Acórdão Nº 0301196-07.2016.8.24.0040 do Quinta Câmara de Direito Civil, 19-10-2021

Número do processo0301196-07.2016.8.24.0040
Data19 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301196-07.2016.8.24.0040/SC

RELATOR: Desembargador RICARDO FONTES

APELANTE: RICARDO PEDRO MENDONCA GARCIA (AUTOR) APELANTE: CASAALTA CONSTRUCOES LTDA EM RECUPERACAO JUDICIAL (RÉU) APELANTE: JENYFFER RAMIREZ OLIVERA (AUTOR) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Adota-se, por oportuno, o relatório da sentença (ev. 172):

Trata-se de "ação indenizatória c/c obrigação de fazer com pedido de tutela antecipada" ajuizada por Ricardo Pedro Mendonça Garcia e Jenyffer Ramirez Oliveira contra Cassalta Construções LTDA.

Aduz o autor, em apertada síntese, que é arrendatário do imóvel vizinho à obra Mar Grosso Residencial Clube, pertencente à Construtora Casaalta LTDA. Explicou que abriu no local o Hostel Alquimia, com o objetivo de oferecer hospedagem a turistas. Contudo, relatou que a obra vizinha causou inúmeros danos ao seu prédio, em razão da constante queda de materiais daquela construção, o que ocasionou buracos no telhado, goteiras e infiltrações, causando-lhe prejuízos emergentes e lucros cessantes, pois teve prejuízos com hóspedes que não puderam usar as suítes em razão das goteiras. Por fim, postulou o ressarcimento dos danos materiais no importe de R$440.576,90, o pagamento de lucros cessantes no valor de R$405.139,28, e danos morais na quantia de R$ 50.000,00 para cada postulante. Juntou documentos.

Na decisão do Evento 17, o juízo indeferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela.

A conciliação não foi exitosa (Evento 32).

O requerido apresentou resposta na forma de contestação, e postulou, preliminarmente, pela ilegitimidade ativa dos autores, e, no mérito, defendeu a inexistência de danos materiais, lucros cessantes e de danos morais. (Evento 33)

A réplica foi apresentada no Evento 37.

No Evento 45 o juízo indeferiu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor no caso. O feito foi saneado no Evento 51, oportunidade em que foi deferida a produção de prova pericial, e determinada a expedição de ofícios à prefeitura de Laguna e à Associação Brasileira da Indústria de Hotéis, postergando-se a análise da produção de prova testemunhal para momento posterior à perícia.

A resposta do ofício encaminhado à Associação Brasileira da Indústria de Hotéis foi apresentada no Evento 70, 74, 75 e 76.

O laudo pericial consta nos Eventos 113, 114, 115 e 116, o qual foi novamente apresentado de forma organizada no Evento 130.

Intimadas, as partes manifestaram-se sobre o laudo nos Eventos 126 e 128.

O juízo, no Evento 138, indeferiu o pedido de complementação do laudo pericial e designou audiência de instrução e julgamento para a oitiva das testemunhas.

No ato, procedeu-se à oitiva de uma testemunha arrolada pela parte autora, e dispensada a oitiva da testemunha Elisabete de Souza Pacheco.

Aberto o prazo para alegações finais, apenas a parte autora o fez no Evento 152.

É o relatório necessário.

Ato contínuo, o Magistrado da 2ª Vara Cível da Comarca de Laguna resolveu a controvérsia por meio de sentença (ev. 172), com a lavra do seguinte dispositivo:

Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do novo Código de Processo Civil, julgo procedente em parte o pedido formulado por RICARDO PEDRO MENDONCA GARCIA e JENYFFER RAMIREZ OLIVERA para condenar CASAALTA CONSTRUCOES LTDA ao pagamento de:

1. R$14.000,00 (quatorze mil reais) a título de danos materiais, acrescidos de juros de mora a partir do evento danoso (art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ) e correção monetária a partir de cada desembolso (Súmula 43 do STJ).

2. R$10.000,00 (dez mil reais) a cada um dos autores à título de danos morais, acrescidos de juros de mora a partir do evento danoso (art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ) e correção monetária a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ).

Em razão da sucumbência recíproca, deve cada parte arcar com 50% das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, atendendo-se aos parâmetros estabelecidos no artigo 85, §2º do mesmo estatuto.

Ressalto que a exigibilidade da verba sucumbencial a que os autores foram condenados fica suspensa, em razão da concessão do benefício da justiça gratuita.

Irresignada, a Construtora ré interpôs recurso de apelação (ev. 178), em que alegou, preliminarmente, a ilegitimidade ativa dos autores para postular os danos materiais, ainda que decorrentes do ressarcimento dos reparos efetuados, visto que não são proprietários do bem e não comprovaram a que título detinham a posse do imóvel.

No mérito, impugnou a quantificação do dano material, ao argumento de que não houve comprovação de que os materiais comprados pelos autores foram empregados no conserto do imóvel, assim como o ressarcimento deve ser limitado ao valor apurado na perícia técnica. Quanto aos danos morais, postulou o afastamento da condenação, discorrendo que os autores representavam, em verdade, uma sociedade de fato - Hostel Alquimia, que não possui honra subjetiva passível de abalo anímico, ademais a situação configurou mero dissabor do cotidiano. Subsidiariamente, pleiteou a minoração do valor arbitrado. Por fim, requereu a redistribuição dos ônus da sucumbência em desfavor somente da parte autora, a incidência da verba honorária sobre o proveito econômico obtido pela ré, além da concessão do benefício da justiça gratuita.

Na sequência, a parte autora manejou recurso adesivo (ev. 184), no qual pleiteou o reconhecimento de sua legitimidade para postular não somente o ressarcimento do que despendeu nos pontuais reparos, mas também dos danos materiais consistentes no montante suficiente para a reforma do imóvel. No mais, discorreu estar comprovado o severo prejuízo provocado pela obra vizinha, fazendo jus aos lucros cessantes, correspondentes ao que o hostel deixou de lucrar naquele período, e a majoração da verba arbitrada a título de dano moral.

Com as contrarrazões (evs. 184 e 187), os autos ascenderam a esta egrégia Corte para julgamento.

VOTO

De início, pugna a empresa apelante pela concessão da benesse da gratuidade da justiça, inclusive para isentá-la do pagamento do preparo, pois encontra-se em processo de recuperação judicial e conforme seus demonstrativos financeiros não possui condições de arcar com os encargos processuais.

Sobre a matéria, tem-se que a Constituição da República de 1988, especificamente no inciso LXXIV do art. 5º, dispõe o seguinte: "O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos".

Aliado a isso, o atual Código de Processo Civil (CPC) preconiza, em seu art. 98, que "a pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei".

Todavia, diferentemente do que ocorre com a pessoa física (art. 99, §3º, do CPC), não há presunção de vulnerabilidade econômica pela simples apresentação de declaração de hipossuficiência, devendo a pessoa jurídica demonstrar a sua condição de precariedade financeira.

A esse respeito, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que "diferentemente do que ocorre com a pessoa física, que para concessão da justiça gratuita não precisa demonstrar exaustivamente sua hipossuficiência, a outorga desta benesse para pessoa jurídica, com fins lucrativos ou não, requer a comprovação objetiva de sua impossibilidade de arcar com as custas processuais" (AgRg. no Ag. n. 526.227/SP, Terceira Turma Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe de 23-8-2011).

Na hipótese vertente, apesar de a recuperação judicial da empresa não ser causa determinante para a concessão da assistência judiciária gratuita, a análise dos documentos apresentados na apelação demonstra a hipossuficiência alegada.

Os balancetes acostados (ev. 178, outros 2 e 3) revelam que a recorrente possui um déficit - diferença entre ativos e passivos - que ultrapassa 70.000.000,00 (setenta milhões de reais). Além disso, seus extratos bancários (ev. 178, extrato 4-9) registram operações negativas, o que corrobora com a impossibilidade de arcar com as custas e despesas processuais.

A propósito, este Órgão Fracionário já se debruçou sobre os demonstrativos da empresa ré e decidiu por conceder-lhe o benefício pleiteado em outros feitos. Veja-se: Apelação n. 0006225-04.2013.8.24.0045, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Rel. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 11-08-2020.

Há que se ressaltar, no entanto, que o benefício será concedido a partir do momento em que o pedido de gratuidade foi realizado, o que ocorreu somente nesta esfera recursal, produzindo seus efeitos a partir deste momento, ou seja, a fim de desobrigar a apelante do recolhimento do preparo e do pagamento de eventuais honorários recursais.

Desse modo, concede-se o benefício da justiça gratuita com efeitos ex nunc - somente a partir da...

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