novos documentos (fls. 201-203), acerca dos quais se manifestou a requerida (fls. 206-207) e novamente o demandante (fls. 208-211).

Acresço que a Juíza a quo julgou improcedentes os pedidos iniciais e o pleito de condenação da ré às penas de litigância de má-fé, entendendo que não houve falha no dever de informação e a retenção de parcela do contrato dá-se por conta do serviço já prestado, conforme parte dispositiva que segue:

Ante do exposto, com fulcro no art. 487, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na presente ação declaratória de nulidade de cláusula contratual cumulada com repetição do indébito e indenização por dano moral ajuizada por Marcelo Jakovljevic Pudla em face de Intercultural Agência de Viagens Ltda - Epp, ambos qualificados nos autos.

Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios ao patrono da ré, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, observando-se a relativa complexidade da causa, a razoável duração do feito, que não contou com atos em audiência de instrução e a atuação dos advogados das partes, nos termos dos artigos 82 e 85, §2º, do CPC.

Sentença sujeita ao regime do art. 523 do CPC.

Com o trânsito em julgado, nada sendo requerido, dê-se baixa e arquivem-se os autos, com as cautelas de estilo.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Inconformado, Marcelo Jakovljevic Pudla apela, sustentando que: (a) a requerida prestou informação enganosa quando da contratação, afirmando que, caso houvesse incompatibilidade de datas entre as férias escolares e a job offer (oferta de emprego), bastaria conversar com o empregador norte-americano; (b) ademais, a demandada afirmou que, se houvesse desistência do contrato, pagaria somente o valor de US$50,00 a título de multa; (c) as rubricas "Custo Intercultural" e "Custo de Intercâmbio" foram "criados de forma confusa e de maneira obscura pela apelada, para se apropriar indevidamente de recursos dos seus clientes em caso de cancelamento imediato, como fora no caso do apelante" (fl. 6 do apelo); (d) como o autor optara por utilizar a modalidade "returnee independent", nenhum dos serviços postos no contrato como "Custo Intercultural" são aplicáveis; (e) assim, é "injustificada a retenção de US$ 399,00, uma vez que nenhum dos serviços ali elencados foram prestados e sequer seriam" (fl. 7 do apelo); (f) a ré deve ser condenada às penas de litigância de má-fé, pois não prestara o serviço de Custo Intercultural; (g) como a acionada se recusara a restituir o valor de "Custo Intercultural" (US$379,00), o importe deve ser devolvido em dobro; (h) além disso, deve ser compensado pela perda do tempo útil e, também, por ter sido enganado através das referidas cláusulas abusivas; (i) a ré deve ser condenada às penas de litigância de má-fé, uma vez que prestou informação falsa ao PROCON e juntou referida declaração no processo, com intuito de "convencer o juízo de que o órgão máximo de proteção ao consumidor havia se posicionado a favor da demandada". Em arremate, requer a concessão da gratuidade judiciária, bem como o conhecimento e provimento do recurso (EVENTO 39).

Ato contínuo, a requerida apresentou contrarrazões (EVENTO 45), rebatendo as teses da parte contrária e pugnando pela manutenção da sentença.

Por fim, o acionante restou intimado para comprovar sua míngua financeira (EVENTO 59), cumprindo o comando judicial no EVENTO 51.

VOTO

1. Da admissibilidade

No que se refere ao juízo de admissibilidade, tem-se que preenchidos os pressupostos intrínsecos, pois o recurso é cabível e a parte tem legitimidade e interesse recursal, inexistindo fatos impeditivos ou extintivos do poder de recorrer.

De igual forma, atinente aos pressupostos extrínsecos, verifica-se que o reclamo é tempestivo, está dispensado de preparo (porquanto requerida a gratuidade judiciária - art. 99, §7º, CPC) e apresenta a regularidade formal, motivo por que segue a análise da insurgência.

2. Da gratuidade judiciária

Sobre a benesse pleiteada pelo apelante, dispõe o art. 98 do Código de Processo Civil:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito...

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