Acórdão Nº 0301883-56.2018.8.24.0058 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 13-10-2022

Número do processo0301883-56.2018.8.24.0058
Data13 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0301883-56.2018.8.24.0058/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: MARILENE DEBARBA APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.

RELATÓRIO

Da ação

Adoto o relatório da sentença recorrida (Evento 18), em atenção aos princípios da celeridade e da economia processuais, por retratar com fidedignidade o traquejo da instrução havido na origem, in verbis:

Marilene Debarba devidamente qualificada nos autos, aforou a presente ação de revisão de cláusulas contratuais c/c cobrança de seguro de proteção financeira, repetição de indébito e pedido de tutela antecipada contra o Banco Bradesco Financiamentos S/A igualmente qualificado, na qual se pretende: a) a redução da taxa de juros remuneratórios; b) a exclusão da incidência da capitalização dos juros (anatocismo); c) o afastamento da comissão de permanência; d) o expurgo das taxas administrativas; e) a nulidade da cláusula que prevê o vencimento antecipado da dívida; f) afastamento da mora, notadamente diante da existência de contrato de seguro, cuja aplicação igualmente é pretendida; e g) o afastamento da tabela PRICE; h) o ressarcimento, em dobro, dos valores pagos a maior.Os pedidos formulados em sede liminar - manutenção de posse sobre o bem e ordem de abstenção de negativação do crédito da autora - restaram denegados pelo comando de p. 73-76, mas, em contrapartida, deferida a consignação em juízo das parcelas incontroversas, além de determinada a apresentação da relação contratual havida entre as partes.A instituição financeira demandada ofertou contestação às p. 82-111, invocando preliminares de ilegitimidade passiva e impugnação ao pleito de justiça gratuita e, tocante ao mérito, replicou os argumentos perfilhados na exordial, defendendo a legitimidade e higidez do pacto celebrado entre as partes, pugnando, assim, pela total improcedência dos pleitos formulados.Replicada a defesa, vieram conclusos os autos.

Da sentença

O Juiz de Direito, Dr. RAFAEL ESPÍNDOLA BERNDT, da 2ª Vara da Comarca de São Bento do Sul, julgou parcialmente procedentes os pedidos deduzidos na exordial, cujo excerto dispositivo transcreve-se abaixo (Evento 18):

a) suspender o feito em relação as tarifas incidentes no contrato de financiamento, até o julgamento do REsp 1.578.526, representativo da controvérsia;b) permitir a capitalização de juros, na forma e periodicidade estipulados na avença;c) vedar a exigência, concomitante, dos juros de mora e multa contratual sobre o débito acrescido de encargos moratórios, os quais, de seu turno, deverão incidir, exclusivamente, sobre o valor da prestação vencida;d) afastar o pedido de descaracterização da mora;e) determinar a devolução de valores eventualmente pagos a maior de maneira simples, acrescida de correção monetária pelo INPC, desde os respectivos pagamentos, bem como de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação; admitida a compensação com eventuais débitos pendentes.Considerando que a parte autora obteve êxito em mínima parcela dos pedidos que formulou na exordial, sucumbindo, por inteiro, em relação aos demais, responderá, integralmente, pelas custas processuais até aqui apuradas e honorários advocatícios, estes que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 86, Parágrafo Único, do Código de Processo Civil, cuja exigibilidade resta suspensa, em face da gratuidade de justiça que lhe foi concedida. Custas na forma da lei.Publique-se. Registre-se. Intimem-se.Oportunamente, arquive-se.

Da Apelação Cível do Banco

Inconformado com a prestação jurisdicional entregue, o Réu BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A., ora Apelante, interpôs recurso de Apelação (Evento 28).

O Banco sustenta que houve equívoco na decisão no ponto que determina o sobrestamento quanto às tarifas administrativas. Argumenta que ocorreu o julgamento do REsp 1.578.553, em 28/11/2018, cuja tese firmada contempla as tarifas objeto dessa demanda revisional.

Salienta que no contrato juntado aos autos, não há previsão de cobrança de comissão de permanência em caso de inadimplemento. Informa que a possibilidade de cobrança dos juros remuneratórios no período da inadimplência - que não se confunde com a comissão de permanência - é confirmada pela Súmula 296 do Superior Tribunal de Justiça. Busca a modificação do decisum a fim de que seja reconhecida a exigibilidade dos encargos de mora tal qual pactuados.

Requer o provimento do recurso para: a) julgar o feito no que diz respeito as tarifas; b) reformar parcialmente a sentença, mantendo-se hígidos os encargos moratórios pactuados.

Da Apelação Cível da Autora

A Autora manejou recurso de Apelação Cível com intuito de reforma da sentença (Evento 23).

Alega que há nos autos prova cabal da oferta de juros remuneratórios na base de 0,99% ao mês, sendo assim, incabível a aplicação de juros acima deste patamar.

Aduz que a possibilidade de capitalizar-se juros somente é admitida mediante expressa previsão de lei em sentido formal, a exemplo do que ocorre em relação aos títulos de crédito rural, comercial, industrial e de exportação; afora isso, a capitalização dos juros é proibida expressamente pela Lei da Usura (art. 4º do Dec. 22.626/33), vedação esta respaldada pela Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal. De outro lado, o art. 4º do Decreto n. 22.626/33 veda terminantemente o anatocismo - cômputo de juros sobre juros -, consentindo, apenas, com "a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta-corrente de ano a ano". Desta feita, não tendo previsão expressa no contrato dispondo sobre a capitalização mensal de juros, esta deve ser expurgada do novo cálculo a ser elaborado em liquidação de sentença.

Afirma que a obrigação é ilíquida, portanto, a comissão de permanência deve incidir somente a partir do trânsito em julgado da sentença, eis que no caso de uma ação revisional é este o momento deflagrador e equacionador da ciência do débito, diante de seu recálculo de acordo com os parâmetros estabelecidos no acórdão a ser exarado por este Colendo Tribunal.

Assevera que o Banco transferiu o ônus da sua atividade comercial a parte Autora, sem o seu conhecimento, ao cobrar a "taxa" de Abertura de Crédito (TAC) e a Tarifa de Emissão de Carnê (TEC). A cobrança das tarifas é indevida e deverá ser restituída ou compensada no saldo devedor, haja vista que a cláusula que permite esta transferência é nula de pleno direito, consoante o disposto no art. 51, IV, do CDC.

A Autora argui que a descaracterização da mora só poderá ser definida em sede de liquidação de sentença, eis que somente o expert pode e deverá analisar detidamente se houve ou não cobrança de encargos excessivos que geraram um saldo negativo que não aconteceria caso tivesse a Instituição Financeira cobrado juros legais e não os abusivos tratados pelo atual ordenamento jurídico.

Também suscita a abusividade da cláusula da previsão de vencimento antecipado da dívida. Neste ponto, a Autora diz que a cláusula resolutória expressa é nula.

Ao final, requer o provimento do Apelo para que seja acatada a preliminar de cerceamento de defesa, cassando a sentença vergastada e remetendo-se o processo para o Juízo de primeira instância, para que possibilite a produção de provas testemunhais, objetivando provar que a taxa de juros remuneratórios livremente pactuada fora diversa da realmente cobrada, bem como para possibilitar a produção de provas quanto aos danos morais suportados pela Autora, a fim de que seja prolatada nova sentença refletindo a verdadeira justiça.

No mérito, pleiteia a reforma da sentença nos seguintes quesitos: 1) a incidência de juros remuneratórios de 0,99% ao mês, tal como acordado; 2) seja afastada toda e qualquer capitalização de juros; 3) o expurgo da cobrança de encargos moratórios como a multa contratual, juros moratórios e comissão de permanência, pois o saldo devedor somente poderá ser apurado após a liquidação da sentença, por ora, em razão da descaracterização da mora por culpa do Credor, não há mora por parte da Autora, sendo que o momento equacionador do saldo devedor neste tipo de procedimento é o trânsito em julgado da ação, quando será conhecido o montante legalmente exigível; 4) seja declarada nula a cláusula do contrato que prevê o vencimento antecipado do contrato; 5) seja declarada a ilegalidade e via correlata a restituição dos valores cobrados reputados como TAC e TEC inclusas no contrato, cujos valores deverão ser restituídos acrescidos de juros legais de 12% ao ano mais a correção monetária incidente sobre os mesmos, caso contrário implica em enriquecimento sem causa do Banco; 6) seja condenada a Instituição Financeira a repetição do indébito, na forma dobrada, porém, corrigida a partir de cada desembolso considerado indevido no momento da perícia contábil a ser elaborada na liquidação de sentença, esta a ser paga pelo Banco em razão da inversão do ônus da prova delineada no CODECON.

Das contrarrazões

O Banco apresentou contrarrazões, na qual aventa a ofensa ao princípio da dialeticidade recursal (Evento 35).

A Autora ofereceu contrarrazões (Evento 45).

Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

Após a redistribuição, vieram-me conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

a) Da desistência da ação

Na dicção do art. 485, § 5º do CPC "A desistência da ação pode ser apresentada até a sentença. ".

Sendo assim, indefiro o pleito de desistência da ação formulado após a sentença (Evento 41).

b) Da dialeticidade recursal

Julgo prejudicado o requerimento preliminar de cerceamento de defesa. O Apelo não possui a exposição do fato e do direito, nem as razões de decretação de nulidade.

Nesse jaez, o édito do art. 1.010, II e III do CPC não foi observado, e está configurada a violação ao princípio da dialeticidade recursal.

Ressalto que os demais pontos do recurso da Autora impugnam a sentença de forma especificada.

Conheço, em parte, da Apelação Cível manejada pela Autora; e conheço do recurso de Apelação Cível interposto pela Instituição Financeira.

II - Do julgamento do...

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