Acórdão Nº 0301211-55.2015.8.24.0025 do Primeira Câmara de Direito Público, 26-10-2021

Número do processo0301211-55.2015.8.24.0025
Data26 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301211-55.2015.8.24.0025/SC

RELATOR: Desembargador PAULO HENRIQUE MORITZ MARTINS DA SILVA

APELANTE: PATRICIA SCHEIDT MARQUES (AUTOR) APELANTE: MUNICÍPIO DE GASPAR (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Patrícia Scheidt Marques propôs "ação ordinária" em face do Município de Gaspar.

Alegou que: 1) é servidora pública ocupante do posto de desenhista; 2) exerceu a função de Secretária Municipal de Planejamento e Desenvolvimento de 13-4-2010 a 13-1-2014; 2) atua como Secretária Municipal de Turismo Indústria e Comércio desde 14-1-2014 e 3) no exercício dos cargos políticos jamais recebeu 13º salário e férias.

Postulou o pagamento das rubricas.

Em contestação, o réu sustentou que: 1) é incabível o pagamento de 13º salário e adicional de férias em favor dos agentes políticos, sob pena de ofensa direta à CF; 2) ainda que se admita o recebimento pelos secretários municipais, este só é permitido quando expressamente previsto em lei e 3) já procede ao respectivo pagamento, pois a LM n. 2.511/2004 estabelece que as rubricas estão contempladas no subsídio percebido pela autora (autos originários, Evento 13).

Foi proferida sentença cuja conclusão é a seguinte:

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por Patrícia Scheidt Marques na presente Ação de Cobrança ajuizada em face do Município de Gaspar e, em consequência:

a) CONDENO o Município de Gaspar/SC ao pagamento do terço constitucional das férias usufruídas pela autora no período em que ocupou cargo de Secretária Municipal junto ao requerido (13/04/2010 e 10/06/2015), observada a remuneração percebida à época de cada fruição, valores que deverão ser atualizados pelo IPCA-E, desde a data que deveriam ter sido pagos, e acrescidos de juros de mora pelo índice de remuneração da caderneta de poupança, consoante a Lei Federal n. 11.960/2009;

b) CONDENO o Município de Gaspar/SC ao pagamento do décimo terceiro salário relativo ao período em que a autora ocupou cargo de Secretária Municipal junto ao requerido (13/04/2010 e 10/06/2015), observada a remuneração percebida no período aquisitivo respectivo, valores que deverão ser atualizados pelo IPCA-E, desde a data que deveriam ter sido pagos, e acrescidos de juros de mora pelo índice de remuneração da caderneta de poupança, consoante a Lei Federal n. 11.960/2009;

c) ESTABELEÇO a obrigação do Município de Gaspar/SC em assegurar o pagamento das referidas verbas (terço de férias e 13º salário) à autora, enquanto ocupar o cargo de Secretário Municipal, na forma do direito ora reconhecido em sentença em favor da funcionária pública Patrícia Scheidt Marques;

d) REJEITO o pedido de condenação do Município de Gaspar/SC ao pagamento do saldo de férias ainda não usufruído pela autora, o qual deverá ser objeto de fruição oportuna, assegurada a indenização apenas caso a autora entre na inatividade ou seja exonerada do Serviço Público Municipal;

e) DECLARO A INCONSTITUCIONALIDADE, de forma incidental, do parágrafo único do artigo 3.º da Lei Municipal n.º 2.511/2004, do Município de Gaspar/SC; e

f) RESOLVO O MÉRITO do presente feito, forte no art. 487, I, do Código de Processo Civil.

Diante da sucumbência recíproca, tendo a autora decaído de parte mínima (indenização de férias ainda não usufruídas), deverá arcar com 20% (vinte por cento) das custas processuais, enquanto o município requerido fica isento de recolhimento de seu percentual (80%), na forma do disposto no art. 7.º, I, Lei Estadual n. 17.654/2018 (Regimento de Custas).

De outro lado, arca o município requerido com o pagamento dos honorários advocatícios do procurador da autora, fixados em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico obtido, e aqueles devidos pela autora ao procurador do requerido em R$ 1.045,00 (mil e quarenta e cinco reais), ex vi do disposto no art. 85, §§ 2.º, 3.º, I e 4.º, do CPC, vedada a compensação (CPC, art. 85, § 14). (autos originários, Evento 38)

O requerido, em apelação, argumentou que: 1) a LM n. 2.511/2004 é constitucional; 2) somente é viável o pagamento das rubricas aos agentes políticos se lastreado em lei; 3) no caso, as verbas estão incluídas na remuneração mensal; 4) o TJSC já reconheceu a validade de lei local que incluiu no subsídio o 13º salário e as férias; 4) em observância ao princípio da legalidade, é incabível o pagamento e 5) em recente julgamento, o STF "reafirmou que a concessão de gratificação natalina e o terço de férias a agente político com base exclusivamente na Constituição, apesar de inexistente previsão no direito local, implicou na má aplicação da tese firmada por esta Corte" (autos originários, Evento 43).

Contrarrazões no Evento 49 dos autos originários.

Em recurso adesivo, a demandante aduziu que: 1) jamais usufruiu férias no período em que atuou como Secretária Municipal, as quais devem ser indenizadas ou concedidas com base no cargo então exercido, acrescido do terço constitucional e 2) não houve sucumbência recíproca, pois ao ser declarada a inconstitucionalidade da Lei Municipal foi reconhecido o direito ao recebimento do 13º salário e ao gozo/indenização das férias (autos originários, Evento 50).

Contrarrazões no Evento 56 dos autos originários.

VOTO

1. Apelo do Município de Gaspar

Caso análogo foi recentemente julgado por esta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C COBRANÇA. ADMINISTRATIVO. ALCAIDE. AGENTE POLÍTICO. SUBSÍDIO FIXADO EM PARCELA ÚNICA. FÉRIAS ACRESCIDAS DO TERÇO CONSTITUCIONAL E GRATIFICAÇÃO NATALINA. CONVERSÃO EM INDENIZAÇÃO. POSSIBILIDADE. EXEGESE DOS ARTS. 7º, VIII E XVII, E 39, §§ 3º E 4º, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRECEDENTES DA CORTE.

Os agentes políticos [...] fazem jus, por força do § 3º, do art. 39, da Constituição Federal de 1988, ao décimo terceiro salário e ao gozo de férias remuneradas, acrescidas do terço constitucional. No entanto, enquanto em atividade no serviço público somente lhes é devido o valor relativo ao décimo terceiro salário, não cabendo a conversão em pecúnia do valor das férias vencidas e não gozadas, uma vez que poderão ser usufruídas oportunamente, com a remuneração acrescida do terço constitucional. A indenização das férias vencidas e não usufruídas na atividade só é devida quando o servidor deixar o serviço público' (Apelação Cível n. 2006.046354-7, de Curitibanos, Relator: Des. Jaime Ramos, Quarta Câmara de Direito Público, j. 26/06/2008)" (AC n. 0005660-22.2012.8.24.0030, de Imbituba, rel. Des. Paulo Ricardo Bruschi, j. 5-4-2018). (TJSC, Des. Jorge Luiz de Borba). (AC n. 0309707-26.2017.8.24.0018, de Chapecó, rel. Pedro Manoel Abreu, Primeira Câmara de Direito Público, j. 19-5-2020)

Em resumo, nos dois casos, os autores são agentes políticos e requereram indenização das gratificações natalinas e das férias não usufruídas, acrescidas do terço constitucional.

Nesse ponto, colhe-se do voto como razão de decidir, porque há identidade de teses jurídicas:

Cinge-se a demanda em definir se o autor/apelante possui ou não direito de recebimento de férias, terço constitucional de férias e gratificação natalina durante o exercício do mandado de cargo eletivo (Prefeito de Nova Itabaraba/SC).

O art. 7º, incisos VIII e XVII, da Constituição Federal, assegura aos trabalhadores urbanos e rurais, o recebimento de "décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria" (inciso VIII) e o "gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal" (inciso XVII).

Por sua vez, o art. 39, § 3º, da Carta Magna, prevê que "aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir".

Já o §4º do mesmo art. 39 da Constituição Federal, dispõe que "o membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI".

Esse evidente conflito de normas que, sabidamente, causou profundas dissidências jurisprudenciais foi solucionado pela Corte Suprema em sede de repercussão geral (Tema 484 - RE n. 650.898) que fixou a tese de que "o artigo 39, parágrafo 4º, da Constituição Federal não é...

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