Acórdão Nº 0301293-42.2018.8.24.0038 do Primeira Câmara de Direito Público, 25-01-2022

Número do processo0301293-42.2018.8.24.0038
Data25 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301293-42.2018.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador PAULO HENRIQUE MORITZ MARTINS DA SILVA

APELANTE: NORBERTO DAVET (AUTOR) APELANTE: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Norberto Davet propôs "ação declaratória de inexistência de débito c/c indenização por danos materiais e morais" em face de Celesc Distribuição S.A.

Alegou que: 1) é proprietário de duas unidades consumidoras de energia elétrica, ambas ligadas no endereço Estrada do Pico, Poste 14, Lote 7, Pirabeiraba, Joinville/SC, onde funciona o parque aquático Recanto Davet; 2) em setembro/2017, a ré realizou vistoria no local e constatou algumas irregularidades que em nada afetavam a medição; 3) realizou as modificações exigidas e permaneceu aguardando a vistoria; 4) em 16-10-2017, funcionários da demandada compareceram ao local e alegaram que o lacre estava rompido e que a energia não estava sendo corretamente medida, mas que já haviam resolvido a situação; 5) sem qualquer notificação, recebeu faturas elétricas no valor de R$ 53.057,60 para a unidade consumidora n. 11622313 e outra no valor de R$ 63.874,86 para a unidade n. 11622321; 6) tentou resolver a questão administrativamente, porém, sem sucesso; 7) em 22-1-2018, a ré efetuou a suspensão do fornecimento de energia elétrica da unidade n. 11622313, causando danos para sua subsistência e de sua família, bem como ao estabelecimento que funciona no local; 8) a outra unidade consumidora está na iminência de ter o fornecimento de energia elétrico suspenso e 9) sofreu dano moral e material.

Postulou o restabelecimento do fornecimento de energia elétrica, a declaração de inexistência de débito e indenização por dano moral e material.

A tutela de urgência foi deferida (autos originários, Evento 6).

Em contestação, a ré sustentou que: 1) o motivo da interrupção foi a constatação de irregularidade, a inadimplência e omissão quanto aos vícios encontrados; 2) nas duas unidades consumidoras os lacres do medidor estavam violados, os bornes de entrada e saída invertidos e o ramal da carga ligado direto no disjuntor; 3) solicitou que o autor apresentasse esclarecimentos e regularizasse os débitos, apurados em conformidade com a Resolução n. 414/2010 da ANEEL; 4) é encargo do consumidor tomar as devidas precauções com os equipamentos que estão em sua posse; 5) o requerente acompanhou a fiscalização, tendo, inclusive, recorrido administrativamente; 6) o cálculo obedeceu o art. 130, III, da Resolução 414/2010, da ANEEL, inexistindo irregularidades e 7) a interrupção da energia foi legal, de modo que devem ser julgados improcedentes os pleitos de dano moral e material (autos originários, Evento 19).

Foi proferida sentença cuja conclusão é a seguinte:

Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, ACOLHO PARCIALMENTE os pedidos deduzidos por Norberto Davet em desfavor de Celesc Distribuição S/A para:

a) Declarar ilegal a interrupção da prestação de serviços de energia na Unidade Consumidora n° 11622313 que teve como fundamento as faturas discutidas nestes autos;

b) Condenar a ré ao pagamento de compensação por dano moral no importe de R$2.000,00 (dois mil reais), atualizados monetariamente pelo INPC desde a sua fixação e com juros de mora de 1% (um por cento) ao mês desde a interrupção.

Em consequência, JULGO o feito com resolução de mérito e mantenho a tutela de urgência concedida no evento 13, revogo a tutela concedida no evento 37.

Considerando a sucumbência recíproca, condeno ambas as partes ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, na proporção de 70% para o autor e 30% para o réu. Fixo esses últimos no importe de 15% (dez por cento) do valor atualizado da condenação, nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil. [...] (autos originários, Evento 56)

Ambas as partes apelaram.

O autor reiterou os argumentos da inicial e postulou a redistribuição dos ônus sucumbenciais (autos originários, Evento 60).

A ré argumentou que o corte de energia obedeceu os procedimentos legais, de modo que não é cabível indenização por dano moral (autos originários, Evento 64).

Contrarrazões nos Eventos 73 e 74 dos autos originários.

VOTO

1. Irregularidade na medição

A sentença proferida pelo MM. Juiz Uziel Nunes de Oliveira deve ser confirmada por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razão de decidir:

Consta na exordial que a ré realizou duas vistorias nas unidades consumidoras do autor. Na primeira - ocorrida em setembro - foi constatado irregularidades, as quais teriam sido sanadas por conduta própria. Por sua vez, na segunda - ocorrida em outubro - teria sido constada nova irregularidade, concernente à violação do lacre e erro na medição. Todavia, essa última teria sido sanada na própria vistoria, sendo sequer entregue laudo pericial ou fotografias. Apesar disso, restaram emitidas duas faturas com altos valores, decorrentes das irregularidades constatadas na última fiscalização, isto é, em outubro.

Em contestação, a ré confirmou que as faturas são decorrentes da vistoria realizada em outubro, tendo sido respeitado o processo administrativo, nos termos da resolução nº 414/2010, da ANEEL. Asseverou o exercício regular do direito, sendo responsabilidade do autor tomar os cuidados necessários com os equipamentos sob sua posse.

Pois bem, diante de tais fatos, é imperioso afastar os fundamentos do autor relativos a primeira fiscalização, isto é, a de setembro. Ora, em que pese tenham sido sanados os flagelos apontados na primeira vistoria, adianto que esses não possuem relação com a dívida. Essa, tem como causa direta e imediata a vistoria realizada no mês de outubro, ou seja, o "medidor com os lacre violados e medição (bornes de entrada e saída) invertidos; ramal da carga ligado direto no disjuntor, não passando pela medição".

Afasto os argumentos quanto aos efeitos decorrentes da primeira vistoria na segunda. Saliento que se tratam de fiscalizações diversas, com fatos geradores diversos. Ademais, a tese que a parte autora insistiu na instrução relativa a possibilidade de verificar a irregularidade no lacre pelo funcionário que faz a medição mensalmente não procede. Tal qual esclarecido pela testemunha Jesana Mattos Nunes da Silva, esse funcionário não possui a capacidade de constatar tais flagelos, visto que não é técnico.

Dito isso, passo a análise da regularidade da fiscalização de outubro, fato gerador das faturas que são objetos desta lide.

O réu trouxe à baila o Termo de Ocorrência e Inspeção - TOI datado de outubro de 2017 (19; 28-29 e 33-34). Nesse, consta a informação de que o lacre estaria violado, bem como os problemas para a realização da correta medição. Consta também a assinatura de recebimento, mas essa é incontroversa, pois o próprio autor descreve tal vistoria na peça vestibular. Anoto que, após tal constatação, houve notificação sobre as irregularidades, bem como apresentação dos cálculos que embasaram as faturas reclamadas. Uma ordem de fiscalização, enviada para o e-mail do autor também foi emitida, informando acerca das irregularidades.

Outrossim, a testemunha Cléber dos Santos Andrade explicou o procedimento de vistoria, afirmando que o laudo pericial se trata do próprio Termo de Ocorrência e Inspeção. Dessa forma, cabe afastar os argumentos relativos à ausência do laudo.

Ainda, a testemunha confirmou as irregularidades existentes no local, informando o acompanhamento da vistoria por um senhor, bem como o aviso de necessária padronização.

Não obstante, cumpre trazer à baila a condição de prestadora de serviços públicos da ré. Com efeito, seus atos gozam de presunção de legitimidade e veracidade. Nesse sentido, ensina Maria Sylvia Di Pietro:

Embora se fale em presunção de legitimidade ou de veracidade como se fossem expressões com o mesmo significado, as duas podem ser desdobradas, por abrangerem situações diferentes. A presunção de legitimidade diz respeito à conformidade do ato com a lei; em decorrência desse atributo, presumem-se, até prova em contrário, que os atos administrativos foram emitidos com observância da lei. A presunção de veracidade diz respeito aos fatos; em decorrência desse atributo, presumem-se verdadeiros os fatos alegados pela Administração. Assim ocorre com relação às certidões, atestados, declarações, informações por ela fornecidos, todos dotados de fé pública. Diversos são os fundamentos que os autores indicam para justificar esse atributo do ato administrativo: 1.o procedimento e as formalidades que precedem a sua edição, os quais constituem garantia de observância da lei; 2.o fato de ser uma das formas de expressão da soberania do Estado, de modo que a autoridade que pratica o ato o faz com o consentimento de todos; 3.a necessidade de assegurar celeridade no cumprimento dos atos administrativos, já que eles têm por fim atender ao interesse público...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT