Acórdão Nº 0301042-55.2017.8.24.0039 do Sétima Câmara de Direito Civil, 27-10-2022

Número do processo0301042-55.2017.8.24.0039
Data27 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301042-55.2017.8.24.0039/SC

RELATOR: Desembargador ÁLVARO LUIZ PEREIRA DE ANDRADE

APELANTE: CIDADE DAS ARAUCARIAS INCORPORACAO DE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA APELADO: STELA MARIA PINTO VARELA

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interpostos contra a sentença proferida na ação de rescisão de contrato c/c indenização por danos materiais e morais que move Stela Maria Pinto Varela em face de Cidade das Araucárias Incorporação de Empreendimentos Imobiliários Ltda., na qual o Magistrado de origem julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial.

Adota-se o relatório da decisão recorrida (Evento 34 - SAJ1G):

"Stela Maria Pinto Varela, devidamente qualificado, ingressou com o presente Procedimento Comum/PROC contra Cidade das Araucárias Incorporação de Empreendimentos Ltda., também qualificado, alegando que as partes celebraram em 23.11.2014 Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda de Imóvel emConstrução - Apto n. A14, Empreendimento Campos da Serra 1, devidamente descrito na inicial, sendo convencionado o pagamento de R$ 145.000,00, com entrada de R$ 66.500,00, e o saldo restante do contrato à vista ou através de financiamento. Aponta que após pagar R$ 65.000,00 referente à entrada sequer foi iniciada a obra, sendo que a requerida justificou o não início da obra pelo fato de que o banco financiador não teria liberado recursos, todavia não houve qualquer informação de tal dependência ao consumidor, discorrendo acerca de abusividades de cláusulas contratuais e apontando que a situação apresentada gerou abalo moral passível de indenização.

Ao final requereu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, bem como declarar a rescisão contratual por culpa exclusiva da requerida, com a devolução integral dos valores, bem como condenando o requerido ao pagamento de multa contratual e indenização por danos morais.

Liminar deferida para averbar no registro do imóvel a existência da presente ação.

Apresentada emenda à inicial para que a devolução dos valores seja efetuada de forma dobrada.

Audiência de conciliação inexitosa.

Em resposta apontou o Requerido, preliminarmente, pela impugnação da concessão dos benefícios da justiça gratuita, bem como, no mérito, após discorrer acerca do CDC e sobre os contratos de adesão, apontou que o contrato prevê prazo de 24 meses para entrega do imóvel contados a partir da liberação do crédito advindo de financiamento bancário na modalidade de imóvel na planta, o que não seria abusivo, suscitando ainda exceção de contrato não cumprido, uma vez que não obteve o financiamento do imóvel. Aponta ainda a impossibilidade de condenação a repetição de indébito em dobro. Defende a ausência de qualquer dano moral passível de indenização. Requereu ao final a improcedência dos pedidos.

Houve réplica.

O Ministério Público se manifestou acerca da impugnação ao benefício da justiça gratuita, defendendo sua revogação.

Possível o julgamento antecipado do feito, nos moldes do art. 355, I do Código de Processo Civil, pois não há necessidade de produção de outras provas.

É o relatório".

Acrescenta-se que a sentença foi publicada em 11-10-2018, de cujo dispositivo extrai-se:

"Isto posto, nos autos de Procedimento Comum /PROC nº 0301042-55.2017.8.24.0039, em que é Autor Stela Maria Pinto Varela, e Requerido Cidade das Araucárias Incorporação de Empreendimentos Ltda., JULGO PROCEDENTE EM PARTE os pedidos formulados na inicial, no que CONDENO o requerido à devolução do valor de R$ 66.500,00 (sessenta e seis mil e quinhentos reais) referente ao contrato de compra e venda de imóvel descrito na inicial, com correção monetária pelo INPC/IBGE (CGJ/SC) a contar de cada desembolso e juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, com aplicação da multa contratual de 10% (dez por cento) sobre tal valor, bem como CONDENO o requerido ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), devendo incidir correção monetária pelo INPC/IBGE (CGJ/SC), desde o arbitramento, e juros de mora (1% ao mês), a contar da citação (obrigação contratual, art. 405 do C.C.).

Tendo em vista que houve sucumbência mínima da autora na demanda, nos termos do art. 86, parágrafo único, do CPC, condeno o réu ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados na forma do art. 85, §2º, do CPC, em 10% sobre o valor da condenação.

P. R. I.

Transitado em julgado, arquive-se".

Inconformada, a parte ré interpôs recurso de apelação (Evento 39 - SAJ1G), alegando, em linhas gerais: a) preliminarmente, a nulidade da sentença, nos termos dos artigos 11 e 489, inciso II e §1°, inciso IV do Código de Processo Civil, por carência de fundamentação; b) que o Magistrado afastou na sentença a impugnação ao benefício da justiça gratuita, o que, todavia, deve ser reformado, já que a autora/apelada recebe vencimento líquido superior a R$ 4.000,00 (quatro mil reais); c) quanto ao mérito, não restou demonstrado o inadimplemento contratual, já que "é muito clara na relação contratual entre as partes, a incumbência da Apelada quanto à obtenção do financiamento para quitação do saldo devedor, bem como o prazo estipulado para entrega da unidade: 24 meses contados da entrega da unidade"; d) quando menos, que os danos morais sofridos pela autora não restaram demonstrados, o que impõe o afastamento da reparação determinada na sentença, ou, subsidiariamente, a sua minoração para R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Pugnou, nestes termos, pelo conhecimento e provimento do recurso.

De seu turno, parcialmente inconformada, a autora aderiu ao recurso da ré (Evento 43 - SAJ1G), aduzindo, em suma: a) que os sócios Aristides Bertuol Netto e Daniel Dias Takase devem ser condenados solidariamente junto com a pessoa jurídica demandada, nos termos do artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor; b) o valor pago a título de arras deve ser devolvido em dobro, nos termos do artigo 418 do Código Civil; c) os honorários sucumbenciais fixados em favor do seu Advogado devem ser majorados ao patamar máximo (20% sobre o valor da condenação), diante do zelo e do trabalho desempenhado; d) os juros de mora de 1% ao mês devem incidir a contar da data de cada desembolso. Requereu, assim, o conhecimento e provimento do apelo.

Houve contrarrazões ao apelo e ao recurso adesivo (Eventos 44 e 48 - SAJ1G).

Os autos ascenderam a esta Corte, ocasião em que foram originariamente distribuídos à Primeira Câmara de Direito Civil, sob a relatoria do então Des. Jorge Luis Costa Beber, tendo sido redistribuídos, depois disso, outras duas vezes, e, com o advento da Sétima Câmara de Direito Civil desta Corte, foram, enfim, redistribuídos, por sorteio, a este relator (Eventos 5, 9, 11 e 16 - SAJ2G).

A parte ré compareceu aos autos informando que foi deferido o seu pedido de recuperação judicial, pugnando, em função disso, pelo "cancelamento da constrição imposta sobre o patrimônio da empresa recuperanda, tendo em vista a inutilidade da manutenção dessa constrição, uma vez que o crédito perseguido pela parte Requerente nesta demanda configura crédito sujeito, cujo recebimento se dará no âmbito do processo de recuperação judicial, e não nesta demanda individual" (Evento 19 - SAJ2G).

O pedido foi indeferido (Evento 27 - SAJ2G), decisão contra a qual a ré/apelante interpôs agravo interno (Evento 34 - SAJ2G).

Sobreveio contrarrazões da apelante/agravada (Evento 46 - SAJ2G).

É o suficiente relatório.

VOTO

A publicação da decisão profligada é ulterior ao início de vigência da Lei 13.105/2015, ocorrida em 18-3-2016 (art. 1.045), razão pela qual os requisitos de admissibilidade seguem a novel regulamentação, em conformidade com o Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

Presentes os respectivos pressupostos de admissibilidade, passa-se à análise dos recursos, a iniciar-se, dada a prejudicialidade, pelo recurso da parte ré.

1. Do recurso da parte ré

1.1 Da preliminar de nulidade da sentença

A parte ré inaugurou seu recurso alegando a nulidade da sentença, por carência de fundamentação, em afronta aos artigos 11 e 489, inciso II e §1°, inciso IV do Código de Processo Civil.

A insurgência não prospera.

O art. 489, § 1º, IV, do CPC disciplina o assunto:

Art. 489. São elementos essenciais da sentença:

[...]

§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

[...]

IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador.

O Magistrado não está obrigado ao enfrentamento explícito dos dispositivos de lei e princípios aplicáveis, desde que, de forma fundamentada (CF, art. 93, IX), componha o litígio, ainda que o faça com suporte em justificativa adversa.

O CPC/2015, a propósito, corrobora tal entendimento sedimentado sob a égide do CPC/1973, porque dispensa expressamente a análise de argumentos incapazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador (art. 489, § 1º, IV).

A propósito, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero lecionam:

"[...] o Superior Tribunal de Justiça, já na vigência do CPC, ainda tem insistido que 'O julgador não está obrigado a responder todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida' (STJ, Corte Especial, Edcl no AgRg nos EREsp 1.483.155/BA, rel. Min. Og Fernandes, j. 15.06.2016, DJe 03.08.2016). No mesmo sentido, já afirmou aquela Corte que "O art. 489 do CPC/2015 impõe a necessidade de enfrentamento dos...

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