Acórdão Nº 0301393-22.2014.8.24.0075 do Segunda Câmara de Direito Civil, 20-02-2020

Número do processo0301393-22.2014.8.24.0075
Data20 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemTubarão
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelações Cíveis n. 0301393-22.2014.8.24.0075 e 0301399-29.2014.8.24.0075, de Tubarão

Relator: Desembargador Jorge Luis Costa Beber

APELAÇÕES CÍVEIS. (A) AÇÃO PRINCIPAL. PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. (B) AÇÃO CAUTELAR. PLEITO DE CANCELAMENTO LIMINAR DE INSCRIÇÃO INDEVIDA. SENTENÇA DE EXTINÇÃO POR CONTINÊNCIA ENTRE AS AÇÕES. INSURGÊNCIA DO ACIONANTE.

CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. CONTROVÉRSIA EM TORNO DE FATOS COMPROVÁVEIS POR PROVA EXCLUSIVAMENTE DOCUMENTAL. AUTOR QUE, ADEMAIS, DEIXOU DE APRESENTAR ROL DE TESTEMUNHAS OU ANUNCIAR DE QUE FORMA A PROVA ORAL SERIA ÚTIL PARA CORROBORAR SUAS ALEGAÇÕES. ESCORREITO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. ARTS. 355, I, E 371 DO CPC. PRELIMINAR RECHAÇADA.

REVELIA DA ACIONADA. NÃO CONFIGURAÇÃO. AÇÕES CONEXAS. MESMA CAUSA DE PEDIR. ART. 55, CAPUT, DO CPC. AUTOS APENSADOS. CONTESTAÇÃO PROTOCOLADA TEMPESTIVAMENTE NA AÇÃO CAUTELAR. DEFESA QUE PODE SER ESTENDIDA À AÇÃO PRINCIPAL. SEGURANÇA JURÍDICA E ECONOMIA PROCESSUAL. EXCESSO DE FORMALISMO QUE DEVE SER AFASTADO DO CASO EM FOCO. INAPLICABILIDADE DOS EFEITOS PREVISTOS NO ART. 344 DO CPC.

MÉRITO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE APARELHO RASTREADOR E DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE RASTREAMENTO VEICULAR. INADIMPLEMENTO INCONTROVERSO. INSCRIÇÃO DO DEVEDOR NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. CONSUMIDOR QUE, POSTERIORMENTE, BUSCOU QUITAR A DÍVIDA E LEVANTAR A ANOTAÇÃO. DISCUSSÃO A RESPEITO DA QUITAÇÃO INTEGRAL OU PARCIAL DO DÉBITO. ELEMENTOS PROBATÓRIOS AMEALHADOS AOS AUTOS QUE SUSTENTAM A TESE DEFENSIVA. ACIONANTE QUE NÃO COMPROVOU O PAGAMENTO PELA AQUISIÇÃO DO PRODUTO. EVENTUAL INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO QUE NÃO EXIME O ADQUIRENTE DE COMPROVAR O PAGAMENTO, SOB PENA DE COMPELIR O FORNECEDOR A PRODUZIR PROVA NEGATIVA. DÉBITO EXISTENTE. LICITUDE DA MANUTENÇÃO DO APONTAMENTO. CANCELAMENTO DA NEGATIVAÇÃO INCABÍVEL. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. PRETENSÃO EXORDIAL REJEITADA. DECISÃO MANTIDA.

RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelações Cíveis n. 0301393-22.2014.8.24.0075 e 0301399-29.2014.8.24.0075, da comarca de Tubarão 2ª Vara Cível em que é Apelante Reinaldo Nunes de Godoi e Apelada Khronos Segurança Privada Ltda.

A Segunda Câmara de Direito Civil decidiu, em meio eletrônico, por votação unânime, conhecer dos recursos e negar-lhes provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Rubens Schulz e Desa. Rosane Portella Wolff.

Florianópolis, 20 de fevereiro de 2020.

Desembargador Jorge Luis Costa Beber

Presidente e Relator


RELATÓRIO

Cuidam-se de apelações cíveis interpostas por Reinaldo Nunes de Godoi contra:

a) a sentença que, nos autos n. 0301393-22.2014.8.24.0075, julgou improcedentes os pedidos de declaração de inexistência de débito e de indenização por danos morais formulados em face de Khronos Segurança Privada Ltda. (fls. 25/32);

b) a sentença que, nos autos n. 0301399-29.2014.8.24.0075, extinguiu o feito sem resolução de mérito em razão do reconhecimento da continência entre as ações (fls. 81/82).

No apelo interposto contra a sentença proferida nos autos n. 0301393-22.2014.8.24.0075 (fls. 35/40), sustenta o apelante, em síntese, o cerceamento de defesa em razão de não lhe ter sido oportunizada a produção de novas provas durante a instrução processual.

Aduz, ademais, que à apelada devem ser aplicados os efeitos da revelia, tendo em vista o transcurso in albis do prazo para apresentação da peça contestatória.

Assim, diz inexistir, nos autos, prova contrária às suas alegações, fato que, somado à presunção relativa de veracidade da narrativa inicial, deve ensejar o acolhimento dos pleitos declaratório e condenatório.

A esse apelo não foram apresentadas contrarrazões (fl. 51).

Já no recurso interposto contra a sentença prolatada nos autos n. 0301399-29.2014.8.24.0075, defende o recorrente, em resumo, inexistir continência no caso concreto, uma vez que, embora haja identidade das ações quanto às partes e à causa de pedir, os pedidos são diversos e não abrangidos uns pelos outros. Afirma, no ponto, que em uma das ações pleiteou a declaração de inexistência do débito e a indenização por danos morais, ao passo que, na outra, de natureza cautelar, requereu o cancelamento liminar da sua inscrição nos órgãos de proteção ao crédito.

A esse recurso foram apresentadas contrarrazões (fls. 96/99).

Ambos os autos ascenderam a esta Corte e, na sequência, vieram conclusos para julgamento.

Este é o relatório.

VOTO

Dispensado o recorrente do recolhimento do preparo por ser beneficiário da justiça gratuita (fl. 20 dos autos n. 0301393-22.2014.8.24.0075 e fl. 18 dos autos n. 0301399-29.2014.8.24.0075), e satisfeitos os demais pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos.

De saída, afasto a preliminar de nulidade processual por cerceamento de defesa nos autos n. 0301393-22.2014.8.24.0075, pois como acertadamente assinalado pela magistrada sentenciante, "a prova, no presente caso, era exclusivamente documental e deveria ter sido produzida pelo autor, fato esse que não ocorreu" (fl. 31).

É que, tratando-se de demanda que versa sobre a manutenção de inscrição do consumidor nos cadastros de inadimplentes, a comprovação dos termos contratados e do pagamento do débito que ensejou a negativação deve ser feita por prova exclusivamente documental. No caso concreto, aliás, em momento algum o apelante apresentou rol de testemunhas ou declarou de que maneira a prova oral poderia corroborar suas alegações exordiais, de sorte que infundada a preliminar recursal invocada.

A propósito, colhe-se da jurisprudência desta Corte de Justiça:

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL DECORRENTE DE INSCRIÇÃO INDEVIDA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. PRELIMINAR. DESCONSTITUIÇÃO DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA EM RAZÃO DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. PRETENSÃO DE REABERTURA DA FASE DE INSTRUÇÃO, COM A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA E OITIVA DE TESTEMUNHAS. MEDIDAS DISPENSÁVEIS. TESE AUTORAL DEMONSTRADA POR PROVA MERAMENTE DOCUMENTAL. [...]" (TJSC, Apelação Cível n. 0301382-56.2014.8.24.0054, de Rio do Sul, rel. Des. Rubens Schulz, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 29-08-2019).

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA. [...] PREFACIAL DE CERCEAMENTO DEFESA POR JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. ALEGAÇÃO DE NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. INSUBSISTÊNCIA. OBJETO DA LIDE RESTRITO À VERIFICAÇÃO DA CONTRATAÇÃO OU NÃO PELO AUTOR DOS PRODUTOS, CUJA DÍVIDA ENSEJOU SUA INSCRIÇÃO NO ROL DE INADIMPLENTES. CONTROVÉRSIA PASSÍVEL DE RESOLUÇÃO POR MEIO DA ANÁLISE DA PROVA DOCUMENTAL. PREFACIAL RECHAÇADA. [...]" (TJSC, Apelação Cível n. 0006493-02.2014.8.24.0020, de Criciúma, rel. Des. Denise Volpato, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 13-08-2019).

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL. CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE. DIREITO INVOCADO PASSÍVEL DE COMPROVAÇÃO POR PROVA ESTRITAMENTE DOCUMENTAL. PREFACIAL REJEITADA. INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. INSCRIÇÃO INDEVIDA. [...]" (TJSC, Apelação Cível n. 0304196-95.2018.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Ricardo Fontes, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 23-04-2019).

Não se olvide, ademais, que impera no processo civil o princípio do livre convencimento motivado, agindo corretamente a togada singular ao julgar antecipadamente a lide, de forma fundamentada, por considerar suficientes ao deslinde do feito os elementos já amealhados ao caderno processual, forte nos artigos 355, I, e 371 do Código de Processo Civil.

Superada essa questão, subsiste uma tese estritamente processual a ser analisada: a alegada revelia da acionada nos autos n. 0301393-22.2014.8.24.0075.

A esse respeito, constato que as duas ações sob análise possuem as mesmas partes (Reinaldo Nunes de Godoi e Khronos Segurança Privada Ltda.) e a mesma causa de pedir, qual seja, a manutenção da inscrição do acionante nos órgãos de proteção ao crédito após o suposto pagamento da dívida que ensejou a negativação.

Rememoro, então, que há conexão quando duas ou mais ações tiverem o mesmo pedido ou a mesma causa de pedir (artigo 55, caput, do Código de Processo Civil), ao passo que existe continência quando duas ou mais ações possuírem as mesmas partes e a mesma causa de pedir, mas o pedido de uma, por ser mais amplo, abranger o das demais (artigo 56 da Lei Adjetiva). Logo, é possível concluir que a continência é uma conexão qualificada, pois abarca os seus requisitos e a eles somam-se outros.

No presente caso, ainda que se possa discutir a configuração ou não de continência - como de fato se debateu nos autos n. 0301399-29.2014.8.24.0075 -, por certo há conexão entre as demandas, uma vez que ambas possuem a mesma causa de pedir.

Sobre as razões de ser da conexão, leciona DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES:

"A primeira e inegável vantagem aferida com o fenômeno da conexão é evitar que decisões conflitantes sejam proferidas por dois juízos diferentes. A existência de decisões conflitantes proferidas em demandas que tratem de situações similares é, naturalmente, motivo de descrédito ao Poder Judiciário, podendo inclusive gerar problemas práticos de difícil solução.

Por outro lado, é inegável que a reunião de duas ou mais demandas perante somente um juiz favoreça no mais das vezes a verificação do princípio da economia processual, já que os atos processuais serão praticados somente uma vez, o que se mostrará mais cômodo ao Poder Judiciário (funcionará apenas uma estrutura - juiz, escrivão, cartorário etc.) e às partes e terceiros que tenham dever de colaboração com a Justiça (p. ex., testemunhas, que só prestarão depoimento uma vez). Com a prática de atos processuais que sirvam a mais de um processo, é evidente que haverá...

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