Acórdão Nº 0301455-40.2017.8.24.0016 do Quarta Câmara de Direito Civil, 18-08-2022

Número do processo0301455-40.2017.8.24.0016
Data18 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301455-40.2017.8.24.0016/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH

APELANTE: CLAUDIRLEI DORINI (RÉU) APELANTE: SONIA MARIA HANEL DORINI (RÉU) APELADO: EMIR LOCH (AUTOR)

RELATÓRIO

Acolho o relatório da sentença (evento 60 dos autos de primeiro grau), de lavra do Juiz de Direito Stefan Moreno Schoenawa, por contemplar precisamente o conteúdo dos presentes autos, ipsis litteris:

Trata-se de 'ação de reintegração de posse' ajuizada por Emir Loch em desfavor de Claudirlei Dorini e outro, ambos representados e qualificados nos autos, no qual aponta que é proprietário de gleba de terra constituída por parte do lote rural n. 379 da Colônia Rio do Peixe, no Município de Piratuba/SC. Afirmou que tinha contrato verbal com a proprietário do terreno confrontante para uso da servidão que dá acesso ao imóvel, contudo, após o óbito desta, o terreno foi alienado aos requeridos que, inadvertidamente, fecharam a estrada que conferia acesso ao terreno do autor. Apontou que o acesso é o único disponível para trafegar com máquina colheitadeira. Requereu liminarmente ordem de reintegração de posse da servidão aparente, confirmada ao final com a procedência da demanda. Recebida a inicial, designou-se audiência de justificação da posse (fl. 63). Realizado o ato, foram ouvidas cinco pessoas e, ao final, o pleito liminar foi deferido (fl. 85). Os réus apresentaram contestação alegando que adquiriram a propriedade no ano de 2016 e que não tinham conhecimento de que a parte autora utilizava a área como passagem, uma vez que o terreno do demandante é servido por estrada larga e de boa qualidade, com trânsito e o escoamento da produção agrícola facilitados. Mencionaram que procederam contato com as herdeiras da antiga proprietária, recebendo a informação de que jamais houve qualquer forma de acordo ou concessão da servidão noticiada pelo autor (fls. 103 a 120). Houve réplica (fls. 124 a 130). Em audiência de instrução foram ouvidas três pessoas. Na sequência, as partes apresentaram alegações finais.

O Magistrado julgou procedente o pedido exordial, nos seguintes termos:

Diante do exposto e com análise do mérito (artigo 487, inciso I, do CPC), julgo procedente o pedido para confirmar a decisão de fl. 85 e reintegrar definitivamente o autor Emir Loch na posse da servidão existente na área descrita, bem assim para determinar que os requeridos se abstenham de obstaculizar o direito de passagem e acesso garantido pela servidão, razão pela qual julgo extinto o processo. Os requeridos deverão providenciar o restabelecimento do acesso no prazo de 30 (trinta) dias, se ainda não o fizeram, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais). Condeno a parte requerida em custas processuais e honorários advocatícios que fixo em R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais), na forma do artigo 85, §8º, do CPC.

Irresignados com a prestação jurisdicional entregue, os réus interpuseram apelação. Alegam que "o apelado assume que há estrada municipal que acessa a sua propriedade, porém, entende ser muito longa e de difícil tráfego com seu maquinário agrícola (que também não prova a existência)". Entendem que "a demanda em questão situa-se na mera insatisfação do recorrido acerca da venda do imóvel aos apelantes e não para si". Sustentam, ainda, que "o que sobressai dos autos, a bem da verdade, é a tentativa de realização do capricho de ter um caminho particular sobre o pequeno imóvel dos apelantes". Segundo os recorrentes, "se existe estrada municipal em ótimas condições (como bem demonstram os depoimentos da audiência de instrução e julgamento), não assistem razões ao recorrido". Concluem que o autor jamais teve a posse, mas mera tolerância baseada na política da boa vizinhança. Suscitam nulidade da sentença, por não contemplar análise completa das provas e realizar "o pinçamento dos elementos que aproveitavam única e exclusivamente ao apelado". Defendem não se tratar de servidão aparente. Fazem menção à sua boa-fé na condição de adquirentes das terras vizinhas ao do autor (evento 985 dos autos de origem).

Contrarrazões no evento 74 dos autos de primeira instância.

Os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça.

Os apelantes apresentaram algumas considerações no evento 9 e a exibição de uma ata notarial, que, segundo alegam, demonstraria a não utilização do atalho pelo recorrido após a liminar.

VOTO

De início, assinalo que, não obstante a existência de outros feitos mais antigos no acervo de processos distribuídos a este Relator, a apreciação do presente recurso em detrimento daqueles distribuídos há mais tempo não significa violação ao disposto no art. 12, caput, do novo Código de Processo Civil, tendo em vista a exceção contida no § 2º, VII, primeira parte, do mesmo dispositivo legal.

O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

1 PRELIMINAR

Os recorrentes postulam a nulidade da sentença, por não contemplar análise completa das provas e realizar "o pinçamento dos elementos que aproveitavam única e exclusivamente ao apelado".

Todavia, em momento algum a sentença guerreada deixou de analisar a matéria submetida a julgamento, tendo resolvido o mérito da lide com base no art. 487, I, do CPC.

O julgador singular analisou o acervo probatório acostado ao feito, sobretudo as declarações advindas das testemunhas e informantes, de modo a chegar em uma conclusão diversa daquela defendida pela defesa.

Em verdade, os apelantes não concordam com a decisão de procedência, o que não significa que se trata de ato nulo, em violação ao disposto no inciso IX do artigo 93 da Constituição Federal, e no inciso IV do § 1º do artigo 489 do CPC.

Logo, o decisum afigura-se suficientemente motivado, com fundamentos necessários ao desate do litígio, não se descortinando nesse proceder qualquer violação à garantia constitucional de fundamentação das decisões judiciais.

Afasta-se, portanto, a aludida prefacial.

2 MÉRITO

Objetiva a recorrente a reforma da sentença que determinou a reintegração do autor/recorrido na posse da servidão de passagem aparente utilizada como acesso para a sua propriedade.

De início, convém observar que o caso em apreço não configura o instituto da passagem forçada, tendo em vista a existência de outro caminho que também dá acesso à propriedade do demandante, descaracterizando-a como encravada, tampouco pode ser classificado como servidão de trânsito.

Cumpre, nesse aspecto, trazer características dos referidos institutos.

A respeito da passagem forçada, cabe destacar os ensinamentos de Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, in verbis:

Trata-se uma das mais rigorosas restrições de direito de vizinhança, como benefício...

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