Acórdão Nº 0301658-59.2019.8.24.0039 do Quarta Câmara de Direito Civil, 08-10-2020

Número do processo0301658-59.2019.8.24.0039
Data08 Outubro 2020
Tribunal de OrigemLages
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0301658-59.2019.8.24.0039

Relator: Desembargador José Agenor de Aragão

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COBRANÇA INDEVIDA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

INSURGÊNCIA DA REQUERENTE.

PRETENDIDA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS EM RAZÃO DE COBRANÇA INDEVIDA. INSUBSISTÊNCIA. COBRANÇA INDEVIDA DE DÍVIDA E ENVIO DE SMS E LIGAÇÕES QUE NÃO CARACTERIZAM, POR SI SÓ, O ABALO ANÍMICO. ÔNUS QUE CABIA A AUTORA. SITUAÇÃO QUE NÃO REPERCUTIU NA SUA ESFERA ÍNTIMA A PONTO DE OFENDER-LHE A HONRA E A DIGNIDADE. ADEMAIS, NÃO HÁ REGISTRO DA INSCRIÇÃO DO NOME DA DEMANDANTE EM ÓRGÃOS RESTRITIVOS AO CRÉDITO. MERO DISSABOR. AUSÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR.

HONORÁRIOS RECURSAIS. EXEGESE DO ART. 85, §11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0301658-59.2019.8.24.0039, da comarca de Lages 4ª Vara Cível em que é/são Apelante(s) Silvana Aparecida da Silva e Apelado(s) Sociedade Educacional Leonardo da Vinci S/S Ltda Nead.

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade de votos, conhecer do Recurso de Apelação e negar-lhe provimento. Nos termos do artigo 85, § 11, do CPC, fixar os honorários recursais, em favor dos procuradores da Requerida/Apelada em R$ 500,00 (quinhentos reais), ficando, todavia, suspensa a exigibilidade, nos termos do art. 98, §3º do CPC. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Hélio David Vieira Figueira dos Santos, e participaram, com voto, os Exmos. Srs. Desembargadores Selso de Oliveira e Luiz Felipe Schuch.

Florianópolis, 08 de outubro de 2020.

Desembargador José Agenor de Aragão

Relator


RELATÓRIO

A bem dos princípios da celeridade e da economia processual, bem como para melhor explanar a situação fática, adoto o relatório elaborado na sentença, por delinear com precisão os contornos da lide (fls. 265/270):

"SILVANA APARECIDA DA SILVA propôs ação, pelo procedimento comum, em face de SOCIEDADE EDUCACIONAL LEONARDO DA VINCI S/S LTDA alegando, em suma, que foi indevidamente matriculada no curso de segurança no trabalho oferecido pela ré. Sustentou que a ré passou a fazer cobranças de mensalidades vencidas, no valor de R$ 237,07, as quais não foram pagas, o que lhe causou abalo moral. Requereu a condenação da ré à reparação do dano moral.

Designou-se audiência de conciliação.

Citada, a ré compareceu à audiência e, não obtida a conciliação, ofereceu contestação.

Em contestação, alegou que a autora havia manifestado interesse em realizar curso superior. Sustentou que ao constatar que a autora não confirmou sua matrícula, procedeu a exclusão das mensalidades lançadas, de modo que não há dano moral a ser indenizado. Pugnou pela improcedência.

Houve réplica".

Sentenciando, o Togado de primeiro grau, julgou os pedidos exordiais, nos seguintes termos:

"[...]Pelo exposto, julgo improcedente o pedido formulado por SILVANA APARECIDA DA SILVA contra SOCIEDADE EDUCACIONAL LEONARDO DA VINCI S/S LTDA, condenando a autora ao pagamento das custas do processo e honorários de advogado da parte adversa, arbitrados em R$ 1.000,00, [CPC, art. 85, §§ 2º e 8º, destacando que "consoante dispõe o art. 85, § 2º, 'os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa'. Entretanto, em sendo o valor atribuído à causa exorbitante diante do caso concreto, é possível o arbitramento equitativamente, nos moldes do art. 85, § 8º, da Lei Adjetiva Civil" (Agravo de Instrumento n. 4017802-41.2016.8.24.0000, de Otacílio Costa, rel. Des. Robson Luz Varella, j. 17-4-2018), observada a suspensão da exigibilidade pelo deferimento da justiça gratuita.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se".

Inconformada, a Requerente interpôs Recurso de Apelação (fls. 101/107), pugnando pela reforma da sentença, ratificando seus argumentos iniciais, defendendo a ocorrência de danos morais pela cobrança indevida de boletos, referentes a prestação de serviço educacional, junto ao Uniasselvi, a qual afirma nunca ter contratado.

Contrarrazões às fls. 111/121.

Presentes os requisitos de admissibilidade do recurso.

Este é o relatório.

VOTO

Ab initio, sobreleva consignar que a sentença objurgada foi prolatada no dia 17.06.2019 (fl. 97) e publicada em 03.07.2019 (fl. 100), ou seja, sob a vigência do Diploma Processual Civil de 2015, atraindo, portanto, a aplicação do Enunciado Administrativo n. 3 da Corte da Cidadania à hipótese em análise, in verbis:

"Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

O recurso de apelação interposto é cabível, tempestivo e preenche os requisitos de admissibilidade, razão pela qual defiro o seu processamento.

Pretende a Requerente/Apelante a reforma da sentença, sustentando a ocorrência de falha na prestação de serviço, ao realizar cobrança de serviços não contratados e portanto indevida, assim pugnando o reconhecimento de danos morais.

Pois bem.

De plano, cumpre consignar que a relação jurídica havida entre as partes é tipicamente de consumo, compreendendo-se a parte autora e a demandada aos conceitos de consumidor e fornecedor estabelecidos, respectivamente, nos arts. e , do Código de Defesa do Consumidor.

Deve-se esclarecer que as normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor deve incidir independente de ficar comprovada a relação contratual entre as partes, porquanto ainda que não fique comprovado que autor contratou de fato os empréstimos, o que adianta-se, desde já, se tratar o caso dos autos, por evidente ausência de relação contratual entre as partes, deverá ele ser tratado como consumidor por equiparação, nos termos do art. 17 do CDC ("Para efeitos desta seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento"), haja vista que terá sofrido danos, de forma reflexa, em razão dos serviços prestados pela empresa ao mercado de consumo. (TJSC, Apelação Cível n. 0301728-94.2018.8.24.0012, de Caçador, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 17-12-2019).

Nesta senda, em se tratando de relação de consumo, consabido que a responsabilidade incidente é objetiva, fundamentada pela teoria do risco (artigo 927, parágrafo único, do Código Civil e artigos 12, 14 e 17 do Código de Defesa do Consumidor), vejamos:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - o modo de seu fornecimento;

II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi fornecido.

O que significa dizer que, nesta modalidade, prescindível a comprovação da culpa do fornecedor, bastando a constatação da ocorrência do ato ilícito, do dano e do nexo de causalidade entre eles.

Nesse viés, sem maiores delongas, registre-se incontroverso a ausência de relação contratual havida entre as partes e a falha na prestação de serviços, decorrente da cobrança indevida, referente a débitos provenientes de mensalidades de curso superior ofertado pela Requerida e não contratado pela Requerente/Apelante. Tanto é verdade, que a requerida não nega tal fato.

Cinge-se, todavia, a controvérsia em verificar se a aludida falha na prestação do serviço é hábil a ensejar danos morais.

E ao que se extrai do caso concreto, o pleito indenizatório por dano moral, adianta-se, não merece acolhimento, porquanto, ainda que indiscutível a indevida cobrança por parte da Requerida/Apelada, inexiste nos autos prova de que a falha na prestação de serviços, tenha repercutido na esfera íntima da Requerente/Apelante, causando-lhe dor, sofrimento ou humilhação a sua honra e dignidade.

Com efeito, verifica-se que ainda que a situação tivesse dado causa a alguns transtornos, não ultrapassaram a esfera do mero dissabor.

Nesse viés, sabe-se que o direito à indenização por dano moral encontra-se insculpido no artigo 5º, inciso X da Constituição Federal que dispõe:

Art. 5º. [...]

X- São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

O Código Civil, por sua vez, ao tratar sobre a responsabilidade civil e o dever de indenizar, dispõe que:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

[...]

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os...

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