Acórdão Nº 0301482-76.2016.8.24.0042 do Terceira Câmara de Direito Público, 04-02-2020

Número do processo0301482-76.2016.8.24.0042
Data04 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemMaravilha
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0301482-76.2016.8.24.0042, de Maravilha

Relator: Desembargador Júlio César Knoll

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. IMPLEMENTAÇÃO DA RODOVIA ESTADUAL SC-497. FAIXA DE DOMÍNIO INSERIDA EM IMÓVEL PARTICULAR. INDENIZAÇÃO CABÍVEL. AVALIAÇÃO CONTEMPORÂNEA. JUROS COMPENSATÓRIOS. TERMO FINAL. DATA DA EXPEDIÇÃO DO PRECATÓRIO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE ACOLHIDO.



Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0301482-76.2016.8.24.0042, da comarca de Maravilha 2ª Vara em que é Apelante Estado de Santa Catarina e Apelado Jair Lowis e outro.

A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, conhecer e prover parcialmente o recurso, apenas para alterar o termo final dos juros compensatórios. No mais, mantém-se incólume a sentença, por seus próprios fundamentos. Custas na forma da lei.

O julgamento, realizado no dia 4 de fevereiro de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Jaime Ramos, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Desa. Sônia Maria Schmitz.

Funcionou como representante do Ministério Público o Dr. Américo Bigaton.


Florianópolis, 4 de fevereiro de 2020.



Desembargador Júlio César Knoll

Relator





RELATÓRIO

Perante a 2ª Vara da comarca de Maravilha, Jair Lowis e Lorita Salete Lowis, devidamente qualificados, promoveram, com fundamento nos permissivos legais, através de procuradores habilitados, ação de indenização por desapropriação indireta, em desfavor do Departamento Estadual de Infraestrutura - Deinfra.

Relataram, em apertada síntese, que são proprietários e possuidores de uma área de aproximadamente 206.500 m², cadastrado na matrícula de n. 4.831 do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Maravilha.

Afirmaram, em suma, que ao realizar obra de construção da Rodovia SC-497, trecho Maravilha-Tigrinhos, em 2008, o requerido se apossou de parte do imóvel que lhes pertence, sem que houvesse indenização.

Postularam pela condenação da autarquia estadual do pagamento da indenização pelo esbulho, além dos consectários legais.

Recebida, registrada e autuada a inicial, o Deinfra foi citado. No prazo legal, apresentou defesa, via contestação, rechaçando os argumentos trazidos na exordial.

Foi determinada a realização do laudo pericial, o qual se formalizou e foi acostados às fls. 279-292.

Apresentadas as alegações finais, sobreveio sentença de lavra do MM. Juiz de Direito, Dr. Guilherme Augusto Portela de Gouvêa, a saber (fls. 437-446):

Por todo o exposto, com fundamento no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Jair Lowis e Lorita Salete Lowis para, por consequência, CONDENAR o Estado de Santa Catarina ao pagamento da importância de R$ 39.047,54 (trinta e nove mil, quarenta e sete reais e cinquenta e quatro centavos), correspondente à indenização pela desapropriação indireta de parte do imóvel matriculado sob o n. 4.831 perante o Registro de Imóveis da Comarca de Maravilha/SC, em decorrência da pavimentação da rodovia SC-497 (atual SC-492). Sobre o valor incidem: a) juros compensatórios, desde a efetiva ocupação do imóvel (janeiro de 2008), no patamar de 6% (seis por cento) ao ano; b) juros moratórios, a contar de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser efetuado, de acordo com os índices apontados acima; c) correção monetária, a partir do laudo de avaliação (05/05/2019), cujo índice a ser utilizado é o IPCA-E/IBGE a partir de jan/2001. Deixo de condenar o réu ao pagamento das custas processuais por determinação do art. 35, "h", da Lei Complementar Estadual n.º 156/1997. Diante da sucumbência mínima do autor, condeno o réu ao pagamento dos honorários advocatícios, os quais ficam arbitrados em 5% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 27, §§ 1º e 3º, II, do Decreto-Lei nº 3.365/41, incluindo-se no cálculo as parcelas referentes aos juros moratórios e compensatórios. Fica o réu, ainda, condenado ao pagamento dos honorários periciais, mediante depósito nos autos e posterior liberação ao experto. Sentença não sujeita à remessa necessária, uma vez que os valores não ultrapassarão o montante previsto no artigo 496, §3º, inciso II, do Código de Processo Civil. Ao cartório, proceda-se à retificação do polo passivo da demanda. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Transitada em julgado, expeça-se mandado de averbação da transferência referente à parte desapropriada do imóvel ao órgão competente.

Inconformado, a tempo e modo, o ente público estadual interpôs recurso de apelação.

Em suas razões, sustentou a tese de que tanto a faixa de domínio como a área não edificável ensejam mera limitação administrativa, não gerando qualquer forma de direito à indenização.

Sucessivamente, aduziu que a indenização deve remontar à época do apossamento, e não no momento da elaboração do laudo.

Por fim, requereu a reforma dos consectários legais.

Apresentadas as contrarrazões, os autos foram encaminhados Pa douta Procuradoria-Geral de Justiça, sendo que lavrou parecer a Dra. Monika Pabst, que manifestou-se pelo conhecimento e parcial provimento do apelo, apenas para ajustar a incidência de juros compensatórios até a inclusão do valor devido em precatório.

Vieram conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

A insurgência voluntária apresentou-se tempestiva e satisfez os demais requisitos legais, motivo pelo qual merece ser conhecida.

A autarquia estadual defende que sobre a área em litígio recai tão somente limitação administrativa consistente na restrição do direito de construir, ou seja, o imóvel não está inserido em faixa de domínio, por isso, desnecessária a sua desapropriação.

Inicialmente, cumpre estabelecer a diferenciação entre faixa de domínio e área non aedificandi.

O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, em seu sítio digital, conceitua faixa de domínio como a "base física sobre a qual assenta uma rodovia, constituída pelas pistas de rolamento, canteiros, obras-de-arte, acostamentos, sinalização e faixa lateral de segurança, até o alinhamento das cercas que separam a estrada dos imóveis marginais ou da faixa de recuo".

Já a área não edificável é conceituada pela Lei n. 6.766/79, a qual dispõe que "ao longo das águas correntes e dormentes e das faixas de domínio público das rodovias e ferrovias, será obrigatória a reserva de uma faixa não-edificável de 15 (quinze) metros de cada lado, salvo maiores exigências da legislação específica".

No caso concreto, o laudo pericial não deixa dúvidas de que, por ocasião da construção da rodovia SC 497, trecho Maravilha – Tigrinhos, o Deinfra apossou-se de parcela considerável do imóvel de propriedade dos autores, tendo em vista que o trecho rodoviário encontra-se assentado sobre o terreno (fl. 285).

Extrai-se da decisão singular que, "a faixa de domínio a ser considerada é aquela efetivamente expropriada (TJSC, Apelação Cível n. 2011.026818-7). No caso dos autos, o laudo pericial apontou que a área desapropriada é de 10.012,19 m², já descontada a área ocupada pela antiga estrada existente no local, que corresponde a 3.640,80 m²" (fl. 440).

Em outras palavras, o bem em litígio foi absorvido pelo Poder Público de forma irreversível, tendo seu conteúdo econômico completamente esvaziado, sem que houvesse justa e prévia indenização, preenchendo os requisitos delimitados pelo Superior Tribunal de Justiça, através do Informativo de Jurisprudência n. 0380, para caracterização de ação típica de desapropriação indireta:

ADMINISTRATIVO - CRIAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL XIXOVÁ-JAPUÍ - DECRETO ESTADUAL 37.536/93 - DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA - REQUISITOS - NÃO-CONFIGURAÇÃO.

  1. Na seara do Direito Constitucional não há mais lugar para falar-se em direito absoluto, já que, segundo o princípio da razoabilidade, os direitos previstos na Carta Magna encontram seu fundamento e limite no próprio texto constitucional.

2. Antes da promulgação da Constituição vigente, o legislador já cuidava de impor algumas restrições ao uso da propriedade com o escopo de preservar o meio ambiente.

3. Para se falar em desapropriação indireta impõe-se que sejam preenchidos os seguintes requisitos: que o bem tenha sido incorporado ao patrimônio do Poder Público e que a situação fática seja irreversível.

4. Caso dos autos, em que não restou constatado que as apontadas restrições estatais implicaram no esvaziamento do conteúdo econômico da propriedade da recorrente, tampouco que o Poder Público revelou qualquer intenção de incorporar ao seu patrimônio o imóvel de propriedade da embargante.

5. Eventual limitação administrativa mais extensa do que as já existentes quando da edição do Dec. Estadual 37.536/93 deve ser comprovada pela autora por meio de ação própria.

6. Embargos de divergência não providos....

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