Acórdão Nº 0302002-34.2015.8.24.0054 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 23-11-2022

Número do processo0302002-34.2015.8.24.0054
Data23 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0302002-34.2015.8.24.0054/SC

RELATOR: Desembargador JAIME MACHADO JUNIOR

APELANTE: MATELOTI CONFECCOES LTDA - ME (AUTOR) APELANTE: CLEITON MARTINI (AUTOR) APELANTE: JULIANA MORATELLI MARTINI (AUTOR) APELANTE: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

1.1) Da inicial

MATELOTI CONFECÇÕES LTDA. ME, JULIANA MORATELLI MARTINI e CLEITON MARTINI ajuizaram Ação Revisional em face de BANCO BRADESCO S.A.

Alegaram a onerosidade excessiva das obrigações contratuais previstas das operações de crédito vinculadas à Conta Corrente 0065.055-2 - Agência 0367-0 -titularizada pela empresa autora e mantida junto ao réu, pois as cobranças ilegais e abusivas tornaram as prestações incertas e ilíquidas e, portanto, inexigíveis.

Pleitearam a concessão da tutela de urgência antecipada para que o réu se abstenha de incluir restrição creditícia em seus nomes com esteio nas dívidas sub judice e, caso já a tenha incluído, promova a sua exclusão.

Requereram a revisão das obrigações contratuais, nos seguintes termos: (i) limitação da taxa de juros remuneratórios à taxa média de mercado; (ii) vedação à capitalização de juros; (iii) afastamento da cobrança da comissão de permanência de forma cumulada com outros encargos; (iv) vedação à cobrança da Tarifa de Abertura de Crédito - TAC e da Tarifa de Emissão de Carnê - TEC; (v) atualização monetária pelo INPC; (vi) descaracterização da mora; (vii) não incidência de consectários da mora; (viii) declaração da nulidade da cláusula que prevê o dever de ressarcimento ao réu pelos autores de despesas com honorários advocatícios por conta de cobrança extrajudicial; (ix) repetição de indébito; e (x) compensação de valores.

Pugnaram pela aplicação do Código de Defesa do Consumidor com a inversão do ônus da prova e pela exibição de documentos pelo réu.

Pediram a atribuição da sucumbência ao réu.

Valoraram a causa e juntaram documentos (evento 1).

1.2) Da resposta

Citado, o réu apresentou resposta, em forma de contestação (eventos 4, 12 e 13). Como preliminar, alegou a inépcia da petição inicial. No mérito, defendeu a obrigatoriedade contratual, a licitude dos encargos contratuais conforme pactuados, a impossibilidade da inversão do ônus da prova e da exibição de documentos, o não preenchimento dos requisitos legais para a concessão da tutela provisória de urgência antecipada pleiteada na petição inicial, o não cabimento da repetição de indébito e a caracterização da mora. Requereu a extinção do feito com acolhimento da preliminar e, de forma subsidiária, a improcedência dos pedidos formulados na petição inicial e a atribuição da sucumbência à autora.

1.3) Do encadernamento processual

Concedida a tutela de urgência antecipada, reconhecida a aplicação do CDC, invertido o ônus da prova e determinada ao réu a exibição de documentos com advertência acerca da presunção legal de veracidade (evento 3).

Réplica (evento 19).

Certificado o apensamento destes autos aos dos Embargos à Execução n. 0302663-76.2016.8.24.0054 (evento 22).

Em decisão de saneamento do processo, o magistrado a quo rechaçou a preliminar alegada pelo réu, a quem ordenou novamente a exibição de documentos com advertência quanto à presunção do art. 400 do CPC (evento 26).

O réu juntou documentos, acerca dos quais os autores se manifestaram (eventos 29 e 33).

1.4) Da sentença

Em julgamento simultâneo desta Ação Revisional e dos Embargos à Execução n. 0302663-76.2016.8.24.0054, o Juiz de Direito Eduardo Felipe Nardelli proferiu sentença resolutiva de mérito (evento 38), nos seguintes termos:

1. Do exposto, resolvo o mérito julgando parcialmente procedentes os pedidos deduzidos na petição inicial (art. 487, I, do CPC), para: a) determinar que o(s) contrato(s) observe(m) o resultado da revisão judicial ora efetuada, expressa no quadro resumo reproduzido na fundamentação, notadamente o afastamento da cumulação da "taxa de remuneração" com outros encargos moratórios ou remuneratórios e o afastamento das tarifas de abertura de crédito, de emissão de boleto e de cadastro (esta somente a partir da segunda cobrança); b) declarar o consumidor em mora, em razão da ausência de depósito do valor incontroverso; e,c) determinar a compensação/restituição, na forma simples, dos valores exigidos a maior, de acordo com a revisão ora efetuada, observando os encargos referidos na fundamentação.Condeno as partes ao pagamento das despesas processuais pendentes, na proporção de 2/3 distribuídos ao(s) integrante(s) do polo ativo e de 1/3 imputados ao(s) do lado passivo, conforme arts. 86 e 87 do CPC.Os litigantes estão obrigados a indenizar as despesas adiantadas no curso do processo, observada a mesma proporção antes fixada, admitida a compensação, conforme art. 82, § 2º, do CPC.Fixo os honorários sucumbenciais devidos aos advogados dos autores no percentual de 10% sobre o valor da condenação, acrescido dos encargos moratórios, e arbitro os honorários devidos aos advogados da ré, por apreciação equitativa, em R$ 2.000,00 (cuja metade deve ser reservada aos pretéritos patronosda ré, nos termos da petição de fls. 511-513), conforme art. 85 do CPC.2. Ante o exposto, acolho os embargos à execução e julgo parcialmente procedentes os pedidos, para declarar inexigíveis os valores em descompasso com o resultado da revisão judicial ora efetuada, expressa no quadro resumo reproduzido na fundamentação, especialmente a cumulação da "taxa de remuneração" com outros encargos moratórios ou remuneratórios e a cobrança das tarifas de abertura de crédito, de emissão de boleto e de cadastro (esta somente a partir da segunda cobrança).Condeno as partes ao pagamento das despesas processuais pendentes, na proporção de 2/3 distribuídos ao(s) integrante(s) do polo ativo e de 1/3 imputados ao(s) do lado passivo, conforme arts. 86 e 87 do CPC.Os litigantes estão obrigados a indenizar as despesas adiantadas no curso do processo, observada a mesma proporção antes fixada, admitida a compensação, conforme art. 82, § 2º, do CPC.Fixo os honorários sucumbenciais devidos aos advogados dos autores no percentual de 10% sobre o valor da condenação, acrescido dos encargos moratórios, e arbitro os honorários devidos aos advogados da ré, por apreciação equitativa, em R$ 2.000,00, conforme art. 85 do CPC. (grifos do original)

1.5) Dos Embargos de Declaração

Rejeitados os Embargos de Declaração dos autores (eventos 44/45).

1.6) Dos recursos

Irresignadas, ambas as partes interpuseram recurso de Apelação Cível (eventos 52 e 56).

Em suas razões recursais, o réu sustenta a obrigatoriedade contratual, a licitude da comissão de permanência, dos juros remuneratórios e da sua capitalização conforme pactuados e o não cabimento da repetição de indébito, com o que pretende a reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial e atribuir a sucumbência integralmente aos autores.

Já os autores requerem a reforma parcial da sentença com a vedação à capitalização dos juros, a limitação da taxa dos juros remuneratórios à taxa média de mercado aplicável ao caso, a atualização monetária pelo INPC, a descaracterização da mora, o afastamento dos consectários da mora, a atribuição do ônus sucumbencial apenas ao réu e a fixação por apreciação equitativa dos honorários sucumbenciais em favor do seu advogado. Formula prequestionamento.

1.7) Das contrarrazões

Apresentadas (eventos 66/67).

É o relatório.

VOTO

2.1) Do objeto recursal

A discussão versa sobre obrigatoriedade contratual, capitalização, juros remuneratórios, correção monetária, mora e consectários, comissão de permanência, repetição de indébito, prequestionamento e sucumbência.

2.2) Da admissibilidade

Ab initio, deixo de conhecer do recurso do réu quanto à tese de licitude dos juros remuneratórios e da capitalização de juros, pois o juízo a quo decidiu nesse sentido. Evidente, pois, a ausência de interesse recursal e de dialeticidade (art. 1.010, II e III, CPC) nesses pontos.

Outrossim, vê-se que o réu impugna a sentença no tocante à comissão de permanência, a respeito do que se limita a defender a licitude do encargo, mas não a sua forma de cobrança (isolada de ou cumulada com outros encargos), sendo que o juízo a quo decidiu pela licitude da comissão de permanência e tão somente vedou a sua cobrança de forma cumulada com outros encargos nas operações de crédito cujo instrumento contratual contempla previsão nesse sentido. Nítida, pois, a ausência de interesse recursal e dialeticidade (art. 1.010, II e III, CPC) também nesse ponto, em relação ao qual deixo de conhecer do apelo do réu.

Por outro lado e ao contrário do alegado pelos autores no bojo de suas contrarrazões (evento 66, fl. 3), não há que se falar em falta de dialeticidade entre a sentença e os demais pontos de insurgência nas razões do recurso do réu.

Isso porque o apelo do réu compreende a exposição do fato e do direito e as razões do pedido de reforma da sentença (art. 1.010, II e III, CPC), mostrando-se apto a impugná-la ao apontar os motivos pelos quais a parte sustenta o desacerto do magistrado de primeira instância quanto à obrigatoriedade contratual e à repetição de indébito e, com isso, defende a improcedência dos pedidos formulados na inicial.

No mais, conheço dos recursos porque presentes requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade , porquanto interpostos a tempo e modo, recolhido o preparo e evidenciados o objeto e a legitimação.

2.3) Do mérito

2.3.1) Da obrigatoriedade contratual

Entendido como aplicável ao caso o Código de Defesa do Consumidor, fica valendo aqui a regra prevista no inciso V do seu art. 6º, que prevê - como direito básico do consumidor - "a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas".

Acerca da proteção do consumidor no tocante aos contratos, elucida a doutrina:

No que respeita aos aspectos contratuais da proteção do consumidor, o CDC rompe com a tradição do Direito Privado, cujas bases estão...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT