Acórdão Nº 0301163-66.2019.8.24.0022 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 23-11-2021

Número do processo0301163-66.2019.8.24.0022
Data23 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301163-66.2019.8.24.0022/SC

RELATOR: Desembargador ROBSON LUZ VARELLA

APELANTE: ELIAS KEMER ALEXANDRE (RÉU) ADVOGADO: PAOLLA ROSSANA SALOMONE (OAB RS081705) APELADO: BV FINANCEIRA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (AUTOR) ADVOGADO: LILIANE DE CASSIA NICOLAU (OAB PR018256) ADVOGADO: MARLI INACIO PORTINHO DA SILVA (OAB SP150793)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação cível interposto por Elias Kemer Alexandre contra sentença proferida nos autos da ação de busca e apreensão ajuizada por BV Financeira S.A. Crédito, Financiamento e Investimento, nos seguintes termos (doc. 76, evento 69):

Isso posto, ACOLHO a pretensão inicial, consoante art. 487, I, do CPC, e CONFIRO À AUTORA A PROPRIEDADE E A POSSE PLENA do veículo objeto da contratação, nos termos do art. 3º, do Decreto-Lei 911/69.

Condeno o réu ao pagamento das despesas processuais e os honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, suspensos em face do benefício da justiça gratuita que ora se lhe defere.

Foram opostos embargos de declaração, todavia, estes foram rejeitados (doc. 79, evento 77)

Em suas razões recursais (doc. 80, evento 83), sustentou a necessidade de juntada do contrato original; descaracterização da mora e a consequente extinção do feito; mitigação acerca da aplicabilidade do decreto-lei 911/69; aplicação de juros à taxa média de mercado; ilegalidade da capitalização de juros; afastamento da cobrança do IOF, das taxas e tarifas administrativas e do seguro prestamista, inviabilidade de cumulação da comissão de permanência com os demais encargos moratórios e possibilidade de repetição dobrada de valores.

Contrarrazões (doc. 84, evento 91).

Este é o relatório.

VOTO

Insurge-se a parte ré contra sentença de procedência dos pleitos exordiais formulados em sede de ação de busca e apreensão.

De plano, tendo em vista a tese recursal acerca da necessidade de juntada do contrato na via original, adianta-se ser necessária a conversão do julgamento em diligência, pelos fundamentos a seguir reproduzidos.

A Lei n. 10.931, de 2/8/2004, dispõe que a cédula de crédito bancário tem natureza de título de crédito, conforme se destaca:

Art. 26. A Cédula de Crédito Bancário é título de crédito emitido, por pessoa física ou jurídica, em favor de instituição financeira ou de entidade a esta equiparada, representando promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade.

Além disso, segundo o art. 29, §1º, da Lei n. 10.931/2004, a circularidade da cédula de crédito bancário permite a negociação dos direitos dela decorrentes com terceira pessoa mediante endosso em preto:

Art. 29 A Cédula de Crédito Bancário deve conter os seguintes requisitos essenciais:

[...]

§ 1º. A Cédula de Crédito Bancário será transferível mediante endosso em preto, ao qual se aplicarão, no que couberem, as normas do direito cambiário, caso em que o endossatário, mesmo não sendo instituição financeira ou entidade a ela equiparada, poderá exercer todos os direitos por ela conferidos, inclusive cobrar os juros e demais encargos na forma pactuada na Cédula.

Nesse viés, pelo princípio da cartularidade, há necessidade de que a parte credora esteja na posse do documento, sem o qual não poderá exercer seu direito de crédito.

Por essas razões é que se entende indispensável à propositura de ações de execução e de busca e apreensão a apresentação da cédula de crédito bancário na via original, porquanto somente com a respectiva juntada restará comprovado que o credor não negociou o seu crédito.

A esse respeito, extrai-se da lição de Fábio Ulhoa:

Título de crédito é o documento necessário para o exercício do direito, literal e autônomo, nele mencionado. Desse adjetivo do conceito se pode extrair a referência ao princípio da cartularidade, segundo o qual o exercício dos direitos representados por um título de crédito pressupõe a sua posse. Somente quem exibe a cártula (isto é, o papel em que se lançaram os atos cambiários constitutivos de crédito) pode pretender a satisfação de uma pretensão relativamente ao direito documentado pelo título. Quem não se encontra com o título em sua posse, não se presume credor. Um exemplo concreto de observância desse princípio é a exigência do original do título de crédito na instrução da petição inicial de execução. Não basta a apresentação de cópia autêntica do título, porque o crédito pode ter sido transferido a outra pessoa e apenas o possuidor do documento será legítimo titular do direito creditício.

Como o título de crédito se revela, essencialmente, um instrumento de circulação do crédito representado, o princípio da cartularidade é a garantia de que o sujeito que postula a satisfação do direito é mesmo o seu titular (Curso de Direito Comercial. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 396) (sem grifos no original)

Dessarte, a razão da exigência do título na via original não decorre da necessidade de verificação da veracidade de seu conteúdo, mas da sua própria natureza e da sujeição ao princípio da cartularidade, de maneira que, estando a execucional ou a reipersecutória calcada em cédula de crédito bancário, a apresentação de fotocópia autenticada não é documento bastante a embasar a demanda.

Nesse sentido, decidiu a Corte Superior:

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXECUÇÃO. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. APRESENTAÇÃO DO ORIGINAL. POSSIBILIDADE. INDICAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. AGRAVO CONHECIDO PARA, DESDE LOGO, NEGAR SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. [...] o Tribunal a quo, consignou que em razão da cédula de crédito bancário ser título de crédito circulável e sujeito ao princípio da cartularidade, é imprescindível a apresentação do documento original para fins de ajuizamento da ação. Sendo assim, o entendimento adotado pelo Tribunal de origem está em conformidade com a orientação desta Corte, no sentido de que é necessária a juntada de documento original em razão do requisito da Cartularidade (AREsp 584.871/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, publ. em 17/8/2015) (sem grifos no original)

Também, este Tribunal de Justiça:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL...

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