Acórdão Nº 0301196-98.2016.8.24.0139 do Sexta Câmara de Direito Civil, 12-07-2022

Número do processo0301196-98.2016.8.24.0139
Data12 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301196-98.2016.8.24.0139/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ CARVALHO

APELANTE: PAULO ROBERTO BITDINGER (AUTOR) ADVOGADO: JULIANA FRANKEN (OAB SC042833) APELANTE: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU) ADVOGADO: JULIANO RICARDO SCHMITT (OAB SC020875) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Adoto, por economia processual, o relatório da sentença (evento 43), da lavra do Magistrado André Luiz Anrain Trentini, in verbis:

Trata-se de ação indenizatória ajuizada por Paulo Roberto Bitdinger, qualificada nos autos, em face de Banco Bradesco S/A, igualmente qualificado, por meio da qual requer o pagamento de indenização por danos materiais e morais em razão da manutenção indevida do gravame de alienação fiduciária de bem já quitado.

A tutela requerida foi deferida às fls. 167/169.

Devidamente citado o requerido contestou às fls. 178/186.

Sobreveio réplica às fls. 199/227.

A parte autora requereu a concessão de tutela de evidência às fls. 118/126.

Os autos vieram conclusos. É o relatório.

Segue parte dispositiva da decisão:

Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados pela autora e, com base no artigo 487, I, do NCPC, resolvo o mérito para CONFIRMAR o pedido de urgência deferido às fls. 167/169, e:

a) CONDENAR a ré a pagar à autora o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de indenização por danos morais, corrigido monetariamente pelo INPC a partir desta data e acrescido de juros moratórios legais a contar da citação;

b) DETERMINAR a baixa definitiva do gravame de alienação fiduciária em garantia, assim como averbação no prontuário do veículo, da informação de perda total e bem fora de circulação. Automóvel Kia/Clarus, MAV 7257, renavam 706808274, sendo dispensável a expedição de ofício, porquanto já providenciado por ocasião do deferimento do pedido de urgência;

c) DECLARAR que toda e qualquer dívida inerente a bem, vencidos após 29/10/2001, sejam de integral responsabilidade da parte requerida.

Considerando que a parte autora decaiu de parte mínima do pedido, CONDENO a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, com base no artigo 85, §2º, do NCPC.

P.R.I.

Inconformado com a prestação jurisdicional entregue, o banco réu interpôs apelação cível (evento 48), alegando, preliminarmente, a nulidade do decisum por ausência de fundamentação, bem como a ausência de pretensão resistida.

No mérito, argumentou a culpa exclusiva do autor, que não lhe entregou a sucata do automóvel, fato que impossibilitou a baixa do veículo junto à autoridade de trânsito.

No mais, argumentou a impossibilidade de cumprimento da decisão, a uma porque o automóvel ainda está registrado em nome do apelado; a duas porque se trata de bem sucateado, não havendo que se falar em cobrança de impostos e demais verbas. Logo, no seu entender, há de ser expedido ofício à autoridade de trânsito competente, a fim de que se proceda à baixa das dívidas do veículo e para que este seja reconhecido como sucateado.

Além disso, sustentou que a indenização por danos morais merece ser afastada ou, quando muito, minorada. Outrossim, que os juros moratórios incidentes sobre eventual condenação devem fluir a partir do arbitramento.

Igualmente irresignado, o demandante manejou reclamo adesivo (evento 53), requerendo, inicialmente, a concessão da gratuidade judiciária e, no mérito, tão somente, a majoração do quantum indenizatório e da verba honorária.

Contrarrazões ofertadas por ambos os contendores, pugnando prefacialmente, pelo não conhecimento das insurgências adversas, por suposta violação ao princípio da dialeticidade e, sucessivamente, o seu desprovimento (eventos 52 e 57).

Na sequência, este Relator proferiu despacho, determinando que o recorrente adesivo instruísse o pedido de gratuidade judiciária, o que restou cumprido (eventos 11 e 14, ambos do caderno processual de 2º grau)

Após, vieram-me, novamente, os autos conclusos.

É o necessário escorço do processado.

VOTO

Admissibilidade

Ab initio, convém assentar que a publicação da decisão objurgada ocorreu na vigência do novo Código de Processo Civil. Logo, o recurso será admitido sob a égide do referido regramento, consoante preconiza o Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça.

Fixada esta premissa, passa-se à análise da tese de ofensa ao princípio da dialeticidade, ventilada em ambas as contraminutas, porquanto potencialmente prejudicial ao conhecimento das insurgências.

Pois bem. Em contrarrazões, ambos os contendores defendem a inadmissibilidade dos recursos adversários por suposta violação ao princípio da dialeticidade.

Todavia, sem razão. Explica-se.

Como é cediço, o recorrente deve deixar claras as razões ensejadoras de seu inconformismo, fazendo constar os fundamentos de fato e de direito que demonstram a sua intenção de ter reformada a decisão proferida em primeira instância.

Em outras palavras, é absolutamente imprescindível que o recurso seja dialético, ou seja, que nele conste de forma explícita e precisa as razões pelas quais o decisum deve ser modificado, sob pena de não conhecimento.

Acerca do tema, extrai-se da doutrina:

Não há forma rígida à motivação. A versão originária do art. 531, revogada pela Lei 8.950/1994, exigia a interposição dos embargos infringentes mediante artigos.Essa mudança não significa que inexistem requisitos para o cumprimento satisfatório do princípio da dialeticidade. É preciso que haja simetria entre o decidido e o alegado no recurso. Em outras palavras, a motivação deve ser, a um só tempo, específica, pertinente e atual. [...] Entende-se por impugnação específica a explicitação dos elementos de fato e as razões de direito que permitam ao órgão ad quem individuar com precisão o error in indicando ou o error in procedendo objeto do recurso. (ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 109-110; grifo acrescido).

Ademais, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a reprodução dos argumentos elencados na petição inicial ou na contestação não implica, por si só, ofensa ao princípio da dialeticidade. Leia-se:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO NÃO CONHECIDA. INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE.CONFIGURAÇÃO. ART. 514, II, DO CPC.1. A reprodução da petição inicial nas razões de apelação não enseja, por si só, ofensa ao princípio da dialeticidade, consoante entendimento pacífico deste Superior Tribunal.2. Na hipótese não houve impugnação suficiente dos fundamentos da sentença.3. Agravo regimental não provido.(STJ, AgRg no AREsp 832.883/RS, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j.26-4-2016, DJe 13-5-2016, o original não ostenta os grifos).

In casu, ambos os recorrentes deixaram claras as razões ensejadores de seu inconformismo e, embora a parte ré tenha reproduzido em seu apelo as teses ventiladas em contestação, dela não é cópia integral.

Assim, havendo correlação entre os argumentos trazidos nos recursos submetido à análise deste colegiado e os fundamentos que embasaram o decisum vergastado, não há falar em inadmissibilidade por violação ao princípio da dialeticidade.

Rechaça-se, portanto, a preliminar aventada.

Ainda no que tange à admissibilidade, não obstante a ausência de recolhimento do preparo pelo recorrente adesivo, oportuno salientar que, mesmo antes da vigência da novel legislação processual civil, esta Corte já entendia estar "dispensado o preparo nos recursos em que o mérito verse acerca da concessão ou não da gratuidade, sem prejuízo de exigência posterior" (Ato Regimental n. 84/2007-TJ).

Essa interpretação foi acolhida expressamente pelo novo codex, porquanto positivou-se que, uma vez "requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento" (art. 99, § 7º, do Digesto Processual).

Dito isso, satisfeitos os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conhece-se das insurgências.



Justiça Gratuita



Antes de mais nada, pertinente analisar o pleito de justiça gratuita formulado pela recorrente.

Cediço que o benefício da justiça gratuita possui estatura constitucional, cujo dispositivo assim prescreve: "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" (art. 5º, inciso LXXIV, da CRFB/1988).

Na dicção de Araken de Assis, a benesse da gratuidade se insere no contexto das políticas públicas destinadas a remover os "obstáculos inibidores ou impeditivos do acesso à Justiça, a exemplo da desigualdade social e econômica, expressadas na situação de extrema pobreza" (ASSIS, Araken de. Processo Civil Brasileiro. Vol. I: Parte Geral. 2ª Edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 401).

Conveniente trazer a lume, igualmente, lição doutrinária do Ministro Alexandre de Moraes, que assim refere-se ao instituto:

A Constituição Federal, ao prever o dever do Estado em prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos, pretende efetivar diversos outros princípios constitucionais, tais como igualdade, devido processo legal, ampla defesa, contraditório e, principalmente, pleno acesso à Justiça. Sem assistência jurídica integral e gratuita aos hipossuficientes, não haveria condições de aplicação imparcial e equânime de Justiça (MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 8ª Edição. São Paulo: Atlas, 2011. p. 404).

Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, o tema ganhou nova roupagem, atualizando-se as antigas disposições previstas na Lei n. 1.060/1950, cujo fragmento pertinente reproduz-se a seguir:

Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.

§ 1º Se...

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