Acórdão Nº 0301069-21.2015.8.24.0035 do Sexta Câmara de Direito Civil, 20-10-2020

Número do processo0301069-21.2015.8.24.0035
Data20 Outubro 2020
Tribunal de OrigemItuporanga
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0301069-21.2015.8.24.0035, de Ituporanga

Relator: Desembargador André Carvalho

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CONDENATÓRIA À INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS AFORADA CONTRA A CELESC. INTERRUPÇÃO ABRUPTA NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. PARALISAÇÃO DO PROCESSO DE SECAGEM DO FUMO EM ESTUFA. PERDA NA QUALIDADE DA PRODUÇÃO. PROCEDÊNCIA NA INSTÂNCIA DE ORIGEM. RECURSO DA CONCESSIONÁRIA.

ADMISSIBILIDADE. PEDIDO DE ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO À INSURGÊNCIA. PRETENSÃO PREJUDICADA PELO JULGAMENTO DEFINITIVO DA RECLAMO. IRRESIGNAÇÃO NÃO CONHECIDA NO PONTO.

OBRIGAÇÃO INDENITÁRIA. FALHA NO SERVIÇO PRESTADO SOB A MODALIDADE DE CONCESSÃO. OMISSÃO ESPECÍFICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA EM RELAÇÃO AOS DANOS CAUSADOS AOS USUÁRIOS (ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ART. 14 DO PERGAMINHO CONSUMERISTA).

NEXO DE CAUSALIDADE. LIAME SUBJETIVO INCONTESTE ENTRE OS DANOS À PRODUÇÃO DE FUMO E À INTERRUPÇÃO DO SERVIÇO DE ENERGIA. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE NÃO VERIFICADAS. ADEQUAÇÃO ADMINISTRATIVA QUE NÃO ILIDE A OBRIGAÇÃO REPARATÓRIA. INTEMPÉRIES CLIMÁTICAS. FORTUITO INTERNO AO SERVIÇO DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO DO USUÁRIO À AQUISIÇÃO DE GERADOR ALTERNATIVO. PRESTAÇÃO DO SERVIÇO QUE INCUMBE À CONCESSIONÁRIA RÉ. DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE.

A conformidade ao marco regulatório do setor elétrico não afasta, por si só, a obrigação de reparar os danos causados aos consumidores em decorrência da prestação anômala dos serviços.

Salvo condições extraordinárias, as intempéries do clima constituem fortuito interno à atividade de distribuição de energia elétrica, não encerrando excludente idônea ao afastamento do dever de indenizar.

Não há que se falar em obrigação do consumidor à aquisição de gerador alternativo, porquanto à concessionária de energia elétrica incumbe a adequada prestação dos serviços.

LAUDO PERICIAL PRODUZIDO EXTRAJUDICIALMENTE. IDONEIDADE À COMPROVAÇÃO DOS PREJUÍZOS. CONTRADITÓRIO OPORTUNIZADO. CONCESSIONÁRIA QUE DEIXOU DE RECOLHER OS HONORÁRIOS PERICIAIS. PRODUÇÃO DA PROVA EM JUÍZO OBSTADA.

CONSECTÁRIOS LEGAIS. DECISÃO QUE DETERMINA A INCIDÊNCIA DA CORREÇÃO MONETÁRIA DESDE O EFETIVO PREJUÍZO (SÚMULA 43 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA) E DOS JUROS DE MORA A PARTIR DA CITAÇÃO (ART. 405 DO CÓDIGO CIVIL). CONFORMIDADE AO ENTENDIMENTO PRETORIANO MAJORITÁRIO. ALTERAÇÃO DESPICIENDA. DECISUM MANTIDO.

CONTRARRAZÕES. PEDIDO DE CONDENAÇÃO DA APELANTE NAS PENAS POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INACOLHIMENTO.

HONORÁRIOS RECURSAIS. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0301069-21.2015.8.24.0035, da comarca de Ituporanga 1ª Vara em que é Apelante Celesc Distribuição S.A. e Apelado Tarcílio Raimundo.

A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, em Sessão Extraordinária Virtual, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nesta extensão, negar-lhe provimento, fixando-se honorários sucumbenciais recursais, nos termos da fundamentação. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o(a)s Exmo(a)s. Sr. Des. André Luiz Dacol e Sra. Desa. Denise Volpato (presidente com voto).

Florianópolis, 20 de outubro de 2020.

Desembargador André Carvalho

Relator

RELATÓRIO

Adoto, por economia processual e em homenagem à sua completude, o relatório da sentença de fls. 86-95, da lavra do Magistrado Giancarlo Rossi, in verbis:

Trata-se de ação de indenização movida por Tarcílio Raimundo contra Celesc Distribuição S/A, ambos qualificados nos autos. Objetiva a parte autora, basicamente, ser ressarcida de danos sofridos em razão da perda na qualidade de fumo que estava em processo de secagem e cura, em estufa que deixou de funcionar, por seguidas horas, em virtude da interrupção no fornecimento de energia elétrica, conforme dados informados na inicial. Valorou a causa, estimou os danos com base em laudo extrajudicial, juntou documentos e requereu a procedência da pretensão inaugural.

Citada, a parte ré apresentou resposta em forma de contestação. Disse não ser caso de responsabilidade objetiva. Defendeu a ausência de culpa e a possibilidade de interrupção do fornecimento de energia elétrica em casos emergenciais. Em suma, negou qualquer responsabilidade no evento. Impugnou o valor requerido pela parte autora. Aduziu ser necessária a realização de média ponderada entre as produções das safras anteriores e da safra reclamada. Pugnou pela improcedência do pedido inicial e juntou documentos.

Houve réplica.

Determinou-se a realização de perícia judicial, mas a parte ré, intimada para apresentar quesitos e para recolher os honorários periciais, mesmo advertida das consequências de eventual inércia, não se manifestou muito menos depositou os honorários.

É o relatório.

Segue parte dispositiva da decisão:

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado pela parte autora contra Celesc Distribuição S/A., na forma do artigo 487, I, do Novo Código de Processo Civil e, em consequência, CONDENO a ré ao pagamento de R$ 20.720,00, devendo o valor ser corrigido a partir de 26/1/2015, pelo índice adotado pela e. Corregedoria Geral de Justiça (Provimento n. 13/95), com juros moratórios de 1% ao mês contados da citação.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação, conforme art. 85, § 2º, do Novo Código de Processo Civil.

Em caso de recurso, intime-se a parte apelada para contrarrazões, após, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. (grifos originais)

Inconformado com a prestação jurisdicional entregue, a concessionária interpôs a apelação de fls. 99-131, alegando, em síntese, que: (i) a despeito das efetivas quedas de energia, estaria a concessionária cumprindo as metas de fornecimento estipuladas pela ANEEL, cuja regularidade administrativa afastaria a ilicitude da conduta impugnada; (ii) intempéries climáticas de força extrema seriam a causa das quedas no serviço, encerrando hipótese de caso fortuito (ou força maior); (iii) a parte autora deveria ter adquirido gerador de energia elétrica alternativo, com o fito de evitar os prejuízos em discussão, não podendo imputar sua desídia à empresa ré; (iv) há culpa exclusiva do consumidor, porquanto a omissão no pleito de adequação da potência de energia elétrica seria a causa direta dos danos supostamente experimentados; (v) a inversão do ônus da prova não seria cabível no caso em deslinde; (vi) o Código de Defesa do Consumidor não seria aplicável à espécie; (vii) inexiste nexo de causalidade entre a conduta da concessionária e o evento danoso, bem como que o implemento dos danos materiais não estaria comprovado à espécie.

Requer, assim, a reforma do decisum, a fim de que seja julgada improcedente a pretensão autoral. Sucessivamente, caso não seja este o entendimento deste Órgão Fracionário pugna pela modificação do dies a quo dos juros de mora e da atualização monetária para que incidam a partir do arbitramento.

Contrarrazões ofertadas pelo autor às fls. 138-144 pleiteando o desprovimento do reclamo e a condenação da ré nas penas por litigância de má-fé, afirmando, para tanto, que a insurgência ostenta caráter meramente procrastinatório.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Mário Luiz de Melo manifestando o desinteresse do parquet no feito (fl. 151).

Por intermédio do interlocutório de fls. 157-158 o Eminente Des. Rodolfo Tridapalli reconheceu a incompetência das Câmaras de Direito Público deste Sodalício para julgamento da quaestio e determinou a sua redistribuição a uma das Câmaras de Direito Civil competentes.

Após, vieram-me os autos conclusos.

É o necessário escorço do processado.

VOTO

Ab initio, convém assentar que a publicação da decisão objurgada ocorreu na vigência do novo Código de Processo Civil. Logo, o caso será analisado sob a égide do referido regramento, consoante preconiza o Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça.

Passa-se à análise da insurgência.

Prima facie, constata-se que o apelo, embora próprio, tempestivo e munido de preparo, merece ser conhecido apenas em parte.

Isso porque a pretensão de recebimento da insurgência no duplo efeito resta prejudicada devido ao julgamento definitivo do reclamo, efetuado neste momento, por este colegiado.

Superada tal quaestio, passa-se à análise do recurso, na extensão que comporta conhecimento.

Como visto, trata-se de apelação cível interposta por Celesc Distribuição S.A. no bojo da "ação de indenização por dano material" movida por Tarcílio Raimundo em desfavor da concessionária de energia, tendo o Magistrado a quo julgado procedentes os pedidos declinados à petição inicial.

Primeiramente, vale gizar que a circunstância relativa à ocorrência das quedas de energia elétrica restou incontroversa ao longo da instrução, porquanto afirmado pela parte autora e reconhecido pela demandada, limitando-se o apelo à abordagem de teses jurídicas com o fito de afastar a obrigação indenitária, devendo ser apreciado sob essa perspectiva.

No mais, impende registrar que o caso vertente atrai a incidência da legislação consumerista, vez que a apelante enquadra-se de maneira precisa no art. 3º, caput, do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: "Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços".

Dessarte, em face da normativa inserta no art. 14 do pergaminho de regência, tem-se que a empresa ré, na qualidade de fornecedora dos serviços de energia elétrica, deve responder objetivamente "pela reparação dos...

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