Acórdão Nº 0301436-21.2014.8.24.0022 do Primeira Câmara de Direito Civil, 29-10-2020

Número do processo0301436-21.2014.8.24.0022
Data29 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCuritibanos
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0301436-21.2014.8.24.0022

Relator: Des. Gerson Cherem II

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. RECURSO DO AUTOR.

PRETENDIDA EXIBIÇÃO DE ÁUDIO (GRAVAÇÃO) DE PROGRAMA DIFUNDIDO POR RÁDIO COMUNITÁRIA. FUTURO AJUIZAMENTO DE AÇÃO ORDINÁRIA. SUPOSTA DISSEMINAÇÃO DE OFENSAS À HONRA DO REQUERENTE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

MATERIAL DESTRUÍDO PELA RADIODIFUSORA VINTE E QUATRO HORAS APÓS A TRANSMISSÃO. OBRIGAÇÃO LEGAL DE MANTER EM ARQUIVO AS GRAVAÇÕES NÃO REGISTRADAS EM TEXTO PELO PRAZO DE VINTE DIAS. INTELIGÊNCIA DO ART. 71, § 3º, DO CÓDIGO BRASILEIRO DE TELECOMUNICAÇÕES C/C ITEM "19.3.1" DA NORMA COMPLEMENTAR N. 01/2004 E ITEM "21.3" DA PORTARIA N. 462/2011, AMBAS DO MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES, VIGENTES À ÉPOCA. COMPROVADA A NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL PARA OBTENÇÃO DO ÁUDIO TRÊS DIAS APÓS A VEICULAÇÃO. DESCARTE ILEGAL. INEXISTÊNCIA DAS GRAVAÇÕES QUE NÃO ENSEJA A PERDA DO OBJETO. IMPERIOSA PROCEDÊNCIA DO PLEITO EXORDIAL PARA FUTURA ANÁLISE DA APLICABILIDADE DO ART. 359, DO CPC/73 (ART. 400, CPC/2015), EM EVENTUAL AÇÃO REPARATÓRIA. SENTENÇA REFORMADA.

"Apelação Cível. Ação cautelar de exibição de documentos - Pretendida exibição de gravação de programas veiculados em rádio comunitária - Sentença de procedência - Recurso de apelação interposto pela ré em que se alega inépcia da inicial, impossibilidade de cumprimento da obrigação e perda do objeto da ação - Descabimento - Medida cautelar de caráter satisfativo, sendo desnecessária a indicação, na inicial, da ação principal a ser proposta - Obrigação legal da ré de manter em arquivo as gravações não registradas em texto, pelo prazo de 20 (vinte) dias, contados das respectivas transmissões - Incidência das disposições do item 19.3.1 da Norma Complementar nº 1/2004 - Requerida notificada pela autora acerca do interesse na exibição das gravações antes mesmo do ajuizamento da ação, quando ainda não decorrido o prazo de 20 (vinte) dias - Hipótese, ademais, em que a destruição das gravações não resultaria na extinção do processo, pela perda do objeto, mas sim na análise da aplicação do disposto no artigo 359, inciso I, do Código de Processo Civil, em eventual ação a ser proposta - Manutenção da R. Sentença. Nega-se provimento ao recurso de apelação." (TJSP; AC n. 0000921-52.2008.8.26.0042; relª. Desª. Christine Santini; j. em 15.09.2015).

INVERSÃO DOS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. DESPESAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS A CARGO DA DEMANDANTE. APLICAÇÃO DO § 4º, DO ART. 20, DO CPC/73.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0301436-21.2014.8.24.0022, da comarca de Curitibanos 2ª Vara Cível em que é Apelante Osni Fontana Carvalho e Apelado Rádio Comunitária Maria Rosa - FM.

A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento para: 1) reformar a sentença e julgar procedente o pleito cautelar, reconhecendo o direito do autor à exibição das gravações, deixando de terminar sua entrega diante da incontroversa destruição irregular do material; 2) por conseguinte, condenar a ré ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), a teor do art. 20, § 4º, do CPC/73. Custas pela apelada.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido por este Relator, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Raulino Jacó Brüning e o Exmo. Sr. Des. Saul Steil.

Florianópolis, 29 de outubro de 2020.

Gerson Cherem II

PRESIDENTE E RELATOR


RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por Osni Fontana Carvalho contra a sentença prolatada pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Curitibanos que, nos autos da ação cautelar de exibição de documentos aforada em desfavor da Rádio Comunitária Maria Rosa FM, julgou improcedente o pleito exordial, nos seguintes termos (fl. 36):

Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial formulado por Osni Fontana Carvalho em face da Rádio Comunitária Maria Rosa ME.

Julgo extinto o processo, na forma do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil.

Condeno o requerente ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em R$ 1.000,00 (um mil reais), forte no art. 20, § 4º, do CPC.

Irresignado, o recorrente sustentou que "considerando que a notificação extrajudicial fora praticada aproximadamente 01 dia após a veiculação de palavras difamatórias praticada pela apelada contra o apelante, é de direito e de justiça que a r. sentença seja reformada condenando a apelada em apresentar tal gravação bem como condena-la em honorários sucumbenciais" (fl. 43). Assim, pugnou pelo provimento do recurso (fls. 39/44).

Com as contrarrazões (fls. 49/52), os autos ascenderam ao Tribunal.

É o relatório.

VOTO

1) Da legislação processual aplicável:

De plano, deve-se atentar para as regras de direito intertemporal no Novo CPC:

Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.

Art. 1.046. Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

Explicitam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:

O efeito retroativo da lei nova é sua aplicação dentro do passado e o efeito imediato é a aplicação da lei nova dentro do presente. [...]. O nosso sistema proíbe a aplicação da lei nova dentro do passado, isto é para os fatos ocorridos no passado. Os fatos pendentes (facta pendentia) são, na verdade, os fatos presentes, regulados pela eficácia imediata da lei nova, vale dizer, que se aplica dentro do presente.

[...]

A lei processual tem vigência imediata e se aplica aos processos pendentes, mas rege sempre para o futuro [...]. Para justificar a aplicação da lei nova aos feitos pendentes, a doutrina fala em "retroatividade apenas na aparência" [...]. Os atos processuais já praticados sob a égide da lei antiga caracterizam-se como atos jurídicos processuais perfeitos, estando protegidos pela garantia constitucional da CF 5º XXXVI, não podendo ser atingidos pela lei nova. (in Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015. p. 2234/2235).

Calha transcrever trecho do acórdão prolatado pelo ilustre Des. Vanderlei Romer:

[...] Nunca é demais lembrar que as normas de natureza processual não podem ser aplicadas retroativamente. [...] 'A novatio legis, de cunho processual, tem aplicação imediata e alcança o processo em curso no ponto em que este se encontra, respeitando os atos processuais praticados e disciplinando os realizados a partir de sua vigência' (STJ, REsp. n. 35.160/SP, rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, DJU de 18-3-96). [...] 'Também as normas processuais, inobstante terem aplicação imediata, alcançando os processos em curso, devem respeito à cláusula constitucional que resguarda o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, formados em data anterior' (REsp 718.432/SC, rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 2-5-2005). [...]." (AC n. 2007.041693-6, rel. Des. Vanderlei Romer, j. em 13.12.2007).

Em decorrência, o diploma legal aplicável ao caso é o Código de Processo Civil de 1973, vigente à época da publicação da sentença, ocorrida em 05.12.2014 (fl. 37).

Presentes os requisitos legais, conhece-se do recurso.

2) Do mérito:

A ação exibitória cautelar encontrava previsão nos arts. 844 e 845, do Código de Processo Civil de 1973. Confiram-se os dispositivos:

Art. 844. Tem lugar, como procedimento preparatório, a exibição judicial:

I - de coisa móvel em poder de outrem e que o requerente repute sua ou tenha interesse em conhecer;

II - de documento próprio ou comum, em poder de co-interessado, sócio, condômino, credor ou devedor; ou em poder de terceiro que o tenha em sua guarda, como inventariante, testamenteiro, depositário ou administrador de bens alheios;

III - da escrituração comercial por inteiro, balanços e documentos de arquivo, nos casos expressos em lei.

Art. 845. Observar-se-á, quanto ao procedimento, no que couber, o disposto nos arts. 355 a 363, e 381 e 382.

Sobre o tema, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery lecionam:

Aquele que entender deve mover ação contra outrem e necessitar, para instruir o pedido, de conhecer teor de documento ou coisa a que não tenha acesso, poderá valer-se deste procedimento preparatório para obter os dados que necessita e armar-se contra o futuro e eventual adversário judicial que tiver. O interesse do autor na obtenção da sentença cautelar há de ser a urgência e necessidade prévia da providência cautelar, necessária e indispensável à obtenção do desiderato que pretende. (in Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 12. ed. São Paulo: RT, 2012. p. 1.348).

A hipótese sub judice veio ilustrada na exordial da seguinte forma:

O autor fora alvo de calunia e difamação no programa de rádio no dia 26/06/2014, especialmente no programa A HORA DO MARCA DE GALPÃO.

No referido programa o apresentador SILVIO ALVES, em resumo disse ao vivo que o autor fora extremamente culpado pelo acidente de ALGUSTO RICARDO BECKER, conhecido como Grilo.

Ainda em seus comentários, disse que Grilo ainda teria dinheiro a receber do autor, tendo o mesmo virado as costas para o ocorrido.

Além do mais, denegriu a imagem do conjunto Fogo de Chão, vez que é concorrente diretamente de seu conjunto "MARCA DE GALPÃO".

Assim excelência, no intuito de se defender resguardar seu direito, por diversas vezes o autor solicitou a entrega da fita/gravação do programa, sendo negado pela ré.

Não conformado, o autor notificou extrajudicialmente a referida radio para fornecer a gravação do programa realizado naquela data, mas a ré manteve se inerte.

Em presença disso, o autor fora alvo de...

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