Acórdão Nº 0301073-19.2016.8.24.0166 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 20-02-2020

Número do processo0301073-19.2016.8.24.0166
Data20 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemMeleiro
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0301073-19.2016.8.24.0166, de Meleiro

Relator: Desembargador Tulio Pinheiro

APELAÇÃO CÍVEL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO CP/CDC. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.

RECURSO DA PARTE RÉ.

POSTULADA CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA. HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA COMPROVADA. BENESSE CONCEDIDA. SENTENÇA REFORMADA. PREPARO RECURSAL DISPENSADO.

MÉRITO. SUSTENTADA IMPOSSIBILIDADE DE MANEJO DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ARGUIÇÃO DE QUE A VIA AFIGURA-SE MEIO EXCESSIVAMENTE GRAVOSO PARA A PARTE DEVEDORA, ANTE O ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL DO CONTRATO, SENDO, PORTANTO, SOMENTE CABÍVEL A CONVERSÃO DO FEITO EM EXECUÇÃO. DESCABIMENTO DA SÚPLICA. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL QUE NÃO SE APLICA À ESPÉCIE. ALTERAÇÃO DO ENTENDIMENTO DESTE ÓRGÃO FRACIONÁRIO. INCOMPATIBILIDADE DA APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL COM OS DITAMES DO DECRETO-LEI N. 911/1969. NECESSIDADE DA OBSERVÂNCIA DA ORIENTAÇÃO FIRMADA NO RECURSO ESPECIAL N. 1.418.592/MS (RECURSO REPETITIVO). IMPRESCINDIBILIDADE DO PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA, ESTA ENTENDIDA COMO OS VALORES APRESENTADOS E COMPROVADOS PELO AUTOR NA INICIAL, PARA EVITAR A CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE DO BEM COM O CREDOR FIDUCIÁRIO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE. CABIMENTO, NESTE CONTEXTO, DO AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO, A TEOR DO ART. 3º DO DECRETO-LEI N. 911/69.

PRETENDIDA LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS ÀS MÉDIAS DE MERCADO. ACOLHIMENTO. AFERIÇÃO DA ABUSIVIDADE QUE DEVE SE PAUTAR PELA MÉDIA PRATICADA PELO MERCADO, ADMITIDA ALGUMA VARIAÇÃO, DESDE QUE NÃO ABUSIVA, A FIM DE NÃO SE DESCONSTITUIR A ESSÊNCIA DO ENCARGO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CÂMARA. TAXAS PACTUADAS QUE, NA HIPÓTESE, SUPLANTAM AS MÉDIAS DE MERCADO EM MAIS DE 10% (DEZ POR CENTO). SITUAÇÃO INDICATIVA DE EXCESSO. REFORMA DA SENTENÇA NO PONTO, A FIM DE LIMITAR ÀS REFERIDAS MÉDIAS QUE SE IMPÕE.

DEFENDIDA ILEGALIDADE DA CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. NÃO ACOLHIMENTO. CONTRATO QUE EXPRIME A DIVERGÊNCIA NUMÉRICA ENTRE O DUODÉCUPLO DOS JUROS MENSAIS E OS JUROS ANUAIS. CAPITALIZAÇÃO EXPLICITADA E SUFICIENTE A AUTORIZAR A COBRANÇA DO ENCARGO.

REQUERIDA DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. DESCABIMENTO. CONSTATAÇÃO DE ABUSIVIDADE DE ENCARGO DA NORMALIDADE - IN CASU, JUROS REMUNERATÓRIOS EXCESSIVOS - QUE, POR SI SÓ, NÃO É CAPAZ DE ILIDIR A MORA DO DEVEDOR, SENDO IMPRESCINDÍVEL QUE A REPERCUSSÃO ECONÔMICA DE TAL ABUSIVIDADE, QUANDO CONFRONTADA COM SALDO DEVEDOR EXISTENTE, NÃO SEJA INEXPRESSIVA. RELEVÂNCIA NÃO VERIFICADA NO CASO SUB EXAMINE. REQUERIDO QUE PAGOU APENAS 32 (TINTA E DUAS) DAS 48 (QUARENTA E OITO) PARCELAS AJUSTADAS. AUSÊNCIA DE PROVAS, ADEMAIS, DE DEPÓSITO DO VALOR INCONTROVERSO OU DE CAUÇÃO IDÔNEA. MORA NÃO DESCONFIGURADA.

PREQUESTIONAMENTO. TEMÁTICAS SUSCITADAS EXAMINADAS À SACIEDADE E DE FORMA FUNDAMENTADA. APRECIAÇÃO DE TODOS OS ARGUMENTOS E DISPOSITIVOS APONTADOS PELOS LITIGANTES DESNECESSÁRIA, QUANDO INCAPAZES DE INFIRMAR A CONCLUSÃO ADOTADA PELO JULGADOR.

SUCUMBÊNCIA. MODIFICAÇÃO DOS ÔNUS PARA ADAPTAR-SE AO DESFECHO DO JULGADO. REPARTIÇÃO RECÍPROCA E PROPORCIONAL AO RESULTADO OBTIDO NA LIDE QUE SE OPERA, SUSPENSA A EXIGIBILIDADE EM RELAÇÃO À PARTE DEMANDADA, EM RAZÃO DE SER BENEFICIÁRIA DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

NECESSIDADE DE FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS.

SENTENÇA PUBLICADA APÓS A ENTRADA EM VIGOR DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. IMPOSIÇÃO DO ART. 85, §§ 1º E 11, DA NORMA PROCESSUAL. ÊXITO PARCIAL DO RECURSO. DEVER DA FINANCEIRA APELADA DE ARCAR COM OS HONORÁRIOS DOS ADVOGADOS DO DEMANDADO E RECORRENTE. FIXAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA EM 1% (UM POR CENTO) SOBRE O VALOR DA CAUSA.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0301073-19.2016.8.24.0166, da Comarca de Meleiro (Unidade Regional de Direito Bancário do Litoral Sul Catarinense), em que é Apelante Juliano de Souza Gloeden, e Apelada BV Financeira S.A. Crédito Financiamento e Investimento:

A Terceira Câmara de Direito Comercial decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, a fim de limitar as taxas de juros remuneratórios às médias mercadológicas e redistribuir os ônus sucumbenciais, na proporção de 10% (dez por cento) pela casa bancária autora e de 90% (noventa por cento) pela parte requerida, vedada a compensação do estipêndio advocatício e observada a suspensão da exigência das verbas em relação ao polo consumidor dada a concessão da justiça gratuita; além de condenar a financeira apelada ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, conforme disposto no art. 85, § 11, do Código de Processo Civil vigente. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Sebastião César Evangelista e Des. Gilberto Gomes de Oliveira.

Florianópolis, 20 de fevereiro de 2020.

Desembargador Tulio Pinheiro

PRESIDENTE E RELATOR


RELATÓRIO

No Juízo da Vara Única da Comarca de Forquilhinha, BV Financeira S.A. Crédito Financiamento e Investimento ajuizou ação de busca e apreensão, com pedido liminar, contra Juliano de Souza Gloeden, com amparo na Cédula de Crédito Bancário CP/CDC n. 1109908673, referente ao Veículo Gol 1.0, de Placas IQF 6296 (Autos n. 0301073-19.2016.8.24.0166) (fls. 1/2).

Ao receber a petição inicial, Sua Excelência deferiu a liminar pretendida (fls. 22/23), sendo o mandado de citação e de busca e apreensão, na sequência, cumprido (fl. 46).

A parte ré apresentou contestação e reconvenção, em peça única (fls. 50/93). De início, arguiu, em preliminar, a ausência de constituição em mora do devedor e a necessidade de juntada do original da cédula de crédito bancário. No mérito, defendeu ser inviável o manejo da presente reipersecutória em razão da ocorrência do substancial adimplemento do contrato, na medida em que, conforme alega, pagou 33 (trinta e três) das 48 (quarenta e oito) parcelas acordadas da avença. Outrossim, justificou o adimplemento da dívida em razão de problemas financeiros. Requereu, ainda, a revisão das cláusulas contratuais, nos seguintes termos: a) limitação dos juros remuneratórios à taxa média do Banco Central; b) afastamento da capitalização de juros; c) afastamento da cumulação da comissão de permanência com outros encargos moratórios; d) redução da multa moratória em 2%; e) estipulação do INPC como índice para correção monetária; f) afastamento do IOF; g) restituição do débito ne forma dobrada. Por fim, postulou os benefícios da justiça gratuita e a concessão da tutela de urgência, além da realização de perícia contábil.

Em seguida, o banco autor ofertou réplica (fls. 102/124).

Por decisão de fls. 129/132, Sua Excelência indeferiu o pleito de tutela antecipada formulada na reconvenção e determinou que a parte requerida comprovasse a hipossuficiência financeira alegada.

Após manifestação da parte demandada (fls. 135/165), após a redistribuição do feito à Unidade Regional de Direito Bancário do Litoral Sul Catarinense, sediado na Comarca de Meleiro, o MM. Juiz Marciano Donato sentenciou o feito, de modo a julgar procedente a ação de busca e apreensão, a fim de consolidar a propriedade e a posse plena do bem em favor do banco demandante, além de condenar a parte ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes estabelecidos em 10% (dez por cento) do valor da causa (fls. 191/199).

Insatisfeita, a parte demandada interpôs recurso de apelação. Nas razões do inconformismo, requereu a reforma da sentença, repisando, para tanto, a tese de impossibilidade de manejo da busca e apreensão em razão do adimplemento substancial do contrato. Outrossim, requereu a revisão de cláusulas contratuais, nos seguintes termos: a) limitação dos juros remuneratórios à taxa média do Banco Central; b) afastamento da capitalização de juros; e c) afastamento da mora. Por fim, pleiteou a concessão da gratuidade da justiça e prequestionou a matéria (fls. 203/219).

Após as contrarrazões (fls. 227/233), os autos ascenderam a esta Corte.

Este é o relatório.


VOTO

Da justiça gratuita.

Busca, de início, a parte apelante a concessão do benefício da justiça gratuita.

Preambularmente, tendo em conta a declaração de hipossuficiência à fl. 95, bem como a demonstração, por meio de documentos, de que o recorrente labora como ajudante de produção na empresa Teixeira Têxtil, Indústria e Comércio de Sacarias Ltda. e aufere renda mensal aproximada de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais) (vide holerite acostado à fl. 223), além de, segundo a certidão negativa acostada à fl. 221, não ser proprietário de bem imóvel na comarca em que reside, dá-se provimento ao recurso para deferir o benefício da justiça gratuita, nos termos dos artigos 98 e seguintes do novo Código de Processo Civil, então negada em sentença.

Por corolário, admite-se o recurso, a despeito da ausência do recolhimento do preparo.

Da busca e apreensão como meio de cobrança do crédito e a teoria do adimplemento substancial.

Sustenta o apelante que, por já ter havido o adimplemento substancial do contrato, o meio empregado pela casa bancária para reaver seu crédito - ajuizamento de ação de busca e apreensão - é muito gravoso para a parte devedora, de modo que deve lhe ser facultado o pagamento das parcelas em atraso devidamente corrigidas.

O reclamo, adianta-se, não merece acolhida.

O atual entendimento deste Órgão Fracionário, perfilhado a partir dos julgamentos mais recentes da Corte da Cidadania e de outras Câmaras desta Casa, é no sentido de que a teoria do adimplemento substancial é incompatível com os ditames do Decreto-Lei n. 911/1969 e, portanto, inaplicável ao caso sub examine.

Salienta-se, inicialmente, que, outrora, este Relator vinha entendendo pela possibilidade do reconhecimento do adimplemento substancial da dívida nas...

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