Acórdão Nº 0301768-47.2014.8.24.0067 do Quarta Câmara de Direito Civil, 29-09-2022

Número do processo0301768-47.2014.8.24.0067
Data29 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301768-47.2014.8.24.0067/SC

RELATOR: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA

APELANTE: LUIZ MARCON SCARIOT ADVOGADO: ANILSE DE FÁTIMA SLONGO SEIBEL (OAB SC005685) ADVOGADO: RICARDO FELIPE SEIBEL (OAB SC019217) ADVOGADO: TATIANA GARZLAFF (OAB SC028916) APELADO: VALDECIR FORGIARINI ADVOGADO: TAINA BASEI (OAB SC035426)

RELATÓRIO

A bem dos princípios da celeridade e da economia processual adoto o relatório elaborado na sentença, verbis (evento 102 - SENT106/origem):

VALDECIR FORGIARINI, qualificado nos autos, ajuizou ação de indenização em face de LUIZ MARCON SCARIOT, também qualificado, alegando, em suma, que em 04.08.2012, por volta da 1h00min, no quilometro 644,0 da BR 282, quando se deslocava para sua residência, oportunidade em que pilotava motocicleta de sua propriedade - Honda CG Titam de placa MCW 9036 -, envolveu-se em um acidente de trânsito ocasionado por um semovente que estava sobre a pista de rolamento.

Afirmou que o boi que estava na via pública pertencia ao requerido, e que devido ao acidente sofreu graves ferimentos e lesões irreversíveis nos braços, as quais o impedem de laborar como motorista, profissão que exercia antes do acidente.

Com base nessas argumentações, requereu a condenação do requerido ao pagamento das seguintes verbas: danos materiais, compostos pelas despesas médicas, conserto da moto, lucros cessantes e desembolso de futuras intervenções cirúrgicas que deverá ser submetido, despesas até então valorados em R$ 835,50, concernente ao concerto da motocicleta e o valor de R$ 450,00 recebido por mês pelas comissões; morais no valor de 100 salários mínimos; e estéticos também valorados em 100 salários mínimos.

Postulou, ainda, pela concessão da gratuidade judiciária e valorou à causa em R$ 55.000,00.

Com a inicial apresentou os documentos de fls. 20/109.

Concedido o benefício da gratuidade judiciária, determinou-se a citação do requerido (fl. 110).

Pessoalmente citado (fl. 118), o requerido apresentou contestação às fls. 120/146, arguindo, em suma, que o semovente causador do acidente não era de sua propriedade e que a identificação que levou a polícia a declinar o brinco n. 958869 como sendo do boi que causou o acidente foi informação obtida de forma equivocada no feito que tramita na esfera criminal e reproduzida nesta demanda.

Sustentou também haver necessidade de chamar o DNIT e a União para integrar o presente feito por possuírem responsabilidade solidária, mormente pelo dever de vigilância e de segurança que deve prevalecer nas rodovias.

Quanto aos danos descritos na inicial impugnou seus valores, além de reafirmar que não possui qualquer relação com o evento danoso e que o acidente de trânsito ocorreu por culpa exclusiva do requerente, que imprimia velocidade excessiva para o local.

Ao final, pugnou pela improcedência do pedido indenizatório e requereu a concessão da gratuidade judiciária.

Com a contestação juntou os documentos de fls. 147/170.

Réplica às fls. 174/177.

Saneado o feito com o indeferimento do chamamento ao processo da União e do DNIT, bem como fixados os pontos controvertidos e concessão da justiça gratuita ao requerido, designou-se data para audiência de instrução e julgamento (fls. 178/180).

Na data aprazada, audiência realizada em 29.03.2016, foi colhido o depoimento pessoal do requerido e inquiridas quatro testemunhas, duas arroladas por cada uma das partes (fl. 191).

Prolatada decisão em 12.10.2016, foi deferida a produção de prova técnica (fls. 216/218), sendo que as partes apresentaram quesitos às fls. 223/224 e 225/226.

Juntado o laudo pericial aos autos (fls. 241/249), as partes se manifestaram às fls. 253/254 e 255/256.

As partes apresentaram alegações finais por memorias às fls. 260/263 e 270/277.

A juíza Aline Mendes de Godoy assim decidiu:

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, os pedidos formulados pela parte autoria para condenar o requerido ao pagamento das seguintes verbas:

I - dano material, concernente ao pagamento do conserto da motocicleta de placa MCW 9036, no valor de R$ 835,50 (oitocentos e trinta e cinco reais e cinquenta centavos), incidindo correção monetária pelo INPC desde o desembolso da quantia (05.03.2013 - fls. 71/72) e juros de mora em 1% (um por cento) ao mês contados do evento danoso, ou seja, 04.08.2012, nos moldes da súmula 54 do STJ;

II - o custeio de procedimentos cirúrgicos futuros que se fizerem necessários e que demonstrarem causalidade com o acidente de trânsito, cujo valor deverá ser verificado em procedimento de liquidação de sentença;

III - danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a ser corrigido monetariamente pelo INPC desde a data do arbitramento e juros de mora em 1% (um por cento) ao mês a contar do evento danoso (04.08.2012), nos moldes da súmula 54 do STJ; e

IV - danos estéticos, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a ser corrigido monetariamente pelo INPC desde a data do arbitramento e juros de mora em 1% (um por cento) ao mês a contar do evento danoso (04.08.2012), na forma da súmula 54 do STJ;

Em face da sucumbência recíproca, condeno o requerido a pagar honorários ao advogado do requerente, os quais fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da condenação, na forma do artigo 85, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil c/c o artigo 11, § 1º, da Lei n. 1.060/50, e condeno o requerente a pagar honorários advocatícios ao procurador do requerido fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do artigo 85, § 8º, do Código de Processo Civil. Suspendo a exigibilidade dessas verbas pelo prazo de 05 (cinco) anos, consoante dispõe o § 3º do artigo 98 do Códex Instrumental Civil, pois tanto o requerente como o requerido são beneficiários da gratuidade judiciária (fls. 110 e 179).

Deixo de condenar as partes ao pagamento das custas processuais, já que ambas são isentas de tal obrigação, nos moldes do artigo 35, alíneas "d", da Lei Complementar n. 156/97.

Não é caso de constituição de capital, mormente porque não houve condenação ao pagamento de prestação alimentícia (artigo 533 do CPC).

Apelou o réu (evento 107/origem), argumentando: a) "inexistir nos autos qualquer prova concreta de que o animal envolvido no acidente era de propriedade do recorrente, não podendo ocorrer, desta forma, a condenação sem prova precisa da responsabilidade" (p. 4); b) "a única forma de se ter certeza que o animal causador do sinistro era de propriedade do recorrente e assim poder lhe imputar o dever de indenizar seria através do brinco ou do animal machucado após o acidente, contudo, esta prova se tornou impossível diante do desaparecimento do animal, se é que foi um bicho que deu causa ao sinistro" (p. 5); c) "o julgado é fundamentado em depoimento prestado pelo IRMÃO DA VÍTIMA (fls. 287), sabendo-se da proximidade entre as partes e do seu impedimento de prestar depoimento na qualidade de testemunha, referida justificação é no mínimo tendenciosa" (p. 7); d) "as testemunhas arroladas pela parte recorrida se contradizem, se confundem e percebe-se claramente que foram instruídas antes de prestar o depoimento, vez que uma delas cita até a data que o acidente teria ocorrido" (p. 7); e) "no momento em que foi colhido o depoimento pessoal do réu, ora recorrente, este informou que outros vizinhos também possuíam e possuem gado que com certa frequência escapam do potreiro (07min09seg), tal relato é confirmado pela testemunha Expedito Francisco Toniolli, ao deixar claro que do outro lado da estrada também tem potreiros - invernada -, na frente da propriedade do Sr. Scariot (recorrente)" (p.7); f) "as testemunhas Olívio Zapani e Expedito F. Toniolli, sustentam que nunca viram qualquer animal de propriedade do recorrente escapar ou fora do potreiro, sendo que a cerca tinha sido concertada uma semana antes da data do acidente" (p. 7); g) "o que houve na redondeza foram comentários que poderia ser o animal do recorrente, vez que um dos seus animais sumiu na mesma época dos fatos que deu ensejo ao ajuizamento da presente demanda, contudo, tratou-se de uma coincidência, e a partir dos comentários e fofocas da redondeza foi atribuída a responsabilidade ao recorrente por supostamente ser o seu animal" (p. 8); h) "o acidente de trânsito, por si só, não possui o condão de gerar danos de ordem extrapatrimonial, mormente no caso em tela em que não se vislumbra o requisito do nexo causal" (p. 9); i) "necessária se faz a minoração dos valores fixados a título de danos morais e estéticos, vez que não vai em conformidade com o entendimento que predomina nos Tribunais" (p. 9), sugerindo-se "o arbitramento em R$ 2.000,00 (dois mil reais) a título de danos morais e estéticos, sendo que referido montante atende os parâmetros da proporcionalidade e razoabilidade do caso concreto" (p. 10).

Contrarrazões pelo autor (evento 111/origem), defendendo que: a) "está devidamente comprovado que o bovino causador do acidente é de propriedade do Apelante, não procedendo qualquer dos questionamentos realizados, devendo ser mantida a condenação em todos os seus termos" (p. 6); b) "o valor fixado a título de danos morais e estéticos deve ser mantido, vez que foram fixados com base no sofrimento suportado pelo Apelado, que ultrapassaram a esfera daquilo que deixa de ser razoável, aquilo que o homem-médio aceita como fato comum à sociedade, devendo ser mantida a sentença monocrática" (p. 7).

O recurso foi recebido, no duplo efeito (evento 9).

VOTO

1 Admissibilidade

A sentença foi prolatada e publicada sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, à luz do qual o caso será apreciado, consoante o Enunciado Administrativo nº 3 do Superior Tribunal de Justiça.

Por meio da decisão de evento 9 já se reconheceu o preenchimento dos pressupostos de admissibilidade recursal, razão pela qual ratifico o recebimento do reclamo.

2 Da responsabilidade pelo acidente de trânsito

Sustenta o recorrente, em suma, que não há provas contundentes nos autos de que o acidente foi causado...

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