Acórdão Nº 0301290-82.2016.8.24.0030 do Quarta Câmara de Direito Público, 07-04-2022

Número do processo0301290-82.2016.8.24.0030
Data07 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301290-82.2016.8.24.0030/SC

RELATOR: Desembargador DIOGO PÍTSICA

APELANTE: MUNICÍPIO DE IMBITUBA/SC (RÉU) APELADO: LEONI GERALDO DE SOUZA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Imbituba, Leoni Geraldo de Souza ajuizou "ação ordinária" contra o Município.

À luz dos princípios da economia e celeridade processual, por sintetizar de forma fidedigna, adoto o relatório da sentença (Evento 98, 1G):

Leoni Geraldo de Souza ajuizou "ação ordinária com pedido de antecipação de tutela" em face do Município de Imbituba, ambos qualificados, alegando, em síntese, que apresenta Transtorno Depressivo Recorrente (CID 10 F 33.2), razão pela qual necessita dos fármacos Donaren 50 mg e Venlaxin 150 mg.

Afirmou, entretanto, que o custo do tratamento é elevado e que suas condições financeiras não lhe permitem a aquisição do medicamento. Aduziu, ainda, a impossibilidade de utilização das alternativas terapêuticas fornecidas pelo SUS.

Diante de tal situação, pleiteou a antecipação dos efeitos da tutela e, ao final, requereu a confirmação da medida antecipatória, para que os réus sejamcompelidos ao fornecimento do fármaco descrito na petição inicial, sob pena de aplicação de multa diária.

Juntou procuração e documentos (fls.10-17).

Após a emenda da inicial (fls. 39/40), a interlocutória de fls. 43-47 deferiu a antecipação dos efeitos da tutela, concedeu os benefícios da Justiça Gratuita, designada a perícia médica e determinou a citação do réu.

Devidamente citado, o demandado ofertou resposta às fls.67-84. Aduziu ilegitimidade passiva para a causa, requerendo o chamamento ao processo da União. No mérito, sustentou que não houve negativa administrativa e que, assim, não pode ser responsabilizado, buscando a improcedência do pedido. Acostoudocumentos.

A decisão de fls. 97-99 saneou o feito.

O laudo pericial aportou aos autos às fls. 124-126, sobre o qual se manifestaram à fl. 134.

A decisão de fl. 143 concedeu a inclusão dos medicamentos Calcitotal (cálcio, vitamina D e vitamina K2) e Colflex (colágeno hidrolisado).

Houve designação de nova perícia médica para análise dos fármacos inclusos, o qual foi acostado laudo às fls. 165/166.

Com vista dos autos, o Ministério Público opinou pela procedência dos pedidos autorais (fls. 176-179).

Vieram-me os autos conclusos.

Devidamente instruída, a lide foi julgada nos seguintes termos (Evento 98, 1G):

Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na presente ação promovida por Leoni Geraldo de Souza contra o Município de Imbituba, para confirmar a decisão que concedeu a antecipação dos efeitos da tutela, determinando que o réu promova o fornecimento dos medicamentos Colflex, Donaren Retard (Trazodona) e Venlaxin.

Revogo parcialmente a decisão que condeceu a tutela antecipada referente ao fármaco calcitotal.

A título de contracautela, deverá a parte autora apresentar, anualmente, diretamente à Gerência de Saúde que lhe entregar a medicação, atestado médico atualizado indicando a necessidade da utilização dos respectivos fármacos.

Sem custas, em virtude do disposto na Lei Complementar 156/97.

Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), com base no art. 85, § 3°, do Código de Processo Civil. Sentença não sujeita a reexame necessário.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, não havendo pendências, arquivem-se os autos com as devidas cautelas.

Irresignado, o Município de Imbituba recorreu. Argumentou que: a) é parte ilegítima para configurar o polo passivo da ação, visto que "as responsabilidades quanto à prestação mesma de serviços de saúde, ou seja, as responsabilidades referentes à execução das ações finalísticas, dividem-se entre a União, os Estados e os Municípios"; b) "necessário, portanto, o chamamento ao processo, ao polo passivo dos demais entes estatais"; c) "a espécie tem que ser analisada sob a perspectiva hermenêutica da reserva do possível"; d) "quanto à questão da hipossuficiência, cabe o(a) autor(a) comprovar, cabalmente, sua condição de hipossuficiência". Por fim, pugnou pelo prequestionamento da matéria (Evento 113, 1G).

Em síntese, requereu:

1. seja reformada a sentença para exclusão dos honorários de sucumbência fixados em face do apelante;

2. alternativamente ao pedido acima, requer a minoração dos honorários fixados.

3. A reversão do ônus sucumbencial em favor do ente municipal, com a condenação do apelado ao pagamento de honorários sucumbenciais no importe de R$ 1.000,00 (um mil reais).

4. A fixação de honorários de sucumbência em sede recursal, de acordo com o art. 85 §10 do CPC.

5. Reformar a sentença, declarando a ilegitimidade passiva do Município, extinguindo o feito à luz do art. 485, VI do CPC;

6. Reformar a sentença, determinando o chamamento ao processo dos demais entes federados (União e Estado de Santa Catarina, se for o caso), declarando-os legítimos para o polo passivo, como coobrigados em substituição ao Município;

7. Reformar a sentença, cassando a liminar deferida e desobrigando o Município a fornecer o fármaco;

8. Determinar o retorno dos autos à primeira instância para realização de diligências que possam comprovar ou não a permanência da situação de hipossuficiência do autor e de sua família;

9. Alterar a sentença no ponto referente ao valor dos honorários, REDUZINDO o valor arbitrado;

10. Reformar a sentença no ponto sobre a concessão da assistência judiciária, declarando a não comprovação cabal da hipossuficiência do autor, condenando-o ao pagamento das custas, honorários periciais e advocatícios a serem arbitrados nos termos do art. 85 do CPC;

11. Determinar que eventual bloqueio ou sequestro online de valores via BACENJUD não se dê sobre as contas do Município, eis que restou demonstrado que o(s) referido(s) medicamento(s) não é(são) de responsabilidade deste Ente Federativo (Município), consoante as responsabilidades pactuadas via Sistema Único de Saúde, por se tratar de procedimento de alta complexidade ou, alternativamente seja realizado, proporcionalmente ou em partes iguais, sobre as contas de todos os Entes (União, Estado, Município).

Sem contrarrazões, os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e parcial provimento do reclamo (Evento 11, 2G).

É o relatório.

VOTO

O recurso merece ser conhecido, porquanto tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade.

Recebo o apelo em seus efeitos legais.

Ab initio, não se desconhece que "a jurisprudência sedimentada deste Sodalício entendia pela ampla solidariedade dos entes federativos na obrigação de fornecimento das prestações de saúde, em decorrência do disposto no art. 196 da Constituição Federal, sendo facultado à parte autora escolher em face de qual(is) ente(s) federado(s) a demanda será proposta, recaindo a responsabilidade sobre qualquer deles e não podendo ser fracionada" (TJSC, Apelação n. 0302029-21.2017.8.24.0030, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Desa. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. 19-08-2021).

Ainda, "o funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, dos Estados e dos Municípios, de modo que qualquer um desses entes tem legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso a medicamentos para tratamento de problema de saúde" (STJ - AgRg no AREsp nº 264840, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 26/05/2015).

Tal posicionamento encontra respaldo, inclusive, no Recurso Extraordinário n. 855.178/SE, em 6-3-2015, (Tema n. 793 de Repercussão geral), de relatoria do Exmo. Sr. Ministro Luiz Fux, in verbis:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. (RE 855178 RG, Relator(a): Luiz Fux, Tribunal Pleno, Julgado em 05/03/2015, Processo Eletrônico Repercussão Geral - Mérito Dje-050 Divulg 13-03-2015 Public 16-03-2015).

Nesse viés, diante do julgamento do Tema n. 793, ficou estabelecido competir à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro, não se referindo à formação do polo passivo da demanda.

Acerca da matéria, a fim de evitar tautologias, por consubstanciar circunstância correlata que merece idêntica solução, ratifico a intelecção professada pelo eminente Desembargador Jaime Ramos, quando do julgamento do agravo de instrumento n...

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