Acórdão Nº 0301611-87.2018.8.24.0082 do Quarta Câmara de Direito Civil, 22-09-2022

Número do processo0301611-87.2018.8.24.0082
Data22 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301611-87.2018.8.24.0082/SC

RELATOR: Desembargador HELIO DAVID VIEIRA FIGUEIRA DOS SANTOS

APELANTE: ASSOC DOS PROFISSIONAIS LIB.UNIV.DO BRASIL-APLUB (Massa Falida/Insolvente) (RÉU) APELANTE: GIACOMINI E VALDEZ ADVOGADOS ASSOCIADOS (Administrador Judicial) APELADO: EDUARDO LEMOS BITTENCOURT (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de "ação de obrigação de fazer e indenização por danos morais" proposta por Eduardo Lemos Bittencourt contra a Associação de Profissionais Liberais Universitários do Brasil - APLUB.

Na petição inicial, narrou o autor que: i) mais de 40 anos antes contratou junto à ré "Plano de Pensão Reajustável", e, em 2004, ao buscar se informar sobre quando poderia receber o benefício, foi surpreendido com a notícia de que seu plano havia sido alterado para "Pecúlio e Acidentes Pessoais"; ii) tentou "resolver a questão de forma amigável", de várias formas, sem êxito, mas só recebeu uma resposta evasiva de que haviam em seu nome dois planos de pecúlio e um seguro de acidente pessoal; iii) numa ida à sede da associação em Porto Alegre, descobriu que o plano de pensão não existia mais e que apenas uma das propostas dos planos vigentes tinha assinatura, que não reconhece como sua; iv) no início de 2018 encaminhou uma notificação extrajudicial para cancelar tudo e reaver todo o valor pago, e, em junho do mesmo ano, recebeu uma carta da ré informando que seu plano fora cancelado por falta de pagamento, situação que acabou lhe causando uma crise de hipertensão. Com base nesse relato, ponderou que em todos esses anos as contribuições foram pagas ininterruptamente e que não lhe resta outra alternativa senão a presente demanda. Requereu a antecipação da tutela, para que a ré fosse compelida ao pagamento da aposentadoria contratada, incluindo os valores atrasados não prescritos e, ao final, a sua confirmação, declarando-se a inexistência do plano de pecúlio e reconhecendo-se o direito ao recebimento da pensão mensal. Ainda, pleiteou a condenação da entidade ao pagamento de indenização por danos morais, em valor não inferior a R$ 10.000,00 (evento 1, INIC1).

Designou-se audiência conciliatória, a qual restou inexitosa (evento 34, TERMOAUD94).

A ré contestou (evento 37, CONT98). Em preliminar, aventou a incompetência em razão do lugar e impugnou o valor da causa. Como prejudicial de mérito, alegou a ocorrência da prescrição (anual, trienal ou quinquenal). Quanto ao mérito, disse estarem vigentes apenas os Planos de Pecúlio e de Acidentes Pessoais, aderidos pelo autor por "mala direta", os quais não preveem o pagamento de aposentadoria. Referiu que o "Plano de Pensão Mensal Reajustável" que o autor afirma ter contratado foi cancelado por falta de pagamento; e que a correspondência e os boletos juntados ao feito pelo próprio autor demonstram que ele tinha plena ciência dos planos em vigor. Sob essa perspectiva, apontou a impossibilidade de devolução das contribuições, por expressa disposição contratual, ponderando também não ser possível o pagamento de pensão mensal em razão da natureza aleatória do contrato de seguro. Impugnou o pedido de danos morais e, ademais, postulou a produção de prova pericial atuarial. Em razão disso, requereu a extinção do processo pelo acolhimento das preliminares suscitadas e subsidiariamente, a improcedência da demanda (ev. 37 - PG).

Houve réplica (ev. 41 - PG).

Na sequência, sobreveio sentença (evento 44, DOC123), pela qual o magistrado i) afastou a tese de prescrição, assinalando a aplicabilidade do prazo prescricional quinquenal (Súmula 291 do STJ), por se tratar de obrigação de trato sucessivo; ii) reconheceu a incidência da legislação consumerista e a necessidade de inversão do ônus da prova; e iii) concluiu que a requerida não demonstrou a legitimidade da contratação dos planos de pecúlio, cuja adesão teria se dado por "mala direta". Assim, os pedidos iniciais foram julgados procedentes, para:

a) condenar a ré a conceder à autora o benefício de aposentadoria complementar, na forma como originalmente contratado, a ser apurado em liquidação de sentença, devendo outrossim pagar em cota única as parcelas sonegadas durante o período imprescrito, de 5 (cinco) anos retroativos a propositura da demanda, incidindo acréscimo de correção monetária pelos índices adotados pela CGJSC e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde cada vencimento;

b) condenar a ré a pagar em favor do autor indenização por danos morais no importe de R$ 8.000,00 (oito mil reais), acrescido de correção monetária pelos índices adotados pela CGJSC a contar do arbitramento e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês desde a citação.

Forte na sucumbência e no princípio da causalidade, arca a ré com o pagamento das custas e despesas processuais, fixados os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2° do CPC. Fica suspensa, contudo, a exigibilidade do pagamento, na forma do art. 98, § 3° do CPC, porquanto a parte faz jus ao benefício da gratuidade da justiça. Retifique-se o valor da causa para R$ 110,279,99 (cento e dez mil duzentos e setenta e nove reais e noventa e nove centavos), conforme manifestação da própria ré (ev. 44 - sent123, p.3 - PG).

A ré apelou (evento 60, REC1). Nas razões recursais, reitera os mesmos argumentos da contestação, inclusive a preliminar de incompetência territorial (art. 53, III, "a" do CPC) e a alegação de prescrição. Além disso, suscita a nulidade da sentença por cerceamento de defesa e julgamento extra petita. No mérito, i) pretende o afastamento da legislação consumerista, por se tratar de entidade fechada; ii) nega que o plano de pensão mensal tenha sido substituído pelos planos de pecúlio e de acidentes pessoais, repisando o argumento de que aquele acabou cancelado por ausência de pagamento; iii) aduz que a assinatura que o autor defendeu ser falsa na verdade seria de Luiz Eduardo Bittencourt, seu filho; iv) diz que tanto o contrato cancelado quanto os vigentes possuem cunho securitário, pois os participantes estão garantidos em relação aos riscos contratados - morte e invalidez por acidente pessoal; e v) assinala que o autor gozou das garantias contratadas enquanto participante plano, mas a desistência operada pelo inadimplemento fez cessar tanto as garantias como a participação. Por fim, pede a gratuidade de justiça e a suspensão do processo, por se encontrar em liquidação extrajudicial desde 30/08/2018. Assim, pugna pela extinção do feito e, sucessivamente, pela improcedência dos pedidos.

O recurso é tempestivo; à ré foram conferidos os benefícios da justiça gratuita (evento 44, SENT123).

Houve contrarrazões (evento 68, CONTRAZAP1).

Este é o relatório.

VOTO

1. O pleito de gratuidade de justiça não pode ser conhecido porque o benefício já foi concedido na origem, carecendo a ré de interesse recursal no ponto.

Também não se conhece da tese de que a assinatura cuja falsidade foi suscitada seria do filho do associado, por não ter sido apresentada oportunamente perante o juízo a quo, o que configura nítida inovação recursal, vedada pelo art. 1.013 do CPC.

No mais, presentes os requisitos de admissibilidade, admite-se o recurso.

2. Inicialmente, reconhece-se a incidência do Código de Defesa do Consumidor a este caso concreto.

Sabe-se que a legislação específica aplica-se às entidades de previdência privada abertas, conforme se extrai da Súmula 563, in verbis:

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às...

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