Acórdão Nº 0300993-16.2017.8.24.0103 do Terceira Câmara de Direito Civil, 09-02-2021

Número do processo0300993-16.2017.8.24.0103
Data09 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0300993-16.2017.8.24.0103/SC



RELATOR: Desembargador MARCUS TULIO SARTORATO


APELANTE: RICARDO ASSIS PEREIRA (RÉU) APELADO: ELISANGELA DE OLIVEIRA (AUTOR)


RELATÓRIO


Adota-se o relatório da sentença recorrida que é visualizado ao Evento 78, por revelar com transparência o que existe nestes autos, in verbis:
Trata-se de ação de conhecimento, pelo procedimento comum, por meio da qual Elisangela de Oliveira pleiteia o recebimento de reparação por danos morais e materiais em face de Ricardo Assis Pereira, em decorrência do falecimento de seu filho em acidente de trânsito, na data de 26.09.2015, após colisão envolvendo veículo conduzido pelo réu.
O benefício de gratuidade da justiça foi deferido (e. 12).
O réu contestou (e. 47). Alegou não ter tido culpa pelo acidente. Negou ter ingerido bebida alcoólica na ocasião, pois inclusive não pode beber, por motivos de saúde.
A autora replicou (e. 51).
Foi deferida a gratuidade da justiça à parte ré (e. 59).
Foram juntadas informações prestadas pelo INSS (e. 67).
Foi realizada audiência de instrução, em que foram ouvidas dez testemunhas (e. 70).
As partes apresentaram alegações finais (e. 75 e 76).
É o relatório.
O MM. Juiz Substituto da 1ª Vara da Comarca de Araquari, Dr. Tiago Loureiro Andrade decidiu a lide nos seguintes termos:
Ante o exposto, julgo procedente em parte o pedido (CPC, art. 487, I), a fim de:
a) condenar o réu ao pagamento de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a título de reparação por danos morais; e
b) condenar o réu ao pagamento de pensão mensal em favor da autora, no valor de R$ 1.216,66 (mil e duzentos e dezesseis reais e sessenta e seis centavos), da data do fato até a data em que a vítima completaria 25 anos, sendo então reduzido pela metade, devendo ser pago até a data em que a vítima completaria 73 anos.
Os valores deverão ser atualizados e acrescidos de juros de mora, nos termos da fundamentação.
Considerando a sucumbência mínima da parte autora, condeno o réu ao pagamento das custas e de honorários advocatícios, os quais fixo em 12% (doze por cento) do valor da condenação (CPC, art. 85, § 2º).
A exigibilidade das verbas sucumbenciais fica suspensa, por força da concessão do benefício de gratuidade da justiça (e. 59).
Publique-se, registre-se e intimem-se.
Transitada em julgado, arquivem-se.
Inconformado, o réu interpôs recurso de apelação (Evento 93), no qual sustenta a impossibilidade de fixação de pensão por morte, em razão da ausência de comprovação de dependência econômica. Alega a inexistência de nexo de causalidade entre o suposto dano moral e acidente, de maneira que a indenização deve ser afastada. Subsidiariamente, requer a minoração do valor dos danos morais.
Em contrarrazões (Evento 98), a autora postula o desprovimento do recurso

VOTO


1. No caso em apreço, constitui fato incontroverso o acidente de trânsito envolvendo o veículo conduzido pelo réu e o veículo no qual trafegava, como passageiro, o filho da autora, ocorrido na data de 26.09.2015, na BR-280, e que teve o último como vítima fatal.
A respeito do danos materiais, estabelece o art. 948, II, do Código Civil que, no caso de morte, "a indenização consistirá na prestação de alimentos à pessoa a quem o morto os devia [...]".
Para determinar a quem o falecido devia alimentos e, portanto, estabelecer quem faz jus à pensão alimentícia mencionada pelo dispositivo em comento, há de se avaliar dois aspectos: a) a existência de vínculo de parentesco entre o falecido e aquele que postula a pensão (CC, art. 1.694 e ss.) e b) a dependência econômica entre este e aquele.
Sem que essas circunstâncias estejam devidamente demonstradas nos autos, não é possível acolher o pedido formulado pelo pretendente, em atenção à regra geral do ônus da prova, prevista no art. 373, I, do CPC.
No caso de famílias de baixa renda, a jurisprudência tem estabelecido a presunção de dependência econômica dos genitores em caso de morte de filhos menores, dispensando-lhes do ônus de prová-la nos autos. Como a realidade brasileira mostra que os filhos menores, uma vez atingindo a idade laboral, usualmente contribuem com o sustento doméstico, não seria mesmo razoável negar o direito à indenização aos genitores somente porque não foram capazes de comprovar o exercício de atividade remunerada pelo menor, proibida, aliás, pela Constituição (REsp 653.597/AM, Rel. Ministro Castro Meira, j. em 24.08.2004).
Esse entendimento, contudo, não se estende às hipóteses de filhos maiores, ainda que seus pais detenham condições econômicas precárias. Nesses casos, até porque não é de difícil produção, há de vir aos autos a prova de que o filho auxiliava-os efetivamente com o sustento, sob pena de se indenizar danos meramente hipotéticos, o que não se harmoniza com o instituto dos lucros cessantes.
O Superior Tribunal de Justiça já foi chamado a se manifestar sobre o assunto, tendo na ocasião realizado a necessária distinção entre o casos de filhos menores e de filhos maiores, reconhecendo que, no caso de morte dos últimos, não se pode presumir a dependência econômica dos genitores (REsp 1372889/SP, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, j. em 13.10.2015). Pela clareza dos argumentos, transcreve-se abaixo trecho do voto proferido pelo Min. Paulo de Tarso Sanseverino:
O pensionamento é devido, na dicção do art. 948, II, do Código Civil/2002, às pessoas a quem o morto devia alimentos, devendo-se, a partir dessa regra, estabelecer quem são as vítimas por ricochete, credoras da obrigação de indenizar.
O reconhecimento de uma pessoa como pensionista é o resultado de uma equação jurídico-econômica, que conduza à conclusão de que ela era efetivamente dependente da vítima direta falecida.
Verifica-se, inicialmente, a vinculação jurídica com o enquadramento do postulante nas regras acerca da obrigação de alimentos, que estão elencadas nos arts. 1.694 e s. do Código Civil/02.
Há necessidade de vínculo de parentesco entre o pretendente a pensionista e o falecido, englobando, assim, em tese, os cônjuges, os companheiros, os ascendentes, os descendentes e os irmãos (art. 1.697 do Código Civil/02).
Em segundo momento, identifica-se a efetiva dependência econômica do pretendente em relação ao falecido na época do óbito. Ou seja, o pretendente à condição de pensionista devia viver efetivamente sob a dependência econômico-financeira da vítima do ato ilícito.
Na doutrina clássica de Clóvis Beviláqua, localiza-se a seguinte anotação no sentido de que "aos filhos menores e à viúva serão devidos alimentos (art. 233, V), qualquer que seja a sua situação econômica; ao marido caberá também igual direito, porque a mulher é sua consorte e auxiliar nos encargos da família" (BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil comentado. 1952. v.5. Rio de Janeiro: Francisco Alves. p. 302-303).
Contrario sensu, em relação aos demais familiares, há necessidade de comprovação da dependência econômica efetiva.
Se o familiar não...

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