Acórdão Nº 0302005-47.2016.8.24.0282 do Quarta Câmara de Direito Público, 13-10-2022

Número do processo0302005-47.2016.8.24.0282
Data13 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0302005-47.2016.8.24.0282/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ LUIZ DACOL

APELANTE: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU) APELADO: MARCOS ELNISTO ALVES (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Jaguaruna, Marcos Elnisto Alves ajuizou ação de obrigação de fazer em face de Centrais Elétricas de Santa Catarina S/A - CELESC.

À luz dos princípios da economia e celeridade processual, por sintetizar de forma fidedigna, adoto o relatório da sentença:

MARCOS ELNISTO ALVES, devidamente qualificado nos autos, por procurador habilitado, ajuizou a presente ação de obrigação de fazer em face da CENTRAIS ELÉTRICAS DE SANTA CATARINA S/A - CELESC, objetivando, em síntese, o fornecimento de energia elétrica em imóvel de sua propriedade.

Narrou, em sua exordial, ser proprietário de imóvel localizado em Área de Preservação Permanente, razão pela qual o pedido de ligação de energia foi indeferido pela parte ré. Sustentou, no entanto, tratar-se de área urbana consolidada, já que em imóveis vizinhos há fornecimento do serviço.

Valorou a causa e arregimentou documentos. Pugnou pela concessão de medida liminar.

Pela decisão contida no ev. 03, deferiu-se a medida liminar. Ainda, determinou-se a inversão do ônus da prova, em razão da relação de consumo existente entre as partes.

Devidamente citada, a Celesc contestou o feito (ev. 18). Preliminarmente, arguiu a carência da ação, em razão da ausência de prévio requerimento de ligação de energia e a incompetência absoluta da justiça estadual para análise do feito. Pugnou pela inclusão do Município de Jaguaruna/SC no polo passivo da demanda, ao argumento que é o responsável pela efetivação das construções.

No mérito, em suma, apontou que a parte autora não apresentou os documentos legalmente exigidos para o fornecimento do serviço: alvará de construção e autorização do IMAJ. Ademais, aduziu estar cumprindo as exigências determinadas na Ação Civil Pública n. 97.0003822-0, a qual tramitou na Justiça Federal, solicitando certificado de inexistência de restrição ambiental. Após outras considerações, pugnou pela improcedência dos pedidos iniciais.

Houve réplica (ev. 27), ocasião em que a parte autora reiterou seus argumentos iniciais.

Definida a competência entre as varas especializadas da Comarca de Jaguaruna, os autos foram conclusos ao representante do Parquet, o qual opinou pela improcedência dos pedidos iniciais (ev. 136).

Devidamente instruída, a lide foi julgada nos termos retro (ev138, origem):

Em razão do exposto, com fulcro no artigo 487, I, do CPC, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por MARCOS ELNISTO ALVES, nestes autos de Ação de Obrigação de Fazer aforada contra CENTRAIS ELÉTRICAS DE SANTA CATARINA S/A - CELESC, para o fim de:

CONDENAR a parte ré a proceder o reestabelecimento da energia elétrica na residência da parte autora.

Em decorrência da sucumbência, CONDENO a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais), consoante prevê o art. 85, §§2º e 8º, do CPC, considerando a natureza e importância da matéria trazida a conhecimento, o grau de zelo dos procuradores, o tempo que lhes foi exigido para o serviço e o lugar da sua prestação.

Irresignada, a parte ré interpôs recurso de apelação (ev150, origem). Preliminarmente, arguiu que não houve requerimento administrativo, impedindo o acolhimento da pretensão deduzida, bem como, diante do litisconsórcio passivo necessário deve o município de Jaguaruna-SC integrar a lide. No mérito, argumentou que: a) o imóvel está localizado em área de preservação permanente; b) inexiste comprovação de alvará de construção, habite-se ou autorização municipal para efetivar a ligação de energia elétrica; c) a recusa foi legítima; d) o cumprimento de sentença 5009898-09.2015.4.04.7200 - que tramita na Justiça Federal - possui a finalidade de evitar instalação de energia elétrica em loteamentos clandestinos e em área de preservação permanente; e) não incumbe indicar se o imóvel está inserido em área urbana consolidada.

Por fim, postulou o provimento do recurso, a fim de que sejam julgados improcedentes os pedidos exordiais.

Com contrarrazões (ev155, origem), os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e provimento do reclamo (ev13, 2G).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

1. Compulsando os autos, observo a presença de todos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade (intrínsecos: cabimento, interesse recursal, legitimidade recursal, inexistência de fato extintivo do direito de recorrer; e extrínsecos: regularidade formal, tempestividade), razão por que conheço do recurso.

2. No tocante às prefaciais suscitadas pela recorrente, de que não houve requerimento administrativo pela parte autora, bem como acerca da necessidade do município de Jaguaruna-SC integrar a lide (litisconsórcio passivo), tenho que se mostra prescindível sua análise, porquanto a resolução do mérito será decidida em favor da parte apelante, nos moldes dos arts. 282, § 2º e 488, ambos do Código do Processo Civil. Veja-se:

Art. 282. Ao pronunciar a nulidade, o juiz declarará que atos são atingidos e ordenará as providências necessárias a fim de que sejam repetidos ou retificados.

[...]

§ 2º Quando puder decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta.

Art. 488. Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485. (grifo nosso)

Nesse sentido, mutatis mutandis, já decidiu este Sodalício:

APELAÇÃO CÍVEL. DECLARATÓRIA E INDENIZATÓRIA. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) DO CARTÃO DE CRÉDITO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO RÉU. PRELIMINAR. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL ALEGADA PELO RÉU. PRESCINDIBILIDADE DA ANÁLISE DA PRELIMINAR ANTE A RESOLUÇÃO DO MÉRITO EM FAVOR DA PARTE QUE A ALEGOU (ART. 282, §2º E ART. 488, CPC). [...]RECURSO PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5038991-65.2021.8.24.0038, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 11-08-2022 - grifo nosso).

3. Cinge-se a controvérsia sobre a pretensão de fornecimento de energia elétrica no imóvel de propriedade do autor, localizado no Loteamento Balneário Campos Verdes, em Jaguaruna/SC. A apelante assevera que a residência do demandante está inserida em área de preservação permanente (APP), motivo pelo qual defende que a recusa na prestação do serviço se mostra legítima.

Adianto que razão lhe assiste.

A despeito da argumentação trazida à baila, vislumbro equívoco no decisum objurgado apto a ensejar a sua reforma, porquanto as documentais carreadas atestam que o imóvel do autor está situado em Área de Preservação Permanente (APP).

É o que se retira do parecer técnico (ev1 - info9, origem) emitido com base no processo administrativo protocolado sob nº 08556//2015 e parecer técnico nº 08556//2016, do Instituto Municipal do Meio Ambiente de Jaguaruna (IMAJ):

[...] Relatório de vistoria

[...] O imóvel encontra-se sobre uma área de dunas.- O loteamente possui Ação Civil Pública nº 5001157-34.2012.4.04.7216.- No entorno do imóvel vistoriado não ocorre a presença de residências unifamiliares.- O imóvel está distante, aproximadamente, à 327m da linha de preamar.

ConclusãoO imóvel vistoriado ESTÁ em Área de Preservação Permanente (APP), conforme Lei Federal n. 12651/12 que institui o Código Florestal Brasileiro e/ou Resolução CONAMAn. 303 de 20 de março de 2002, que dispõe sobre parâmetros, defnições e limites de áres de preservação permanente (grifo nosso).

Conforme extrai-se da peça contestatória (ev18 - fls. 2 e 15, origem):

[...] NÃO EXISTE AUTORIZAÇÃO PARA LIGAÇÃO DE ENERGIAELÉTRICAR PELO ORGÃO AMBIENTAL, COMO DETERMINA A LEI INDICADAACIMA.

[...] Conforme informado acima, em conformidade com o Cumprimento de Sentença a CELESC TEM OBRIGAÇAO DE EXIGIR CERTIFICADO DE NÃO EXISTÊNCIA DE RESTRIÇAO AMBIENTAL PARA O LOCAL ONDE SERÁ REALIZADA A LIGAÇAO DE ENERGIA ELÉTRICA.

[...] Ressalta-se que:

- O imóvel não possui matrícula no registro de imóvel;

- O imóvel não possui escritura pública;

- O autor não apresenta ALVARÁ de construção ou regularização;

- O autor não apresenta habite-se;

- O autor não apresenta laudo de viabilidade para construção;

- NÃO EXISTE CADASTRO DE IPTU do referido imóvel;

- Não existe documento acerca do recolhimento de lixo;

- Não existe autorização do IMAJ para construção.

De sua vez, o demandante admite a localização do imóvel em Área de Preservação Permanente (APP), contudo, argumenta se trata de área urbana consolidada, inexistindo perigo de dano ambiental.

Nesta direção, embora sustente que a área urbana já se encontra consolidada no local, verifico que a parte autora não amealhou ao caderno processual nenhum elemento probatório nesse sentido. Isso, per si, inviabiliza o acolhimento da pretensão formulada.

Ademais, observa-se das fotografias acostadas ao feito (ev1 - info6-7, origem) que o imóvel não está localizado em perímetro urbano, tratando-se de local bastante arenoso, cuja estrada é desprovida de pavimentação, sem muitas residências próximas, inexistindo a comprovação de existência de prestação de demais serviços públicos.

Frise-se que o demandante não demonstrou que a edificação da sua residência se encontra regularizada perante o município de Jaguaruna-SC, uma vez que não apresenta qualquer alvará de construção, habite-se, ou ainda, laudo de viabilidade para edificar o referido imóvel.

Não obstante, é consabido que "a existência de outras edificações em situação semelhante e destinatárias do serviço não é argumento idôneo para tolerar a irregularidade da construção, pois os abusos e as violações da lei devem ser coibidos, não imitados."(TJSC, Agravo de Instrumento n. 0025491-10.2016.8.24.0000, de Blumenau, rel. Pedro Manoel Abreu, Terceira Câmara de Direito Público, j. 13-06-2017).

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