Acórdão Nº 0301246-05.2017.8.24.0135 do Quinta Câmara de Direito Civil, 20-10-2020

Número do processo0301246-05.2017.8.24.0135
Data20 Outubro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301246-05.2017.8.24.0135/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROS

APELANTE: CRISTHIANE LEHMANN (AUTOR) ADVOGADO: PAULO SOARES (OAB SC007208) APELANTE: GRACIELA REGINA CUNHA (AUTOR) ADVOGADO: PAULO SOARES (OAB SC007208) APELANTE: RENATO HOWE (AUTOR) ADVOGADO: PAULO SOARES (OAB SC007208) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Por refletir fielmente o contido no presente feito, adoto o relatório da r. sentença (ev. 31 do primeiro grau):

"Cristiane Lehmann, Renato Howe e Graciela Regina Cunha ajuizaram a presente Ação de Rescisão de Contrato em face de Banco do Brasil S/A; alegaram, em síntese, que a primeira requerente adquirira do requerente Renato Howe terrenos situados no município de Balneário de Gaivotas lotes 01 a 30 da quadra 13 do loteamento praia de Ipacaraí matriculados sob nº 57081 a 57110, adquiridos através pelo requerente Renato através de processo de concorrência pública nº 104/2006 firmado com o Banco do Estado santa Catarina (BESC), sucedido pelo requerido.

No entanto ao regularizar a transferência dos imóveis, tiveram conhecimento de que havia ordem judicial averbada nas matrículas dos mesmos (autos administrativos n° 08/2011), com a informação da inexistência física dos loteamentos. Requerera a rescisão do contrato e indenização por perdas e danos.

Citada, a parte ré apresentou contestação intempestivamente (fls.273/179) e (fls.400 a 406).

Houve réplica".

Acresço que o Togado a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos, por meio da sentença cujo dispositivo segue transcrito:

"Do exposto, resolvendo o mérito da lide, com fundamento no art. 487, I, do CPC, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para:

a) Declarar a inexistência do negócio jurídico firmado entre o Banco do Estado de Santa Catarina S/A, sucedido pelo Branco do Brasil S/A, e Renato Howe, e dos negócios jurídicos sucessivos, quais sendo, entre o requerente Renato e a requerente Cristiane Lehmann, determinando o retorno das partes ao status quo ante;

b) Condenar o requerido Banco do Brasil à restituição em favor do requerente Renato Howe do valor pago, no importe de R$ 31.975,80, corrigido monetariamente segundo os índices da CGJ/SC.

Considerando a sucumbência recíproca, condeno as partes ao rateio das custas processuais remanescentes, na proporção de 60% para a parte passiva e 40% para a parte ativa, conforme art. 85 do CPC.

Fixo honorários devidos ao patrono da parte autora, em 10% sobre o valor atualizado da condenação ".

Irresignado, BANCO DO BRASIL S.A. interpõe apelação, na qual alega, em preliminar, a falta de interesse de agir dos autores, pois este é "secundário, instrumental e pressupõe o interesse material. Se a parte demandante [nem] sequer prova este último, obviamente que lhe falta interesse de agir, porquanto o provimento jurisdicional pleiteado não será adequado nem trará utilidade prática às partes".

No mérito, sustenta: a) "não há que se falar em abuso da Instituição Financeira Apelante ou irregularidade na venda dos lotes à época", uma vez que a parte apelada sabia muito bem o que estava pactuando e adquirindo; b) os recorridos não comprovam "que o Banco tenha agido com má-fé ou falha na prestação dos seus serviços que tenha contribuído com qualquer falha na contratação ora discutida"; c) "evidente que a não reforma da presente decisão seria aceitar que uma cliente, após utilizar-se dos serviços do banco quando necessita, e concordar com os termos do contrato, pleiteie a devolução dos valores por se arrepender da aquisição, ou seja, por mero arrependimento"; d) a apelada contratou com a instituição financeira, de livre e espontânea vontade, "porque concordou com o conteúdo do processo de concorrência pública nº104/2006 devendo, por isso, serem respeitadas as manifestações de vontade das partes (pacta sunt servanda)"; e) "o contrato firmado entre as partes é indiscutivelmente válido, e isto é de meridiana clareza, haja vista que os signatários são civilmente capazes, o objeto é lícito e sua forma não é defesa em lei, tudo em perfeita consonância com o disposto no artigo 104, do Código Civil"; e f) "imutável é o que se contratou, sob pena de lesão ao princípio pacta sunt servanda, da força obrigatória do contrato e da Boa-fé, entendimento este não só consagrado na doutrina como na jurisprudência pátria" (ev. 36 do primeiro grau).

Também inconformados, CRISTHIANE LEHMANN, GRACIELA REGINA CUNHA e RENATO HOWE apelam, sustentando: a) foram induzido a erro pelo recorrido, que, "agindo de forma negligente ao efetuar a venda de múltiplos terrenos que [nem] sequer possuem área física, cometeu ato ilícito"; b) assim, por força dos arts. 186 e 927 do Código Civil, "o recebimento das indenizações pleiteadas pelos apelantes é medida que se impõe, ante o dano sofrido em virtude do negócio fraudulento que foram levadas a celebrar"; c) partindo-se da premissa de que "os lucros cessantes consistem na diminuição potencial do patrimônio do credor, pelo que deixou de ganhar em razão da culpa do devedor [...] evidente que [estes] devem ser balizados visando o que a recorrente lucraria caso os imóveis adquiridos existissem fisicamente"; d) o prejuízo, desse modo, deve ser apurado com base nas avaliações dos imóveis, caso existentes, apresentadas no processo; e) ademais, "os apelantes criaram toda uma expectativa de lucros sobre os lotes adquiridos, tanto que participaram do leilão atraídos que foram pelo banco apelado, sendo indiscutível, aos olhos da teoria da aparência, os prejuízos experimentados em relação aos lucros cessantes que almejaram com os lotes arrematados"; f) por sua vez, "o Código Civil, prevê que em havendo declaração de nulidade do contrato, há dever de indenização do apelante pelas perdas e danos, conforme artigo 182 do CC"; g) sem olvidar da incidência da Súm. n. 479 do Superior Tribunal de Justiça, de modo que "requer seja declarada a responsabilidade objetiva do apelado, bem como reconhecido o dever de indenizar os apelantes pelos danos sofridos em decorrência do negócio celebrado"; h) "diante do evidente ato ilícito praticado pelo apelado, o que resultou no reconhecimento da inexistência do negócio jurídico, indispensável a aplicação de juros de mora na atualização do valor a ser restituído"; e i) durante os anos de 2008 a 2015, "segundo comprovantes anexos aos autos, foi dispendido o montante de R$ 6.220,55 (seis mil, duzentos e vinte reais e cinquenta e cinco centavos)" a título de pagamento de IPTU, de modo que esse valor deve ser restituído à apelante Cristhiane (ev. 40 do primeiro grau).

Intimados (ev. 37 e 41 do primeiro grau), ambos os apelados apresentaram contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso adverso (ev. 45-46 do primeiro grau), com o que os autos ascenderam a esta Corte para julgamento.

VOTO

1 Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, o reclamo merece ser conhecido, passando-se, desta forma, à respectiva análise.

2 Recurso do Banco

2.1 Afirma o recorrente que falta interesse processual, pois este é "secundário, instrumental e pressupõe o interesse material. Se a parte demandante [nem] sequer prova este último, obviamente que lhe falta interesse de agir, porquanto o provimento jurisdicional pleiteado não será adequado nem trará utilidade prática às partes".

A ação de nulidade contratual é baseada em alegação de que imóveis foram comprados do Banco, mas, quando os adquirentes tentaram registrar a operação, vieram a descobrir que foi averbada em respectivas matrículas ordem judicial com a informação da inexistência física dos...

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